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CAPÍTULO 1 – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

1.4.3 A Dialogia para Ford e Wargor

Ford e Wargo10 (2011), em seu artigo “Dialogic Framing of Scientific Content for conceptual and Epistemic Understanding”, também apresentam uma definição de dialogia baseada nos pressupostos teóricos de Bakhtin. Para esses autores a compreensão por si só, tanto em seus aspectos conceituais quanto em aspectos epistemológicos, é de natureza dialógica. Esses autores argumentam que ao apropriarmos de uma ideia científica nos envolvemos em uma relação dialógica com essa ideia.

Em seu trabalho Ford e Wargo (2011) apresentam a dialogia como um elemento fundamental para a compreensão do conteúdo científico. Para esses autores a ciência possui algumas características próprias e estão em contraste com outros conhecimentos. Portanto, compreender ciências implicaria em dialogar com diferentes explicações para um mesmo fenômeno.

Ford e Wargo (2011) em suas pesquisas utilizam três aspectos diferentes para a compreensão da ciência, todos considerados dialógicos. Primeiro aspecto: ser capaz de usar as ideias científicas para explicar fenômenos naturais. Segundo: saber que existe uma multiplicidade de alternativas explicativas. Terceiro aspecto: avaliar as diferentes explicações para a ideia científica, o que envolve relacionar evidências e considerá-las para a compreensão dos fenômenos. Para eles, todos esses três aspectos da compreensão das ciências envolvem aspectos conceituais e/ou epistemológicos. Os autores explicam que, em cada aspecto, a noção de dialogia é fundamental para a compreensão da ciência.

1.4.3.1 – Primeiro aspecto: Usar as ideias científicas para explicar um fenômeno

Para esses autores o primeiro aspecto da compreensão da ideia científica é somente conceitual. Explicar um determinado fenômeno usando uma ideia científica demonstra a nossa compreensão em relação a essa ideia. Explicar um fenômeno envolve entender e compreender como esse fenômeno foi produzido. Esses autores explicam que, de acordo com Bakhtin (1986, apud FORD e WARGO, 2011), esse ato

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de explicar é considerado como dialógico, pois envolve utilizar o enunciado de outra pessoa em uma situação e contexto totalmente diferentes.

1.4.3.2 – Segundo aspecto: Multiplicidade de alternativas

Os autores explicam que o segundo aspecto é tanto conceitual quanto epistemológico. A justificativa para o segundo aspecto é a existência de uma multiplicidade de explicações para uma mesma ideia científica. Para esse autores, a compreensão conceitual envolve a capacidade de integrar as suas próprias ideias com o discurso científico e, ainda, identificar esse discurso como uma das possibilidades para explicar o fenômeno. A multiplicidade de alternativas é considerada como epistêmica, pois o conhecimento científico é produzido pelas comunidades, e nessas comunidades há várias formas de explicar um fenômeno (FORD e WARGO, 2011).

1.4.3.3 – Terceiro aspecto: Saber avaliar as diferentes alternativas

Para os autores esse terceiro aspecto do entendimento dialógico é somente epistêmico, pois existe um contexto científico, no qual existe uma multiplicidade de alternativas que devem ser avaliadas para identificar que escolhas e quais ideias deveremos adotar. Esses autores consideram esse aspecto como dialógico, pois ele ilumina o fato de que o conhecimento científico, fundamentalmente, é um produto do diálogo — e esse diálogo acontece dentro de uma comunidade de práticas que possuem normas e critérios.

Esse autores utilizam a definição de conteúdo como forma de apoiar a compreensão dialógica, relacionando o conteúdo com atividades de explicação e argumentação. Para eles o conteúdo pode ser representado e aprendido de uma forma dialógica, mesmo que os padrões de discurso durante o processo de aprendizagem forem monológicos.

1.4.3.4 - O discurso monológico ideologicamente dialógico

Um dos argumentos utilizados por Ford e Wargo é que os aspectos do discurso monológico de sala de aula podem coexistir com aspectos dialógicos. Para isso esses autores elaboraram uma estrutura para caracterizar o discurso como ideologicamente dialógico.

Ford e Wargo investigaram uma sala de aula e propuseram uma atividade em que os conceitos científicos estariam focados nos aspectos conceituais e epistemológicos. Esses autores enquadraram o tema seleção natural nos três aspectos para a compreensão científica, que são conceituais e epistemológicos, e de entendimento dialógico.

