4. AS TENDÊNCIAS TEÓRICO-POLÍTICAS NA QUESTÃO DA ORIENTAÇÃO
4.1 OS EVENTOS E OS PERIÓDICOS EM NÚMEROS
4.1.1 A Diversidade Sexual no Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais
ocorre o maior evento do Serviço Social brasileiro, o CBAS. Faz-se essencial
52 Na primeira edição que selecionamos (1998) não houve publicação que contemplasse os critérios elencados, por este motivo apenas artigos de duas edições foram analisados. 53 Segundo Irineu (2013 – CBAS), é durante a primeira metade da década de 2000 que é criado, tanto no CBAS, quanto no ENPESS, o Grupo de Trabalho “Gênero, Raça/Etnia e Orientação Sexual”. 0 2 4 6 8 10 12 14 16 1995 1998 2004 2012 2013 CBAS ENPESS
lembrar que este foi o palco da “Virada” que representou o questionamento ao Serviço Social tradicional, quando na sua edição de 1979, realizada na cidade de São Paulo. Nesta ocasião, a vanguarda profissional protagonizou o enfrentamento político das lutas pela implementação do Estado de Direito, após o período de longos ataques experimentados pelos/as trabalhadores/as durante a ditadura militar.
A “Virada” teve o sabor de descortinar novas possibilidades de análise da vida social, da profissão e dos indivíduos com os quais o Serviço Social trabalha. Dali em diante, a realidade em sua dinamicidade e dimensão contraditória torna-se o chão histórico prenhe de lições cotidianas por meio do protagonismo das lutas da classe trabalhadora e dos sujeitos profissionais que passaram a apreender as necessidades reais vivenciadas pela população como demandas postas ao Serviço Social (CFESS, 2009 – CFESS Manifesta).
Sua última edição, realizado no ano de 2013 na cidade de Águas de Lindóia/SP, teve como tema “Impactos da crise do capital nas políticas sociais e no trabalho de assistentes sociais” e contou com a inscrição de, aproximadamente, 3000 pessoas entre profissionais e estudantes. Sendo aprovados 1288 trabalhos, segundo o caderno de programação do evento, expressando a relevância que o evento tem, sobretudo no caráter acadêmico e político.
Seu avanço em torno da discussão da diversidade sexual é visível, com destaque para a ampliação na quantidade de trabalhos, inclusão de mesas temáticas. Apesar disso, em termos quantitativos, sobretudo, se comparado com outros temas, ainda é pouco expressivo.
Para fins de análise, buscamos artigos nos anais das edições de 1995, 2004 e 2013 (as mais próximas ao recorte temporal que delimitamos), a partir dos termos anteriormente citados e identificamos o crescimento do número de artigos relacionados à temática.
Entretanto, é necessário afirmar que diante dos números, quando relacionamos ao quantitativo de trabalhos aceitos, ainda temos muito a avançar. Para termos ideia, no ano de 1995, momento de iniciação da discussão dos DH no âmbito da profissão, de 205 trabalhos aceitos, um se tratava de diversidade sexual, correspondendo a menos de 1% do total de artigos. Em 2013, conforme dissemos anteriormente, foram aprovados 1288 trabalhos, sendo 10 relacionados à temática, o
que corresponde a 1,2% do total de trabalhos, estando sua maioria, concentrados no eixo temático Raça, Etnia, Gênero e Sexualidade – ênfase em Sexualidades, conforme apresentados na tabela seguinte.
1995 2004 2013 TOTAL
Quantidade de artigos relacionados, em seus títulos, aos termos “Orientação Sexual”, “Diversidade Sexual”, “LGBT”, “Lésbica”, “Gay”, “Bissexual”, “Travesti”, “Transexual”, “Transgênero” e “Homossexual”
01 04 10 15
Porcentagem em relação ao número total de trabalhos aceitos 0,5% 0,5% 0,8% Tabela 3 – CBAS e a incorporação da temática em números
No CBAS, a expressão das duas principais tendências na produção intelectual do Serviço Social, anunciadas em números, revela que a ênfase nas discussões que vislumbram que o atual modo de produção é capaz de dar respostas eficazes às demandas da população LGBT é significativa, segundo podemos constatar e apresentar na forma de gráfico.
Gráfico 2: Representação das tendências em números (CBAS)
Esses dados mostram certamente a pluralidade teórico-metodológica que permeia o CBAS, o que consideramos positivo, em se tratando do maior evento da
0 1 2 3 4 5 6 1995 2004 2013 Tendência 1 Tendência 2
área. E por outro lado, revela no Serviço Social brasileiro, uma tendência comum no âmbito de outras áreas das ciências humanas e sociais, que é o fato da questão da diversidade sexual ser apreendida a partir de referenciais teóricos distintos do marxismo.
Um dos desafios consiste em dar maior visibilidade para as produções neste campo temático que se fundamentam na perspectiva de totalidade e encontrar, do ponto de vista político, possibilidades de articulação entre os profissionais na luta contra o preconceito.
CBAS 1995
Título e autor/a Tendências Referências
01
EM CENA: O travesti de Mossoró. Gláucia Helena Araújo
Russo
Análise aparente superficial do objeto de estudo; não é possível ser identificado no texto o questionamento de o
porquê as travestis são hostilizadas pela sociedade.
