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3.1: A estrutura produtiva, a incapacidade de absorver emprego e o setor industrial

Capítulo I: As políticas econômicas neoliberais dos anos 90 e seus impactos macroeconômicos

I. 3.1: A estrutura produtiva, a incapacidade de absorver emprego e o setor industrial

Um dos impactos do novo modelo na estrutura produtiva foi o grande aumento das importações, o que se verificou não só em relação aos bens de capital, partes e peças, mas principalmente com respeito aos bens de consumo. Deste modo, como pode se observar no Tabela I.12, os aumentos do PIB foram acompanhados de um notável crescimento do coeficiente de importações, muito acima do de exportações.

Como parte do mesmo processo, o setor industrial perde dinamismo, já que se expande a menor ritmo que o PIB, reduzindo-se o coeficiente de industrialização. Em contrapartida, os serviços vão explicando maior proporção do produto, aprofundando-se a terceirização da estrutura produtiva que havia se iniciado a meados dos anos 70. Entretanto na década de 90 este processo vai adquirir conotações particulares, expressando uma das características do novo modelo. Se nos anos 80 a perda de importância da indústria a favor dos serviços foi produto de um processo de acumulação desarticulado, nos anos 90 vai ser o resultado de um padrão de acumulação que atenta expressamente contra a expansão da indústria e a geração de emprego.

A menor presença do setor industrial e o aumento dos serviços na estrutura produtiva foram sentidos na estrutura ocupacional, diminuindo o emprego industrial e aumentando-se o emprego em 15

A respeito ver (ASPIAZU, 1993) e CEP (1997)

Períodos PIB Valor Participación Valor Coeficiente Participação Valor Participação Participação Coeficiente Coeficiente agregado no PIB agregado Industrializac. no emprego agregado no PIB no emprego Importação Exportação t.a.a. t.a.a % t.a.a % urbano % t.a.a. % urbano % % % 1990 -1.3 8.4 8.8 -2.3 25.9 19.3 -1.9 57.5 73.5 5.9 12.8 1991 10.5 4.3 8.3 9.9 25.7 18.4 10.1 57.3 73.5 9.4 11.0 1992 10.3 -1.0 7.5 10.3 25.7 18.1 10.1 57.2 74.8 14.2 10.2 1993 6.3 3.0 7.3 5.1 25.5 17.6 6.5 57.3 74.5 15.2 9.8 1994 8.5 3.7 7.0 6.2 24.9 16.7 9.4 57.8 75.0 17.2 10.5 1995 -4.6 2.3 7.5 -7.0 24.3 16.1 -2.7 58.9 76.2 15.9 13.5 1996 4.8 3.0 7.3 5.3 24.4 17.2 4.7 58.9 75.3 17.9 13.7

Fonte: elaboração própria com base a estimativas de contas nacionais a preços de 1986 do Ministério da Economia e Quadro I.13

TABELA I,12

Indicadores macroeconômicos selecionados

serviços. Entretanto, os serviços não conseguem compensar totalmente a perda de emprego industrial e a destruição de postos de trabalho na indústria terminou se expressando no conjunto da economia. Isto se observa particularmente entre 1993 e 1995, momento em que a economia argentina aponta destruição líquida de postos de trabalho e aumenta notavelmente o desemprego aberto (Tabela I.13).

A vinculação direta entre a evolução do total de ocupados, a evolução dos ocupados no setor industrial e a de desemprego aberto podem ser observados no Gráfico I.1. Ali se vê que o maior ritmo

de destruição de postos de trabalho na indústria determina a tendência decrescente do nível de emprego total16, tendência que explica grande parte do aumento da brecha entre a evolução do emprego global e da PEA, quer dizer o incremento do desemprego aberto.

No mesmo gráfico também se observa como, neste contexto de estancamento na geração de emprego e aumento do desemprego aberto, expandem-se os postos de trabalho vinculados aos serviços prestados às empresas. Assim, a curva que mostra a evolução do emprego em Outros Ramos, e que inclui uma variedade de serviços que em sua grande parte são dirigidos a empresas, é a única que sobe de forma sistemática.

