• Nenhum resultado encontrado

4 MONITORAMENTO E ASSESSORAMENTO AOS SERVIÇOS DE PROTEÇÃO SOCIAL BÁSICA PELOS GOVERNOS ESTADUAIS: O CASO DA STDS E SUAS

4.4 A dimensão do assessoramento nos processos de acompanhamento do SUAS

Assim como a literatura sobre monitoramento de políticas públicas é encontrada basicamente em documentos técnicos, esta temática ainda carece de uma produção, mais substantiva nos espaços acadêmicos. Igualmente o tema da assessoria na área social é outro assunto pouco discutido nessa área. Segundo Matos e Souza Bravo (2010), o pouco de assessoria que existe está localizado no campo da administração e é elaborada no intuito de maximização dos lucros das empresas. No campo da gestão pública, apesar de a assessoria ter sido largamente utilizada como estratégia para o aperfeiçoamento das políticas sociais, é praticamente inexistente a produção teórica sobre o tema e, algumas vezes, é ancorada numa visão da iniciativa privada.

Na mesma obra observa-se o esforço para discutir a temática da assessoria no âmbito do Serviço Social, e traz ao presente estudo contribuições teóricas sobre essa dimensão ligada à assistência social e seus processos de acompanhamento pelos governos estaduais. O assessor ao exercer o papel de intelectual, deve conhecer a realidade tanto do ponto de vista institucional como das características dos sujeitos de direito. Assim é possível apresentar estratégias a serem empreendidas por uma equipe interdisciplinar que traduza tais orientações na operacionalização da política, no caso específico do que preconiza a missão dos CRAS, no que se refere aos grupos sociais assistidos. Nesse sentido a assessoria é definida como:

Aquela ação que é desenvolvida por um profissional com conhecimento na área, que toma a realidade como objeto de estudo e detém uma intenção de alteração na realidade. O assessor não é aquele que intervém, deve, sim, propor caminhos e estratégias ao profissional ou à equipe que assessora e estes têm autonomia em acatar ou não as suas proposições. Portanto, o assessor deve ser alguém estudioso, permanentemente atualizado e com capacidade de apresentar claramente suas proposições (MATOS, 2010, p. 21).

A atividade de assessorar, então, implica em contribuir para a solução de determinadas demandas a partir de conhecimentos específicos, atribuições e capacidades. Ela pode ser pontual, restrita a um objetivo definido, ou pode estar relacionada a várias demandas do assessorado (Ruiz, 2010). Assim, ao pensarmos a atuação da STDS como assessora dos CRAS e das Secretarias Municipais de Assistência Social, os depoimentos de ambos os atores confirmam essa atuação do estado, e alguns avaliam positivamente esse aspecto:

No monitoramento da STDS que eu participei, foi mais um momento de esclarecimento, dizer o que era PAIF, qual o papel dos técnicos de nível superior e de nível médio. Foi mais um momento de alinhamento de informações, do quê que era atendimento particularizado, do quê que era acompanhamento. Num segundo monitoramento a gente sentou numa mesa dessa, e foi dito o objetivo do monitoramento, discutir o que era PAIF, o que era Serviço de Convivência, quais as atribuições dos técnicos nesses serviços, etc. Do que era pra ter no CRAS, o que era necessário ter pra se ofertar um serviço de qualidade pra população. Mais ou menos, eles pontuaram esses aspectos. Nessa última vez foi agendada uma reunião com a equipe, a coordenadora do CRAS nos mobilizou, sentamos numa mesa, eles fizeram algumas perguntas, alguns questionamentos, perguntaram com qual serviço cada técnico ficava, quais as responsabilidades, se tinha atendimento individualizado todo dia, se tinha visita, pra gente perguntaram essas coisas, pra saber como era o funcionamento no dia a dia (Técnica Júlia, de Maracanaú).

