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A Educação não formal no contexto social brasileiro

No documento O papel da música na educação infantil. (páginas 45-50)

CAPÍTULO I – FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PESQUISA

1.1 A EDUCAÇÃO NÃO FORMAL

1.1.1 A Educação não formal no contexto social brasileiro

A educação se desenvolve em espaços diferenciados, os quais oferecem aprendizagens que podem ocorrer na escola, na família, na comunidade, nas relações que os indivíduos constroem ao longo da vida, nas informações que recebe da mídia, nas redes sociais, etc. No caso da educação não formal, ela possui características próprias, definida por Gohn como:

[...] um processo sociopolítico, cultural e pedagógico de formação para a cidadania, entendendo o político como a formação do indivíduo para interagir com o outro em sociedade. Ela designa um conjunto de práticas socioculturais de aprendizagem e produção de saberes, que envolve organizações/instituições, atividades, meios e formas variadas, assim como uma multiplicidade de programas e projetos sociais. (GOHN, 2010, p.33)

A educação não formal tem como objetivo a educação para a cidadania, a qual inclui educação para a justiça social; para os direitos (humano, sociais, políticos, culturais, etc.); educação para a liberdade, igualdade, diversidade cultural, democracia e contra qualquer tipo de discriminação. É claro que em diferentes épocas, os contextos nos quais ela foi construída apresentaram variáveis, ou seja, mesmo presente na história brasileira ela não era vista como se apresenta hoje, como uma prática com intencionalidade nas ações desenvolvidas (GOHN, 2010).

Apesar da educação não formal ter começado a se evidenciar no século XX, historicamente sua presença já ocorria no Brasil desde a chegada dos portugueses, quando estes precisaram se comunicar com os índios para conquistar a confiança e os bens descobertos. Essa “necessidade de comunicação” fez com que Portugal trouxesse os jesuítas para catequizar os índios e, assim, pudesse se apossar das riquezas do nosso território.

Dessa forma, os jesuítas fizeram o seu papel: introduziram a língua portuguesa como elemento imprescindível para que Portugal tivesse acesso às riquezas brasileiras. Os jesuítas permaneceram no Brasil, no período 1549 a 1759 [...] (FRANÇA, 2008, p.75)

Observa-se então, que a educação não formal já ocorria desde a chegada dos portugueses e se perpetuou ao longo da história em diferentes espaços, inclusive naquela realizada pelo preceptor, ou seja, a pessoa que deveria acompanhar e orientar uma criança ou um adolescente no âmbito das famílias mais abastadas21. Este é um fato significante, pois a educação não formal se apresenta como uma possibilidade para toda a sociedade, não sendo destinada, ao contrário do que muitos pensam, somente aos mais pobres.

Nas últimas décadas do século XX, tornou-se um campo que está sendo construído acompanhando as transformações que ocorreram decorrentes do processo de globalização e das demandas que emergiram a partir de uma nova realidade social. Segundo Gohn:

A educação não formal é um campo que vem se consolidando desde as últimas décadas do século XX e a explicação para este fato advém das mudanças e transformações ocorridas na sociedade neste período, especialmente com a globalização. (GOHN, 2010, p.34)

Vários aspectos da vida em sociedade foram se alterando, dentre eles, as questões relacionadas ao mundo do trabalho, aos processos educativos, ao aparecimento de novas

21 Mário Alighiero Manacorda em seu livro “História da Educação – da antiguidade aos nossos dias” (2010), traz

tecnologias, aos movimentos sociais 22e luta por direitos, as relações familiares, além da criação de programas e projetos sociais direcionados para diferentes segmentos da sociedade etc.

As dimensões do processo educativo e as emergências que se criaram a partir dessas mudanças permitem redimensionar os papéis atribuídos aos (novos) sujeitos, os quais buscavam por novas formas de aprendizagens e conquistas sociais. A qualidade do ensino passa a representar um dos grandes problemas sociais, não só pelas questões políticas que a permeiam, mas também pelos enfoques sociais que passa a ter.

Foi somente a partir dos anos de 1980 que a educação não formal passou a assumir um papel mais relevante no processo educativo, pois antes disso, as atenções estavam concentradas na educação formal, desenvolvida nos aparelhos institucionalizados (GOHN, 2005).

Enquanto a escola formal apresenta problemas de diferentes ordens, a educação não formal passa, a partir dos anos de 1990, a ser mais valorizada, pois se apresenta como um espaço de aprendizagem em grupos, nos quais os valores culturais são reconhecidos como necessários para a formação de cidadãos críticos, autônomos e conscientes do mundo que os cerca. Gohn (2005, p.92) fala sobre essas mudanças:

O grande destaque que a educação não-formal passou a ter nos anos 90 decorre das mudanças na economia, na sociedade e no mundo do trabalho. Passou-se a valorizar os processos de aprendizagem em grupos e a dar-se grande importância aos valores culturais que articulam as ações dos indivíduos. Passou-se ainda a falar de uma nova cultura organizacional que, em geral, exige a aprendizagem de habilidades extra-escolares.

