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A Estação “Alto da Serra” (1898)

Imagens das principais edificações da Vila Velha

R. Rodrigues Alves

4.4 Arquitetura Ferroviária

4.4.1 A Estação “Alto da Serra” (1898)

“A arquitetura de um monumento deve revelar sua destinação”

Auguste Perdonnet A Vila Ferroviária de Paranapiacaba já contou com três estações. A primeira, provisória e muito simples, estava situada em frente ao largo dos padeiros e fazia parte do primeiro sistema funicular, sendo inaugurada em 1874. A segunda, localizada no centro do pátio ferroviário, ficou conhecida como antiga estação; era de 1898 e fez parte dos planos de melhorias ao longo de toda extensão da linha da SPR. Tanto a primeira quanto a segunda estação não existem mais. A terceira é a que existe atualmente, contando apenas com a plataforma e a torre do relógio, que sofreu algumas alterações quanto a sua localização e altura.

Se, por um lado, elogiava-se a engenharia britânica, por outro se criticava a precariedade e desconforto das estações e paragens. Em relatório do Ministério da Agricultura de 1865, assinalava-se que eram péssimas as estações de passageiros e mercadorias em Santos (...) e também a estação de São Bernardo (atual Santo André) era tão mal feita que só poderia ser considerada provisória (MAZZOCO, 2005).

Durante os planos de melhorias e duplicação da linha, a SPR construiu algumas estações visando substituir paradas provisórias que prestavam atendimento às vilas que se formavam ao redor da estrada de ferro. Promoveu também algumas reformas das estações primitivas. Dentre as estações que foram construídas no período de 1879 a 1900, estão o Alto da Serra, Campo Grande, Ribeirão Pires, Pilar (atual Mauá), São Caetano, Ipiranga, Barra Funda, Pirituba, Taipas, Caieiras, Juqueri, Campo Limpo e Várzea.

O terreno (Il.11) para implantação da nova estação na vila foi

aberto pelos ingleses para servir como pátio de operação do sistema funicular, local de manobras dos trens que subiam e desciam a serra.

Il.11. Preparação do terreno para implantação da estação. Foto: Marc Ferrez

Arquitetura da Vila Ferroviária de Paranapiacaba

O engenheiro James Madeley apresentou um relatório ao engenheiro Daniel Fox em que constavam todas as ações dos planos de duplicação das linhas e melhorias, além de prever a construção de diversas edificações, principalmente novas estações. Junto a esse relatório estavam também os orçamentos, havendo a intenção de adotar um padrão estético de instalação e dimensões das estações

(LAVANDER, 2005).

Essas remodelações marcam os diferentes estágios de desenvolvimento da estrada de ferro: das colunas feitas com trilhos, em um modesto galpão, passou-se às estações maiores com espaços hierarquizados, salas de espera para senhoras, sanitários, escritórios, plataformas cobertas e acabamentos rendados (COSTA, 2001).

Para o Alto da Serra foi idealizada a construção de uma nova estação (IL.12 e 13), toda em madeira, ferro e telhas francesas, vindas

da Inglaterra. Seu projeto foi elaborado por engenheiros britânicos, sendo que suas medidas foram escritas em inglês com cotas em pés e polegadas, foram previstas também plataformas com 160m de comprimento ligadas por pontes metálicas, de passagem superior, além de armazéns de carga.

A estação ferroviária veio toda ela desmontada e numerada peça a peça, o que facilitava a montagem, tornando-a mais rápida e

não necessitando de mão-de-obra especializada. Nela utilizou-se grande quantidade de peças pré-fabricadas na Grã-Bretanha. Os equipamentos, em sua maioria importados, eram de alta qualidade e grande unidade de estilo. Por sua localização no meio do caminho da serra, mereceu tratamento diferenciado com uma torre para o relógio e ampla plataforma coberta (COSTA, 2001).

Il.12. Estação na década de 40.Fonte:www.estacoesferroviarias.com.br

O alpendre dessa estação (Il.14), ainda de acordo com Costa (2001), era semelhante aos apresentados nos catálogos de Walter MacFarlane e, possivelmente, de sua fabricação. Já as coberturas de plataforma eram todas de colunas, consolos e complementos ornamentais em ferro fundido, coberto por telhas do tipo francesa.

Arquitetura da Vila Ferroviária de Paranapiacaba

Arquitetura da Vila Ferroviária de Paranapiacaba

Em um eixo imaginário simétrico em relação à passarela metálica, o corpo principal abrigava o vestíbulo como uma grande sala de espera, o setor de bagagens e encomendas, uma área destinada para o posto telegráfico e outras dependências. Na ala à esquerda desse eixo, estavam as dependências do bar-café e sanitários e, no outro extremo, a ala destinada ao chefe da estação. Todo esse grande edifício encontrava-se paralelo às linhas férreas.

