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3 A ECONOMIA PERNAMBUCANA E AS OBRAS DE 1909

3.1 A SITUAÇÃO ECONÔMICA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

3.1.1 A dificuldade econômica do estado: A posição do açúcar no país

Desde o período colonial, o Recife (Pernambuco) estendia as suas influências às áreas circunvizinhas, aos outros estados, que atualmente é o Nordeste brasileiro. Entretanto, é durante o século XIX que Pernambuco se fez a partir de uma indústria açucareira que liderava as exportações brasileiras e exemplificou bem os problemas da indústria nacional neste período. Sendo a cana de açúcar seu principal produto de exportação, constituindo-se este igual a qualquer outro produto mundial, enfrentou dificuldades como a queda dos preços e uma dura concorrência. Não sabendo lidar com tal tipo de situação, a economia veio a estagnar196. Esse declínio econômico começou se acentuar com a crescente competição dos cultivadores estrangeiros, que fez baixar o preço do açúcar no mercado internacional e cortou o valor das exportações do Nordeste pela metade197. Pernambuco exportava quase toda sua produção, só o mercado internacional absorvia cerca de três quartas partes do açúcar pernambucano198, fazendo com que houvesse uma dependência com o mercado internacional. A relação que existia era de mão dupla, pela venda dos produtos pernambucanos e a necessidade de importar produtos manufaturados, pois o país não produzia produtos que pudessem suprir as suas necessidades por tais artigos.

A situação econômica do Estado de Pernambuco, durante a segunda metade do século XIX, tende a ter novas dificuldades com o surgimento de concorrência no mercado externo mundial na venda do açúcar. Países como Cuba, Guiana Inglesa, Martinica Guadalupe, Peru, Ilhas Maurício, Java, Queensland, Filipinas, Havaí Porto Rico, México, Argentina e a Luiziana, nos Estados Unidos, que estavam produzindo açúcar a partir da cana, além da França, Alemanha, Áustria-Hungria, Rússia, Holanda, Bélgica, Itália, Dinamarca, Suécia, EUA, com a produção da sacarose a partir da beterraba199, tornam-se concorrentes diretos do açúcar brasileiro e, em especial, ao pernambucano.

196 EISENBERG, Peter L. Modernização sem mudança. A indústria açucareira em Pernambuco 1840-1910. Rio

de Janeiro: Paz e Terra, 1977. The sugar industry in Pernambuco. Modernization without change. 1840-1910. PHD thesis, Columbia Univ. New York, 1969. Berkley, Univ. of California, 1974. p. 41.

197 LEVINE, Op. Cit. 1980. p. 57. 198 EISENBERG, Op. Cit. p. 41.

199 Os anos e a produção de cada país não foram abordados nesse trabalho porque a ideia é fazer um breve

levantamento da situação econômica do estado de Pernambuco, não cabendo aqui uma análise dessa maneira. Mas a produção em toneladas dos países citados pode ser encontrada com melhor detalhamento In.: EISENBERG, Op. Cit. p. 258/261.

Dentro do país houve uma hegemonia recifense consolidada que se ampliou com a substituição da navegação à vela pelos navios a vapor, cujos tamanhos e calados aumentaram, não podendo ancorar nos portos menores como o de Cabedelo, de Maceió, ou o de Fortaleza200. Foi por volta da década 1870 que ficava clara a situação do porto do Recife, de não poder acomodar embarcações de grande porte por ser, relativamente, raso. Na Preamar, sua profundidade atingia sete metros, o que não era muito profundo, fazendo com que os navios maiores fossem forçados a ancorar fora da barra, exigindo o uso de diques flutuantes e ferry-boats para a carga e descarga, além do embarque e desembarque de passageiros201. No ancoradouro entravam apenas os vapores que não tinham grande calado, a exemplo dos que pertenciam às frotas das companhias Loídes Brasileiro, Chageurs Reunis (do Havre), Haburgêses austríacos, entre outros, sendo alguns com 2 chegando até 3.000 toneladas de lotação202. Havia também no bairro portuário uma ausência de uma rede interna de transporte, moderna e integrada, a serviço da região, constituindo-se uma dificuldade para a entrada e a saída de produtos.