Esses pesquisadores, ao analisarem o discurso presente em sala de aula, identificaram a prevalência do padrão discursivo I-R-A11. Nessas aulas, na maioria das vezes, o discurso foi identificado como não interativo e monológico. Mas de acordo com os autores esse discurso era, ao mesmo tempo, ideologicamente dialógico.

As atividades exigiam que os estudantes explicassem alguns fenômenos naturais tais como a formação do olho, um registro fóssil e uma variedade de raças de pombo usando as três diferentes teorias evolutivas - Paley, Lamarck e Darwin. Nas atividades os estudantes foram divididos em grupos. Cada grupo deveria utilizar uma teoria evolutiva para explicar os fenômenos. Alguns grupos deveriam explicar os fenômenos do ponto de vista de Paley. Outros grupos utilizariam Lamark e outros, ainda, Darwin. Após a conclusão das atividades os estudantes apresentaram as suas conclusões e as devidas inconsistências teóricas percebidas. Nas aulas investigadas o padrão discursivo é o I-R-A, caracterizado como estruturalmente monológico, mas o professor trabalhou com os estudantes para justapor as três diferentes explicações para a evolução. Portanto, o trabalho se valeu de três ideias diferentes para explicar um mesmo fenômeno.

A intenção desses pesquisadores foi apresentar um exemplo de como um conteúdo pode ser representado e aprendido de uma maneira dialógica, mesmo que os padrões de discurso durante o processo de aprendizagem sejam monológicos. !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Ford e Wargo dizem que não defendem os padrões monológicos do discurso nas salas de aula de ciência, mas fizeram uma tentativa de caracterizar formas de apoio que podem ser eficazes em envolver os estudantes na explicação e argumentação.

1.5 – CONSIDERAÇÕES SOBRE O CAPÍTULO

Neste capítulo destacamos os principais aspectos teóricos que norteiam esta pesquisa: a dialogia e a abordagem comunicativa. Na construção deste capítulo também tivemos a preocupação de apresentar as múltiplas perspectivas da dialogia em algumas pesquisas de sala de aula. Reconhecemos, nesta pesquisa, que a dialogia pode ser interpretada de várias formas, como demonstrado ao longo do texto.

Nos trabalhos de Mortimer e Scott identificamos a dialogia no conceito de abordagem comunicativa. O conceito de abordagem comunicativa fornece a percepção sobre a abertura do discurso do professor para os pontos de vista dos estudantes, em interação ou não (alternando ou não turnos de fala) com eles. Esse discurso é constituído de duas dimensões. A primeira envolve os seguintes extremos: discurso dialógico e discurso de autoridade. A segunda envolve os extremos: discurso interativo e não interativo.

Para Wells todo discurso tem uma natureza dialógica. Mas, as diferenças no discurso dependem de como os falantes se posicionam em relação ao seu destinatário e da natureza das respostas que pretendem obter. Esse autor nos mostrou as duas funções do discurso em relação a três posições distintas.

No trabalho de Ford e Wargo, esses apresentam três maneiras de se compreender as ideias científicas em uma abordagem dialógica. A primeira é usar as ideias para explicar um fenômeno; a segunda compreender que as ideias científicas podem ter multiplicidade de alternativas; e a terceira é saber avaliar as diferentes alternativas.

Neste trabalho adotamos a noção de dialogia de acordo com a perspectiva de Mortimer e Scott. Entendemos e comungamos da ideia que todo discurso tem uma natureza dialógica. Mas, para o movimento da construção dos significados em sala de aula temos que utilizar tanto o discurso dialógico para abrir e identificar as diferentes ideias dos estudantes quanto o discurso de autoridade para fechar e

apresentar a ideia científica. Assim, entendemos que as transições entre os discursos dialógico e de autoridade são fundamentais para apoiar a aprendizagem significativa (AGUIAR e MORTIMER, 2003). Portanto, nesta pesquisa tentaremos identificar como o professor incentiva a discurso dialógico e como ele adota a abordagem de autoridade para apresentar o ponto de vista científico ao longo de uma sequência.

Nessa perspectiva, no próximo capítulo apresentaremos a ferramenta de análise discursiva elaborada por Mortimer e Scott (2002 e 2003) e os seus desdobramentos na área da educação em ciências.

CAPÍTULO 2 – A FERRAMENTA SOCIOCULTURAL PARA ANALISAR E

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