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Os indicadores expressam a interpretação do pesquisador frente um conjunto selecionado de expressões do participante (informações originadas em situações informais e formais - via instrumentos), que se integram às construções parciais anteriores, ampliando a abrangência da trama complexa de processos subjetivos focalizados no estudo. Indicador refere-se à ―[...] construção capaz de gerar um significado pela relação que o pesquisador estabelece entre um conjunto de elementos [...]‖ (GONZÁLEZ REY, 2002, p. 112) de sentido implícito ou explícito, que corresponde à lógica construtiva, processual e configurada das informações rumo às construções hipotéticas, que contradizem a lógica das respostas conclusivas sobre fenômenos complexos humanos. (GONZÁLEZ REY, 2014).

Os indicadores representam uma possibilidade de construção hipotética que só toma corpo a partir da associação que o pesquisador, em seu momento interpretativo, estabelece frente o conjunto de elementos da informação que, de modo indireto e não explícito, guarda

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relação com o fenômeno estudado, nunca havendo correspondência biunívoca entre o ―dado‖ observado e o indicador gerado pelo pesquisador. (GONZÁLEZ REY, 2005a).

Os indicadores exercem papel fundamental na construção da informação, são elementos hipotéticos construídos a partir da interpretação do pesquisador frente um conjunto de expressões do participante, oriundo de momentos e instrumentos diversificados. Pelo conjunto de indicadores congruentes entre si, a pesquisa toma dimensão construtiva e explicativa do fenômeno em questão. Essa perspectiva contrasta com abordagens de pesquisas qualitativas que, com base restrita às respostas dos instrumentos e observações diretas do pesquisador, descrevem comportamentos ou caracterizam o indivíduo de acordo com conceitos e padrões previamente estabelecidos, tornando o empírico um espaço de legitimação da teoria.

Pela geração dos indicadores, o pesquisador consegue dar sentido ao que está na ordem do não-observável. (GONZÁLEZ REY, 2005a; 2005b). São os indicadores gerados/produzidos a partir do conjunto dos elementos da informação implícita e indireta do participante, que aparece tanto por meio dos instrumentos utilizados como na relação comunicativa e interativa estabelecida com o pesquisador. (GONZÁLEZ REY, 2005a, 2010). Eles representam a chave para compreensão da trama configurada pela subjetividade do indivíduo em estudo e pressupõem um processo gradativo, contínuo, reflexivo e criativo do pesquisador, que deve inter-relacionar elementos do material empírico capazes de fortalecer hipóteses as quais resultarão no modelo teórico da pesquisa. (GONZÁLEZ REY, 2014).

Os trechos de informação que o pesquisador reúne para gerar os indicadores originam- se da expressão atual dos participantes, porém estão sempre além de sua consciência ou intencionalidade. (GONZÁLEZ REY, 2013b). Isso decorre da compreensão de que no método construtivo-interpretativo a intencionalidade do participante não obscurece os sentidos subjetivos e configurações subjetivas que estão na base de suas ações, expressões e posicionamentos, os quais só se tornam inteligíveis pela construção interpretativa do pesquisador. (MITJÁNS MARTÍNEZ, 2014). Na esteira dessa compreensão, destacamos um trecho de González Rey e Mitjáns Martínez (2017b) que dá clareza sobre o exposto:

Os indivíduos nunca são conscientes da complexidade das configurações subjetivas que emergem no decorrer de sua experiência. A subjetividade só aparece indiretamente através de construções teóricas baseadas nas cadeias de significações que o pesquisador constrói, processo pelo qual as ideias do pesquisador e as significações produzidas a partir do material empírico são inseparáveis (p.204).35

35―Individuals are never conscious of the complexity of the subjective configurations that emerge in their ongoing experience. Thus, subjectivity only appears indirectly through theoretical constructions based on chains of meanings

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Os eixos norteadores da construção interpretativa não são estabelecidos a priori e sim a partir da seleção de trechos de informação, que o pesquisador considera relevantes e associados ao objetivo da pesquisa. Com base neste material empírico, viabilizado pelos instrumentos utilizados, o pesquisador realiza interpretações que julga pertinentes, gerando indicadores que se integram a sucessivos conjuntos de informação direcionados a uma linha interpretativa, que aponta para o problema da pesquisa, culminando na sustentação de hipóteses explicativas do fenômeno em estudo, que fornecem subsídios para a construção teórica final da pesquisa.