16 Com relação à importância do setor industrial como determinante da evolução do emprego urbano ver (FRENKEL E

GONZALES ROZADA, 1999) Ramos de atividade 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 93/95 PEA urbana 10618000 10994690 11412000 11722000 11928000 12307000 12589000 585000 Empregados 9937000 10299690 10586000 10659000 10529000 10348000 10542000 -311000 Indústria 1917841 1897040 1916066 1875984 1758343 1666028 1813224 -209956 Construção 715464 824800 751606 842061 873907 807144 790650 -34917 Com, Rest e Hotéis 1997337 2165100 2286576 2398275 2190032 2142036 2118942 -256239 Serv Com Soc e Pessoais 3895304 3886870 4033266 3847899 3937846 3932240 3700242 84341

Outros ramos (1) 1411054 1525880 1598486 1694781 1768872 1800552 2118942 105771

Desempregados 681000 695000 826000 1063000 1399000 1959000 2047000 896000 (1) Inclui fundamentalmente: Eletricidade, Gás e Água; Transporte, armazenamento e comunicações;

serviços financeiros, seguros e serviços prestados às empresas.

Fonte: elaboração própria com base ao Ministério do trabalho, "Boletín de Estadísticas Laborales" e Ministério da Economia, "Informe Economico".

TABELA I.13

População Economicamente Ativa: Total ocupados urbanos segundo principais ramos de atividade e desempregados. Série 90-96 e variação absoluta 93/95

Portanto, o pronunciado incremento do desemprego aberto, que é um dos impactos das políticas neoliberais no mercado de trabalho foi, em grande medida, causado pela redução relativa e absoluta da capacidade da economia de gerar emprego. Esta redução foi determinada, fundamentalmente, pelo comportamento do setor industrial, que se transformou nesta década em expulsor líquido da força de trabalho. É por isso que a análise das transformações suscitadas na indústria é fundamental para entender o comportamento do mercado de trabalho.

Uma segunda característica deste período que se vincula com a expulsão do emprego, é o crescimento divergente entre o produto e o emprego, derivado do aumento da produtividade. Este fenômeno se apresenta com maior incidência no setor industrial que no conjunto da economia, e explica a forte redução de postos de trabalho neste setor. No Gráfico I.3 se observa que durante o período a produtividade cresce a taxas superiores às do produto, com a óbvia expulsão de emprego.

1990 1991 1992 1993 100 104 107 110 100 104 107 107 100 99 100 98 100 115 105 118 100 108 114 120 100 100 104 99 100 108 113 120

Outros serviços inclui fundamentalmente: Eletricidade, Gás e Água; Transporte, armazenamento e comunicações; serviços financeiros, seguros e serviços prestados às empresas.

Fonte: Elaboração própria com base na Tabela I.13

Evolução da PEA e os ocupados urbanos segundo ramos de atividade. Indice 1990 = 100.

GRÁFICO I.1 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997

PEA total Emprego Total

Indústria Construção

Comércio, Restaurantes e Hotéis Serviços Comunais, Sociais e Pessoais

Esta dispersão entre a evolução do produto e do emprego está presente nos principais ramos industriais e vai passar a constituir um traço permanente da dinâmica industrial dos anos 90. No Gráfico I.4, observa-se que a expansão do nível de produção com estancamento ou expulsão absoluta de emprego é característica até 1995 nos setores mais intensivos em mão-de-obra: alimentos e bebidas, maquinário e equipamento, têxteis e roupas e substâncias químicas, que em conjunto absorvem mais de 50% dos ocupados industriais. O setor automotor aumenta seu nível de emprego só até 1994. A partir de 1996, e depois do forte choque derivado da crise 'tequila', ainda que o nível de produção tenha se recuperado para a generalidade dos setores (exceto o setor têxtil) isso não consegue se traduzir em maiores níveis de emprego. O que é gerado a partir deste momento é uma expulsão relativa de mão-de- obra, já que a brecha entre a evolução da produtividade e do nível de produção vai adquirindo uma tendência constante. Em outros termos, o novo ciclo de expansão do produto que inicia em 1996 é desenvolvido sobre a base de uma dimensão ocupacional de menor envergadura que a vigente nos inícios da expansão do ciclo anterior, e este é um dos indícios da redução da capacidade do modelo para gerar emprego.

