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4 POSSÍVEIS ADAPTAÇÕES PARA O SUS DA ESTRUTURA E PRÁTICA DO

4.1 O Financiamento da Saúde Brasileira

4.1.1 A Gestão Financeira do SUS

Os recursos destinados ao orçamento da saúde, na conformidade do artigo 33 da Lei nº 8.080/1990, devem ser depositados em conta especial a ser manipulada pelo ente federativo dela titular. As transações serão fiscalizadas pelos conselhos de saúde. Já se teve ocasião apropriada, no decorrer desta monografia, para apresentar as características do importante instrumento de participação e representação popular que é o conselho de saúde165, de conceito explorado na Lei nº 8.142/1990.

Explica-se: no âmbito federal, a União, representada pelo Ministério da Saúde, movimenta todas as receitas por ela arrecadadas destinadas à área da saúde sob a fiscalização do Conselho Nacional de Saúde, por meio da já referida conta especial, que vem a ser, nessa órbita, o Fundo Nacional de Saúde (FNS). Há simetria quanto a esse ponto em relação a Estados, Distrito Federal e Municípios.

O artigo 2º da Lei nº 8.142/1990 informa que os recursos do Fundo Nacional de Saúde são alocados na forma de despesas de custeio e de capital do Ministério da Saúde, seus órgãos e suas entidades, da administração direta e indireta; investimentos previstos em lei orçamentária, de iniciativa do Legislativo e aprovados pelo Congresso Nacional;

162 OECD. Health spending (indicator). 2016. Disponível em: <https://data.oecd.org/chart/4xvL>. Acesso em:

14 mai. 2016.

163 OECD. Gross Domestic Product (GDP) (indicator). 2016. Disponível em:

<https://data.oecd.org/chart/4xvM>. Acesso em: 14 mai. 2016.

164Os autores Carvalho e Santos traduzem essa primeira fonte de recursos como serviços que não “interferem no

atendimento médico-hospitalar, não estando diretamente ligados ao atendimento assistencial. Por exemplo: as perícias, os laudos, a assistência técnica etc.” (CARVALHO, Guido Ivan de; SANTOS, Lenir. Sistema Único de

Saúde: comentários à Lei Orgânica da Saúde (leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90). 4. ed. Campinas: Editora da

Unicamp, 2006. p. 202).

investimentos previstos no Plano Quinquenal do Ministério da Saúde e cobertura das ações e dos serviços de saúde a serem implementados pelos Municípios, Estados e Distrito Federal.

Ressaltando-se o último item: tal destinação às pessoas jurídicas mencionadas se faz essencial à medida que se aprofunda a descentralização político-administrativa sanitária, que deve ser seguida pela descentralização fiscal.

Com efeito, as transferências entre a União e as demais esferas federais são obrigatórias, fato confirmado pela própria EC 29/2000 (art. 198 §3º, II, CRFB/88). Se há enunciado constitucional frisando essa obrigatoriedade, desaparece-se a carência de mecanismos assemelhados a convênios ou pactos para que o repasse de verbas se verifique na prática e justifica-se o comando do artigo 3º da Lei nº 8.142/1990 a respeito das formas regulares e automáticas dessas transações, regulamentadas pelo Decreto nº 1.232/1994.

Na verdade, havia discussão sobre o aspecto da automaticidade das transferências na década de 1990, por parte do Ministério da Saúde, de posição centralizadora. Porém, após amplos debates, interpretou-se a real vontade do constituinte de atribuir a obrigação do prestar da saúde pública, por meio do SUS, aos demais entes federativos que não a União166.

Se os Estados, o Distrito Federal ou os Municípios desejam receber as receitas oriundas das transferências provenientes do âmbito federal, devem adequar-se aos critérios especificados no artigo 4º da Lei nº 8.142/1990: possuir Fundo de Saúde, Conselho de Saúde, plano de saúde, relatórios de gestão, contrapartida de recursos para a saúde no próprio orçamento e comissão incumbida de elaboração do Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS).

Embora seja certa a transferência automática e regular dos recursos da União para os demais entes, no art. 35 da Lei nº 8.080/1990167, existem sete critérios para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, os quais precisam ser analisados por programas e projetos, de forma harmônica, entre si e com os artigos 36, 37 e 47 da mesma lei. Assim se precisa proceder para que não se dê margem ao surgimento de empecilhos às transferências automáticas e regulares.

166 CARVALHO, Guido Ivan de; SANTOS, Lenir. Sistema Único de Saúde: comentários à Lei Orgânica da

Saúde (leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90). 4. ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2006. p. 210-211.

167 Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será

utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: I - perfil demográfico da região;

II - perfil epidemiológico da população a ser coberta;

III - características quantitativas e qualitativas da rede de saúde na área; IV - desempenho técnico, econômico e financeiro no período anterior;

V - níveis de participação do setor saúde nos orçamentos estaduais e municipais; VI - previsão do plano qüinqüenal de investimentos da rede;

O art. 47, em destaque, informa a criação de um sistema nacional de informações em saúde, integrado em todo o Brasil, que abrangerá questões epidemiológicas e de prestação de serviços. Essas questões são as mesmas relatadas pelo art. 37, ao impor que as características epidemiológicas e da organização dos serviços de saúde, em cada jurisdição administrativa, influenciarão a elaboração dos planos de saúde de diretrizes emanadas do Conselho Nacional de Saúde.

Para arrematar o raciocínio, cita-se o art. 36, que, ao falar do planejamento orçamentário do SUS, determina que ele será ascendente, do nível local ao federal, de maneira a serem compatibilizadas as necessidades da política de saúde com a disponibilidade de recursos em planos de saúde dos Municípios, dos Estados, do Distrito Federal e da União.

A interpretação sistemática feita168 acarreta a compreensão de que os elementos

do art. 35 não se devem contrapor à necessidade de as transferências interfederativas serem automáticas e regulares, pois isso engessaria o sistema, burocratizando os repasses de verbas para a saúde pública, o que não é compatível com a vontade do constituinte, conforme se percebe pelos ditames da EC 29/2000.

Apesar disso, é interessante se extrair da relação feita que o rol do art. 35 é organizado em uma classificação dual no art. 37, entre características epidemiológicas e organização dos serviços de saúde. Os elementos dessa classificação são bastante importantes na feitura do planejamento orçamentário e gerencial do SUS, pois fornecem bases comparativas entre as situações da saúde das regiões brasileiras, que serão devidamente organizadas pelo sistema nacional de informações em saúde.

Todas as movimentações financeiras interfederativas, partindo dos Fundos de Saúde nacional, estadual ou municipal, são fiscalizadas, de acordo com o art. 33 da Lei nº 8.080/1990, pelos Conselhos de Saúde respectivos. Essa função advém, principalmente, do artigo 1º §2º da Lei nº 8.142/1990, o qual leciona sobre a atividade de controle da execução das políticas de saúde pelos Conselhos, até mesmo nos aspectos econômicos e financeiros. A EC 29/2000 também reforça essa responsabilidade ao incluir o § 3º no art. 77 do ADCT169.