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Compreender uma doença crônica é um fenômeno complexo, tendo em vista os diversos aspectos fisiopatológicos, psicológicos e sociais envolvidos no contexto do indivíduo, sendo a integração dos diferentes saberes, um dos fatores necessários para a concretização desse cuidado.O paciente deve ser assistido integralmente já que a proposta consiste em cuidar do indivíduo em todos os aspectos: físico, mental e social, o que requer complementação de saberes e partilha de responsabilidades, uma vez que demandas diferenciadas se resolvem em conjunto (Sebastiani & Maia, 2005).

Uma equipe de saúde multidisciplinar é começo para uma visão integral do paciente/indivíduo, pois exige a compreensão do fenômeno, baseada na contribuição e compartilhamento dos saberes das diferentes áreas profissionais.A presença de equipes multidisciplinares que envolvam diferentes profissionais torna-se uma necessidade para poder acolher, de diferentes ângulos, a complexidade das demandas (Moré, et al., 2011).

Mendes & Oliveira (2011) relatam que o objetivo de uma intervenção psicológica em fibrose cística junto a um programa multiprofissional é acompanhar o desenvolvimento psicológico do paciente-família em sua melhor forma possível na constância de uma doença crônica de difícil tratamento. Porém, sendo esta uma doença crônica, são diversos os desafios que as equipes multiprofissionais encontram no desenvolvimento de um trabalho que vise a integralidade, entre eles, a comunicação presente na relação equipe-paciente- familiares.

A comunicação de más notícias é um assunto recorrente na literatura na área de saúde dada a dificuldade das equipes em lidar com questões relacionadas à morte e finitude do paciente. A comunicação de más notícias é um aspecto que exige responsabilidade, conhecimento e habilidade para lidar com o paciente e seus familiares. É um conceito que envolve uma conduta considerada emocionalmente desgastante pelos profissionais envolvidos nessa tarefa, pois a situação confronta

com limitações entre doença-cura (Guerra et al., 2011) mobiliza nos profissionais os mais variados sentimentos, como ansiedade, culpa, raiva, fracasso, impotência, entre outros (Ribeiro & Martins, 2011; Guerra et al., 2011; Mello & Silva, 2012; Quintana, 2002; Hoffmann, 1993).

A carga emocional decorrente das vivencias profissionais que envolvam temas como morte e finitude, acabam interferindo na estabilidade da equipe (Kóvaks, 2011; Pitta, 1991; Dejours et al., 1994) e por sua vez, refletindo nos atendimentos de saúde. Nesse sentido, questões que envolvam a participação tanto da equipe de saúde quanto do paciente, demandam intervenções em que seja facilitada a comunicação entre equipe de saúde-paciente-familiar (Nieweglowski & Moré, 2008).

Em estudo sobre doença crônica, Oliveira e Gomes (2004), referem que o sucesso do tratamento é obtido através de uma boa adesão sendo esta uma função da qualidade comunicativa relacional entre médico/equipe – paciente - família. Nesse sentido, uma atuação que promova e facilite a comunicação entre criança-família-equipe, destaca- se, também,como um dos papeis do psicólogo na equipe de saúde em fibrose cística.

Além de acompanhar o desenvolvimento psicológico e as repercussões da comunicação do diagnóstico,Mendes & Oliveira (2011), ainda apontam intervenções junto a esses pacientes, tais como na relação mãe-pai-filho,no processo de separação-individuação e nas fantasias sobre a doença.

3.7 APOIO SOCIAL, POLÍTICAS PÚBLICAS E FIBROSE CÍSTICA Algumas denominações, como redes sociais, políticas, organizacionais, de serviços entre outras, independente das concepções que lhes são atribuídas, estão sempre associadas à imagem de teia, de conexões, de fios que se entrelaçam e se tecem. O campo da saúde tem explorado o uso desse conceito nas políticas públicas de saúde, ainda que, como metáfora, para traduzir as relações entre os indivíduos e demonstrar a importância de apoio por meio dos vínculos e das redes socais, para ajudar no enfrentamento das adversidades, promover ou recuperar a saúde.

Entende-se por rede de apoio um complexo sistema de ações, relações e intervenções, que ocorre tanto num plano microssocial, o qual comporta a família, amigos, grupos sociais mais próximos, quanto num plano macrossocial, envolvendo as políticas públicas em geral (saúde,

educação, cultura, esporte, lazer, habitação e trabalho), que são ou deveriam ser efetivadas por instituições governamentais e não- governamentais, órgãos especiais e também por pessoas nas interações do convívio cotidiano (Germano & Colaço, 2012).

Atualmente, a triagem neonatal é uma ação proposta pela saúde pública e de pediatria preventiva, ligada à genética, mais conhecida e utilizada em todo o mundo (Leão & Aguiar, 2008) e, também no Brasil, é uma iniciativa do Sistema Único de Saúde (SUS) na área de genética. Na maioria dos países, falta uma legislação específica e critérios para a orientação sobre como deve ser feita a Triagem Neonatal para fibrose cística. Os critérios para a implantação de um programa de triagem neonatal, os quais são preenchidos pela fibrose cística, foram estabelecidos pela OMS. No Brasil, a Triagem Neonatal para fibrose cística foi implantada com a publicação no Diário Oficial da União, em 07/06/2001, da portaria 822, que rege as normas para realização da Triagem Neonatal no país (Santos et al., 2005).

