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A formação superior é almejada por muitos jovens e adultos, pois as exigências sociais da atualidade reforçam a idéia da formação, nesse nível, para a ascensão no mundo do trabalho. A universidade é o locus principal da formação do professor que se dá por meio dos cursos de Pedagogia e Licenciaturas, no entanto, muitos estudantes não estiveram ou não estão inseridos nas universidades, e sim, nas faculdades isoladas, privadas. As interlocutoras desta pesquisa tiveram a formação, em nível superior, em instituições privadas, sendo que, 6 delas em faculdades privadas e 3 em universidades privadas, na época da conclusão do curso, como ilustra o quadro a seguir:

Quadro 1 – Instituições freqüentadas pelas interlocutoras

Interlocutoras Graduação Instituição / ano

Cecília Pedagogia e

Artes*

Faculdades Integradas da Católica de Brasília (1985) *Faculdade Dulcina de Moraes (1995)

Deise Pedagogia Faculdade de Filosofia Bernardo Sayão- GO (1988)

Leila Pedagogia Faculdades Integradas da Católica de Brasília (1993)

Nilda Pedagogia Faculdades Integradas da Católica de Brasília (1987)

Rita Pedagogia Faculdades Integradas da Católica de Brasília (1988)

Veralina Letras Faculdade Cenecista de Brasília (FACEB) (2002)

Dalva Pedagogia Universidade Católica de Brasília (1993) Mara Pedagogia Universidade Católica de Brasília (2000) Nelma Pedagogia UniCEUB (2006)

Fonte direta: (2007).

O incremento da rede privada – Instituições de Ensino Superior (IES) não foi acompanhado de uma política de qualificação dos cursos, talvez pelo número alto de IES funcionando atualmente, como se percebe pela análise feita por Sousa (2006, p.156) a partir dos dados do MEC/INEP:

Considerando os dados relativos ao número de Instituições de Ensino Superior no período entre 1994-2004, constata-se que, em 1994, existia no Brasil um total de 851 IES. Dessas, 218 eram públicas (25,6%) e 633 pertenciam ao segmento privado (74,4%). Em 2004, havia no País 2.013 Instituições de Ensino Superior, sendo 224 de natureza pública e 1.789

vinculadas à rede privada. Em termos percentuais, a esfera pública respondia por 11,1% e a esfera privada por 88,9% das IES no Brasil.

Pelos dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior13 (SINAES) 2006, no Brasil, havia 2.398 Instituições de Ensino Superior, sendo 257 (10,7%) públicas e 2.141 (89,2%) privadas. Além do grande crescimento da rede privada, concomitantemente, uma política ainda em andamento e com resultados parciais SINAES que somados à pressão econômica do capitalismo atual, geram a necessidade de certificação rápida, almejada pelos alunos para inserção no mercado de trabalho, contrariando, assim, o princípio de qualidade estabelecido pelas leis maiores do País como o art. 206 - inciso VII da Constituição Federal, e o art.4º - inciso IX da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) que destacam o padrão mínimo de qualidade do ensino, baseado no menor custo por aluno.

Essa certificação, tratando-se de um curso fragmentado, é uma forma de eliminação adiada, como afirma Freitas (2002, p.311) que faz com que “[...] a exclusão se faça, de fato, segundo a bagagem cultural do aluno, o que permite que ela ocorra no próprio interior da escola de forma mais sutil, ou seja, ‘internalizada’[...]”. Muitas vezes esses certificados acabam não abrindo portas no mercado de trabalho, pois de modo geral, o profissional recém- formado não consegue de imediato uma posição neste, de um lado em razão da formação precária e, de outro, pela escassez de postos de trabalho na sociedade atual. Esse aspecto merece reflexão, pois com todas as mudanças sociais em razão do fenômeno da globalização, a escassez de postos de trabalho e decréscimo de oportunidades de inserção no mercado deixa alguns profissionais sem emprego, mesmo que esse fenômeno não atinja da mesma forma os trabalhadores, pois muitos profissionais de várias áreas estão vindo para o magistério pela possibilidade de espaços de trabalho.

