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Rocha (2009) apresenta em seu trabalho científico dois projetos de educação para o meio rural: a Educação Rural e a Educação do Campo.

Os termos Educação Rural e Educação do Campo tem sido amplamente discutidos no cenário nacional, tendo em vista a diferença em suas configurações e interesses. Segundo (ASSUNÇÃO, 2012, p.5):

A educação rural é entendida apenas como um processo de escolarização e tem sido praticado sobre os moldes e especificidades dos centros urbanos. Esta prática é vista como uma forma de perpetuar os interesses neoliberais, colocando o homem do campo fora dos projetos de desenvolvimento nacional, enquanto políticas públicas de Estado.

As políticas públicas do próprio governo confirmam de certa forma, até a década de 80 a citação de Assunção (2012), pois a oferta da educação vinha atendendo as demandas do processo de industrialização com enfoque curricular para a formação tecnicista, onde o homem do campo e sua família não eram atendidos sob nenhuma oferta de educação que contemplasse o desenvolvimento social e educacional.

Portanto, nesta lógica de concepção, assistimos a um fluxo migratório populacional do campo para a cidade.

Nesse contexto de debates/embates surge então a Educação do Campo, tentando instituir-se como um novo paradigma educacional, como possibilidade de assumir, declarar e adotar um conceito mais amplo sobre educação nas dimensões familiar, afetiva e de trabalho, buscando a constituição do protagonismo dos sujeitos do campo em suas organizações sociais, a fim de complementar e potencializar o saber.

Ciavata (2012) aponta algumas questões que são importantes na compreensão dos descompassos entre formação básica e profissional, que vão ao encontro dos ideias e objetivos da Educação do Campo. Afirma a necessidade de sintonia de uma educação coerente com a emancipação dos aprisionamentos materiais e ideológicos do mundo. A seguir apresentamos uma dessas questões:

A primeira destas questões é a crítica ao capitalismo, modelo econômico que se apresenta com a aparência sedutora do consumo fácil, obscurecendo sua essência, a contradição capital e trabalho, pela exploração de uma parte da produção do trabalhador para fins da apropriação produtiva e financeira do capital (CIAVATA, 2012, p. 70).

(SANTOS e CANHAMAQUE, 2012, p. 258) reforçam a necessidade de desenvolvimento de um projeto para educação do campo que rompa com a hegemonia dos valores neoliberais capitalistas que culminam para o individualismo e a competição. Ressaltam ainda que “[...] a fragmentação das lutas dos povos do campo contribuem para a reprodução de tais valores, sendo necessário ter uma postura inconformista diante do projeto hegemônico de desenvolvimento que tem sido pensado para o campo”.

Os movimentos sociais e as organizações da sociedade civil têm-se mobilizado no sentido de romper e combater tal hegemonia e capitalismo, a fim de incluir a educação do campo na pauta dos temas estratégicos para redemocratização do país, bem como atender as reais necessidades e anseios dos camponeses, de forma que não haja o imperativo da lógica do capital nas relações sociais.

Tais movimentos ajudaram na culminância das diretrizes da Lei de Educação Nacional número 9.394 de 1996, pois em complemento à Constituição de 1988,

preveem uma base comum e adequação do calendário escolar às peculiaridades da vida rural.

A realização da I e II Conferência Nacional por uma Educação Básica no Campo, ocorridas em 1998 e 2004, respectivamente, tem articulado uma agenda de reivindicações, baseadas nos movimentos de Educação Popular de Paulo Freire, na tentativa de combater o descaso do Estado para com as questões da educação da população rural.

As referidas reivindicações e mobilizações acabaram resultando na conquista de diretrizes e legislações17, que vem enfrentando desafios na consolidação de uma política de educação básica adequada para o campo.

As Diretrizes Operacionais da Educação Básica para o Campo (2001), bem como as legislações específicas já citadas, representam conquistas importantes para o Movimento: por uma educação do campo, principalmente para os Centros Familiares de Formação por Alternância, pois contemplam resultados propositivos para a educação básica do contexto rural, abordando princípios provenientes dos movimentos sociais e assumidos pelo governo. Essas mudanças renovam e fortalecem a esperança do povo campesino, que acredita na formação de seu povo de forma sustentável, solidária e humana.

