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2 A EDUCAÇÃO INCLUSIVA E A PESSOA COM DEFICIENCIA VISUAL

2.2 A DEFICIÊNCIA VISUAL NUMA PERSPECTIVA DO MODELO SOCIAL

2.2.1 A deficiência visual: perspectivas conceituais

Nesta pesquisa estou utilizando o termo deficiência visual incluindo todas as pessoas que se enquadram nas leis e benefícios de amparo aos recursos de adaptação para desenvolver atividades profissionais, educacionais e comunicacionais, as quais necessitam do uso do Braille ou de letras ampliadas, uso da bengala, do cão guia ou de acompanhante, ou ainda, uso de software especializado para leitura. Entretanto, quero explicitar um pouco sobre esses termos.

A conceituação de deficientes visuais, cegos e pessoas com baixa visão, ocorre considerando pelo menos dois aspectos: acuidade visual, a distância e com que qualidade se enxerga um objeto; e o campo visual, outra forma de mensuração, que considera a amplitude da área alcançada pela visão.

De acordo Conde (2005), professor do Instituto Benjamin Constant, no ano de 1966, foi registrado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) 66 diferentes definições de cegueira. Foi feita uma pesquisa por um grupo de estudo sobre a Prevenção da Cegueira da OMS com a finalidade de padronizar os valores de acuidade visual assim como construir um banco de dados estatístico para ser utilizado em diversos países.

Foi realizado um trabalho em comum entre a American Academy of

Ophthalmology e o Conselho Internacional de Oftalmologia, de onde surgiram, como

relata o professor Conde (2005):

Extensas definições, conceitos e comentários a respeito, transcritos no Relatório Oficial do IV Congresso Brasileiro de Prevenção da Cegueira (vol-1, págs. 427/433, Belo Horizonte, 1980). Na oportunidade foi introduzido, ao lado de 'cegueira', o termo ' visão subnormal' ('low vision'), em língua inglesa).

Segundo o professor Conde (2005), o termo cegueira não é restrito a uma única acuidade visual, pois reúne indivíduos com vários graus de visão residual. Ela não significa, necessariamente, total incapacidade para ver, mas sim, limitação total ou parcial dessa aptidão a níveis incapacitantes para o exercício de atividades do cotidiano que exijam o uso da visão.

Saliento que nesse estudo escolhi o termo pessoa com deficiência visual, visto ser atualmente a expressão politicamente correta e usual. Além do que, me

identifico com esta terminologia, pois acredito dar um significado melhor à condição de limitação visual, pautado também nos documentos oficiais e atuais do governo brasileiro, definido na Lei de Acessibilidade. (BRASIL, 2000)

Refiro-me ainda ao conceito apresentado pelo professor Conde, no qual ele descreve a 'cegueira parcial' (também dita “legal” ou “profissional”) na qual estão os indivíduos apenas capazes de “contar dedos” a curta distância e os que só “percebem vultos”. (CONDE, 2005) Mais próximos da cegueira total, estão os indivíduos que só têm percepção e projeção luminosas. No primeiro caso, há apenas a distinção entre claro e escuro; no segundo (projeção) o indivíduo é capaz de identificar também a direção de onde provém a luz. (AMIRALIAN; MORAES, 1997; MARTÍN HERNÁNDEZ; SANTOS PLAZA, 2004)

No Art. 70, inciso III da Lei de Acessibilidade, Decreto nº 5.296, de 2004, conceitua a deficiência visual da seguinte forma:

Deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores; (BRASIL, 2004)

No livro Conviver com a cegueira, Steve Parker (1994) traz conceito esclarecedor sobre a concepção de cegueira quando descreve o enxergar como uma função estritamente da retina, enquanto a função da parte óptica localizada no cérebro seria o de construir as imagens formadas a partir das experiências do individuo. Acrescento assim ao que se refere às terminologias e aos aspectos técnicos relacionados à questão do órgão da visão, que são várias as circunstâncias possíveis de acometimento na ausência do enxergar. Ratifico que o individuo com deficiência visual pode até não enxergar por ser esta uma função exclusiva da retina, mas as imagens poderão ser formadas no interior de seu cérebro, já que o ver é uma função da parte óptica do sistema nervoso. (PARKER, 1994) Assim como uma pessoa “vidente” quando faz a experiência de fechar os olhos tem toda uma construção das imagens pensada.