O método construtivo-interpretativo pressupõe um processo que se desenvolve sem a presunção de hipóteses a priori, visto que o conhecimento sobre subjetividade só se torna possível a partir da construção hipotética, realizada no curso vivo e dinâmico da investigação. (GONZÁLEZ REY, 2005b; 2014). As hipóteses são resultantes da trama [de indicadores] tecida pelas interpretações do pesquisador, que busca compreender o fenômeno em estudo sem fragmentar a rede de relações e contextos envolvidos nos processos subjetivos, que envolve a realidade de vida humana. Neste sentido, o recorte empírico da pesquisa construtivo-interpretativa, embora direcione o processo construtivo das hipóteses ao objetivo do estudo e consequentemente à construção do modelo teórico, não limita a compreensão da rede de produções subjetivas, que por sua natureza dinâmica, fluida e processual requer a constante abertura para novas articulações entre o teórico e o empírico.

As hipóteses correspondem à produção do pesquisador e estão em constante desenvolvimento no curso da pesquisa, sendo partes constitutivas do processo de construção teórica da pesquisa. No curso do processo construtivo-interpretativo, o pesquisador precisa manter-se crítico e reflexivo em relação às hipóteses construídas, que podem ser reafirmadas ou refutadas diante dos novos elementos que surgem no decorrer da investigação tal como González Rey (1997) explica:

Neste processo configuracional se seguem de forma simultânea várias hipóteses abertas diante do conteúdo expresso pelo sujeito (participante) [...] e formam parte dos momentos de sínteses do referido processo, mas em outros casos são descartadas diante da impossibilidade de segui-las através da informação produzida (p. 157)

that are theoretically constructed by the researcher in such a process in which the researcher‘s ideas and the meanings produced from the empirical material are inseparable.‖ (p. 204).

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Esta teia interpretativa que se constrói, se configura, se desconfigura e se reconfigura ao integrar novas informações e significações [construção interpretativa do pesquisador], tornando a construção um processo continuamente e configurado de hipóteses explicativas do fenômeno em estudo. Nessa dinâmica processual de construção das informações, a geração de indicadores e formulação de hipóteses, vinculadas ao objetivo do estudo, faz emergir do entrelaçamento teórico-empírico os subsídios que fundamentam o modelo teórico resultante da pesquisa, tal como González Rey e Mitjáns Martínez (2017b) explicitam neste trecho:

A teoria é entendida como fonte de categorias e princípios teóricos que sustentam novas construções teóricas que são geradas durante a pesquisa. Os modelos teóricos são as construções teóricas, hipóteses, idéias e insights do pesquisador que regem o caminho seguido pela pesquisa. O material empírico não é definido como uma fonte externa e objetiva que rege a investigação, como algo dado na realidade; em vez disso, é visto como material empírico que só é relevante para a pesquisa através dos significados que tomam corpo na construção teórica (p. 205).36

Dessa compreensão decorre a lógica configuracional do processo construtivo- interpretativo que, nessa prática de pesquisa, é representada pela construção gradual do pesquisador que, como já mencionado, não define a priori nenhum conceito ou expectativa sobre a construção a ser configurada no curso da investigação. (GONZÁLEZ REY, 2005b). Em síntese, no âmbito desta pesquisa, os sentidos subjetivos e configurações subjetivas relacionadas aos casos em estudo, resultam da lógica configuracional representada pelas construções hipotéticas do investigador, frente um conjunto de expressões do participante. González Rey e Mitjáns Martínez (2017d), ilustram bem o processo construtivo das informações no trecho a seguir:

O problema vai se esclarecendo, aprofundando e desdobrando no curso da pesquisa – quando novas ideias surgem no pesquisador como resultado desse processo – e vai gerando novos desafios que se integram no modelo teórico dentro do qual o problema avança como parte do processo de construção da informação (p. 93).

