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Modalidade EpistemológicaModalidades

2.4. A EXPRESSÃO DA MODALIDADE

A modalidade, um domínio semântico-discursivo, pode ser expressa por uma variedade de meios nas línguas naturais: morfológicos, lexicais, sintáticos ou prosódicos, podendo ocorrer um ou mais meios de marcação simultaneamente.

Segundo Palmer (1986), a modalidade pode ser marcada pelo uso de verbos modais, pelo modo e por partículas e clíticos.

Com relação aos verbos auxiliares modais, o autor chama a atenção para o fato de que uma mesma forma pode servir à expressão da modalidade epistêmica e deôntica, como ocorre em inglês e em várias línguas, como as indo-européias, as semíticas e as filipinas. Dessa forma, verbos como “poder” e “dever” apresentam leitura ora epistêmica, ora deôntica, ou seja, são polissêmicos. Assim, o modal poder36 pode expressar tanto

possibilidade deôntica (permissão/ sugestão), quanto uma possibilidade epistêmica. Daí a

importância de considerar-se o contexto em que estão inseridos os modais, uma vez que são os contextos que condicionam as interpretações de poder e dever como argumenta Silva-Corvalán (1995).

Além dos verbos modais, o modo, principalmente o subjuntivo, pode servir à expressão da modalidade. Entretanto, vale ressaltar que a modalidade não está estritamente relacionada às características verbais, podendo, pois, ser marcada por meio de partículas, encontradas em línguas como o Alemão, Japonês, Huichol (México) e Luiseño (Uto- azteca, Califórnia)37. Tais partículas não necessitam ocorrer como parte integrante do verbo, mas podem ocorrer em várias posições a depender da língua e de sua relevância na cláusula (PALMER, 1986, p. 43- 46).

Neves (1996) também diz que a modalidade pode ser expressa por verbos (auxiliares modais ou plenos), advérbios, adjetivos em posição predicativa, substantivos e pelas categorias gramaticais do verbo, tais como aspecto, tempo e modo. Além disso, a autora acrescenta alguns expedientes sintáticos, como a unipessoalização, apassivização, bem como os meios prosódicos. Estes, por necessitarem de aparato especial, não serão examinados por nós no estudo da modalidade deôntica.

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Segundo Mesquita (1999, p. 68-69), o verbo poder pode designar possibilidade epistêmica, deôntica e ainda ser usada para expressão da capacidade. A autora ressalta ainda outros usos do verbo com o valor de “agüentar”, “suportar” (“A criança não podia com o peso”).

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Koch (2004) define como modalizadores qualquer elemento lingüístico que está relacionado ao evento de produção do enunciado e que indica as intenções, sentimentos e atitudes do locutor com relação ao discurso. Em língua portuguesa, são vários os meios de lexicalização da modalidade, tais como:

a) os performativos explícitos: eu ordeno, eu proíbo, eu permito, etc.; b) os auxiliares modais: poder, dever, querer, precisar, etc.;

c) os predicados cristalizados: é certo, é preciso, é necessário, é provável, etc.;

d) os advérbios modalizadores: provavelmente, certamente, necessariamente,

possivelmente, etc.;

e) modos e tempos verbais, etc.;

De qualquer modo, seja qual for o meio de expressão da modalidade vale ressaltar que

O recurso às modalidade permite, pois, ao locutor marcar a distancia relativa em que se coloca com relação ao enunciado que produz, seu maior ou menor grau de engajamento com relação ao que é dito, determinando o grau de tensão que se estabelece entre os interlocutores; possibilita-lhe também, deixar claros os tipos de atos que deseja realizar e fornecer ao interlocutor “pistas” quanto às suas intenções (...) (KOCH, 2004, p. 86).

Assim, a categoria modalidade constitui um recurso ao qual recorremos a fim de fornecermos indícios acerca de nossas opiniões, crenças, desejos, bem como, o grau de comprometimento com o que se diz. Além disso, a opção por determinados modalizadores é feita levando em consideração a informação pragmática do Ouvinte, de modo a modificá- la.

2.5. SÍNTESE CONCLUSIVA

Entendendo que a modalidade constitui uma categoria lingüística por meio da qual o falante codifica conteúdos e intenções, segundo seu conhecimento ou normas de conduta, de modo a atuar sobre o ouvinte, buscamos traçar um panorama que nos possibilitasse, ao final, tomar uma decisão quanto à tipologia a ser seguida em nossa análise. Vimos que as abordagens que seguem um ponto de vista estrito não conseguem atingir o efeito comunicativo do enunciado produzido pelo falante, uma vez que as análises não dão conta da função interpessoal da linguagem.

O exame da cláusula proposto pela gramática funcional (Dik, Goossens, Hengeveld, etc.) permite que se identifiquem diferentes instâncias de modalização, já que é possível identificar o escopo de atuação dos modalizadores. Além disso, uma abordagem funcional da modalidade requer a consideração do contexto de produção dos enunciados modalizados, uma vez que o mais importante é o caráter interacional da linguagem. Desse modo, sintetizamos a seguir a proposta de Hengeveld (1988) para a categoria modalidade, além de fornecermos informações acerca do nível de atuação do modalizador e os meios de expressão em cada nível:

Quadro 6: Tipologia das modalidades: nível de atuação do modalizador e meios de expressão

Modalidade Subdivisão Função Nível

Meios de Expressão

Inerente ____ Caracterizar a relação entre um participante e um EC Interno ao EC Operadores de predicados Epistêmica Avaliar a realidade de

um estado-de-coisas, segundo seu conhecimento (certo>provável>possív el>improvável>impossí vel). Predicação Predicados encaixadores (adjetivo em posição predicativa) e operadores de predicado Objetiva Deôntica Avaliar a realidade de

um estado-de-coisas, segundo convenções morais, sociais e legais.

Predicação Predicados encaixadores (adjetivo em posição predicativa) e operadores de

predicado

Subjetiva Expressar o

comprometimento do falante com relação à verdade da proposição, cuja fonte de informação é o próprio falante. Proposição Predicados encaixadores (adjetivo em posição predicativa) e operadores de predicado e satélites

Epistemológica Evidencial Expressar o

(des)comprometimento do falante, que pode não se apresentar como fonte de informação, com relação à verdade da proposição. Proposição Predicados encaixadores (adjetivo em posição predicativa) e operadores de predicado e satélites

Com relação à marcação desta categoria, as línguas naturais dispõem de uma infinidade de meios lexicais, gramaticais, sintáticos, entonacionais, etc. Ressaltamos, ainda, a relação entre a Modalidade e outras categorias como Tempo, Aspecto, Modo e Polaridade, a fim de que possamos compreender os efeitos de sentido que estas emprestam àquela.

CAPÍTULO 3