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4. A Prova da Irresponsabilidade do Executado

4.3. O Ónus da Prova

4.3.2. A distribuição do ónus da prova

A ideia de distribuição do ónus probatório consiste na definição da sua orientação, isto é, por força da distribuição, uma das partes será onerada com a prova e a outra beneficiada, sendo que o Tribunal irá orientar a sua decisão em prejuízo de uma das versões discutidas, não podendo proferir uma decisão alternativa.

As regras de distribuição do ónus da prova encontram-se previstas nos artigos 343.º e seguintes do CC. De referir, desde já, que em contencioso tributário, e particularmente no que se refere à dispensa de prestação de garantia, a postura adoptada vai no sentido do que dispõe o aludido preceito, cabendo ao executado que pretende a dispensa de garantia o ónus de provar as condições que a lei determina, porquanto estão em causa factos constitutivos do direito que

93 Leo Rosenberg, “Die Beweislast”, 5.ª edição, Munique, Verlag C. H. Beck, 1965, página 54 e seguintes 94 Pedro Ferreira Múrias, “Por uma Distribuição Fundamentada do Ónus da Prova”, Lex, Lisboa, 2000, p. 10. 95 Cf. Artigos 423.º, 425.º, 454.º 475.º e 516.º do CPC, ex vi artigo 2.º do CPPT.

pretende ver reconhecido.

A compreensão destas regras parte, em grande medida, de um estudo interpretativo das normas de atribuição do ónus da prova, sendo, por conseguinte, indissociável uma visão filológica das regras em análise. Assim, cremos que é de toda a pertinência trazer à colação as considerações de Rosenberg no que à sua «teoria das normas» diz respeito.

A «Teoria das Normas» parte da obra, Die Beweislast, cuja primeira edição data de 1900, mas algumas alterações significativas levaram a que surgisse uma segunda edição e foi esta que serviu de base a uma enorme querela doutrinária, sem prejuízo das edições posteriores, que não mais alteraram o conteúdo essencial da obra, limitando-se, essencialmente, a responder a críticas de outros autores.

Em termos genéricos, este ensinamento assenta na ideia de que a aplicação de uma determinada norma ao caso concreto depende do preenchimento dos elementos que constituem a sua facti species, sob pena de o Tribunal decidir em sentido contrário à pretensão da parte onerada.

A distribuição do ónus da prova não ocorre em função da posição de cada uma das partes no processo, essa distribuição há-de depender da formulação do pedido, i. e., a parte que invoca um facto, para que possa dele aproveitar, tê-lo-á de provar. Esta é a orientação que,

grosso modo, foi acolhida pelo legislador do CC, ao prescrever no n.º 1 do artigo 342.º do CC

que o ónus da prova recairá sobre quem invoca os factos constitutivos do direito alegado. No domínio do contencioso tributário, no mesmo sentido do que vem ora sendo referido, a jurisprudência é unânime em atribuir à Administração Tributária o ónus de provar, para efeitos de Responsabilidade Tributária subsidiária, além da gerência de Direito, o exercício de facto

daquelas funções96.

A este propósito cabe fazer a distinção entre normas de base e contranormas, que ajudarão o juiz a formar a sua convicção. Ora, as normas de base são normas constitutivas e as contranormas são àquelas antagónicas, sendo impeditivas, extintivas ou excludentes das normas de base.

Segundo o autor, o modo de redacção é fulcral para a distinção das várias normas jurídicas, de tal ordem que a sua doutrina já foi designada por alguns autores, e de um modo

pejorativo e que, já agora, nos parece injusto97, de “teoria da estrutura de frases”98. Rosenberg

não permaneceu imune à crítica e tentou retirar algum peso da redacção normativa na mecânica de atribuição do ónus probatório, dando ênfase à importância dos elementos de interpretação na autonomização das normas e enaltecendo a actualidade da sua teoria, na medida em que deveria servir de base para todo e qualquer regime processual que viesse a ser construído no futuro.

Deste modo, a teoria de Rosenberg, como já foi referido supra, tem ínsita a ideia segundo a qual, para obter o provimento de determinada pretensão, os pressupostos de aplicação da respectiva norma terão de estar comprovados. Assim, seguindo um método lógico- dedutivo, “A terá direito a P, caso se verifique x e não se verifique y”. A parte onerada com a prova, terá, por assim dizer, dois ónus: o ónus de provar a verificação de x e o ónus de provar a não verificação de y.

Casos haverá em que A, para ter direito a P, terá de se verificar x, salvo se for verificado

y. Neste caso, a parte onerada tem o ónus de provar x (norma de base) e sobre a parte contrária

recairá o ónus de provar y (contranorma).

Assim, o esquema de atribuição do ónus da prova, não se configura como um esquema demasiado rígido, estando alicerçado pelo circunstancialismo do caso concreto. E o próprio autor reconduz a questão da distribuição da arena batalhada do litígio para o éter puro da

ordem jurídica.

Eis a relevância da estrutura sintática. Através da técnica de distribuição do ónus da prova, com base na própria sintaxe da lei, qualquer que seja a sua redacção, o direito será reconhecido a A, se houver prova da ocorrência do facto x e não-y e não será reconhecido, caso tenha sido provado não-x e ou y.

Posto isto, não obstante este ser um ponto de partida incontornável, sempre que se pretende desenvolver qualquer teoria sobre o tema, esta visão de Rosenberg não está isenta de

97 Tanto é que, na doutrina alemã, é pacífica a relevância da estrutura sintática das normas no que concerne à distribuição do ónus da prova.

98 Heiner Stecher, “Die Ursachenvermutungen des Umwelthaftungs und des Gentechnikgesetzes im Gefüge der individualhaftungsrechtlichen Schadenszurechnung”, Peter Lang, Francoforte no Meno, 1995

críticas. Como se verá adiante, a propósito da prova de factos negativos, sem prejuízo de tudo o que se referiu supra, cremos que há necessidade de se substituir esta doutrina por uma concepção ainda mais presente no caso concreto.