Alguns cursos têm sido denunciados como verdadeiras "fábricas de diploma", sendo coordenados por empresas de consultoria, em escolas de precária infra-estrutura física e pedagógica: sem bibliotecas, coordenação pedagógica, e com professores pouco preparados para lidar com a realidade. De fato, pode-se afirmar que todo esse processo configura-se como um nefasto fomento à certificação e/ou à diplomação e não qualificação nem formação docente para o aprimoramento das condições do exercício profissional. A formação em

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Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, instituiu o SINAES e tem como objetivo promover a qualidade da educação superior, a orientação da expansão/oferta, o aumento da eficácia institucional, a efetividade acadêmica e social e, especialmente, o aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais. Fonte: http://sinaes.inep.gov.br:8080/sinaes/. Acessado em setembro de 2007.

serviço da imensa maioria dos professores passa a ser vista como um lucrativo negócio nas mãos do setor privado e não como política pública de responsabilidade do Estado e dos poderes públicos (ANFOPE, 2004).

Nesse cenário, a formação inicial dos professores pode acontecer de forma desarticulada da prática. A interlocutora Nilda mencionou a desarticulação entre teoria e prática, quando falou do estágio no curso de Pedagogia: “No curso de Pedagogia essa questão ficou a desejar, porque fizemos uma forma de microensino para a habilitação Magistério de 2º grau. A professora do estágio nos ajudava na seleção do conteúdo e preparávamos uma aula para a nossa turma mesmo de Pedagogia”. Além das questões da prática se voltarem somente para o momento do estágio, o aluno estava distante da realidade escolar com toda sua complexidade e dimensões. Conforme Imbernón (2006, p. 61) “A estrutura da formação inicial deve possibilitar uma análise global das situações educativas que, devido à carência ou à insuficiência da prática real, se limitam predominantemente a simulações dessas situações”. Essa possibilidade de articulação entre a teoria e a prática recai somente nos estágios dos cursos de licenciaturas caracterizando, assim, um reducionismo.

Para Charlot (2005, p.95), não se trata apenas de uma desarticulação entre teorias e práticas, pois “[...] a questão é a troca entre dois tipos de teoria: uma enraizada nas práticas, nas situações, e outra enraizada no desenvolvimento de uma ciência ou de várias ciências [...]”. Essa posição reforça a importância da vivência do formando no contexto da escola durante todo o processo formativo para que se aproprie dos saberes e contextos da prática articulados ao da teoria. As perspectivas da articulação teórico-prática nas propostas curriculares, analisadas com base na concepção dialética, “[...] são consideradas o núcleo articulador da formação profissional, na medida em que os dois elementos são trabalhados de forma integrada, constituindo uma unidade indissociável” (FREITAS, 2002, p.65).

Nessa linha de compreensão muitas discussões foram encaminhadas pela Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), com o objetivo de superar a fragmentação na formação dos professores. A ANFOPE (2004) defende uma instituição, tanto pública como privada, que tenha como foco: a formação para o humano; a docência como base da formação; o trabalho pedagógico como foco formativo; sólida formação teórica e cultural; a pesquisa como princípio de formação; a reflexão sobre a formação; as condições de trabalho; e avaliação permanente dos cursos de formação profissional.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia pela Resolução Conselho Nacional de Educação / Conselho Pleno (CNE/CP) n° 5, de 13 de dezembro de 2005, aponta, dentre toda a organização do curso, o perfil profissional do egresso do curso, cabendo destacar: desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico; atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria.

