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A Escola Polivalente do contexto de modernização da

CAPÍTULO 3 A concepção de modernização na política da cooperação entre o

3.6. EFETIVAÇÃO – A modernização da educação nas políticas

3.6.2. A Escola Polivalente do contexto de modernização da

Um exemplo típico da exportação de modelos e programas educacionais via recomendações, conferências, auxílios e convênios de cooperação, foi a introdução da profissionalização no ensino de primeiro e segundo graus nos anos 1970. Com a reforma educacional de 1971, a preparação e a orientação para o trabalho constituíram- se em elementos centrais dos currículos, focados na profissionalização, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento, fortalecendo o chamado Projeto Nacional.

A expansão do ensino primário e, em especial, do ginasial, vinha ocorrendo desde os anos de 1950, sobretudo nas cidades dos estados ditadas pelas condições locais, sejam industriais, comerciais ou agrícolas. Neste sentido, nos debates da LDB/61 questionava-se o caráter essencialmente propedêutico no ramo secundário, incluindo, aí, o curso ginasial e o curso secundário. Paralelamente, apontava-se o incremento de disciplinas de cultura geral nos cursos técnico industrial, isto é, a secundarização do ensino industrial. A habilitação profissional compulsória do 2º grau tinha o objetivo de inserir um grande contingente de alunos, que saísse do sistema escolar, diretamente no mercado de trabalho, diminuindo a pressão dos jovens das classes médias por vagas no ensino superior

Sobre a égide da Carta de Punta del Este, que fixava as bases para a efetivação da política inspirada pela Aliança para o Progresso, e de uma série de conferências e reuniões de ministros de economia e de educação dos países da América Latina e, ainda, com a redefinição político-econômico-ideológica pela qual passou o Brasil com o governo ditatorial que assume em 1964, estavam lançadas as bases para a implementação do novo modelo educativo da “escola polivalente” que institucionalizou, naquele momento, e ainda antes das alterações na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a exploração vocacional para o 1° ciclo e profissionalizante para o 2° ciclo.

Com a proposta de racionalização de todos os setores da vida social, política e econômica do país, apresentada como ideário da ditadura militar instalada em 1964 sob uma perspectiva de modernização, ocorrem significativas transformações ao nível formal, na estrutura do sistema de ensino e de formação profissional.

O novo discurso, fundamentado na Teoria do Capital Humano, apontava a baixa produtividade e a inadequação da proposta educacional em relação ao momento histórico que o país atravessava, principalmente no que diz respeito às necessidades do mercado de trabalho em função das metas de desenvolvimento econômico acelerado e de desmobilização política. Segundo esta lógica, as maiorias dos cursos eram ‘excessivamente acadêmicos’ e não preparavam para o exercício das funções produtivas, não atendendo às necessidades do mercado de trabalho (...).

Assim, fazia-se necessária uma reestruturação que dotasse o ensino, em todos os níveis, de maior racionalidade, constituindo-se em fator de desenvolvimento individual e social, através da constituição de um sistema educacional que diminuísse a demanda pelo ensino superior e substituísse o caráter acadêmico pela formação profissional já no 2° Grau (Kuenzer, 1991:9).

Nos Acordos assinados entre o MEC e a USAID nesse período, esta última se propunha, segundo Arapiraca (1982:149), a prestar assistência na implementação de sistemas estaduais de ensino secundário destinados a introduzir e estimular o desenvolvimento de Ginásios Polivalentes, e adaptar os currículos tradicionais de ensino secundário brasileiro às atuais necessidades sócio-econômicas do país.

A expressão “escola polivalente” foi assimilada dos conceitos teóricos da

Comprehensive High School estadunidense. Porém, o seu modelo teórico foi

introduzido no Brasil precedido dos conceitos do Ginásio Orientado para o Trabalho (GOT), dos Ginásios Pluricurriculares, do Ginásio Compreensivo e do Centro de Educação Popular, constituindo-se em uma versão da idéia chamada Escola Única, de caráter politécnico, à moda brasileira.