As estações ferroviárias eram de fato templos da nova tecnologia e seus espaços se multiplicavam pela criação de serviços utilizados por indivíduos de todos os níveis sociais (SILVA, 1988). Segundo recomenda Auguste Perdonnet em seu tratado sobre estradas de ferro, a arquitetura das estações intermediárias localizadas em grandes cidades deveria ser produto daqueles edifícios, ou seja, contemplar as características predominantes de uma cidade. Isso ocorreu em Paranapiacaba, onde o prédio da estação seguiu o padrão construtivo e os mesmos materiais foram utilizados não só nos principais edifícios da vila, como em todo seu conjunto urbano.

De relevante interesse é distinguir a diferenciação entre parada e estação. A parada é um simples ponto estabelecido para acessar uma localidade pouco freqüentada pelos passageiros, com

instalações simples. Já as estações comportam um ponto de chegada com vias de garagem, geralmente classificadas em terminais ou intermediárias (de passagem). Na maioria das vezes as estações intermediárias estavam divididas em três classes, variando de acordo com o tamanho e importância da localidade que serviam (Cloquet, 1900).

Il.14. Plataforma com pilares em ferro c. 1968. Foto: Octaviano Gaiarsa. Acervo:

Museu de Santo André (MSA).

A planta do edifício seguiu o projeto enviado pelos ingleses, porém sua implantação foi dada exatamente no meio do pátio ferroviário, ficando a estação entre as duas linhas férreas: de um lado partiam os trens sentido São Paulo e, do outro, para Santos.

Arquitetura da Vila Ferroviária de Paranapiacaba

A Estação ‘Alto da Serra’ estava incluída na categoria de estação de passageiros, entre São Paulo e Santos, classificada como sendo ‘especial de segunda classe’. Era um edifício monumental pelas suas dimensões e de fundamental importância no contexto urbano da Vila Ferroviária de Paranapiacaba.

Il.15. Estação de Paranapiacaba e parte do pátio ferroviário, 1968.

Foto: Carlos Haukal. Acervo: MSA.

A respeito dessa estação um jornal da época registrou o seguinte comentário:

“A estação do Alto da Serra é um vasto edifício luxuoso de requintado gosto artístico, elegante e construído em parte em madeira, toda envernizada. A sua collocação e o estylo architectonico a torna um edifício imponente, gracioso e pittoresco no meio daquella serra, cercada de

altas montanhas de verde escuro, pujante na grandeza da natureza brazileira, deslumbrante pelo panorama cheio de sorprezas que desenrolão-se aos olhos dos visitantes(...) Na estação existem vastas dependências com todas as commodidades e conforto para os passageiros, salas especiaes para famílias, armazéns, asseiadas e bem collocadas reservadas, e um excellente botequim sob a intelligente direcção do Sr. Henriques Reeve. Todo o edifício da estação e suas proximidades são illuminadas a luz electrica”(Jornal do Commercio, 30 de março de 1900). A estação (Il.15) era o ponto focal de encontro da população

da vila que se reunia em suas plataformas para tratar de negócios, para comentar futebol, política ou qualquer outro assunto. Em seus relatos João Ferreira destaca que:

“As noites de sábado e domingo eram os dias de glória da estação. Durante o dia, o movimento já aumentava, mas à noite era impressionante o movimento nas suas dependências; plataformas bastante largas ofereciam espaço para um grande número de pessoas. (...) Caminhava-se pelas plataformas em dois sentidos, um ao contrario do outro. Dessa forma obrigatoriamente, depois de duas ou três voltas todos viam-se (...) encontravam-se além de namorados, casais com seus

Arquitetura da Vila Ferroviária de Paranapiacaba

filhos e pessoas de todas as idades”.

Na estação erguia-se a torre do relógio. Este fazia parte do corpo do edifício, sendo também a torre em madeira. Ela media 14,40 m de altura até a base da cúpula, reservando 5,40 m para acomodar o relógio de quatro faces, da empresa Johnny Walker Benson, de 1888, encimado por uma cúpula circundada por pequenas aberturas -óculum- arrematadas e ornamentadas por grades de ferro.

Esta estação foi desativada em 1977. Em 1981 pegou fogo e, da antiga estação, restou apenas a plataforma. O mecanismo de funcionamento do relógio foi recuperado e instalado numa nova torre reconstruída em alvenaria, sendo a cúpula ornamentada com grades, possivelmente originais, porém sem as aberturas do óculum.

Il. 16. Incêndio na Estação, 1981. Fonte:www.vfco.com.br