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3 A ECONOMIA PERNAMBUCANA E AS OBRAS DE 1909

3.1 A SITUAÇÃO ECONÔMICA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

3.1.2 A industrialização pernambucana

Os produtos agrícolas, em especial a cana de açúcar, não foram os únicos empreendimentos pernambucanos. Nas últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século passado, houve uma diversificação nas atividades produtivas, que ocorreu com a criação de uma indústria local. Em sua maioria, os empreendimentos eram para a produção de bens de consumo não duráveis, focando na produção que se voltava para o mercado local221. Essas perspectivas divergem do pensamento de Manoel Correia de Andrade, já que ele acredita que a industrialização de Pernambuco chegou com os engenhos banguês, que se disseminaram a partir do século XVI222.

Durante o os últimos decênios do século XIX, havia uma grande variedade de produtos sendo produzidos por diversas fábricas em todo o estado. A cidade do Recife contava com fabricas de alimentos (fábrica de vinagre, chocolate, azeite, macarrão), bebidas (fábrica de licores, vinhos limonadas, cerveja), roupas (fábrica de chapéus, camisas), utensílios (colchões, pianos, vassouras, caixas de papelão), de artigos de limpeza (fábrica de sabão), de meio de transporte (fabrica de carro de passeio, de carroças), sem contar com as

220 EISENBERG, Op. Cit. p. 41-58. 221 BERNARDES, Op. Cit. p. 49.

222 Analisando-se o processo de industrialização na Região Metropolitana do Recife, pode-se ver que as

primeiras fabricas ai implantadas foram os engenhos de açúcar, chamados de banguês, que se disseminaram a partir do século XVI, com a colonização, pelos vales do Beberibe, do Capibaribe, do Jaboatão, do Pirapama e do Paratibe; em seguida, surgiram as indústrias mecânicas, ligadas à manutenção do funcionamento desses engenhos. Só no século passado surgiram as primeiras tentativas de implantação de indústrias têxteis, como a que pertencia ao político Gervásio Pires Freitas, e de beneficiamento de couros peles. Indústrias que surtiram sem qualquer planejamento, implantadas em pontos considerados favoráveis pelos seus proprietários, não consultando os interesses da população da área. ANDRADE, Manoel Correia de. Recife: problemática de uma metrópole de região subdesenvolvida. Recife: EDUFEPE, 1979.p. 33.

fábricas de charutos e fumo e de envernizar couros223. A quantidade de fábricas, ao passar dos anos, tende a crescer, como podemos ver no (Quadro 14). Nota-se que a proporção de seu crescimento, durante o século XX, é elevada, se compararmos os anos de 1900 a 1909 com os de 1910 a 1919, e se torna muito maior entre os anos de 1920 a 1929, como podemos atestar pelo quadro 14. Entre os ramos que se destacam durante esse processo de expansão industrial, os de gêneros alimentício e o têxtil tem um maior desenvolvimento e expansão (Quadro 15)224, mesmo que, diferentemente do de alimento que cresce rapidamente, o têxtil tem um crescimento mais lento, sendo que ele cresce mais que o de extrativismo de produtos minerais.

Quadro 14

Número de empresas industriais instaladas em Pernambuco

Antes de 1900 1900 a 1909 1910 a 1919 1920 a 1929

113 33 99 345

Fonte: BERNARDES, Denis e PERRUCI, Gadiel. Recife: O Caranguejo e o Viaduto. Recife: Ed. Universitária,

1996.

Quadro 15

Tipos de empresas sobre o total

Tipos Antes de 1900 1900 a 1909 1910 a 1919 1920 a 1929 Têxtil 8 2 5 20 Produtos Alimentícios 31 17 30 116 Extrativas de produtos minerais 56 1 8 12

Fonte: BERNARDES, Denis e PERRUCI, Gadiel. Recife: O Caranguejo e o Viaduto. Recife: Ed. Universitária,

1996.

