• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO IV: CABO VERDE E A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

4.4. A R ESPOSTA DOS P AÍSES A LIADOS À O PERAÇÃO “F ÉLIX ”

A Inglaterra tinha conhecimento da Operação “Félix” e, caso Cabo Verde fosse invadido pela Alemanha, havia um plano de contra-ataque a partir de Freetown (Serra Leoa Britânica), através de “uma pequena força anfíbia”299. Como comentou o historiador britânico Michael Alpert, “Churchill

tinha estudado bem Hitler e estava seguro de que este cometeria erros na condução da guerra, pelo que bastava esperá-los e aproveitá-los”300. Conquanto, só defendendo as ilhas atlânticas é que a

Inglaterra e os EUA faziam face aos ataques alemães.

A Inglaterra pretendia ocupar Cabo Verde como resposta à operação “Félix”. A 27 de Setembro de 1940, Churchill propôs ao Gabinete de Guerra inglês informar os americanos dos

296 AHU – 2966, 1A, UM, GM, MÇ, 1940-1941, Cópias Ofícios, UTL, Ofícios Expedidos de Julho de 1941, P. 1479.

297 Ministro das Colónias, 19 de Dezembro de 1940 – AHU – 2965, UM, GM, MÇ, 1940-1941, Cópias Ofícios, UTL,

Ofícios Expedidos Dezembro de 1941.

298 Ministro das Colónias, 19 de Dezembro de 1940 – AHU – 2965, UM, GM, MÇ, 1940-1941, Cópias Ofícios, UTL,

Ofícios Expedidos Dezembro de 1941.

299 António José Telo, op. cit., 2007, p. 26. 300 Citado por David Solar, op. cit., 2005, p. 45.

Adildo Soares Gomes Capítulo IV: Cabo Verde e a Segunda Guerra Mundial

planos em relação aos Açores e a Cabo Verde de modo a planear uma acção conjunta no caso de um ataque alemão a Gibraltar. A 9 de Outubro do mesmo ano, Roosevelt foi oficialmente informado dos planos para ocupar os dois arquipélagos, se a Espanha entrasse em guerra ao lado de Hitler. Os Estados Unidos concordaram em ocupar Cabo Verde e os Açores, caso fosse preciso.

O Governo inglês estava consciente de que Salazar nada faria contra os interesses britânicos, isto é, não se opunha a que a Inglaterra ocupasse as ilhas atlânticas de forma a impedir as intenções de Hitler. A Península Ibérica surgiu como alternativa a Gibraltar e às ilhas, em virtude da “situação potencialmente perigosa existente nos Açores e em Cabo Verde”301.

O arquipélago de Cabo Verde é vital como posto de transbordo e reabastecimento. Podemos constatar a necessidade de evitar que estas ilhas ficassem sob o controlo do inimigo. Numa conversa com o Secretário de Estado Britânico dos Negócios Estrangeiros, Armindo Monteiro referiu as posições vitais para o Império Britânico que Portugal tinha no mundo – “os Açores e Cabo Verde”. Afirmou ainda que “a nossa amizade representa para a Inglaterra a segurança do Atlântico, a entrada do Mediterrâneo, a certeza do caminho do Oriente sempre aberto. Porque é que tanta vez e durante tanto tempo [...] se obstinaram, nestas condições em nos tratar como quantité

negligeable?”302

A 10 Janeiro de 1941, a operação “Félix” foi cancelada devido às discórdias existentes entre Alemanha, Espanha, Itália e Turquia. Hitler retomou as conversações com o propósito de fazer renascer a operação, mas a situação política e estratégica não lhe eram favoráveis, uma vez que Churchill, com o apoio de Roosevelt, deu nova expressão aos seus objectivos e a Rússia insistia nas suas reivindicações sobre o Báltico e no acesso aos mares.

Nos primeiros meses de 1941, reuniram-se em Londres e em Lisboa os representantes de Portugal e de Inglaterra para serem discutidos os problemas relacionados com a defesa de Portugal continental e insular. Ficou acordado que a Inglaterra daria auxílio para a construção de campos de aviação e apoios técnicos na organização da defesa, tanto nos Açores como em Cabo Verde.