Nas últimas décadas perceberam-se avanços nas redes de políticas públicas no Brasil, em que a ampliação e garantia de direitos tem sido um continuum, cujo marco inicial foi a implementação da Constituição Federal em 1988, que requereu reestruturação na legislação brasileira, como a implementação do SUS. Ficou estabelecido como proposição básica o dever do Estado em assegurar a saúde visando à redução de riscos de doenças e outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação (Brasil, 1991). Ainda que a legislação apresente avanço no âmbito das políticas na rede públicas de saúde no Brasil, a promoção da saúde é tratada como um conceito que envolve ―reformulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos‖ (Brasil, Ministério da Saúde, 1990b, Art. 2º, § 1º). Isso significa que mesmo que a saúde seja entendida na perspectiva da atenção integral, as estratégias ainda estão no combate ao risco de doença, e não na promoção do bem-estar e garantia do seu desenvolvimento pleno.

Além do SUS, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Brasil, 1990), também, assegurando atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde (Beiber, 2011).

Em 2001, o Ministério da Saúde lançou a Portaria nº 822, que instituiu, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa Nacional de Triagem Neonatal garantindo, a todos os brasileiros recém-nascidos,

acesso igual aos testes de triagem. Desde, então, todos os estados brasileiros devem contar com, pelo menos, um Serviço de Referência em Triagem Neonatal e, diversos postos de coletas distribuídos por todos os municípios do Estado. Este programa nacional ocupa-se da detecção, confirmação diagnóstica, acompanhamento e tratamento dos casos suspeitos de quatro doenças, entre elas a fibrose cística (Almeida et al., 2006). O estabelecimento de um planejamento adequado dos Serviços de Referência em Triagem Neonatal é realizado pela rede das Secretarias de Saúde dos Estados a fim de facilitar o acesso dos usuários à rede de coleta e a cobertura assistencial.

A rede de saúde pública brasileira oferece a Triagem Neonatal para Fibrose Cística em dezoito Estados brasileiros, ou seja, ainda não é uma realidade em todo o país, situação que deixa parte da população em estado de vulnerabilidade. Questões sociais como esta, em que necessidades e carências confrontam os pacientes e seus familiares, indicam a necessidades de interlocução e articulação com as redes de apoio social para buscar alternativas que garantam a condição de cidadania plena. O efeito protetivo que este apoio social poderia oferecer relaciona-se ao desenvolvimento da capacidade de enfrentamento das adversidades, promovendo processos de resiliência e desenvolvimento adaptativo (Andrade & Vaitsman, 2002).

No Brasil, as associações de apoio aos portadores de fibrose cística surgiram pela necessidade organizacional desses pacientes e seus familiares, atuar em favor dos portadores da doença. A Associação Brasileira de Amparo à Mucoviscidose – ABRAM – foi fundada em 1979, sendo depois seguida por rede de associações regionais e municipais. A ABRAM, atua principalmente, na esfera federal, além de exercer o papel de congregar as associações estaduais (Mota et al., 2008).

Essas redes de associações de apoio desempenham um importante papel na vida dos pacientes e suas famílias, priorizando as informações e comunicação sobre a fibrose cística e. Como força representativa dos associados, elas possibilitaram o surgimento de centros de tratamentos especializados na doença. A função principal das redes de associações é diminuir as dificuldades enfrentadas pelos portadores de fibrose cística, auxiliando na efetivação de políticas públicas garantindo o atendimento dos portadores no que diz respeito as suas necessidades e integral desenvolvimento. É papel das associações valorizar e incentivar a inclusão social dos pacientes de fibrose cística que acabam abandonando suas atividades em virtude da repercussão do tratamento como as

constantes hospitalizações, consultas médicas, indisposições físicas resultantes da doença e do próprio tratamento (Sampaio, 2005).

Foram conquistas da ABRAM, juntamente com as demais associações estaduais e regionais:

 Inclusão dos medicamentos dornase alfa e enzimas digestivas na Portaria de Medicamentos Excepcionais do Ministério da Saúde (Portaria GM/MS 102/1995, Portaria GM/MS 1318/2002, Portaria GM/MS 2577/2006);

 Drogas Órfãs: autorização especial para importação de novas medicações destinadas à fibrose cística, por meio da Resolução RDC N.º 86, de 21 de setembro de 2000, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA;  Implantação do sistema paciente-dia para a fibrose

cística, pela Portaria GM/MS nº 44, de 10 de janeiro de 2001;

 Criação do Dia Nacional de Conscientização e Divulgação de Fibrose Cística (5 de setembro), pela Portaria do Ministério da Saúde nº 1.411, de 29 de agosto de 2001.

 Inclusão da fibrose cística no Teste do Pezinho (Triagem Neonatal), pela Portaria GM/MS n.º 822/GM, de 06 de junho de 2001.

Na luta pelo reconhecimento dos direitos de cidadania as redes permitem a reconfiguração das práticas de integralidade e bem estar ao longo do tratamento. Com isso se quer dizer que todo o suporte ao paciente com fibrose cística está interligado em rede, dessa forma, o olhar da equipe de saúde deve estar ampliado e articulado com as redes da saúde pública e com as redes de apoio social dado o potencial de fortalecer o trabalho em equipe. Todas as relações que o paciente- família estabelece com as outras pessoas, vindas dos diversos sistemas nos quais transitam tal como a família extensiva, amigos, escola, associações, entre outros, podem fornecer apoio para a manutenção do tratamento e da vida.

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