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―The theory is understood to be a source of theoretical categories and principles that support new theoretical constructions that are generated during the research. The theoretical models are the theoretical constructions, hypotheses, researcher‘s ideas and insights that rule the path followed by the research. The empirical material is not anymore defined as an external and objective source that rules the investigation, as something given in reality; rather, it is viewed as empirical material that is only relevant to the research through the meanings through which it becomes part of the theoretical construction.‖ (p. 205).

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A lógica configuracional37 que caracteriza o processo construtivo-interpretativo é descrita por Goulart (2017) de forma mais detalhada:

Nessa proposta, evitam-se conclusões gerais de caráter indutivo com base nas informações analisadas, de modo que a ênfase é dada em construções interpretativas graduais baseadas em indicadores, que, a partir de seus pontos de convergência, vão se desdobrando em hipóteses mais abrangentes. Esse jogo recursivo entre indicadores e hipóteses, somado às construções teóricas que o acompanha, forma o modelo teórico sobre o problema estudado. (GOULART, 2017, p. 92).

Nesta perspectiva metodológica, o conjunto de instrumentos utilizados e a forma pela qual se constrói a informação na pesquisa buscam superar as típicas e inevitáveis diferenças entre a expressão intencional do participante e a realidade de sua constituição subjetiva. O processo construtivo-interpretativo favorece a compreensão das expressões do participante para além do explícito em sua fala, sua escrita e demais formas de linguagem, mesmo diante da eventual e inevitável ―expressividade positiva‖. Podemos afirmar que o dilema da ―resposta socialmente esperada‖, impossível de ser evitada no campo da pesquisa em geral, no método construtivo-interpretativo se converte em pistas, que na linha interpretativa do pesquisador perspicaz favorece suas construções e hipóteses sobre o problema em estudo. (GONZÁLEZ REY, 2005a).

Fleer, González Rey e Veresov (2017) enfatizam o importante papel dos indicadores e hipóteses na investigação focalizada na compreensão dos sentidos subjetivos e configurações subjetivas: ―Um grupo de indicadores, construídos gradualmente pelo pesquisador, torna as hipóteses consistentes e capazes de serem integradas à construção do modelo teórico, possibilitando gerar inteligibilidade aos sentidos subjetivos e configurações subjetivas‖ (p. 5,

tradução nossa)38.

A fundamentação teórica deste estudo está em plena coerência com os princípios da Epistemologia Qualitativa e assim, somente a partir do método construtivo-interpretativo tornou-se possível compreender a configuração subjetiva da criatividade profissional, como forma de avançar na compreensão do desenvolvimento da criatividade. A configuração subjetiva torna-se passível de compreensão somente a partir de sentidos subjetivos a ela

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Lógica configuracional é uma forma de produção de conhecimento neste marco teórico de caráter irregular e contraditório e que constitui um processo aberto e diferenciado para cada participante, cujas construções teóricas parciais e específicas se mantém integradas entre si. (GONZÁLEZ REY, 2005a).

38 ―A group of indicators constructed by the researcher gradually become a consistent hypothesis capable of being integrated within the on going theoretical model, able to generate intelligibility on subjective senses and subjective configurations‖. (FLEER; GONZÁLEZ REY; VERESOV, 2017, p. 5).

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associados, os quais por seu caráter contínuo, incontrolável, imprevisível, inconsciente, altamente dinâmico e fluido, não admitem ser identificados de forma direta. Diante dessa imprevisibilidade da rota de produção de conhecimento científico sobre processos humanos complexos envolvidos na subjetividade, o método construtivo-interpretativo, tal como apresentado neste capítulo, demandou e favoreceu o posicionamento ativo, reflexivo e criativo da pesquisadora, favorecendo o espaço social dialógico, aberto e flexível diante das novas situações que surgiam no decorrer das experiências desta pesquisa.