Os Centros Familiares de Formação por Alternância se sentem mais fortalecidos com as últimas políticas públicas de governo, no que se refere à Educação do Campo, pois a intenção é extrapolar a visão tradicional do rural, designada para o lugar geográfico e se contrapor aos interesses do capitalismo e do agronegócio. É necessário reconhecer os povos do campo como sujeitos de direitos. A efetivação de tais políticas tem sido os maiores desafios dos CEFFAs, desde a sua fundação até os dias atuais. O movimento dos Centros Familiares de Formação por Alternância surgiu na França, há quase 80 anos, nas Casas Familiares Rurais, a partir das necessidades de agricultores que estavam inseridos no mundo do capital, mas que, auxiliados por

17

Ressaltamos as indicações estabelecidas na LDB 9394/96, Artigo 28; A partir de 1999, o surgimento e desenvolvimento de instrumentos institucionais como: o Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável para Agricultura Familiar (Condraf); as diretrizes operacionais para a educação básica do campo brasileiro CNE em 2002. O Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo (GPT) em 2003; a criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), em 2004. A criação do Projovem Campo – Saberes da Terra, integrando a qualificação social e profissional de jovens agricultores/familiares em 2005 e mais recentemente o Decreto presidencial Nº 7.352, de 4 de Novembro de 2010, que dispõe sobre a política de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA.

movimentos sindicalistas e sociais ligados à Ação Católica, compreendiam os mecanismos de exploração e acumulação capitalista e vislumbravam proporcionar aos seus filhos uma educação que contribuísse para o desenvolvimento humano e de sua própria realidade. Já nessa época, se percebia uma preocupação grande dos agricultores com o desenvolvimento da região em que viviam.

A experiência bem sucedida na França possibilitou a expansão dos CEFFA’s para outros países da Europa e depois para o mundo inteiro.

O maior país da América Latina foi o primeiro que começou a longa caminhada com os CEFFA’s nesse continente. A história dos CEFFA’s no Brasil iniciou-se no final dos anos 60, período em que o Brasil passava por uma conturbada conjuntura política, a ditadura militar. Essa história teve início no Estado do Espírito Santo com a chegada de pessoas com o conhecimento da experiência do projeto CEFFA na Itália, que articularam as famílias rurais e as lideranças políticas, populares e religiosas a fim de implantar esse projeto no Estado, que resultou na fundação do Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES), com a implantação de três Escolas Famílias Agrícolas (EFA’s) no sul do Estado (Anchieta, Alfredo Chaves e Rio Novo do Sul).

A Pedagogia da Alternância foi introduzida no Brasil, no interior do Estado do Espírito Santo, recebendo forte influência das experiências francesas e italianas. Tal introdução no nosso estado confirma o grande número de instituições existentes voltadas para a Educação do Campo, apresentando um quadro complexo. É o Estado que concentra o maior número e a maior diversidade de instituições pedagógicas em Alternância: Escolas Famílias Agrícolas, Escolas Famílias Autônomas, Escolas com Pedagogia da Alternância nos assentamentos, Escolas Municipais Comunitárias Rurais e a primeira Escola Estadual Comunitária Rural (ECOR), criada pelo governo do estado em 2012, localizada no Distrito de Ângelo Frechiani, município de Colatina, anexa à escola campo desta pesquisa.

No início da década de 70, os agricultores do norte do Estado, estimulados pelo movimento da Pastoral Social da Igreja Católica, também interessados no modelo de formação, buscaram tal experiência no sul do estado, surgindo as Escolas Famílias Agrícolas de Jaguaré, São Gabriel da Palha e São Mateus.

A região norte do Estado do Espírito Santo, especificamente na região de abrangência da Regional das Associações dos Centros Familiares de Formação por

Alternância do Espírito Santo (RACEFFAES), composta pelos municípios de Ecoporanga, Montanha, Boa Esperança, Pinheiros, Barra de São Francisco, Boa Esperança, São Gabriel da Palha, São Mateus, Mantenópolis, Nova Venécia, Jaguaré, Rio Bananal e Colatina, conta atualmente com a existência de 28 CEFFAS, baseadas nos princípios da PA, formando 2.613 crianças para a vida, de acordo com o informativo 2012 da RACEFFAES.

De acordo com tal informativo, a RACEFFAES acredita que o desenvolvimento de uma comunidade se dá a partir das pessoas daquele lugar. Sendo assim, vê a expansão da PA como meio de valorização da cultura camponesa e criação de oportunidades para o desenvolvimento da juventude e das comunidades.

Vale ressaltar a transformação de mais duas unidades de ensino municipal de Colatina para CEFFAS, no início do ano letivo de 2013, tendo em vista o fortalecimento das comunidades já atendidas pelas EMCORs “São João Pequeno” e “Pe. Fulgêncio do Menino Jesus”, bem como o apoio do poder público municipal, que já entendeu a necessidade de proporcionarmos uma educação apropriada à realidade do campo.

De acordo com Gimonete (2007) compreender e praticar os princípios da PA nos CEFFAs não é tarefa simples, pois propõe um desenvolvimento coerente com o seu objetivo, obedecendo a um processo que parte da experiência da vida quotidiana (familiar, profissional, social) para ir em direção à teoria, aos saberes dos programas acadêmicos, para, em seguida, voltar à experiência, e assim sucessivamente.

