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A análise quantitativa das entrevistas permitiu-nos estabelecer algumas relações entre as variáveis definidas para este trabalho, em particular entre as três dimensões da teoria da oscilação, a idade das viúvas e o número de segmentos tópicos por elas realizados. O comportamento destas dimensões face à idade revela-nos que à medida que a idade aumenta, o número de Orientações para o Restabelecimento e o número de oscilações diminuem. Já em relação ao número de segmentos tópicos, isto é, ao número de unidades discursivas, verificámos que quanto maior é este número, maior é o número de Orientações para a Perda e de Oscilações.

Da análise das tabelas e dos gráficos observámos, ainda, que a maioria das viúvas orienta a sua atenção para a perda, isto é, uma grande parte da fatia dos segmentos tópicos são constituídos por orientações para a perda.

Da análise qualitativa que realizámos podemos afirmar que, à semelhança da análise quantitativa, a maioria das viúvas orienta a sua atenção para a perda, com momentos de restabelecimento e de oscilação entre ambas. A permanência na orientação para a perda parece indicar a existência de um trabalho de luto, tal como afirmavam Stroebe & Schut (1999). Com efeito, nas narrativas das viúvas, pudemos observar sentimentos de dor, choro, saudade, tristeza, angústia, desespero, choque, revolta, sofrimento. Observámos, também, que os laços entre a viúva e o morto continuam através de memórias e lembranças, sendo que a sensação de presença do morto, não deixa, contudo, de constituir uma forma de continuar esses laços. O processo de luto destas mulheres centra- se pois, na perda.

Da observação das narrativas, torna-se evidente, através dos testemunhos já aqui referidos, que algumas viúvas continuam as suas relações, através de memórias, recordações, pensando no falecido marido, sentido a sua presença ou o seu cheiro, realizando

tarefas a pensar no morto. Esta evidência mostra-nos, tal como Bowlby (1980) já havia referido, que estamos perante uma reorganização da relação com o falecido marido, e não perante uma quebra (desvinculação) dos laços que unem a pessoa enlutada ao morto. Acreditamos que esta atitude é facilitadora de uma adaptação à perda que, de acordo com aquilo que já referimos ao longo deste trabalho, envolve uma ligação entre o passado, o presente e o futuro.

Poderemos concluir, portanto, que a teoria da oscilação envolve a teoria do trabalho do luto (Freud) e a teoria da vinculação (Bowlby), tal como já havia sido referido, num outro momento deste estudo, quando se referiu que a teoria da oscilação incorporava elementos de outras teorias. É, também, o caso do contexto interpessoal da perda. Nestas narrativas encontramos porções do discurso que evidenciam esta característica. Stroebe & Schut (2001) reclamam para esta característica uma mudança da relação entre os sofredores, (perda secundária), ou seja entre aqueles que são afectados pela perda. Nestes casos pode ocorrer, por exemplo, um divórcio (perda terciária). É aquilo a que os autores chamam de “incremental loss” (Stroebe & Schut, 2001 , p.391). Contudo, nas narrativas por nós analisadas, este contexto interpessoal da perda refere-se à evidência do sofrimento por parte de outros familiares da viúva. Podemos dizer que se observa uma espécie de partilha da dor, causada pela perda. Os testemunhos não nos permitiram averiguar a dimensão desta partilha, nem as “perdas” que poderia causar. Da observação deste elemento – contexto interpessoal – retiramos a ideia de que a sua descrição permitiu às viúvas reforçar aquilo que estavam a sentir. Atente-se no segmento narrativo da viúva K: “As

pessoas próximas, neste caso, os meus filhos e o meu pai, reagiram acho que um pouco como eu, revolta, angústia, tristeza, reagimos todos mais ou menos dessa forma”. Os sentimentos da viúva são, de

A observação de elementos, condizentes com aquilo que Stroebe & Schut (1999) determinaram para o restabelecimento, evidenciam uma necessidade de lidar com outros stressores que não só aquelas associados à perda. A existência destes stressores constitui uma fonte de stress e de preocupação para as viúvas. As narrativas sustentam, assim, que estes stressores têm que ser atendidos, constituindo-se como parte integrante do processo de adaptação.

Em relação ao processo de oscilação, as narrativas evidenciaram a presença deste processo através do evitamento e confronto de stressores relacionados com as duas orientações. A certa altura a viúva evita lidar com aspectos relacionados com a perda, optando por focar a sua atenção noutros relacionados com o restabelecimento. Contudo, chega o momento em que é preciso lidar com aspectos relacionados com a perda e então, a atenção da viúva dirige-se para eles, confrontando-os. Este processo de confrontação e evitamento com as duas orientações irá, lentamente, conduzir a uma adaptação à perda, com a qual a pessoa enlutada irá aprender a viver.

As entrevistas por nós efectuadas permitiram-nos, também, recolher alguns elementos, que nos mostram que na Teoria da Oscilação a adaptação à perda se constitui como um desafio desenvolvimental, em que o luto surge como o acontecimento que coloca à prova os recursos da viúva, levando-a a reorganizar a sua vida e a reestruturar a sua identidade. A viúva, por exemplo, depara- se com o problema de mudança de papeis, pois passou de esposa a viúva. Este problema irá constituir-se como mais um stressor, uma tarefa de restabelecimento com o qual a viúva terá de aprender a lidar.

Lidar com a perda, constitui-se, pois, como uma tarefa normativa do Ciclo de Vida, portanto, do desenvolvimento humano. A tarefa de lidar com a morte do cônjuge vem de encontro àquilo que

Havighurst (1972) preconizava como uma tarefa normativa do Ciclo de Vida a realizar no período da velhice. Segundo este autor, perante a morte do cônjuge, a viúva confrontar-se-á, então, com a mudança e a aprendizagem de novos papeis. A qualidade desta aprendizagem influenciará o rumo do desenvolvimento desta viúva.

Na nossa amostra encontram-se, também, viúvas de meia- idade que se deparam, também, com esta tarefa de lidar com a morte do cônjuge. Pensamos que, dentro das tarefas que Havighurst (1972) propõe para este período da vida, adaptar-se à morte do cônjuge parece ser uma tarefa mais difícil, pois este período envolve, segundo o autor, tarefas que exigem uma participação mais activa e mais preocupada destas viúvas. Veja-se o exemplo da viúva N, com 47 anos de idade e que se depara com a tarefa de lidar com um filho adolescente: “Além do problema que já estava a viver ainda tinha

mais esse com o menino que tive que segurar sozinha”. Esta situação

significa, para a viúva, uma fonte adicional de stress e de preocupação, obrigando-a a dirigir a sua atenção para uma tarefa de restabelecimento, antes partilhada com o falecido marido.

Marcia (2002), também havia definido a experiência do luto como uma tarefa reestruturante da identidade, a qual vai sendo reformulada e reestruturada ao logo da vida adulta, à media que o indivíduo é confrontado com acontecimentos que perturbam o seu equilíbrio, como por exemplo a perda do cônjuge.

Perante os resultados obtidos neste estudo e a reflexão que em torno deles se realizou, parece-nos que os mesmos poderão apresentar implicações que a seguir se apresentarão.

11. Implicações Educativas e Comunitárias deste Estudo

No documento Processos de luto e educação (páginas 168-172)

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