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5. A PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL A PARTIR

5.2 A gestão da instituição

5.2.2 A eleição do diretor

Num regime político representativo, como é o caso do Brasil, na maioria das vezes a participação da população se restringe ao direito de voto. Outras possibilidades de participação da população são os conselhos de políticas públicas tais como as conferências educacionais, conselho municipal de educação e conselhos locais, o que nem sempre contam com a participação da grande massa e sim de delegados ou conselheiros escolhidos para representar o restante do povo. Na Educação Infantil de Betim o direito de escolher o dirigente escolar é um

processo novo, como já mencionado no Capítulo 3, acontecendo desde 2013. No CIM RC foi apenas em 2015 que a comunidade teve a experiência de participar do pleito democrático pela primeira vez. Antes de acontecer o processo eleitoral em toda Rede Municipal de Educação, que foi em dezembro de 2015, no mês de outubro, ocorreu uma eleição interna entre os funcionários para escolher uma diretora interina visto que a antiga diretora havia passado em um concurso em outra cidade e solicitou exoneração do cargo.

Teve, teve até ata, teve uma eleição interna, votaram atendentes, professores e administrativos, as Qualitecs não. Aí foi eu e a Anjos, desses, vinte nove votaram em mim e dezesseis nela. Teve uma mini eleição dentro da escola. A SEMED também veio para estar fiscalizando, teve uma mini eleição mesmo (ROCHA, diretor/mãe, CIM RC, 2015, Ent.).

Nessa eleição interna, como pôde ser observado na fala de Rocha, os profissionais da Qualitec não puderam participar. Assim, um questionamento que faço é: até que ponto um processo pode ser considerado democrático se entre os próprios pares não é garantido a todos o direito de se manifestar? Durante o processo de escolha democrática de dezembro, em toda rede municipal, tanto nos CIMs como nas Escolas Municipais as funcionárias da Qualitec não tiveram o direito de participar da escolha dos gestores escolares. Quando a Comissão Organizadora desse processo na rede, que foi formada por representantes da SEMED e do Sind-UTE, foi questionada por mim sobre quais seriam os motivos de tal impedimento, alegaram que muitas funcionárias da Qualitec são indicadas por vereadores, assim, para não comprometerem o processo optaram por deixá-las de fora. Essas profissionais que já possuem péssimas condições laborais, que dependem de “jeitinho” de vereador para trabalhar e, que quando tentam se organizar em quanto classe são demitidas, nem mesmo são reconhecidas como sujeitos da própria comunidade a que prestam serviços? De fato, essa posição precisa ser revista pelos gestores da SEMED e pelo Sind-UTE que tem o papel de representar pelo menos politicamente “todos” os trabalhadores(as) em educação. Para os profissionais tanto do CIM RC como do CIM AFS escolher o dirigente da instituição é um direito conquistado e que deve ser exercido no contraponto às práticas clientelistas que historicamente marcaram a Educação Infantil de Betim: a

indicação de vereadores para cargos públicos, o controle destas instituições por vereadores visto o interesse eleitoral mais amplo da cidade93.

É porque a direção ela foi conquistada, foi conquistado o direito de voto para a direção, então, de repente fala assim, se não tiver ninguém a prefeitura vai indicar e eu imaginei alguém, algum cabo eleitoral [...]. Então, como assim, se eu posso concorrer, se meu colega pode concorrer, se a gente brigou para ter o direito à escolha, que a comunidade escolhesse um de nós, porque eu vou abrir mão do meu direito para vir uma pessoa de fora que não sabe da luta, não sabe da história do CIM, vai vim de onde, entendeu? (GUIMARÃES, professora/mãe, CIM AFS, 2015, Ent.).

Uai é um ganho muito grande para a educação porque mil e uma vezes sendo escolhido pelo grupo, pela comunidade do que uma indicação igual estava propondo ser uma indicação de vereadores. Eu acho que a democratização seria mesmo essa consulta popular, uma eleição mesmo, muito mais democrático. É um direito, né, que a gente está tendo (ROCHA, diretora/mãe, CIM RC, 2015, Ent.).

No CIM AFS onde a relação entre o grupo de profissionais é marcada por conflitos, observa-se que parte dos trabalhadores se dividiram em relação ao processo democrático da escolha do dirigente, pois, estava previsto no Decreto 39.236/2015 a constituição de uma comissão organizadora formada paritariamente por familiares das crianças e por profissionais, no entanto, somente as mães das crianças se disponibilizaram a participar da Comissão Organizadora do Processo de Escolha Democrática neste CIM.