Fonte: elaboração própria com base a estimativas de contas nacionais, "Informe Economico", Cuadro I.13 e INDEC (1999) (a) Indice 1990 =100

GRÁFICO I.3

Produção, ocupados e produtividade na Indústria Manufatureira formal

GRÁFICO I.2

Produto Interno Bruto e ocupdos Total nacional urbano

60 80 100 120 140 160 180 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Productividad 60 80 100 120 140 160 180 1988 1990 1992 1994 1996 1998 PIB Ocupados urbanos

Fonte: elaboração própria com base a INDEC (1999) (a)

GRÁFICO 1.4

Período 1990-1998. Indice 1990 = 100

Participação no emprego industrial formal 93/95: 6,0 % Participação no emprego industrial formal 93/95: 7,7 % Participação no emprego industrial formal 93/95: 6,3 %

Participação no emprego industrial formal 93/95: 3,6 % Participação no emprego industrial formal 93/95: 8,0 % Participação no emprego industrial formal 93/95: 27 %

Alimentos e Bebidas 60 80 100 120 140 160 180 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Fabricação de produtos Têxteis

40 60 80 100 120 140 160 180 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Fabricação de Prendas 50 70 90 110 130 150 170 190 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Fabricação de substâncias e produtos químicos

50 70 90 110 130 150 170 190 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Fabricação de maquinário e equipamento

50 70 90 110 130 150 170 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Fabricação de veículos,automotores y rebolques

50 100 150 200 250 300 350 400 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 Produção Ocupados Produtividade

Uma terceira característica do período, vinculada com a forte expansão das importações como fonte de aumento da produtividade e com a incapacidade de absorver emprego, é a redução da capacidade relativa do setor industrial para gerar renda, e em conseqüência para gerar emprego. Como pode-se observar no Gráfico I.5, a indústria em seu conjunto reduz em mais de 7 pontos percentuais o coeficiente de valor agregado entre 1984 e 1993, com um descenso mais acentuado nos grandes estabelecimentos.

A expulsão de emprego no conjunto da economia e particularmente no setor industrial foi interpretada a partir do discurso ortodoxo como produto de um choque de inovação tecnológica que substituiu trabalho por capital. Argumenta-se que a abertura econômica reduziu o preço dos bens de capital importados e, devido às excessivas regulações no mercado de trabalho para que diminuísse o salário, aumentou-se o preço relativo do trabalho em relação ao capital, dando lugar a sua substituição. A partir deste argumento, sustenta-se que os aumentos da produtividade e a redução de emprego

são derivados da incorporação de importantes inovações tecnológicas , e estaria perante uma

Fonte: com base a ASPIAZU (1998) e segundo INDEC.

GRÁFICO I.5

Evolução do Coeficiente de Valor Agregado industrial por tamanho de estabelecimento e total (%)

40.5 39.9 39.7 40.1 40.8 32.9 36.4 36.2 29 31.9 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45

Total indústria menos de 10 ocupados de 11 a 50 ocupados de 51 a 100 ocupados mais de 100 ocupados Tamanho de plantas

Coeficiente de Valor Agregado (%)

1984 1993

estrutura produtiva que reduziria de forma importante a brecha tecnológica em relação ao resto do mundo.

A seguir se discute esta interpretação como causa da expulsão de emprego, mostrando que as transformações ocorridas nos preços relativos, mais do que promover a inovação tecnológica, desalentaram tanto a produção de bens comercializáveis como o investimento no setor industrial.