É durante o mesmo período de industrialização do Recife que começou a se acentuar uma concentração de capital investido por estrangeiros em grandes obras públicas e no estabelecimento de vasta rede bancária225. Os imigrantes que vinham de Portugal estabeleciam pequenas fábricas no Recife e em seu entorno, enquanto algumas firmas mais prósperas foram, anos depois, continuadas pelo seu crescimento com o capital inglês,

223 SINGER, Op. Cit. p. 305.

224 BERNARDES, Op. Cit. 58-59. Os dois quadros são utilizados, mas não com todos os dados, pois estes

avançam muito no tempo, afastando-se muito do tempo estudado. Outra informação que podemos dar sobre os quadros é a que o autor do mesmo apresenta em seu livro: “Não compreendidas 23 empresas cujas datas de instalação não foram declaradas”.

tornando, por fim, brasileiras226. Normalmente, esses investimentos estrangeiros recebiam concessões ou taxas garantidas de lucro do governo brasileiro ou do estadual, muitas dessas firmas conseguiam a isenção dos impostos ou obtinham licença para importar equipamento e outros materiais sem pagar direitos à alfandega227.

Recife, durante o início do século XX, teve o seu crescimento industrial228, já que contava com um considerável potencial de mercado229 em sua área de influência e uma fraca expressão para a exportação230. A capital pernambucana se transformou na grande promessa de crescimento urbano-industrial ao norte de Rio de Janeiro231. Mas no período da Primeira República, de 1903 a 1910 e de 1924 a1930, houve crises econômicas que abalaram a economia exportadora de Pernambuco e, desta forma, viu-se outras vezes obrigado a ter o açúcar como seu principal produto, sendo que, dessa vez, voltando para o mercado interno232. Todavia, questões intrigantes se colocam ao se verificar que uma séria crise abatia, fortemente, o mercado local do Recife (1903-1910)233.

Durante o período de 1901 a 1906, alguns desses anos corresponderam aos anos da crise econômica, temos uma queda da produção e dos rendimentos, sendo esses das sacas de açúcar produzidas e sacas exportadas. Em 1901, houve uma produção de 5.205.385 sacas e exportação de 3.119.435; em 1902, produziu 5.205.385 e exportou 2.279.287; em 1903, produziu 3.168.750 e exportou 364.816; em 1904, produziu 3.309.300 e exportou 131.108; em 1905, produziu 3.295.500 e exportou 629.108; por sua vez, em 1906, foram produzidos 4.675.500 e exportados 1.415.805. Pode-se notar a profunda queda que sofreu a exportação de açúcar que, comparada com a produção que se manteve mais estável, mostrou-se bastante

226 LEVINE, Op. Cit. p. 144. 227 LEVINE, Op. Cit.p. 144.

228 Segundo Andrade (1979. p. 33.) Existia uma problemática no processo de industrialização do Recife que é

instaurado “Desde o início do processo de industrialização, começou também a ser intensificado o processo de poluição, com o lançamento de resíduos, de água servidas e de impurezas aos rios, criando sérios problemas às populações ribeirinhas. Poluição que provocaria o abastardamento dos rios e lhes tirava o caráter utilitário que possuíam nos primeiros tempos, como fontes de abastecimento de água às habitações, de alimento e de local de banho”.

229 Segundo Singer (1977. p. 317) de um ponto de vista puramente demográfico, este mercado local da indústria

recifense pode ser considerado muito amplo. Os 5 estados – Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará – possuíam 3.414.651 habitantes em 1900, o que representava praticamente um quinto da população brasileira. Em 1920, as populações destes estados tinham aumentado para 5.951.057 habitantes, permanecendo a mesma proporção (um quinto) em relação à o país.

230 Andrade. Op. Cit. p. 88/89.

231 BRANDÃO, Maria de Azevedo. A regionalização da grande indústria do Brasil: Recife e Salvador na

década de 70. Revista de Economia Política Brazilian Jorunal of Politcal Economy. Vol.5, nº 4(20), 1985. Disponível em < http://www.rep.org.br/search.asp?txt_busca=Maria+de+Azevedo+ > Acesso em: 29 de dezembro de 2013. p. 88.