A pessoa com deficiência visual tem as imagens nítidas formadas a partir dos estímulos externo – auditivo, táteis, olfativo. Desmistificando assim a ideia de que o

não enxergar significa que a pessoa está em total “escuridão”. Quando falamos ou pensamos em pessoas cegas imediatamente nos vem à mente a imagem de uma pessoa sofrida, que vive nas "trevas" e em eterna "escuridão".

Isto porque, para nós, cegueira se identifica com fechar os olhos, acabarem- se as luzes, e com as inúmeras dificuldades físicas, motoras, cognitivas e emocionais dessas situações, além da imagem social de cegueira que adquirimos informalmente durante toda a nossa vida. (AMIRALIAN; MORAES, 1997)

Para os autores Martín Hernández e Santos Plaza (2004), existem quatro etapas para se formar imagem no cérebro. Primeiramente tem-se a percepção, resultado do estimulo externo em contato com os músculos externos dos olhos. Depois se tem a transformação desses impulsos ou energia luminosa que chegam a retina e ativam suas células sensoriais e por meio de reações químicas as transformam em energia elétrica. Na terceira etapa acontece a transmissão desse impulso elétrico que são conduzidos pelas fibras nervosas, através das células da retina formando o nervo óptico. Esse abandona o globo óptico e penetra na cavidade cerebral no córtex. Na última etapa acontece a interpretação desse processo, o qual permite ao individuo construir imagens. Por isso eu afirmo a partir da descrição a cima, que o ver é uma função cerebral e não impede da pessoa com deficiência visual ter imagens a partir de outros estímulos que não seria o visual, mas permitiria um construir imaginário desta percepção tátil, olfativo, auditivo.

A perda da visão tem acometido diversas pessoas, sendo algumas das causas mais evidentes as doenças degenerativas da retina, retinopatia diabética, retinose pigmentar, aumento da pressão inter ocular, conhecido como glaucoma, deficiência refratária que pode levar a uma baixa visão ou ausência total, hipermetropia, miopia e estigmatismo, geralmente corrigido pelo uso de óculos. A perda da visão também é decorrente de fatores sociais como a grande violência social e a falta de atendimentos médicos de qualidade, principalmente em regiões afastadas dos grandes centros urbanos. (MELO, 2011)

Aponto que a causa ou a doença que gerou uma condição do não enxergar, é importante se investigar e analisar para se promover a prevenção, ou ainda para se nortear em relação aos cuidados posteriores que esta doença ainda possa requisitar nos cuidados diários. Entretanto, existe outra prevenção denominada secundaria, a qual se refere ao cotidiano das pessoas com deficiência que não deve ser esquecido, visto que sua limitação não impede de desenvolver diversas outras

habilidades do dia a dia. Nesse sentido, a prevenção secundaria diz respeito aos cuidados sociais em promover uma sociedade adaptada para evitar possíveis outros comprometimentos ou prejuízos, seja de ordem física, cultural, moral, educacional ou profissional.

Evidente que a ausência do enxergar condiciona algumas barreiras na realização de algumas atividades, mas o que discuto é que o olhar deve estar centrado no que é possível se realizar quando se tem uma deficiência visual e seu o seu contrário, aquilo que não é possível.

Telford e Sawrey (apud ARAÚJO, 2007, p. 25) falam das limitações intrínsecas da incapacidade que a cegueira provoca, quais sejam:

1. falta de acesso à escrita e leitura em tinta; 2. restrição da mobilidade independente;

3. falta de percepção direta do ambiente e dos objetos e 4. privação das pistas sociais e de imitação.

Estas limitações podem ser refletidas sobre o que exatamente a pessoa com deficiência visual não pode de fato realizar, aquilo que pode realizar com auxilio de alguma outra pessoa, ou ainda o que pode ser adaptado para uma ação autônoma e independente da pessoa com deficiência visual.