Por sua natureza, o ensino politécnico proporciona, através do sistema da Escola Única, uma educação capaz de unir a teoria à prática. Segundo seus princípios políticos essenciais, a cisão entre os aspectos teóricos e os aspectos práticos da vida (incluindo ao a divisão dos sistemas de ensino em propedêutico e profissionalizante), espelham a divisão social de classe. Nessa perspectiva, torna-se necessário que a sociedade democrática proporcione a todos, indistintamente, atividades culturais e profissionais, teóricas e práticas.

A noção de educação polivalente, fundamentada numa dimensão politécnica da Escola Única, vê a manualização como atividade-meio no desenvolvimento intelectual e político do aluno, principalmente os de uma faixa etária de 7 a 14 anos. Na filosofia da Escola Única, o fim da educação de formação elementar é o próprio processo educativo.

Existe, entretanto, conforme afirma Arapiraca (1982:156), uma explícita oposição entre o modelo teórico de ensino politécnico da Escola Única, cujo objetivo é

explorar as potencialidades intelectuais do indivíduo através da experimentação e a manualização do conhecimento naturalmente pelo indivíduo, e um sistema de ensino que tente objetivar, a priori, uma potencialidade, dirigindo-a a um processo produtivo prematuramente, na pressuposição de que com isto estão praticando a solidariedade social buscada pela Escola Única.

Contraditoriamente ao modelo esboçado enquanto Escola Única, que se expressa pela pedagogia do aprender a fazer, o modelo de Escola Polivalente aqui discutido e implementado pelo Programa de Expansão e Melhoria do Ensino (PREMEN), conforme o próprio Conselho Federal de Educação (CFE), se estrutura a partir da visão pragmática do saber fazer, visando “proporcionar ao aluno experiências que desenvolvam atitudes e capacidades de trabalho adequadas à preparação do jovem para a sociedade industrial em que vivemos” (Brasil-MEC, 1969).

Para Arapiraca (1982:157), a Escola Polivalente implementada através do PREMEN, diferentemente dos ideais da Escola Única, não estava efetivamente preocupada em combater o dualismo tradicional entre ensino acadêmico e ensino técnico. Sua tarefa era provocar impacto no sistema de ensino a partir do seu efeito demonstração, ao mesmo tempo em que se esperava, a partir do segmento educativo, legitimar todo um processo de modernização do segmento produtivo nacional.

No regime político em que se equacionava a economia, anunciando a euforia do “milagre econômico brasileiro”, apresenta-se, então, a Lei nº 5.692/71, que tinha como objetivos principais assegurar a ampliação da oferta do ensino de 1º grau, para garantir formação e qualificação mínimas à inserção de grande parcela da classe trabalhadora no processo produtivo taylorista-fordista, cujos postos de trabalho ainda exigiam pouca qualificação; e criar condições para a formação de mão-de-obra habilitada a ocupar cargos da administração pública e da indústria, de modo a favorecer o processo de importação tecnológica e de modernização que se pretendia para o país.

Entretanto, do ponto de vista da prática concreta, como observou Kuenzer (1991:10), pouca coisa mudou em função de inúmeros fatores estruturais e conjunturais que impediram que a pretendida homogeneidade ocorresse. O que se pretendeu, na

verdade, foi resolver no interior da escola, através da homogeneidade, a divisão entre trabalho intelectual e manual.

Instituído com a função de implementar, através das escolas polivalentes, uma educação concebida como agência de produção da capacidade de trabalho, de potenciação do fator trabalho, o PREMEN se inscreve no quadro geral das políticas de reajustamento da educação à nova racionalidade econômica. Afirmar isso significa entender a função da proposta pedagógica do PREMEN na perspectiva do conceito de capital humano, quando estabelece uma relação direta e imediata entre educação e produção capitalista, concepção que aparece de forma mais evidente na reforma do ensino de 2° grau, através da pretensa profissionalização, reduzindo assim a educação a um mero instrumento de manutenção das relações de trabalho.

Neste sentido, a Lei nº 5.692/71, ao generalizar a profissionalização no ensino médio, deixou de limitar a educação profissional às instituições que se dedicavam, há décadas, à formação profissional, surgindo, então, inúmeros cursos sem investimento apropriado e perdidos dentro de um segundo grau supostamente profissionalizante e de baixa qualidade. A responsabilidade da oferta se deu de modo difuso, acelerando a queda da qualidade do ensino nas redes municipal e estadual de ensino.