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Além da inconstitucionalidade comissiva, o constituinte brasileiro também mostrou preocupação com a inconstitucionalidade omissiva, em que editou

enunciado constitucional que possibilitasse ao STF realizar o controle de constitucionalidade na hipótese em que a inação do Poder Público prejudicasse a eficácia de um preceito da CF. Nesse sentido, o artigo 103, §2º, CF determina que, uma vez declarada a inconstitucionalidade por omissão, o STF dará ciência ao órgão competente para a implementação da medida necessária, o qual, se administrativo, terá trinta dias para fazê-lo.

A Lei Federal nº. 9.868/99, após a reforma ocasionada pela Lei Federal nº. 12.063/09, no art. 12-A e seguintes regulamenta a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADIO), em que estabelece, em seu art. 12-H, §2º, que se aplica à decisão da ADIO, no que for compatível, o mesmo regime cabível às decisões da ADI e ADC. Nesse contexto, tem-se que o art. 28, parágrafo único, da Lei Federal nº. 9.868/99, o qual atribui às decisões da ADI e ADC efeito contra todos e vinculante.

Logo, questão relevante para o presente trabalho é saber se o efeito vinculante é compatível com a decisão da ADIO. Para tanto, faz-se necessário analisar a ADI e ADC, suas singularidades e técnicas de decisões e compará-las com as peculiaridades da ADO e saber se os efeitos são compatíveis previstos no art. 28, parágrafo único da Lei nº. 9.868/99.

A ADI e a ADC são ações que buscam reprimir atos normativos dos órgãos públicos que atentem contra a Constituição, retirando-o do ordenamento jurídico. Dessa forma, trata-se de uma fiscalização normativa cujo pedido envolve a declaração de inconstitucionalidade ou constitucionalidade do objeto do controle e a consequente retirada, ou manutenção. Nesse contexto, o efeito contra todos estabelece que os órgãos estatais submetam-se à decisão do STF, aceitando exclusão ou permanência da norma do sistema. Ademais, o efeito vinculante impõe que os órgãos que estão incluídos dentro dos limites subjetivos adequem-se ao decidido e evitem a edição de ato normativo similar no futuro.

Por outro lado, a ADIO e a declaração de inconstitucionalidade por omissão têm feição diferente. Ao contrário das citadas ações de controle, que têm como objeto uma atuação do Estado, a ADIO tem como objeto justamente o silêncio legislativo134 de um ente estatal, que deixa de concretizar norma constitucional, não editando o ato normativo necessário para implementar o comando constitucional. Nesse

contexto, o pedido da ADIO envolve a identificação de uma omissão inconstitucional e a ciência do órgão responsável para que a supra (no caso de órgão administrativo, há a previsão do prazo de 30 dias para a edição do ato que acabe com a omissão – art. 103, §2º, CF).

No tocante à omissão parcial, tem-se questão distinta, pois nesse caso há um ato que implementa de forma insuficiente o estabelecido constitucionalmente. Essa forma de omissão pode se dar de duas maneiras: horizontalmente e verticalmente.135 No primeiro caso, a norma é omissa porque deixa de beneficiar determinado grupo ou classe de um benefício ao qual faria jus. Nesse caso, há também uma violação da igualdade, pois os que não foram atingidos pela norma são tratados desigualmente de outros em situação similar. No segundo caso, há uma baixa intensidade da proteção, não atingindo um padrão mínimo estabelecido constitucionalmente.136

Apesar dessa modalidade de omissão ter por base a existência de uma norma, a técnica de decisão é a mesma da omissão total: ciência do órgão responsável para que supra a inconstitucionalidade. Isso se dá pelo fato de que, a declaração de inconstitucionalidade (e retirada da norma do ordenamento jurídico) ocasionaria a acentuação da inconstitucionalidade, pois deixaria sem regulamentação até mesmo a parte que havia sido resguardada pelo dispositivo declarado em desconformidade com a Constituição pela omissão parcial. O vício da omissão parcial não está no fato da parte que ela concretiza, mas sim em sua extensão. Igualmente, a suspensão do diploma legal resultaria em efeito similar, acentuando a inconstitucionalidade.137 Além disso, o preenchimento da omissão pelo Poder Judiciário esbarra na separação dos Poderes, na limitação das funções típicas do tribunal constitucional como legislador negativo e na redação do art. 103, §2º, CF.138

135 A figura da inconstitucionalidade parcial horizontal é controversa na literatura especializada, havendo

quem a considere também como uma omissão total. Dimitri Dimoulis e Soraya Lunardi fazem tal consideração, apesar de não tratarem o tema nesses termos, mesmo sua análise se adequando claramente no inconstitucionalidade parcial horizontal. Nesse sentido, Dimitri Dimoulis e Soraya Lunardi, Curso de

processo constitucional, p. 127-130; Sarlet, Marinoni e Mitidiero, Curso de direito constitucional, p.

1111-1113.

136 Sarlet, Marinoni e Mitidiero, Curso de direito constitucional, p. 1111.

137 Gilmar Ferreira Mendes defende que a consequência ideal para a ADIO é a suspensão da lei. Nesse

sentido, cf. Gilmar Ferreira Mendes, Controle abstrato de constitucionalidade, p. 422-427.

138 Nesse sentido, Dimitri Dimoulis e Soraya Lunardi e Juliano Taveira Bernardes. Em sentido contrário,

Sarlet, Marinoni e Mitidiero defendem a possibilidade do Poder Judiciário atuar positivamente, preenchendo a omissão legislativa. Dimitri Dimoulis e Soraya Lunardi, Curso de processo

constitucional, p. 134-137; Juliano Taveira Bernardes, Ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADInO), 556-560; Sarlet, Marinoni e Mitidiero, Curso de direito constitucional, p. 1116 e ss.

Nesse contexto, o efeito vinculante não parece ser aplicável às decisões da ADIO, pois há incompatibilidade entre a técnica de decisão específica da declaração de inconstitucionalidade por omissão e o efeito vinculante. Isso se dá pelo fato de, como se viu, os limites subjetivos do efeito vinculante não incluírem o Poder Legislativo, enquanto a declaração da omissão é dirigida justamente para o órgão legiferante (ou administrativo, se for o caso), em que se apela que ele preencha a ausência de norma necessária para a concretização da Constituição. Dessa forma, não seria possível a aplicação do art. 12-H, §2º, da Lei Federal nº. 9.868/99 e, consequentemente, do efeito vinculante.