Eu vejo o monitoramento do Estado muito válido porque é uma troca. Às vezes a gente age de uma forma pela situação extremada que ta surgindo e a gente tem que ter condição de dar resposta de uma forma que não seja imediatista. E aí o apoio do Estado, a presença do estado é importante, é interessante, é bacana, porque de alguma forma norteia. E aí são novas experiências que a gente recebe, são novos saberes que eles trazem pra gente pra gente também estar se adequando, estar vendo a melhor forma de trabalho. E aí quando eles não vêm a gente sente sim, com certeza faz falta porque é todo um amparo legal, um amparo teórico legal que a gente não tem. Era pra o Estado vir, com certeza, mas na falta disso a gente acaba indo lá (Técnica Mariana, de Pindoretama).

Assim, eu acho muito bom o monitoramento, as orientações que são dadas. Eu lembro que ano passado, quando vieram, o pessoal do CRAS estava iniciando, que era uma gestão nova e ela focou muito nessa questão do... ela ajudou bastante a gente nessa questão dos serviços de convivência, que estava saindo um instrumental novo, ela ajudou bastante a gente, foi muito útil a ajuda dela (...)é válida, é muito boa a orientação delas, com

certeza. Eu não vejo como fiscalização, eu vejo como uma ajuda mesmo, elas vêm para ajudar o município. Era bom que viessem mais vezes, não uma vez no ano, né, muito rápida a visita delas, mas é muito bom (Técnica Lívia, de Pindoretama).

No caso específico das visitas técnicas da STDS aos municípios, a análise do trabalho de campo nesta pesquisa demonstrou que o assessoramento tem como objetivo central orientar, traduzir os conceitos embutidos na concepção de cada serviço de proteção social básica, sobre as diretrizes metodológicas na condução de cada serviço, considerando as particularidades dos sujeitos de direitos atendidos.

Acredito que, por sermos multiplicadores, por termos essas capacitações, a gente se torna apto a repassar e acompanhar como é que eles estão desenvolvendo, dentro das propostas do ministério, os Serviços, o Trabalho Social com Família, que engloba o serviço direcionado mesmo para o CRAS, que é o PAIF e o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, e (...) a questão da assessoria mesmo, a questão de estar perto e acompanhar o desenvolvimento, que junto do monitoramento vem essa questão do acompanhamento, da avaliação, que a gente, enquanto estado, tem o feedback – ou não – dos municípios (Técnica Maria, da STDS)

A gente vai pra os CRAS, onde há toda uma conversa de orientação com os técnicos do CRAS, tentando verificar os indicadores já relatados, pra identificar como é que está a situação do equipamento, identificar como é que está a oferta dos serviços socioassistenciais, as dúvidas, existem dúvidas com relação aos serviços que são ofertados, então é o momento de tirar dúvidas, de troca de experiências, de fortalecer mesmo a construção da Política de Assistência Social (Técnica Marta, da STDS).

O assessoramento, que não se dá apenas por meio presencial, mas também via e-mail e telefone pelos técnicos da STDS, visa orientar os técnicos dos CRAS sobre a metodologia dos serviços à luz das orientações do MDS. Nos processos de visita aos CRAS, a observação dos serviços acontecendo também dá subsídios para as orientações que são repassadas aos técnicos de referência do PAIF e do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos.

Então como se dá esse monitoramento, a gente faz esse agendamento prévio com o gestor da assistência social, onde a gente vai expor todo o nosso objetivo de trabalho, com vistas a dar suporte técnico às equipes dos CRAS, desde as orientações técnicas pautadas nas legislações vigentes, como também das ações que são inerentes ao PAIF. A gente trabalha em cima de reuniões ampliadas com as equipes, trazendo novas informações, apresentando novas legislações, as novas orientações técnicas dos MDS, e isso tudo na verdade é papel do Estado prestar essa assessoria. (Técnico João, da STDS).