A pouca profundidade do porto de Recife nunca foi problema para se dar vazão aos produtos de exportação, até o aparecimentos das embarcações de grande calado e de metal, que por ele passaram, mesmo nos anos de maior safra203. É forçoso confessar que o seu melhoramento, que já chegou a ser cogitado e iniciado com algumas obras durante o século XIX, tiveram que parar por desarranjos financeiros, relacionados às empresas que deviam ter feito o procedimento. Essas obras constituíam, para a época, uma aspiração geral, entre os nacionais e os estrangeiros, para concorrer e dar maior desenvolvimento à riqueza pública do Estado.

No meado do século XIX, houve uma modificação na forma de transportar os seus produtos dentro do Estado. A partir do ano de 1855, dá-se o início da construção da estrada de ferro Recife-São Francisco204, em direção ao sudoeste. A ferrovia foi a segunda estrada de ferro do Brasil; tendo os governos imperial e provincial garantido a linha férrea205 “7%206 do

200 BERNARDES, Denis e PERRUCI, Gadiel. Recife: O Caranguejo e o Viaduto. Recife: Ed. Universitária,

1996. p. 48.

201 LEVINE, Op. Cit. p. 87. 202 VIANNA, Op. Cit. p. 86. 203 Idem. p. 89.

204 A estrada de Ferro estava a cargo da companhia britânica Recife & S. Francisco Railway que mais tarde, no

ano de 1900, foi arrendada pela Great Western of Brazil.

205 BERNARDES, Op. Cit. p. 69.

206 Segundo Benévolo não foi inicialmente dado os sete por cento e sim um processo gradativo que se inicia em

“1852 (lei da garantia de juros de 5% ou lei Gonçalves Martins) e 1873 (garantia até 7%), houve os regulamentos gerais de 1874 (sobre a lei de 1873) , de 1878 (sobre as leis de 1852 e 1873), de 1880

seu capital em um monopólio de 90 anos207”. A locomotiva, conforme se pode ver na imagem (3), foi a que rodou na estrada de ferro Recife-São Francisco, que tinha uma bitola de 1,60mts e raio de curvatura de 1,50mts, e a inauguração da linha férrea, que ocorreu no dia 8 de fevereiro de 1859208, é o marco para a expansão das ferrovias no Estado.

Imagem 2 - Primeira locomotiva a circular no estado de Pernambuco 1855209.

A rede ferroviária começou a se expandir e ganhar espaço a partir de 1858 dentro da economia pernambucana, por já ligar o Recife ao interior do estado. Formas tradicionais de transporte, topas de mulas e barcaças, logo foram suplantadas pelas ferrovias210. Neste período, houve uma polarização dos ramais ferroviários, que vieram favorecer Pernambuco de

(regulamentação geral das cláusulas concessionais)”. In.: BENÉVOLO, Ademar. Introdução a História Ferroviária do Brasil. Recife: Folha da Manhã, 1953. p. 112/113.

207 Doze anos depois nada se fizera, e a lei de 26 de junho de 1852 aumenta para 90 anos o prazo do monopólio,

assegurando ainda a companhia concessionária a garantia de Juros de 5% ao ano sobre o capital empregado. Este prazo máximo de 90 anos era inicialmente atribuído apenas ás estradas de maior Importância, concedidas pelo governo da corte; E. F. Recife ao S. Francisco (1852). In.: BENÉVOLO, Op. Cit. 1953. p. 138.

208 FERREZ, Gilberto. Velhas fotografias pernambucanas 1851-1890. Rio de Janeiro: Ed. Campo Virtual. 1988.

p. 75.

209 Idem. p. 75.

210 “Como resultado do desenvolvimento ferroviário, logo os trens estavam transportado três quartos de todo

açúcar remetido para Recife e tinha eliminando, virtualmente, as caravanas de animais de carga que moviam menos de 5% da safra de 1885" In.:EISENBERG, Op. Cit. p. 72/73.

forma direta e indireta, já que ligavam as cidades mais afastadas produtoras ao porto do Recife211.