Gimonete (2007) apresenta de forma resumida o processo de criação da PA:

Os agricultores inventores e seus porta-vozes pedagógicos não se basearam em teorias ou conceitos para colocá-los em prática de maneira dedutiva. Não, eles perceberam, escutaram e se conscientizaram dos problemas, das necessidades. Questionaram-se, formularam hipóteses e tem enunciado soluções.... Em seguida, inventaram, realizaram, agiram, olharam as práticas. Analisaram, destacaram os componentes do sistema e os fatores de êxito e de fracasso... Disto tudo extraíram ideias, pensamentos, saberes e conhecimento, mesmo que fossem empíricos.... Confrontaram-se com outros, diferentes, para atingir outros saberes, outros conhecimentos mais amplos no campo das ciências educativas.... para entender melhor, agir melhor a fim de prestar um serviço educativo, responder às necessidades, contribuir para o desenvolvimento das pessoas e do meio rural (GIMONETE, 2007, p. 27).

Percebe-se então, que esse processo de criação tornou-se um momento de ação- pesquisa-formação permanente, bem característico dos princípios da Pedagogia da Alternância.

A PA é tida como uma das pedagogias do trabalho, porque funciona como uma pedagogia preocupada com a relação entre a vida prática e a escola, numa relação dialética: prática - teoria – prática.

(Oliveira ; Pinto 2012, p.23) afirmam a necessidade de desenvolver esta relação (prática-teoria-prática), “[...] no sentido de tornar possível uma mediação entre o saber experencial e o conhecimento científico”.

O parecer do CNE/CEB nº 01/2006 também afirma a necessidade de desenvolver tal relação:

Numa concepção de alternância formativa, não é suficiente a aproximação ou a ligação de dois lugares com suas lógicas diferentes e contraditórias, ou seja, a escola e o trabalho. É necessária uma sinergia, uma integração, uma interpenetração rompendo com a dicotomia teoria e prática, abstrato e concreto, saberes formalizados e habilidades (saber – fazer), formação e produção, trabalho intelectual e trabalho físico (manual) (BRASIL, 2006, p.4).

Pensando nessa lógica de processo de formação permanente, Gimonete (2007) apresenta quatro pilares dos CEFFAs: dois pilares da ordem das finalidades (formação integral e o desenvolvimento do meio) e dois pilares da ordem dos meios (a associação e a alternância).

Figura 4 - Representação gráfica dos pilares nos CEFFAs.

A Associação Local representa os vários segmentos constituintes da PA (estudantes, monitores, famílias, associações, entre outras). É a responsável pela parte gerencial, administrativa e financeira da Escola. No caso específico da escola campo desta pesquisa, a APREMCOR “Pe. Fulgêncio do Menino Jesus” encontra-se devidamente associada a este pilar. Tais atribuições estão ancoradas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação, por meio do artigo 14.

No pilar Alternância, podemos inferir que funciona o método pedagógico de funcionamento dos CEFFAs, seguindo a proposta de ação-reflexão-ação. É o sistema da alternância propriamente dito, cujo princípio educativo e a aprendizagem são organizados em função da realidade concreta, permitindo períodos de formação na sede da escola (sessão), que se alternam com períodos no meio comunitário- sócio-profissional (estadia).

O presente pilar encontra-se fundamentado no Capítulo II, Seção I, Art. 23 da LDB. O terceiro pilar possibilita enriquecer a formação na experiência e convivência em grupos, alternados entre os momentos de formação na família e escola. O artigo 22 da LDB também ampara este pilar.

O quarto e último pilar reúne características dos outros três. A formação integral associada ao mundo do trabalho permite uma formação que possa descobrir uma vocação profissional, abrindo possibilidades de se tornarem-se agentes de transformação do meio.

O termo desenvolvimento sustentável pode ser considerado um dos pontos importantes na formação em alternância, conforme prevê a LDB, na forma do art. 2º:

A educação, dever da família e do estado inspirada nos princípios da liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade, o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1996, p.1).

Neste sentido, de acordo com Caliari (2002), os CEFFAs:

Oportunizam as famílias uma flexibilidade de contraposição às necessidades por elas enfrentadas. Por pautar-se no cotidiano do educando, de sua família, e comunidade, a PA adota instrumentos de intervenção na realidade do educando, enfatizando dimensões de incentivo à participação popular e adoção de práticas agrícolas voltadas para uma relação equilibrada entre homem e a natureza. Uma educação rural voltada para a realidade do aluno torna-se

cúmplice do pleno desenvolvimento do educando e da comunidade (CALIARI, 2002, p.21).

Depois de apresentar as concepções da Educação do Campo e da Pedagogia da Alternância, com a finalidade de evidenciar seus pressupostos históricos e objetivos embasadas nos pilares que as compõem, o tópico a seguir apresenta os instrumentos pedagógicos da alternância na perspectiva de conectá-los a um fazer matemático voltado à realidade do estudante, objeto da pesquisa.

3.5 INSTRUMENTOS PEDAGÓGICOS DA ALTERNÂNCIA PRATICADOS NOS