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A função da escola no PME segundo o Balanço de Literatura

ANO DE PUBLICAÇÃO

3.3 PRIMEIRAS CONCLUSÕES SOBRE O MATERIAL COLIGIDO Com o intuito de compreender como o Programa Mais Educação

3.3.1 A função da escola no PME segundo o Balanço de Literatura

A discussão acerca do Programa Mais Educação (PME) traz à tona uma temática fundamental para esta pesquisa: buscar compreender a função da escola para este Programa e seus envolvidos. Neste contato com as produções deste balanço, o foco esteve também nesta discussão onde se verificou 16 trabalhos abordando esta temática de alguma forma (CAVALIERE, 2007, 2009, 2010; CELLA, 2010; COELHO, 2011; COSTA, 2011; MIGUEL, 2012, NÓBREGA; SILVA, 2009, 2011; PINHEIRO, 2011; REGIS; PADILHA, 2010; SANTOS, 2009; SILVA, 2011; SILVA, K.N.P; SILVA, J.A., 2009; SILVA, K.N.P; SILVA, J.A., 2010, 2011).

(2011), que informou conseguir captar nas falas de alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental (E.F.) a compreensão do “papel da escola hoje, na contemporaneidade, em que funções sociais ampliadas são imputadas à instituição escolar sem que esta tenha autonomia suficiente para aceitá-las ou rejeitá-las, em nome de sua natureza – a apreensão do(s) conhecimento(s) sócio-historicamente construídos”. Segundo a autora, as reflexões de seu trabalho estão apoiadas em estudos questionadores da perspectiva que a Educação Integral visualiza na escola, propondo o deslocamento do eixo dessa instituição para o social. Em sua inconclusão, como ela mesma intitulou, a autora faz o seguinte questionamento:

Hoje, nas assim denominadas sociedades

contemporâneas, as instituições modernas vêm sendo

ressignificadas. Essa mesma instituição, a escola, aparece assim mais permeável, cabendo-lhe o

papel de conter, agora, outras funções sociais que não apenas aquela que historicamente a criou. Acreditamos que essa (com)formação gesta-se no sentido de legitimar concepções de mundo e de

sociedade que vêm buscando espaço na arena

mundial, prensada esta por processos político-sociais e político-epistemológicos cujas arestas não se conectam. E, nesse processo, onde entra a educação integral? (COELHO, 2011, p. 12) [grifo nosso].

Ao levantar esses questionamentos, Coelho proporcionou ao leitor a abertura de um leque de outras inquirições. Dentre as inúmeras possibilidades, esta pesquisa pretendeu compreender que outras funções sociais estão contidas no papel da escola segundo a documentação do PME.

Silva e Silva. (2011, p. 2) apresentaram uma entrevista com a Diretora de Educação Integral do MEC e Coordenadora do Mais Educação, Jaqueline Moll, que deixa claro qual é a função da escola para o PME:

Nós temos que trabalhar na perspectiva de uma

profunda reinvenção no modo como a escola opera e uma reinvenção que traz todo o debate

proposto por Paulo Freire, sobretudo na perspectiva de tornar esse sujeito, esse estudante de fato sujeito do seu processo educativo, então eu acho que esse é um importante [sic] em termo de pensar o que a gente tem como função da escola. [grifo nosso].

escola opera baseada em conceitos contidos no debate proposto por Paulo Freire, que não podem ser considerados inovadores, afinal, são conhecidos há décadas. Não é objetivo duvidar da relevância deste debate proposto pelo educador Paulo Freire, um dos mais notáveis da história da pedagogia mundial, mas a forma como os documentos do Mais Educação e seus divulgadores utilizam discursos evasivos para consolidar o Programa. Contudo, esta pesquisadora concorda que seja importante pensar e discutir a função da escola para o PME.

Sobre este mesmo tema, Cavaliere (2009, p. 61) apresenta algumas considerações sobre o papel socializador da escola, quando alerta que:

Construir uma escola a mais justa possível, a mais democrática possível, com papel socializador efetivo,

atenta aos novos saberes e questões do

conhecimento, muito provavelmente incluirá a ampliação do seu tempo e a estabilidade de seus atores. Implicará, principalmente, melhor definição de sua identidade institucional. Essa melhor definição requer seu fortalecimento como local público destinado a garantir o desenvolvimento e o bem-estar de todas as crianças e jovens brasileiros. [grifo nosso].

