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CAPÍTULO 1 – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

1.4.2 A Dialogia para Wells

Wells9 em seu artigo “Semitoc mediation, dialogue and the construction of knowledge” foi perspicaz ao realizar um movimento dialógico de trazer uma diversidade de teóricos e pesquisadores para a discussão sobre mediação semiótica e diálogo. Wells,! nesse! artigo,! apresenta! diferentes! conceitos! da! psicologia,! semiótica,! linguística!e!sociologia.!O’Connor e Michael (2007) resumem as ideias de Wells, nesse artigo, em:

1) A aquisição da linguagem e uso da linguagem na interação com outros são formas de mediação (semelhante ao uso de ferramentas);

2) O diálogo é uma forma de mediação semiótica que sustenta a aprendizagem e o pensamento dos indivíduos, grupos e culturas em geral; 3) Signos, interações e socialização (todas as formas de mediação semiótica) podem ser mais ou menos “dialógicas”;

4) No processo de aquisição da linguagem, as crianças adquirem um sistema de signos que é implícito na sua cultura. A “dialogicidade”, ou a posição de produtor de significado da cultura local, é internalizada na medida em que os signos são internalizados. Desta forma, as crianças de diferentes culturas, diferentes classes sociais, ou em ambientes escolares diferentes assumem mais do que a linguagem, eles assumem diferentes valores ou “potenciais significados” e as expectativas relativas a fazer sentido no diálogo com os outros ou em pensar por conta própria.

O nosso objetivo é apresentar como esse autor utiliza a noção de dialogia nos seus trabalhos. Nesta seção nos ateremos a apresentar a parte em que ele discute a dialogia de acordo com Bakhtin e em debate com os autores Lótman e Tomasello.

Para Wells (2007) “entrar em diálogo” pode ser entendido como o início de um encontro comunicativo entre dois ou mais indivíduos. No entanto, para iniciar e manter um episódio de interação linguística, os participantes têm que trabalhar para estabelecer e posteriormente manter acordo sobre o tema e a finalidade da sua conversa. Para esse autor existem três sentidos para “entrar em diálogo”.

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O primeiro sentido é sobre a intersubjetividade necessária para dar prosseguimento em uma conversa. O segundo está ligado a ideia de significados compartilhados, no qual “uma ponte é lançada entre mim e o outro”. Se uma das extremidades da ponte depende de mim, então a outra depende do destinatário (VOLISHINOV, 1973, P. 86, apud WELLS, 2007).

O terceiro sentido de “entrar em diálogo” é apresentado nos trabalhos de Bakhtin. Wells trabalha com duas funções do discurso, o monológico e o dialógico, e trabalha com três posições: de Bakhtin, de Lótman e de Tomasello.

Wells, baseado nas ideias de Bakhtin, afirma que toda comunicação é dialógica. Mas as diferenças aparecem nas formas nas quais os falantes se posicionam em relação ao seu destinatário e na natureza das respostas que pretendem obter.

Uma ideia que esse autor trabalha é a da responsividade, que é entendida como uma abertura para posições contrárias. Nessa perspectiva, Wells, diz que Lótman (1988, apud WELLS, 2007) propôs que textos poderiam ser lidos ou ouvidos de duas maneiras e que diferem entre si sobre a dimensão de responsividade. A primeira maneira seria o texto “monológico”, do orador ou do escritor, que não assume nenhuma expectativa de uma tréplica e na qual tudo é compreendido e aceito sem nenhuma objeção. Para Lótman, a função monológica é importante para transmitir significados culturais, preservando assim a continuidade e estabilidade das crenças e valores dentro de uma cultura. Portanto, a natureza desse texto é de autoridade, pois não está aberta para a ideia das outras pessoas.

A segunda maneira é quando o texto convida o destinatário a se posicionar frente a ele. Para Lótman, um texto deixa de ser um link passivo em transmitir informações constante entre a entrada (o remetente) e a saída (o receptor). Para Wells esse texto é dialógico, no sentido bakhtiniano.

Wells identifica em Tomasello (1999, apud WELLS, 2007) uma distinção um pouco semelhante nos seus relatos sobre o desenvolvimento cultural da cognição humana, na qual propõe o que ele chama de “efeito catraca” para explicar a natureza cumulativa da evolução cultural. Como ele observa, o “progresso” depende da criatividade de indivíduos ou de grupos particulares em inventar e melhorar as ferramentas culturais.

Da mesma forma, enquanto Lótman utiliza claramente Bakhtin para valorizar a função criativa dos textos dialógicos, ele também não descarta o valor da função monológica. Como Tomasello, ele reconhece que a continuidade, bem como a inovação, é necessária para uma sociedade saudável e, para esse fim, os textos de conhecimento cultural precisam ser utilizados tanto monológica quanto dialogicamente.

O’Connor e Michaels, sintetizaram em um quadro, reproduzido a seguir, as três posições para diferenciar entre o discurso monológico e dialógico de Wells.

Monologia Dialogia

Bakhtin Expressão utilizada “autoridade” – significado fixo

Expressão utilizada “internamente persuasivo” – significado negociado

Lótman Texto como dispositivo de transmissão ou “monológico” (função: cria memória comum para o grupo)

Texto como 'dispositivo de pensar' (função: gera novos significados)

Tomasello As práticas culturais como a transmissão social (efeito catraca, então a aprendizagem cultural é mantida)

As práticas culturais funcionam para dar suporte a invenção criativa

Quadro 2 - Duas funções do discurso: monológico e dialógico retirado de O’Connor e Michaels (2007).

Wells, em seus trabalhos, demonstra como o discurso dialógico oferece oportunidades para a aprendizagem, as quais, geralmente, não são suportadas apenas pelo discurso monológico. Ele discute, também, a necessidade da postura dialógica, baseado nos trabalhos de Dewey sobre prática docente. Ele relata, em alguns de seus trabalhos, como os professores tentam aumentar a frequência e a profundidade do discurso dialógico em sala de aula, mas descobrem que muitas vezes isso não é fácil (O’CONNOR e MICHAELS, 2007).

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