Depois dos sinais da intervenção da Alemanha na Grécia, Churchill temeu uma ofensiva do Eixo no Mediterrâneo. Assim, em Março de 1941, o Primeiro-Ministro britânico, com mais forças disponíveis, mencionou a intenção de desencadear uma nova ocupação de Cabo Verde, designada de operação Shrapnell303, para “afastar de vez” as intenções de Hitler de ter “um golpe de mão bem sucedido” neste arquipélago. O Estado-Maior norte-americano também estava atento à situação do

301 Carta secreta de Lord Halifax ao embaixador de Portugal em Londres. Citada pelo próprio Armindo Monteiro num

telegrama enviado a Oliveira Salazar, em DAPE, vol., VII, p. 63.

302 DAPE, vol. IV, p. 157.

303 Curiosamente, Roosevelt só toma conhecimento destes preparativos dos ingleses em finais de Abril de 1941.

Contudo, não deixou de apoiar Churchill na ocupação de Cabo Verde, porém, apelou que quando concluída a guerra, a Inglaterra de abandonar o arquipélago.

Adildo Soares Gomes Capítulo IV: Cabo Verde e a Segunda Guerra Mundial

79 arquipélago. A Inglaterra não precisava de usar Cabo Verde para fazer a ligação à América do Norte, mas Cabo Verde era importante para se ligar a América do Sul e às suas colónias.

Desassossegado com a defesa de Cabo Verde, Bluter escreveu a Armindo Monteiro, no dia 16 de Abril de 1941, a dizer que o Governo britânico estava disposto a enviar “dois ou três peritos de guerra a cada grupo de ilhas” para aconselharem sobre as defesas de Cabo Verde e dos Açores304.

Poucos dias depois, Churchill enviou uma carta a Roosevelt a comunicar-lhe que “a capacidade ibérica para resistir às pressões alemães podia ceder a curto prazo, o que implicava a ocupação dos Açores e de Cabo Verde”305.

Neste mesmo mês, o Senador norte-americano Pepper anunciou no Senado a “ocupação dos

Açores e de Cabo Verde”. O Governo comunicou que, à excepção da defesa aérea, a defesa dos Açores estava completa e que as guarnições de Cabo Verde iriam ser reforçadas. Assim, a defesa se fazia contra qualquer ameaça, quer viesse o Eixo, quer viesse os Aliados306.

Nestes dois arquipélagos era patente a fragilidade do dispositivo militar português307. Com a evolução da guerra, as medidas da preocupação militar na região do Atlântico tomaram um volume considerável.

Segundo Roosevelt, “o controlo ou a ocupação de qualquer uma das ilhas atlânticas pelas forças nazis comprometeriam a segurança imediata de tractos da América do Norte e do Sul e das posições insulares norte-americanas e, finalmente, a segurança do próprio território continental dos Estados Unidos”308. E caso Cabo Verde e os Açores fossem invadidos pela Alemanha “poriam

directamente em perigo a liberdade do Atlântico e a nossa própria segurança física”309.

Em suma, os governos dos país Aliados estavam “extremamente preocupados” com a defesa das ilhas atlânticas portuguesas, pois “do muito que se tinha colhido, de palavras e de atitudes dos chefes militares e políticos do Reich, incluindo o próprio Führer, conclui-se que a expansão germânica se orienta em vários sentidos, tomando, alguns deles, grande raio de acção”310. A

possibilidade da Alemanha avançar sobre a Península Ibérica fazia o executivo americano recear pela segurança do eixo Dakar-Natal.

304 DAPE, vol. VIII, p. 314. 305 Idem, Ibidem.

306 Pedro Cardoso, “Evolução do Conceito Estratégico Nacional no Século XX” in: Estratégia, vol. IV, Instituto de

Relações Internacionais,Lisboa, ISCSP, 1992, p. 47-49.

307 Maria Carrilho, “Política de Defesa e de Rearmamento”, in: Portugal na Segunda Guerra Mundial, Contributos para uma Reavaliação, Lisboa, Dom Quixote, 1989, p. 32 e 33.

308 Telegrama de Bianchi a Oliveira Salazar, em DAPE, vol. VIII, p. 451-456.

309 Idem, Ibidem.

Adildo Soares Gomes Capítulo IV: Cabo Verde e a Segunda Guerra Mundial

Um reforço da frota do Atlântico poderia significar a necessidade de operar no “teatro” da Islândia, no dos Açores e de Cabo Verde, com o volume de forças navais disponíveis e com um

deficit de forças armadas terrestres ainda pouco preparadas para operar em tempo de guerra.