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A Educação Infantil no período de 1958 a 1992

2. EDUCAÇÃO INFANTIL EM BETIM

2.1 A Educação Infantil no período de 1958 a 1992

A história da Educação Infantil na cidade de Betim se assemelha em seus aspectos estruturantes ao percurso da Educação Infantil no Brasil. Claro que também há diferenças, principalmente, diferenças temporais. Enquanto em nível nacional as primeiras instituições de atendimento à infância surgem no final do século XIX, em Betim a primeira instituição na qual encontramos registros10 surge no final da década de 1950. O marco inicial da política pública de Educação Infantil na cidade, tem origem no ano de 1958, quando nesta época, o governo municipal representado pelo então prefeito Raúl Saraiva, sancionou uma legislação que dispõe sobre a doação de um terreno público para a construção da sede do Jardim de Infância Menino de Jesus, na rua Serrado ao lado da casa das senhoras Divina Starling, Francisca Pinto e Josua Iracia de Jesus (BETIM, 1958). O ano de 1959 marca-se como o início das atividades do Jardim de Infância Menino de Jesus, que era uma organização privada (BETIM, 2006). Desta forma, este jardim de infância é a primeira instituição que atendeu crianças pequenas na cidade de Betim da qual se tem alguns poucos registros históricos11.Quando comparado com a situação do Brasil notam-se movimentações similares em Betim, visto que as primeiras instituições de atendimento à infância brasileira também foram os Jardins de Infância, pois houve uma tentativa frustrada de implantação do modelo frobeliano no ano de 1875 (KRAMER, 1984; KUHLLMAN Jr., 2011), e em 1896 ocorreu a criação do Jardim de Infância Caetano de Campos (SP). Ressalta-se que estas instituições, tanto em Betim quanto no Brasil, eram de exclusivo atendimento às crianças filhas da elite.

9 Uma análise mais detalhada sobre a trajetória histórica da educação infantil em Betim no período

de 1958 a 2016 pode ser verificada no livro “Educação Infantil em Betim (1958-2016), que é um dos nossos produtos desta pesquisa de mestrado (SILVA, O., 2016). Registro os meus agradecimentos à professora Mônica Correia Baptista pelas sugestões de aprofundar a escrita deste tema.

10 Essa informação foi levantada durante a consulta às legislações municipais de Betim no site da

câmara municipal e também é destacada no documento Betim (2006).

Em relação às creches, assim como foi o movimento das primeiras instituições brasileiras, as creches em Betim surgem com o processo de industrialização e com a proposta de atendimento das crianças pobres filhas dos trabalhadores e das trabalhadoras. São as creches que demarcam o processo de assistência à infância no Brasil com a criação do Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro e com a Creche da Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado (RJ), em 1899; e em Betim, em tempos mais tardios, com a criação da Associação de Proteção à Maternidade, Infância e Velhice (APROMIV), em 1971.

Uma ação que se destacou durante a década de 1960 foi a filantropia das primeiras-damas municipais. Dona Mariquinha, então casada com Álvaro de Sales Barbosa, figura pública que foi vice-prefeito e também prefeito municipal, era uma dessas primeiras-damas de reconhecimento na prestação de serviços de caridade em Betim. Em 1964, ela fundou a Ação Social Santa Edwiges – instituição que realizou diversas parcerias para a captação de recursos, inclusive com a LBA. A instituição fundada por Mariquinha atuava na oferta de atendimento médico, exames de laboratório, dentista e distribuição de alimentos, tudo isso com o foco nas famílias carentes.

Em 1971 foi criada a Associação de Proteção à Maternidade, à Infância e a Velhice, mais conhecida na cidade por sua sigla APROMIV. A sua criação aconteceu porque era de costume no município a primeira-dama atuar em parceria com LBA na promoção da ação social. A Sr.ª Maria de Lourdes Lara passou a ocupar o status de primeira–dama, em 1971, com o início do mandato de seu marido João Lara, que havia sido eleito prefeito. Porém, como o prefeito anterior, que era marido de Dona Mariquinha, tinha interesse em se candidatar novamente, Mariquinha continuou com o seu trabalho à frente da Ação Social Santa Edwiges. Então, para que a nova primeira-dama conseguisse captar recursos de doações “[...] federais e estaduais, a alternativa encontrada foi a de constituir outra entidade não governamental, a exemplo da que existia no município, mas que na prática era ‘da D. Mariquinha’.” (MIRANDA, 2008, p. 78). A APROMIV tinha como objetivo atender a três tipos de públicos: as gestantes por meio de amparo em questões sociais e materiais; a infância por intermédio de creches, lactários ou similares; e a velhice com asilos e outras ações (MIRANDA, 2008). O surgimento da APROMIV ocorre

após a chegada da Refinaria Gabriel Passos (REGAP)12, em 1968, também em período próximo ao da construção do Distrito Industrial Paulo Camilo e da chegada da montadora automobilística FIAT Automóveis durante a década de 1970. Foi a APROMIV que pela primeira vez apoiou a oferta dos serviços de atendimento à infância no município de Betim. Desta forma, a instituição demarca na cidade o início da construção das políticas voltadas para o atendimento da infância e é partir do surgimento dela que se percebem movimentações dos poderes executivo e legislativo no desenvolvimento de legislações/ações voltadas para as instituições populares (SILVA, O., 2016).

