• Nenhum resultado encontrado

A experiência do luto e a qualidade da morte

No documento Processos de luto e educação (páginas 91-94)

A qualidade da morte é um factor importante que influencia a adaptação à viuvez da pessoa enlutada.

Carr (2001), baseando-se em dados obtidos do CLOC, procurou averiguar se a adaptação psicológica das pessoas idosas é afectada pela natureza da experiência de morte do cônjuge, seis meses após a perda. Dito de outro modo, pretendeu avaliar como é que a qualidade da morte de uma pessoa idosa, afecta a adaptação psicológica do enlutado, seis meses após a perda. Para tal, Carr (2001), tomou como referência o conceito de “morte boa”, que ela define da seguinte forma:

“A “good death” is characterised by physical

comfort, social support, acceptance, and appropriate medical care, and should minimise psychological distress for the dying and their families” (abstract).

Para o seu estudo, Carr (2001) considerou cinco indicadores para caracterizar a experiência da morte da pessoa entretanto falecida. Estes indicadores foram definidos com base em testemunhos de pessoas enlutadas, seis meses após a perda e constituem, também, aspectos da qualidade da morte. Podemos encontrar estes indicadores em Carr & Utz (2001/02, p.74):

“the patient’s acceptance of their impending death,

social support from loved ones, degree of burden on others, death timeliness and appropriate physical care”.

Depois de Carr (2001) percorrer uma série de teorias e paradigmas sobre a relação da qualidade da morte e a adaptação psicológica do enlutado, confronta-nos com os resultados da sua própria pesquisa. Estes resultados mostram que aqueles que morrem após uma doença prolongada, com uma duração de pelo menos seis

meses, revelam níveis significativos de aceitação da morte, enquanto que aqueles que morrem de repente, revelam níveis significativamente mais baixos de aceitação da morte, quando comparados com aqueles que dispuseram de um curto período de antecipação da morte. Estes dados conduzem Carr (2001) a uma outra conclusão: em relação aos cuidados prestados à pessoa agora falecida, a morte súbita não constituiu uma sobrecarga tão grande para as pessoas enlutadas, como as mortes antecipadas. Estas implicaram um grau de cuidados, à pessoa doente, mais elevado. Compreende-se que assim seja, pois a pessoa padecendo de uma doença prolongada, como o cancro, não possui autonomia suficiente para levar a cabo as tarefas mais simples, cabendo à esposa ou esposo esta função. A carga de cuidados é, pois, função do tipo de morte.

Outros resultados obtidos por Carr (2001) dizem respeito às mortes dolorosas. Em relação a este indicador, Carr (2001), afirma que este se encontra relacionado com a causa e o momento da morte, bem como com características sócio-demográficas e psicológicas do enlutado. Assim, Carr (2001) verificou que aqueles que morreram de cancro apresentam uma probabilidade 2.5 vezes de terem sofrido, enquanto que as pessoas que morreram de uma doença do coração apresentam uma probabilidade menor de terem sofrido. Esta autora pode constatar também que aqueles que esperam cerca de seis meses pela morte apresentam uma probabilidade de 3.5 de terem sofrido bastante. Carr (2001) afirma, ainda, a propósito da origem social das pessoas enlutadas, “more

likely educated persons are less likely to report that their spouse had a painful death” (p.17). Não perdendo de vista os objectivos definidos

por Carr (2001) para esta pesquisa, deduz-se, destes resultados, que a qualidade da morte se encontra relacionada com o tempo de duração de espera da morte e com o nível e a duração do sofrimento que rodeia a morte provável.

Carr (2001) pretendeu, também, saber se a angústia, após a perda, era afectada por aspectos qualitativos da experiência da morte, tais como: saudade, pensamentos intrusos, raiva e ansiedade. Os resultados obtidos mostraram que as pessoas enlutadas, cujos maridos sofreram mais, durante o período que antecedeu a morte, apresentavam níveis mais elevados de saudade seis meses após a perda. Em relação aos pensamentos intrusos, estes apresentavam um nível elevado para os enlutados cujo cônjuge esteve em grande sofrimento. Estar com o cônjuge no momento da morte constitui um indicador de “morte boa” para o enlutado. Esta atitude reduz os níveis de pensamentos intrusos em um terço.

Em relação à raiva, esta é influenciada pela negligência médica e pela qualidade conjugal durante os últimos dias. Em relação a este indicador, Carr (2001) confirma que as pessoas enlutadas revelaram elevados níveis de raiva, seis meses após a perda, quando a morte era devida a negligência médica. No entanto, o convívio com o cônjuge, imediatamente antes da morte, protege o enlutado contra os elevados níveis de raiva. Significa que o convívio funciona como que um amortecedor contra os efeitos psicológicos provocados pela negligência médica.

A ansiedade, verificou Carr (2001), é afectada pelo sofrimento e pelo facto de o cônjuge estar numa “nursing home”. Carr (2001) considera que, apesar de o cônjuge estar afastado da família, esta atitude de colocar o cônjuge num tipo de instituição como esta, está relacionada com níveis baixos de ansiedade. Com efeito, separar o doente da família pode ser mau para ele, contudo para a pessoa enlutada significa que a pessoa querida está a ser bem tratada e que não está a sofrer, transmitindo-lhe uma sensação de bem estar.

Olhando para os resultados podemos verificar que as interacções com o cônjuge, durante o processo de morte, constituem atitudes importantes para a adaptação psicológica das pessoas viúvas. Na verdade, esta acção ficou provada com o baixo nível de

pensamentos intrusos nas pessoas que estiveram junto dos cônjuges no momento da morte.

O facto de a institucionalização do cônjuge provocar níveis baixos de ansiedade, pode ser explicado, talvez, pela sensação de libertação que os enlutados podem experienciar. Ou seja, não têm a responsabilidade de cuidar do cônjuge. Esta atitude pode constituir uma preparação emocional para a viuvez, facilitando, deste modo, a transição para este estado (Carr,2001). A este propósito, referindo-se ao contexto da morte, Carr (2001) revela:

“These findings also suggest that improved end-of-

life care and pain management programs, may also enable a smoother transition to widowhood“(p.25).

Na sequência destes resultados, o ponto seguinte abordará um outro aspecto do qual depende a adaptação à viuvez e que está relacionado com o contexto relacional deste acontecimento.

4. A experiência do luto e a qualidade da relação conjugal

No documento Processos de luto e educação (páginas 91-94)

Documentos relacionados