Nós também fazemos visita in loco aos serviços, em especial ao PAIF, e hoje ele pode acontecer não só no CRAS, mas em outros espaços

referenciados, desde que seja feito pela equipe do PAIF, como também a gente vai aos serviços de convivência: os grupos que trabalham com crianças, adolescentes, jovens. A gente trabalha mesmo nessa orientação técnica, de como eles [profissionais] devem conduzir os grupos, de como esses grupos devem ser formados, quais as temáticas que devem ser trabalhadas (...) qual a proposta mesmo do serviço de convivência. Esclarecemos pra eles quais as ações do PAIF e quais as ações dos serviços de convivência, que são serviços distintos, mas que são complementares. Então perpassa mais ou menos por isso a nossa orientação (Técnico João, da STDS).

A gente assessora os municípios conforme as normativas, a documentação, as orientações que estão surgindo de novo, então a gente vem, fala do PAIF, fala do Serviço de Convivência, agora o PRONATEC já está no CRAS, o Acessuas, outros projetos do governo do estado que estão sendo executados, então a gente acompanha tudo isso e presta esse assessoramento: se a equipe tem dúvidas, a gente está (...) não é ensinando, mas é orientando como deve ser executado (Técnica Francisca, da STDS).

Percebe-se que a visita é bem mais definida como “assessoramento”, do que mesmo como “monitoramento”, em especial nas falas dos técnicos da STDS. Os depoimentos confirmam que o planejamento do trabalho com os municípios, apesar de colher dados e analisar os indicadores do monitoramento, pontuam, de forma bem mais destacada, o desenvolvimento desse trabalho de orientação técnica às equipes sobre a condução dos serviços. Dimensão também perpassada por desafios, pois esta assessoria nem sempre atende ao que os municípios esperam do ponto de vista dos avanços necessários e permanentes. Sobre esta questão os próprios técnicos da STDS admitem que as produções teóricas e metodológicas dentro da assistência social têm muitos limites e que precisam ser problematizados.

Tem muito que avançar... Outra dificuldade é que nós técnicos que fazemos esse trabalho, nós precisamos de capacitação, mas não é capacitação só a gente com a gente, não é só leitura dos documentos que chegam de Brasília, mas é da gente ir à fonte, da gente ter eventos pensados pra gente, com pensadores, aí vamos sair também dos manuais do MDS (...) com professores das universidades, com doutores que também estão escrevendo e pensando essa política (...) isso não acontece. Então, como é que a gente pode também avançar, como é que a gente vai também propor essas reflexões, como é que a gente vai discutir conceitos se a gente (...) recebe tudo pronto e a gente não participa da elaboração desses conceitos. A gente não tem tempo nem de refletir sobre esses conceitos (Técnica Marta,da STDS).

Do monitoramento da STDS, desse movimento de mão dupla que deve ser o monitoramento, eu sempre achei o retorno deles a questão mais questionável. Porque, primeiro, o que a gente sentia é que não existia nenhuma criticidade com relação ao próprio desenho da política de assistência social, e também não tem muito entendimento nem abertura com relação a isso. Porque não é porque somos técnicos “da ponta” da assistência, que não fazemos análises do processo mais macro. É preciso

reconhecer os avanços, mas visualizar também o que precisa avançar. A preocupação era mais ver o que estava acontecendo em consonância com a Política. O processo a mais, esse olhar pra além, não eram muito bem recebido. É um aprisionamento do que está escrito na Política, que tem que ser aquilo... Eu sempre senti isso, tanto nos monitoramentos como nas capacitações (Técnica Vanessa, de Maracanaú).

Os profissionais dos CRAS e da STDS entendem que os técnicos do estado, diante dessa função de assessorar, devem também ser fortalecidos tecnicamente, através de capacitações, sobre temáticas para além dos cadernos de orientações do MDS e para além da formalidade de colher informações para constar nos relatórios de visita. Os técnicos problematizam que é importante que se tenham direcionamentos nacionais sobre a condução dos serviços socioassistenciais, entretanto, é importante que se considere as especificidades de cada município e, também, os território nos quais estão localizados os CRAS, pois mesmo dentro de uma mesma cidade, entre territórios e bairros o público usuário da assistência social é bastante diferente.