232 LUBANBO, Op. Cit. p. 47. 233 Idem. p. 48.

abrupta pela sua instabilidade no movimento exportador. No ano de 1907, seguia a mesma queda nas exportações, não passando de 214.300 sacas234.

Com a crise na exportação do açúcar, sua mais forte indústria235, o mercado interno, era o caminho mais obvio a ser tomado, mas vender os produtos internamente não era tão rentável quanto o exportar. Mesmo Recife podendo contar com a sua rede de influência para negociar com outros estados a sua volta, estes tendo basicamente um quinto da população do país, não podia dispor de um mercado desenvolto para a sua indústria. O problema se dava por grande parte dessa população estar no setor de subsistência, ficando fora da margem da economia de mercado236. Para essa economia não suprir as necessidades econômicas pernambucanas, há dois fatores primordiais: o primeiro, já falado, é que a grande maioria da população não faz parte dos consumidores, sendo assim, havia poucas pessoas absolvidas pela economia de mercado, e o segundo é o baixo poder aquisitivo dos que trabalhavam. O grande número de desocupados e semidesocupados faziam com que os empregadores tivessem uma grande quantidade de possível mão de obras237, desta forma, os salários dos seus empregados eram denigridos, mal dando para a sobrevivência física do trabalhador e da sua prole238.

Com relação aos trabalhadores fabris e do comércio, eram pessoas mais humildes que viviam nos bairros considerados para a época decadente. Muitos viviam em casas de concreto que tinham de dois a cinco andares que, por muitas vezes, estavam caindo aos pedaços. Já outros moravam em cortiços acaçapados, instalados em ruelas sinuosas e estreitas, muito comum no bairro do Recife, no de São José e no de Santo Antônio; havia também o problema que, nessas casas, a luz solar mal as alcançava e havia uma pouca circulação de ar nelas239.

Durante a primeira década do século XX, notou-se que nem as fábricas, estas que empregam um grande número de pessoas, principalmente de baixa renda e nem a indústria do açúcar dos grandes agricultores, garantia uma rentabilidade ao governo Pernambucano. O Estado, mesmo com uma forte produção industrial e um amplo mercado, não conseguiu com que este ramo fosse forte o suficiente para ser o carro chefe de sua economia, mantendo a

234 SINGER, Op. Cit. p. 310.

235 O açúcar sendo o principal ramo de agricultura é também a base da instruía do estado, que tem várias usinas

para a confecção desse produto, sendo subvencionada a construção de algumas delas pelos poderes estaduais, com o empréstimo de cerca de 14mil contos. In.: VIANNA, Op. Cit. p. 93.

236 Idem. p. 318.

237 A situação que passou os trabalhadores recifense com as causas trabalhistas dentro das fábricas e na cidade se

assemelha ao que ocorreu com os trabalhadores franceses e ingleses durante o século XIX. Condição de trabalho e de moradia, além de uma cidade não salubre.

238 SINGER, Op. Cit. p. 319. 239 LEVINE, Op. Cit. p. 103.

produção de açúcar como a principal “renda do estado240”. A situação que se encontrava o Estado por não conseguir manter uma economia forte, em nenhuma de suas frentes, fez com que no ano do início das obras de remodelação e saneamento do bairro e do porto do Recife estivesse os seus cofres em péssima situação.

É a perspectiva política e econômica do Recife, no ano de 1909, que será, a partir de agora, o foco. Discutir a contexto político econômico do Recife pré-obras vai ser de bastante importância para entender o porquê são aclamadas as obras de melhoramento e revitalização da região portuária da cidade, mas que vai se tornar um problema para outra parte da sociedade menos abastarda que lá encontrava o seu “ganha pão” ou lá residia.