É nesse contexto que a educação não formal passa a se articular com a educação formal23, sem que, necessariamente, estejam vinculadas, já que o processo de aprendizagem não se restringe aos espaços formais de ensino. Jaume Trilla (1996) afirma que o termo educação não formal passa a ser relacionado ao campo pedagógico, ao mesmo tempo em que a educação formal começa a receber uma série de críticas, já que não consegue responder às demandas sociais que lhe são impostas. Libâneo (2001, p.20) aponta uma ação pedagógica

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No livro “Teorias dos Movimentos Sociais – Paradigmas clássicos e contemporâneos” (2008b), Maria da Glória Gohn apresenta um mapeamento dos paradigmas e teorias sobre os movimentos sociais, destacando conceitos e categorias utilizadas e localizando suas matrizes e referenciais.

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Segundo Gohn (2010, p.19), a educação formal requer tempo, local específico, pessoal especializado. Requer a normatização das formas de organização de vários tipos (inclusive curricular), sistematização sequencial das atividades, tempos de progressão, disciplinamento, regulamentos e leis, órgãos superiores etc.

múltipla na sociedade. O pedagógico perpassa toda a sociedade, extrapolando o âmbito escolar formal, abrangendo esferas mais amplas da educação informal24 e não formal.

Inicialmente, a educação não formal se apresentava como um campo de práticas que não eram consideradas como educação por não obedecerem às regras e normas da educação formal, mas que contribuíam na construção de uma nova forma de se compreender o processo de ensino-aprendizagem.

No decorrer da década de 1990, segundo Gohn (2005), a educação não formal ampliou seu campo de atuação, não se restringindo mais às mudanças provocadas pelo processo de globalização e pelos apelos da mídia. Organismos internacionais como a ONU - Organização das Nações Unidas e a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) colaboraram nesse sentido.

Com esse novo olhar, outros avanços se fizeram presentes nas concepções que permearam os processos de formação dos indivíduos, como o ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/90), decorrente da Constituição Federal25 de 1988. Com a promulgação do ECA crianças e adolescente são reconhecidos como portadores de direitos que devem ser garantidos por todos: família, sociedade e Estado.

A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN (Lei nº 9.394/96), promulgada em 20 de dezembro de 1996, a Educação não se restringe mais aos espaços formais de ensino, sendo considerados como espaços formativos e responsáveis pela produção de saberes a casa, o trabalho, os espaços de lazer e cultura etc. Sobre isso, Libâneo afirma:

De fato, vem se acentuando o poder pedagógico de vários agentes educativos formais e não formais. Ocorrem ações pedagógicas não apenas na família, na escola, mas também nos meios de comunicação, nos movimentos sociais e outros grupos humanos organizados, em instituições não escolares. Há intervenção pedagógica na televisão, no rádio, nos jornais, nas revistas, nos quadrinhos, na produção de material informativo, tais como livros didáticos e paradidáticos, enciclopédias, guias de turismo, mapas, vídeos e, também, na criação e elaboração de jogos, brinquedos. (LIBÂNEO, 2001, p.19)

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A educação informal, para Gohn (2010, p.19-20), não é organizada, os conhecimentos não são sistematizados e são repassados a partir das práticas e experiências anteriores, usualmente é o passado orientando o presente.

25 O artigo 227 da Constituição Federal prioriza o atendimento à criança e ao adolescente: "É dever da família,

da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."

A fim de suprir as carências e lacunas deixadas pelas instituições formais, ampliam- se os espaços destinados à Educação, buscando atender às exigências do mercado, além de oferecer às crianças e jovens novas oportunidades de atendimento nas áreas social e cultural.

É importante destacar o espaço conquistado pela educação não formal dentro do processo educacional brasileiro. Ainda que haja problemas, ela já é reconhecida como importante na formação dos indivíduos, principalmente, por ser aquela “que se aprende ’no mundo da vida’, via processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivas cotidianas” (GOHN, 2010, p.93). Outro fator importante que merece ser ressaltado é o fato de a educação não formal ter um espaço próprio e não ter a pretensão de ocupar o lugar da educação formal. Nesse sentido Gohn explica (2007, p.14) que:

Ela não deve ser vista, em hipótese alguma, como um tipo de proposta contra ou alternativa à educação formal, escolar. Tampouco deve ser definida pelo que não é, mas sim pelo que é – um espaço concreto de formação com a aprendizagem de saberes para a vida em coletividade.

Como já visto, a educação não formal está presente na história do Brasil desde os seus primórdios. Ela se configurou como um espaço de aprendizagens e saberes, nos quais programas, projetos sociais e políticas públicas buscam formar indivíduos para a vida em sociedade por meio da formação para a cidadania e emancipação social. Conforme ressalta Gohn (2010, p.92), “[...] a educação não formal é uma ferramenta importante no processo de formação e construção da cidadania das pessoas, em qualquer nível social ou escolaridade”.

Quando direcionada para comunidades mais carentes, consideradas de vulnerabilidade social e/ou econômica, atendendo crianças em situação de risco, observa-se que o sentido da educação não formal está na inclusão social, ou seja, trazer esses indivíduos para uma esfera de direitos e que os tornem autônomos e emancipados.

Tantas são as questões que envolvem a educação não formal, que são necessárias pesquisas que façam uma reflexão crítica dessa realidade, uma vez que permitem maior clareza quanto à execução dessas atividades, além de discussões que possam contribuir para mudanças na forma como são implementadas.

No documento O papel da música na educação infantil. (páginas 45-50)