As estradas férreas convergiam para o Recife, sendo o ponto de convergência comum para a grande maioria das linhas212. Pernambuco assumiu uma postura de destaque à medida que ia impondo a sua liderança às regiões, aos estados vizinhos213. Para que o açúcar pudesse chegar ao porto do Recife, havia dois curtos e um complicado transporte para que o produto estivesse a bordo dos navios, rumo à Europa, aos Estados Unidos ou ao sul do Brasil, porque a linha Recife and San Francisco terminava no forte das Cinco Pontas, que se encontrava a uma distância de um quilômetro dos armazéns e das docas oceânicas na ilha do Recife, gerando, assim, mais custos de transporte e de carregamento dos produtos214. Mesmo com as dificuldades que foram apresentadas, o porto Pernambucano tornou-se o ponto final de várias linhas de estradas de ferro que atravessavam a Zona da Mata e o Agreste, o que fez com que criasse uma esfera pernambucana de influência ainda durante o século XIX215. No início do século XX, a ferrovia ligava a capital pernambucana ao Sul, a Alagoas (a “Great Wester”, com 193km), ao São Francisco (“E. F. do Recife ao São Francisco”, com 125km), ao oeste (“E. F. Central de Pernambuco”, com 180km) e ao norte, até a Paraíba (“Great Wester” com 83km, até Limoeiro diversos ramais), ao Norte até Natal, construindo assim sua área de atuação216, como podemosver no mapa (2).

Com relação à economia do Nordeste nesse determinado momento, notava-se que os Estados Nordestinos lutavam uns contra os outros pelos socorros federais, principalmente, os produtores agrícolas. Os Estados disputavam o controle de determinadas regiões para se criar uma área de influência que os fizessem se abastecer de mercadorias e, economicamente, pelas taxas de transporte e comercialização dos produtos. O controle de regiões insoladas era disputado por Pernambuco e outros estados: “Bahia e Pernambuco pleiteavam ambos a região de Petrolina, no São Francisco; Pernambuco e Alagoas, a zona entre Paulo Afonso e Bom Conselho; Paraíba e Pernambuco contendiam pelos produtos do sertão oriental e central217”.

211 BERNARDES, Op. Cit. p. 48.

212 Segundo Marx “A burguesia submeteu o campo à dominação da cidade. Criou cidades tentaculares, aumentou

maciçamente a população das cidades em relação à dos campos e, portanto, arrancou uma parte expressiva da população do embrutecimento da vida rural”. MARX; ENGELS. Op. Cit. p. 31.

213 Segundo SINGER, Op. Cit. p. 316. “Deste modo, a ferrovia interligava Recife, desde 1901, com a Zona da

Mata e Agreste de Pernambuco e de dois Estados limítrofes: Alagoas e Paraíba. Posteriormente a área sob a influência de Recife foi expandindo-se, até atingir todo Nordeste, de Alagoas até o Maranhão”.

214 EISENBERG, Op. Cit. p. 76. 215 LEVINE, Op. Cit. p. 131. 216 SINGER, Op. Cit. p. 316. 217 LEVINE, Op. Cit. p. 133.

Pernambuco fazia estender as suas influências econômicas pelas linhas férreas aos estados como o Piauí, Ceará e Paraíba, mas ao mesmo tempo sentia a pressão que outros estados fronteiriços exerciam sobre os limites do estado. Em 1890, uma proposta para a construção de uma linha ferroviária de Imperatriz, em Alagoas, na parte oeste do rio São Francisco, encontrou oposição da Associação Comercial do Recife, afirmando que a construção dessa estrada drenaria o comércio de Alagoas e da Bahia218.

Mapa 2 - Mapa do sistema ferroviário e as zonas do alcance das linhas ferreiras pernambucanas no início do

século XX219.

Por conta da ampla concorrência que se inicia entre os estados nordestinos pelo escoamento das produções de açúcar e outros produtos agropecuários, as linhas férreas

218 LEVINE, Op. Cit. p. 134.

deixam de ser tão rentáveis quanto antes, além de contar com a baixa profundidade do porto que faz com que houvesse uma diminuição dos rendimentos. Eisenberg pode nos deixar alguns dados os quais mostram que a concorrência no mercado internacional fez com que caísse o valor do produto, mas não a produção220. No primeiro decênio do século passado, houve um aumento de negociação para o mercado interno, o que fez com que o estado ainda conseguisse sobreviver economicamente, já que o principal produto pernambucano era o açúcar e outros produtos agrícolas. Mesmo que Pernambuco já tivesse um pequeno parque industrial, já no final do século XIX, não era de grande expressão para a economia local.