Talvez seja preciso analisarcomo Cavaliere – assim como o próprio PME –compreendem termos como democracia, justiça, ampliação do tempo, bem-estar. Contudo, é foco desta pesquisa compreender como o Programa contribui para a construção da função da escola e quais as consequências desta contribuição para o papel do professor.

Em trabalho publicado anteriormente, a autora informa que identificou quatro concepções de escola de tempo integral, cada uma com um papel específico. A visão predominante, segundo Cavaliere (2007, p. 1028-1029), de cunho assistencialista, vê a escola para os desprivilegiados, que deve suprir deficiências gerais da formação dos alunos, onde o mais importante não é o conhecimento, mas sim a ocupação do tempo e a socialização primária. Outra visão é a

autoritária, com o discurso de que é melhor estar na escola do que na

rua, esta visão vê a escola como espécie de lugar de prevenção ao crime. A terceira concepção é a democrática, que defende um papel emancipatório para a escola, vendo na ampliação do tempo um meio de proporcionar uma educação mais efetiva do ponto de vista cultural, de conhecimentos, do espírito crítico e vivências democráticas. Por último,

a concepção mais recente, intitulada pela autora de multissetorial, que pode acontecer ou não na escola, com ação de diversos setores e onde o Estado compartilha sua responsabilidade de educação frente ao mundo contemporâneo.

Quanto a isso, Pinheiro (2011, p. 51) chama atençãopara o fato de que algumas propostas de Educação Integral utilizam concepções de forma interligada, podendo ter mais de uma abordagem.

Rosenei Cella (2010, p. 47) ao analisar o texto do PNE (BRASIL, 2001), no qual o Mais Educação é previsto, observou as novas responsabilidades atribuídas às escolas:

O texto faz referência também às responsabilidades

sociais atribuídas à escola e que extrapolam o simples ensinar, pois os alunos precisam ter um atendimento social mínimo que lhes garanta renda

mínima, além dos programas como alimentação escolar, transporte escolar e livro didático. [grifo nosso].

Ora, a partir do momento em que é repassada para a escola a responsabilidade de atendimento social, retira-se do Estado esta sua função e sobrecarrega-se a escola com funções que, obviamente, não pode (e talvez não deva) dar conta, já que não possui estrutura e condições materiais, funcionais, de pessoal e/ou financeira para exercê-la. Afinal será que realmente é pretendido que a escola consiga dar conta de mais esta função? Quando Cella afirmou que essas funções extrapolam o “simples” ensinar, que na verdade não tem nada de simples, desmerece, ao menos na leitura desta pesquisadora, a principal e mais importante função da escola, que é ensinar! É justamente esta função que tem sido constantemente apagada e camuflada dentro das políticas educacionais em curso.

Ponce e Barros Neta (2011, p.6) afirmaram que a função social da instituição escolar “é debatida no Programa Mais Educação, inclusive com citação de um trecho do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932) em que se trata da fecundidade da ação educativa da escola no meio social, em relação aos conteúdos escolares”. O trecho referido61

61 O trecho citado é o que segue: A Escola antiga, presumida da importância do seu papel e

fechada no seu exclusivismo acanhado e estéril, sem o indispensável complemento e concurso de todas as outras instituições sociais, se sucederá a escola moderna, aparelhada de todos os recursos para atender e fecundar a sua ação na solidariedade como meio social, em que então, e só então, se tornará capaz de influir, transformando-se num centro poderoso de

pelas autoras foi citado num dos documentos referenciais da série Mais Educação (BRASIL, 2009a) justificandoseu intuito em contribuir no conhecimento da história da educação visando proporcionar o debate sobre o papel e a função social exercida pela escola.

Com base nos estudos de Bourdieu sobre capital cultural alguns autores do balanço (CAVALIERE, 2007; SILVA, 2011) discutiram o papel da escola. Silva (2011, p. 29-30) observou a importância de discutir o papel da escola e da pedagogia em agravar, ou não, as desigualdades sociais a medida em que privilegia a cultura dominante ao construir e favorecer ações pedagógicas e práticas avaliativas que só servem para reforçar essas distinções. Na opinião de Silva (2011, p. 31) é preciso, para compreender a função da escola, discutir amplamente a ação pedagógica, os conteúdos curriculares e os procedimentos de avaliação dos sistemas de ensino – fatores que tornam a escola conservadora e reprodutora das desigualdades sociais e culturais. E, complementando, que são consequências das desigualdades econômicas.