Alguns meses após a sua criação, a APROMIV foi considerada como instituição de utilidade pública municipal, consequentemente, ela passou a receber recursos públicos da cidade, em 1972, conforme previsto na Lei nº 988/1971 que trata de assuntos sobre a concessão de subvenções sociais, econômicas e outros encaminhamentos (BETIM, 1971). De acordo com Miranda (2008), a APROMIV não tinha estrutura própria até o ano de 1981, e os funcionários que trabalhavam nela eram cedidos pela Prefeitura Municipal de Betim. Nas creches apoiadas por esta organização havia também alguns trabalhadores voluntários. Todavia, a instituição da primeira–dama, mesmo promovendo mudanças em relação ao atendimento à infância, não se desvinculava da política eleitoreira com fortes marcas na cidade, pois, o cidadão para ser atendido pelos serviços da APROMIV precisava preencher uma ficha de inscrição informando, inclusive, o título de eleitor (MIRANDA, 2008). A parceria entre a Prefeitura Municipal de Betim e APROMIV serviu de modelo para as outras parcerias que o município realizou posteriormente com diversas instituições filantrópicas e associações comunitárias, que surgiram na cidade principalmente durante a década de 1980.

No documento Betim (2008a) é destacado que durante a década de 1980 o número de instituições de atendimento à infância teve um grande aumento, passando de apenas uma instituição filantrópica e quatro particulares, no final da década de 1970, para 25 instituições comunitárias e filantrópicas no fim da década seguinte. O Aumento destas creches continuou a favorecer a região central da cidade, pois cerca de 40% do atendimento acontecia na regional Centro e era onde

estavam lotados 70% dos profissionais cedidos pela Secretaria Municipal de Educação às instituições filantrópicas (BETIM, 1996).

Apesar da APROMIV demarcar o momento de atendimento à infância popular em Betim, a relação dela com as creches comunitárias e filantrópicas se dava por meio de repasses descontínuos de recursos financeiros e materiais. Não existia uma articulação entre a APROMIV e as creches, na perspectiva de projetar uma política pública de atendimento às crianças da cidade. Mesmo Betim sendo uma cidade altamente industrializada desde a década 1970, no começo dos anos 1990 é observado que o meio empresarial ainda não realizava nenhuma ação direta ou indireta voltada para a promoção da oferta do atendimento à infância (BETIM, 1996).

Em 1991, registra-se uma primeira ação direta da prefeitura municipal direcionada para a Educação Infantil, quando foi construída a primeira instituição de atendimento à infância de forma direta pelo setor público, sendo nomeada de Centro Infantil Emílio Mafia Gomes pela Lei nº 2.136, de 8 de outubro de 1991 (BETIM, 1991). Embora tenha sido relevante a construção desta instituição, essa ação isolada por si só não caracterizou o compromisso do Poder Público em assumir a gestão dos serviços voltados para o atendimento das crianças pequenas da cidade.

O primeiro divisor político para o atendimento à primeira infância de Betim aconteceu durante a década de 1980, com a articulação e participação das instituições comunitárias no Movimento de Luta Pró-Creches (MLPC), movimento social que se originou nas periferias da divisa entre Belo Horizonte e Contagem no ano 1979. Pondera-se que a APROMIV já pautava a oferta de creches em Betim em 1971 (MIRANDA, 2008), e o MLPC surge posteriormente como instrumento de mobilização popular liderado por mulheres pioneiras das creches comunitárias na região da divisa, e que passaram a lutar pelo direito das crianças ao acesso à educação e assistência com qualidade.13

Tratava-se de iniciativas de mulheres habitando bairros pobres, que a princípio contavam apenas com o apoio dos vizinhos, das mães das

13 Filgueiras (1994) diz que em um período de 12 anos o MLPC sofreu mudanças em sua concepção,

passando da defesa da manutenção das creches comunitárias para a luta política pelo direito à Educação Infantil.

crianças e, às vezes, do padre da paróquia mais próxima. As primeiras creches foram o embrião do que mais tarde se tornaria o Movimento de luta por Creches. Elas começaram a se reunir para trocar informações e experiências e buscar soluções para as suas dificuldades (FILGUEIRAS, 1994, p. 19).

Em Betim, as primeiras creches que se filiaram ao MLPC foram a Creche Comunitária Sorriso de Uma Criança, em 1983, e a Creche Comunitária Pequeno Príncipe, em 1986, ambas localizadas na Regional Imbiruçu. No ano de 1992, o número de instituições betinenses que aderiram ao movimento chegava a dez (LARA, 2004). O surgimento do MLPC em Belo Horizonte e em Betim ocorreu no fervor do momento em que o povo brasileiro amargurava com a descentralização arquitetada pelo Estado autoritário que empurrava as políticas sociais para a gestão da sociedade civil e das comunidades, e também, em meio ao processo de mobilização dos movimentos sociais na busca pelo fim da ditadura militar e pela construção de um Estado de bem-estar social que garantisse os direitos sociais para a população. O MLPC contribui para demarcar nacionalmente o reconhecimento jurídico do direito da criança à Educação Infantil conquistado em 1988 na Constituição Federal. Em Betim, o MLPC representou a demarcação da reivindicação na cidade do direito de uma Educação Infantil de qualidade para as crianças betinenses.