• Nenhum resultado encontrado

A ESCOLA COMO ORGANIZAÇÃO

No documento SOLANGE - Dissertação final (páginas 48-51)

CAPÍTULO III GESTÃO ESCOLAR: CONCEPÇÕES E PRÁTICAS

1. A ESCOLA COMO ORGANIZAÇÃO

O estudo da escola como instituição tem sua tradição e importância, entretanto, preocupar-se com a noção de escola como organização participativa, permite novos olhares e, conseqüentemente, novas ações. A idéia de organização pode ser associada a um conjunto de obrigações funcionais e hierárquicas, orientado para um determinado objetivo. É interessante destacar a clássica distinção entre dois aspectos da organização, aspectos estes que permeiam todas as construções teóricas da administração: o formal e o informal.

A organização formal é constituída por um grupo que é estabelecido deliberadamente a partir de um objetivo. Assim sendo, uma organização formal pode ser caracterizada especialmente pelas regras, normas e estrutura hierárquica que definem as relações entre as pessoas. A organização formal, orientada para atingir determinados objetivos pré-estabelecidos, gera necessariamente um tipo de relacionamento entre as pessoas, considerado formal, que permite reduzir a espontaneidade e aumenta a previsibilidade do comportamento. As organizações que enfatizam o seu aspecto formal são também consideradas organizações burocráticas.

A noção de organização informal, por sua vez, está relacionada às configurações que emergem espontânea e naturalmente entre as pessoas que ocupam posições na organização formal. Nesses termos, pode-se afirmar que a organização informal é aquela que se constrói através de laços de amizade ou de antagonismo, enfim, de interações entre as pessoas no ambiente de trabalho.

É relevante pontuar que, pelas lacunas em sua formação, o educador tem desprezado esses aspectos informais, que muitas vezes não sabe sequer identificá-los ou não dispõe de elementos teóricos para lidar com eles. Muitos dos conflitos existentes nas práticas cotidianas da educação escolar têm ultrapassado os aspectos formais, portanto, é preciso se atentar para essa questão. Pensando-se na escola, é possível distinguir com certa facilidade estes dois aspectos da organização. O aspecto formal está relacionado às normas, ao regimento, aos estatutos que dispõem sobre a estrutura burocrática da escola. O aspecto informal diz respeito aos diferentes grupos que são construídos por afinidades relacionadas ao trabalho ou por laços de amizade. Vale ressaltar que as relações espontâneas tecidas no interior das organizações formais fornecem outra leitura da organização, já que a partir dela pode-se distinguir líderes, regras e normas não escritas e que, muitas vezes, são tão ou mais fortes do que aquelas prescritas.

No interior desse debate é fundamental observar que, atualmente, estudos têm revigorado o conceito de organização, quando a referência é a escola. A reflexão de Licínio C. Lima (1992) é uma importante contribuição nesse sentido. O autor ressalta a idéia de que, se por um lado, fazer referência à escola como organização é relativamente comum na literatura educacional, configurando-se praticamente como um consenso, por outro, pode-se afirmar que a imagem organizacional da escola é pouco estudada. Ao discutir a questão, o autor destaca especialmente os modelos racional e anárquico de organização aplicados ao estudo da escola. O modelo racional prioriza o consenso e a clareza dos objetivos organizacionais, propondo a existência de processos e de tecnologias transparentes. Esse modelo está centrado na orientação para a tarefa e na importância das estruturas organizacionais. Contrariamente ao modelo racional, o anárquico distingue três características gerais da organização: os objetivos são inconsistentes e definidos de forma insuficiente; os processos e

tecnologias não são claros e são pouco compreendidos pelos membros da organização; a participação é fluida. Após suas análises sobre a escola em Portugal, Lima indaga:

A ordem burocrática normativamente consagrada, decretada e imposta, resultaria no plano da acção organizacional numa estreita conexão entre diferentes elementos, num modo de funcionamento conjuntivo e em conformidade com o plano das orientações? Poderia admitir-se, mesmo ainda somente no plano teórico, uma reprodução normativa perfeita, e sempre perfeita, organizacionalmente localizada, uma acção organizacional totalmente determinada pelo plano das orientações e da imposição normativas, espécie de imagem refletida sem distorções assinaláveis? Seria admissível considerar a acção organizacional a nível escolar como apenas, ou sobretudo, uma variável dependente do plano das orientações, reduzindo este às orientações normativas extraorganizacionalmente produzidas? (LIMA, 1992, p.476).

As indagações de Lima extrapolam a realidade local – de Portugal – e podem ajudar na compreensão da questão voltada à gestão nas escolas brasileiras. Ao considerar as reflexões do autor, surgem indagações: pode-se aceitar como natural a lógica que afirma que as políticas educacionais são efetivadas, na escola, exatamente como são prescritas? É possível e real considerar que a legislação educacional é aplicada nas escolas exatamente como é prevista? Afinal, a escola é apenas local de reprodução de normas ou também as recria, produzindo leis próprias, que não são escritas, mas que são obedecidas? Nesse sentido, é necessário desconfiar da lógica que tem permeado o pensamento dos educadores e educadoras. É preciso enxergar o cotidiano, as regras que ele institui, muitas vezes independente de imposições governamentais.

Entende-se que uma questão tem se apresentado como essencial a de que não existe uma correspondência linear entre o que é estabelecido oficialmente pelas políticas públicas educacionais e sua legislação e a prática escolar. Isto significa que a ordem da instituição-escola não obedece cegamente às regulamentações macropolíticas. Há uma dinâmica menor, micropolítica, que também determina normas e regras. Nesses termos, pensar a escola-organização significa acenar para além de leis, regimentos e outros instrumentos normativos; requer análise de contexto, através

da qual a escola se converterá em objeto de conhecimento dos próprios sujeitos que a fazem. Assim, Lima conclui que

a escola, como organização, não se revelava exclusivamente nem burocrática nem exclusivamente anárquica e a acção organizacional, dos actores, ora se apoiava na ordem das conexões, ora promovia a ordem das desconexões; simultaneamente, e seletivamente, locus de reprodução normativa, a escola era também, e possivelmente não podia deixar de o ser, locus de produção de diferentes tipos de regras ( LIMA, 1992, p. 477 ).

No documento SOLANGE - Dissertação final (páginas 48-51)