Muitos fatores interferem, na boa qualidade da educação como: salários corroídos, políticas institucionais que desvalorizam os professores, condições de trabalho precárias, ausência de utilização e realização de pesquisas nos diferentes níveis de formação, falta de autonomia, assim como, a formação inicial fragmentada, dentre outros que contribuem com os altos índices de evasão e repetência na escola básica e a perda de prestígio social dos professores. A interlocutora Nilda contribui com o depoimento sobre o seu curso de Pedagogia:

Fui formanda da primeira turma em 1987, no campus novo da atual UCB em Taguatinga. Tive alguns professores muito bons, mas alguns não contribuíram muito não. Me veio à cabeça uma professora de Didática que só falava em "blocos lógicos”, coloquei entre aspas porque ela só falava nisto e eu utilizei pouquíssimo em minhas atividades, a professora nunca se preocupou em contextualizar essa prática. A turma era formada com alguns professores da SEEDF e alguns profissionais de outras áreas. Alguns colegas só queriam o diploma. Acho que, também, não contribuímos muito.

Portanto, esse depoimento revelou a ausência da construção de sentidos e contextualização do processo educativo. Essa formação fragmentada, também se constitui como um dos pontos centrais para a discussão sobre os caminhos da formação docente. Marin (1996, p. 163) contribui com a reflexão sobre o paradigma de formação de professores:

Precisamos adotar um paradigma com fundamento histórico e social para embasar nossos cursos, buscando levantar a história de vida, o processo de socialização, as expectativas, as crenças, os valores, as representações que os alunos têm no início do curso como subsídio para nosso trabalho. Desse modo, temos a chance de trabalhar tais informações ao longo do curso e fazer com que esses alunos saiam mais bem formados. O fato de ignorarmos tais informações faz com que falemos de um processo, atuemos de uma forma que não corresponde ao quadro de referências dos alunos. E aí temos

a sensação (confirmada muitas vezes) de que os alunos não passaram pelos nossos cursos!

No Distrito Federal, houve uma articulação entre a SEEDF e a Faculdade de Educação da Universidade de Brasília para a formação de 5000 professores concursados da rede pública de ensino do DF que não tinham formação em nível superior. Por questões políticas e de gestão do convênio entre as duas instituições, a FE/UnB ficou responsável pela formação de 2000 professores e um Centro de Ensino Privado, posteriormente, ficou responsável por 3000 professores da SEEDF. Na FE/UnB foi feito o planejamento e oferecido o Curso de Pedagogia para professores em exercício no Início de Escolarização (PIE), nos anos de 2001 a 2005. Na outra instituição, o curso foi chamado de Professor nota 10 e formou 3000 professores que não tinham essa formação superior, nos anos de 2002 a 2006.

Nos dois cursos, os professores-alunos estavam em plena atividade docente, pois essa era uma das exigências para o ingresso, e a articulação teórico-prática foi facilitada pela experiência profissional dos participantes que estavam imersos no cotidiano das escolas, onde trabalhavam. Foram experiências importantes nas duas instituições de formação, cada qual com seu currículo e organização pedagógica diferenciados, mas que marcaram o corpo docente da rede pública do DF por serem todos docentes em formação na instituição superior.

A possibilidade de formação inicial de boa qualidade e com condizentes condições de trabalho, como indicam a ANFOPE e as Diretrizes do curso de Pedagogia, não significa que a educação continuada seria dispensável para a formação do professor após a sua certificação, pois não possui um caráter compensatório. Segundo Imbernón (2006, p.59), a formação tem o papel de “[...] descobrir a teoria para ordená-la, fundamentá-la, revisá-la e combatê-la, se for preciso. Seu objetivo é remover o sentido pedagógico comum, para recompor o equilíbrio entre os esquemas práticos e os esquemas teóricos que sustentam a prática educativa”.

Nesse cenário, a reflexão sobre a formação inicial e continuada de professores torna- se importante, assim como a articulação entre as instituições de formação superior e a escola básica, por ser uma possibilidade de desenvolvimento profissional por meio do desvelamento desse contexto macro sócio-econômico-político em que se inserem a sociedade e a escola.