Eu acho que as famílias estão mais interessadas em que o processo aconteça do que a maioria dos profissionais, né, aqui dentro da escola. Eu acho que os pais estão mais com mais interesse, assim, estão chegando com perguntas, isso foi demonstrado na hora de formar a comissão, né, pois os funcionários não se dispuseram a isso e a comissão foi toda tirada dos pais. Eu acho que mesmo com algumas dificuldades entre eles de às vezes disponibilizar o tempo para isso, mas foi conseguido. Então eu acho que eles estão com mais interesse nessa parte do que o grupo. [...] Eu acho que foi por causa da primeira consulta que teve duas chapas e foi meio que um processo de disputa, eu acho que isso desgastou um pouco as pessoas que participaram. E com esse desgaste elas vão passando para os outros que aí não tem esse interesse de participar. Eu acho que foi mais pelo primeiro processo mesmo, foi uma experiência que elas passaram por isso e para elas não foram uma coisa boa. Então acho que o não interesse delas de participar vêm daí, eu acredito (NUNES, diretora, CIM AFS, 2015, Ent.).

93 Ressalta-se que em Betim a indicação da prefeitura muitas vezes significa a indicação de

vereadores, visto a negociata de cargos públicos que ocorre nos bastidores entre o poder executivo e legislativo.

A partir da fala de Nunes que estava na direção do CIM AFS e não era candidata a reeleição, e da observação da instituição, verifica-se que uma parte do grupo de profissionais que no processo de 2013 estava envolvida tanto na Comissão Organizadora como na chapa de oposição a que foi eleita, sentiram-se desgastados com a disputa eleitoral. O desgaste provocado pelos conflitos do último processo, assim como a dificuldade da chapa não eleita em aceitar o resultado do processo democrático, fez com que esse profissionais banalizassem a situação e disseminassem entre os demais profissionais o desinteresse de participarem da organização do pleito eleitoral. A Comissão Organizadora foi toda composta por mães das crianças do CIM e uma das mães foi a presidenta desta comissão. Neste CIM, houve apenas uma candidata em 2015 e que foi eleita com a maioria dos votos da comunidade.

No CIM RC, diferente da outra instituição, os profissionais participaram da organização do processo democrático.

A Comissão foi tirada dentro do conselho mesmo, quem está mais por dentro mesmo são eles do conselho escolar. [...] A presidente da comissão é uma funcionária, ela que está mais por dentro mesmo, ela é que vai nas reuniões, ela que passa para o grupo, creio que é a que está mais informada mesmo. Mas ela é esclarecida pelo que parece (ROCHA, diretora, CIM RC, 2015, Ent.)

Apesar de a Comissão Organizadora ser escolhida a partir dos membros do conselho escolar, onde também os pais participam, percebe-se que os profissionais estavam mais a frente da condução do pleito eleitoral. Oliveira, que é considerada uma das mães mais participativas do CIM RC e também faz parte do conselho escolar, alegou durante o grupo de discussão realizado na Câmara dos Vereadores que suas dúvidas não foram esclarecidas e que algumas informações foram passadas para os pais de forma incorreta.

A dúvida que eu tive, eu tirei. Nós tivemos uma reunião lá creche onde falaram que agora vai ter eleição porque político não pode mais indicar diretores. Ela acabou de dizer, se não ter os vinte e cinco ou trinta por cento, quem indica? Um político, querendo ou não o político sempre estará de ponte e sempre indicará, eu quero é fulano e pronto. E na creche na reunião eu fiquei calada porque até então eu não tinha certeza. Guimarães, você não estava na reunião? Pains? Foi para apresentar a candidata a direção lá da creche, foi falado que agora o CIM que tem eleição é porque político e nem vereador não pode indicar nada à creche, vereador não pode não. Aí hoje ela me deu a certeza, então na próxima reunião vou dizer assim: você pode ratificar tal coisa que você passou

para os pais que estavam na reunião? [...] (OLIVEIRA, liderança comunitária/mãe, CIM RC, 2015, GD).

Essa mãe, que também é liderança na comunidade, chama atenção para a necessidade das famílias e profissionais estarem informadas corretamente sobre os reais motivos de se realizar o processo democrático, as conseqüências do CIM que não tiver candidatos e sobre os casos em que não for alcançado o quórum mínimo de participação da comunidade: são os políticos da cidade que indicarão os gestores das instituições. No CIM RC em 2015, houve apenas uma candidata ao cargo de diretor e a mesma foi eleita com a maioria dos votos da comunidade escolar.