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2.2 Dimensões da competência

2.2.2 A dimensão estética

O termo “estético” é derivado do grego aisthesis, aistheton (sensação, sensível) e significa sensibilidade, percepção pelos sentidos ou conhecimento sensível-sensorial. A primeira definição de estética foi feita por Alexander Baumgarten (1714-1762) como “ciência do conhecimento sensível ou

gnoseologia inferior”18 ou ainda como a “ciência das sensações” ou “teoria do

belo”.19 Em Hermann (2005), encontramos que essa definição aparece em 1750,

na obra Aesthetica, e marca seu surgimento como uma disciplina filosófica, ao lado da lógica, da metafísica e da ética, preocupada inicialmente com a definição de beleza com caráter intelectualista. Baumgarten (1993) defendia a tese de que são objeto da estética as representações sensíveis, chamando-as propriamente do conjunto que congrega o conhecimento sensível.

Hoje, o substantivo “estética designa qualquer análise, investigação ou especulação que tenha por objeto a arte e o belo e, por consequência, a criatividade (criação, imaginação, nascimento, invenção) e a sensibilidade (capacidade de receber facilmente as sensações externas), indepen- dentemente de doutrinas e escolas.

Muitas definições de estética são determinações entre a estética, a natureza e a realidade e entre a estética e a sociedade (PERNIOLA, 2011). Desse modo, pode-se entender a estética como algo dependente da realidade

17 Para conhecer um pouco mais sobre essa dimensão, vale uma consulta atenta à obra de

Pretto (2005) e igualmente à obra de Bazzo (1998).

18 A tendência para localizar a estética no sensível ocorreu particularmente por ocasião do

racionalismo alemão, destacando-se Leibniz (1646-1716), porém muito especialmente Alexander Baumgarten (1714-1762) e Johann G. von Herder (1744-1803) (Cf. PAULI, 1963, p. 121).

19 Em 1750-1758, Alexander Baumgarten publicou os dois volumes de Aesthetica.

Principia seu famoso livro, com a definição do título: “A estética (teoria das artes liberais, gnoseologia inferior, arte da razão analógica) é a ciência do conhecimento sensível” (BAUMGARTEN apud PAULI, 1963, p. 122).

e da sociedade, independentemente dela ou condicionada por ela. Trata-se, segundo Perniola (2011), de um terceiro saber, a estética, que se coloca junto com a lógica (regras do pensar) e com a ética (atitude interior das pessoas), o que a faz determinante do comportamento das pessoas.

A noção de estética não reconhece consenso entre estudiosos, já que as relações entre estética e ética não se apresentam do mesmo modo em seu desenvolvimento histórico. No contexto do século XVIII, por exemplo, há valorização da beleza natural e artística, na experiência evocada pela natureza, pelo impulso ou voz interior, mas há também um caminho de renovação, de reação em favor de sentimentos e da atividade criadora do espírito. É desse modo que a noção de estética se associa desde seu surgimento, com a totalidade da vida sensível, de como o mundo atinge nossas sensações. Nesse sentido, o seu significado ressurge nos dias atuais como uma forma de lidar com as exigências éticas da pluralidade.

Ainda no século XIX, na base dos primeiros escritos de Hegel, já estavam implícitas as ideias da filosofia que revelam, entre outros temas, seu interesse pela estética, porque, segundo ele, “este termo adquiriu direito de cidadania na linguagem corrente” (HEGEL, 1991, p. 10), e pelo poder de dar, das ideias elevadas, uma representação sensível, o que já é um argumento em favor da conservação dessa noção. O filósofo explicava que tanto a estética como a arte possuíam um valor e um lugar e exemplificava: “o pintor dedica-se à longa aprendizagem para se familiarizar com as relações entre as cores, com os efeitos e os reflexos da luz, e o saber transpor para a tela” (HEGEL, 1991, p. 10) e, reforça:

Todas as paixões, o amor, a alegria, a cólera, o ódio, a piedade, a angústia, o medo, o respeito, a admiração, o sentimento da honra, o amor da glória etc., podem invadir a nossa alma por força das representações que recebemos [da estética]. (HEGEL, 1991, p. 10).20

20 Em Hegel (1991, p. 10, 27-28), a estética é enunciada pelo “belo” e pela “arte”, ambos os

irmãos da estética, pois, pelo conteúdo, a obra de arte – a estética – é individual e concreta, imagem que se dirige aos sentidos e que a arte destina-se a despertar em nós sensações agradáveis mediante a criação de formas com a aparência da vida.

De fato, a arte ordena e expressa simbolicamente uma dimensão da vida, relativa aos sentimentos e às percepções pessoais, que não pode ser explicitamente formulada pelos produtos da razão. Por meio da sensibilidade e da criatividade demandadas pela arte, o homem sempre buscou atingir ideais de harmonia e beleza essenciais ao bem viver. Para os adeptos da arte pela arte, por exemplo, a beleza não é uma propriedade inerente das coisas, e sim o resultado da atividade do homem transformado em artista.

Hegel (1991, p. 225), referindo-se à estética, afirmava que “a obra de arte, como produto do espírito, exige uma atividade subjetiva criadora que faz dela um objeto de intuição para os outros e um apelo à sensibilidade alheia”. Para o filósofo, é a imaginação que constitui esta atividade subjetiva criadora, e há nessa atividade criadora um dom e um sentido que permitem apreender as formas da realidade, e no espírito gravar as variadas imagens multiformes da realidade existente, alargando o círculo das intuições.

O ato criador abrange a capacidade de compreender, e esta, por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar. O criar só pode ser visto, então, num sentido global, como um agir integrado em um viver humano. De fato, criar e viver se interligam. A criatividade é, assim, um potencial inerente ao homem, e a realização desse potencial, uma de suas necessidades (OSTROWER, 2008).

Por esse viés, a sensibilidade estética está diretamente relacionada ao potencial criador e a um fator determinante para a competência em informação. Com base nas teorias educacionais de Paulo Freire, Jacobs (2008, p. 261), por exemplo, afirma que a educação para a competência em informação fundamenta-se na criatividade e estimula a verdadeira reflexão e a ação sobre a realidade, respondendo assim à vocação das pessoas enquanto seres que são autênticos apenas quando engajados em questionamentos e na transformação criativa. É poder dar forma a algo novo, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos igualmente em termos novos (OSTROWER, 2008).

Há que se lembrar ainda que sobre a estética repousam posicio- namentos filosóficos sobre a sua função, que consideram a estética ora como educação, ora como expressão.

As teorias que veem na estética um instrumento educativo, ou seja, de educação política, consideram-na como parte do esforço de libertação das pessoas. Para Perniola (2011, p. 68), “[...] o sensível é elevado à forma do saber, porque o próprio saber é uma superforma. Por isso, e não por acaso, o estético é o âmbito que funda a unidade entre natureza e liberdade”. Há, assim, na estética, a libertação, oposição oportuna às tentativas de manipulação ou de subordinação das pessoas em sociedade.

A estética como expressão ou como forma final das vivências, das atividades, ou ainda das atitudes humanas são transformações das noções tradicionais de estética. É o que podemos chamar de mundo da vida, ou como afirma Perniola (2011, p. 71), da “experiência vivida”. Há, nessa perspectiva, uma dimensão objetiva. A história ainda apresentaria uma dimensão mais vinculada ao prazer: o “gosto” e a “paixão” (PERNIOLA, 2011, p. 73).