Ainda vieram muito na linha do instrumental que tinham que aplicar. Não houve muito uma preocupação de saber quais as principais dificuldades do equipamento, quais são as principais dificuldades da equipe, quais são os principais problemas enfrentados no território, como é que a equipe está trabalhando essas questões (...) isso eu sinto falta. Porque se é para “monitorar” o CRAS, eu entendo que é pra dar um suporte técnico a esse equipamento, e não pra saber o que está sendo cumprido ou não de acordo com os cadernos de orientação. Porque a gente tinha, e tem questões maiores, tipo: como atrair esses públicos pros serviços, evitar as evasões? Quais são as principais dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores nos serviços? Não se toca nisso. O que é que eles querem saber no monitoramento: que horas o equipamento abre, que horas o equipamento fecha, se o profissional ta dando a carga horária devida... isso é importante, é importante sim, mas como é que ta se dando a gestão desse trabalho, como é que estão esses trabalhadores vivenciando todas as expressões da questão social que adentram no CRAS? Como é que ta a nossa retaguarda, a atuação das outras políticas públicas no território? Então é isso que eu sinto falta. Em nenhum dos três monitoramentos que eu participei não houve essa preocupação. A impressão que me passa é que eles vêm pra cumprir uma obrigação do Estado e preencher um instrumental, que tem que ser respondidas aquelas perguntas, daquele jeito, porque eles têm que apresentar um relatório, é essa a impressão que eu tenho. Não há uma preocupação maior com a realidade do município, pensar que eu vou olhar esse município e trazer contribuições. E eu acho que o trabalho de monitoramento é para além de alimentar um sistema (Técnica Paula, de Maracanaú).

Porque assim, eles vêm com o manual todo na ponta da língua, e eles querem aplicar esse manual na realidade dos CRAS, e cada CRAS tem sua especificidade. A gente segue no geral o que está nos manuais porque é importante, mas tem que adaptar, porque a gente não consegue seguir exatamente do jeito que está lá. Esses manuais são nacionais, e dentro de

Maracanaú a realidade de um CRAS é totalmente do outro, então você imagina aplicar uma coisa geral dessa em cada um (Técnica Raquel, de Maracanaú).

Sobre este aspecto, Ruiz (2010) aponta que há um natural comprometimento de quem assessora com sua visão ou sua leitura sobre determinado aspecto, e alerta que sobre essa questão deve-se ter cautela, pois “assessorar implica conhecer os objetivos-fins da instituição, sujeitos e atores sociais aliados, e, ainda, interagir com outros profissionais, numa perspectiva interdisciplinar” (Ruiz, 2010, p. 94). Além disso, outro aspecto importante da assessoria é sua capacidade de adotar uma postura propositiva, de apresentar sugestões e desenvolver críticas construtivas, elaborando táticas e estratégias capazes de extrair o que há de melhor nas diferentes percepções dos assessorados.

Desse modo, sobre as estratégias de assessoramento da STDS aos CRAS de Maracanaú e Pindoretama, vimos que, assim como a dimensão do monitoramento, as ações de orientação e acompanhamento não podem ser momentos esporádicos, mas devem ter sua periodicidade definida em consenso com os municípios. Além disso, o governo estadual, através de seus técnicos, precisa ter cautela ao reproduzir as diretrizes emanadas a nível nacional pelos cadernos de orientação publicados no âmbito da política de assistência social (Portarias, Manuais, Decretos, etc.). Metodologias de trabalho próprias de cada CRAS, mesmo que não sigam diretamente o que está nos manuais e orientações, podem constituir estratégias valorosas se dialogadas e adaptadas à realidade local. Caso sejam exitosas poderão ser replicadas em outros territórios, e a STDS pode ser uma articuladora desse processo mais criativo e com maior adequação às características da localidade em questão.