Característica reformista. Magnani (1991); Mott (1988); Sell (1987); Revista Veja (1993). CBAS 2004 01 A CONSTRUÇÃO DA VULNERABILIDADE LÉSBICA ÀS DST/AIDS: Um estudo sobre a discussão da possibilidade de infecção no Brasil contemporâneo. Glaucia
Elaine S. de Almeida
Análise superficial acerca do objeto de estudo; consiste na apresentação de parte do
processo histórico de construção da vulnerabilidade
lésbica às DSTs/AIDS. Por se tratar de parte do projeto
de tese, apresenta a discussão inicial, tornando incapaz de
visualização do aprofundamento do da análise. Característica reformista. Green (2000); Fachinni (2002); Mott (1987); Almeida (2004); Moutinho (2003). 02 GARANTIA DE DIREITOS NA ADOÇÃO POR HOMOSSEXUAIS. Maria de Lourdes Bohrer Antonio; Marcia Mathias; Sandra Regina Pessoa
Discussão desarticulada ao PEPSS. Traços ecléticos. Ao
mesmo tempo em que reconhece que esta sociedade
cerceia a liberdade da
Rios (2001) Sarti (2003) Weeks (1999) Sawaia (2003)
de Meneses população LGBT, utiliza autores que não fazem a crítica
contundente ao status quo, o que fragiliza o debate por apresentar superficialidade na
análise.
03
LESBIANIDADE E FEMINISMO: Sinalizando desafios para a efetivação de
direitos. Marylucia Mesquita
Crítico-dialética Ávila (2001); Heller (1989); Ianni (1987); Lessa (1997); Palangana (1998) Lima (2004). CBAS 2013 01 "NASCIDOS LIVRES E IGUAIS"? Violação de direitos e
opressão da população lgbt na cidade. Andréa Lima da Silva; Silvana M. de M. dos Santos
Realiza crítica ao direito burguês; perspectiva crítico-
dialética Harvey (2008); Lefebvre (1991); Santos (2007; 2008) 02
“SEM MOVIMENTO NÃO HÁ LIBERDADE”: Trajetória e
desafios dos Movimentos Sociais pela liberdade de Orientação Sexual. Mirla Cisne;
Maria Lúcia Duriguetto, Luiz Agostinho de Paula Baldi
Perspectiva crítico-dialética Simões e Fachinni (2008); Santos (2005); Okita (2007); Selem (2007); Montaño e Durigueto (2010) 03 A NECESSIDADE DA DISCUSSÃO SOBRE A DIVERSIDADE SEXUAL NO ÂMBITO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL DOS/DAS ASSISTENTES SOCIAIS. Daniella Elana dos Santos Cruz;
Bárbara da Rocha Figueiredo; Laura Costa de Paiva e
Realiza crítica à sociabilidade do capital que aprofunda preconceitos enquanto se legitima/fortalece; Perspectiva crítico-dialética Barroco (2006; 2008); Behring (2008); Iamamoto (2009); Mesquita ET. AL.
(2011); Mészaros (2008);
Mendonça Duriguetto (2011); Santos (2009 e 2003); Silva (2011) 04 DIVERSIDADE SEXUAL E DIREITOS HUMANOS: Olhares
sobre saúde, políticas e direitos de LGBT. Marco José de Oliveira Duarte Contextualiza a criação de políticas públicas LGBT e aponta necessidade de efetivação, vislumbrando a legitimação da cidadania daqueles indivíduos; características reformista. Duarte (2011); Lionço (2008); Mello (2011); Peres (2010) 05 O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL E A DIVERSIDADE DE GÊNERO:
Orientação sexual encarada como violação de direitos.
Andreza Cristina da Silva
Análise com traços conservadores acerca da diversidade sexual; apresenta
análise moralista Braz (?); Bueno (2000) 06 O PAPEL DA FAMÍLIA DE LGBT: a dualidade de vítima e vitimizador. Jacqueline Malacarne Mendonça
Reforça a análise na esfera do micro. Ao tratar de familia, imagina-se que a autora vai
tratar de configurações de famílias, o que está no cerne
do preconceito... Essas questões não são discutidas no
texto. Perspectiva pós-moderna Nunan (2003); Bento (2006); Butler (1990) 07 PARA COMPREENDER O UNIVERSO TRAVESTI: Elas
por elas. Valdecio Carlos da Silva Junior; Ricardo de Lima
Soares
Análise superficial, centrada na subjetividade; apesar de algumas travestis afirmarem “categoricamente” (sic) não ter
problemas ao transitar pela sociedade, a autora não
problematiza. Duarte (2004); Agnoleti (2010); Derzan (2011); Pelúcio (2004); Peres ( 2009)
08 REFLEXÕES ACERCA DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA
Traços de ecletismo no artigo; Embora tenham sido utilizadas
Foucault (1988); Butler (2003);
A POPULAÇÃO LGBT NO BRASIL E OS DESAFIOS À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS. Bruna Andrade Irineu
algumas referências que caminham no sentido de
questionar a ordem estabelecida, foram citados estudos pós-modernos sem
apontar críticas. Louro (2004); Bandeira (2008); Góis (2003); Rubin (1993); Gramsci (2007); Montaño (1999); Chauí (2005); Freire (2006) 09
SERVIÇO SOCIAL E LUTAS LGBT: Algumas questões para
o debate. Gustavo Henrique Teixeira
Crítico-dialética
Barroco (2008); Mesquita Et. Al.
(2011); Santos (2010); Silva (2011) 10 UMA ANÁLISE DO ATENDIMENTO ÀS POPULAÇÕES LGBT NO ÂMBITO DO CREAS. Jéssyka
Kaline Augusto Ribeiro
Não contextualiza as políticas públicas para pop LGBT no contexto da contrarreforma; análise da Política Nacional de Assistência Social apenas para
fim de ampliar e efetivar... não a apresenta como mediação
política necessária nesta sociabilidade. Traços de ecletismo. Sitcovsky (2008); Mota (2008); Irineu (2010); Scott (1995); Louro (2010)
Tabela 4 - Produção intelectual CBAS 1993-2013 referente à temática.
4.1.2 A Diversidade Sexual no Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço