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A I NGESTÃO

No documento PEDRO MANUEL DA FONSECA ANTUNES (páginas 93-98)

2.3. I MPORTÂNCIA A MBIENTAL DOS PCDD/F S E PCB S

2.3.1. A E XPOSIÇÃO H UMANA A PCDD/F S E PCB S

2.3.1.1. A I NGESTÃO

Considerando o caso dos seres humanos em particular, verifica-se que a exposição a estas substâncias é fortemente condicionada pela ingestão de alimentos contaminados. A ingestão oral assume portanto um papel preponderante contribuindo com cerca de 90 a 95% do valor de toda a carga de PCDD/Fs assimilada [6]. Uma vez que os congéneres de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina são lipossolúveis e de difícil degradação, estes tendem a acumular-se no topo da cadeia alimentar, em especial nos alimentos ricos em gorduras, tais como, a carne de vaca, o leite, a carne de porco, os ovos e outros. Na tabela 2.13, apresentam-se os níveis de congéneres de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina detetados em diferentes amostras de alimentos dos EUA.

Tabela 2.13. – Teor de PCDD/Fs e PCBs em diferentes tipos de alimentos comercializados nos EUA. [53]

A sigla NQ corresponde a parâmetro não quantificado durante o ensaio, isto é, o valor de concentração obtido pela análise foi inferior ao limite de quantificação do método (LQ). Na tabela existem dois tipos de valores de concentração, respetivamente os Limites Inferiores de Concentração – LIC (sempre que a concentração do congénere é inferior ao limite de deteção do método considera-se que o seu valor de concentração na amostra é zero, isto é, ND = 0) e os Limites Superiores de Concentração - LSC (sempre que quando a concentração do congénere é inferior ao limite de deteção do método considera-se que o seu valor de concentração na amostra é metade do respetivo limite de deteção, ND = ½ LD). a) Valor corrigido pelo fator 1,08 para compensar a ausência de dados. b) Valor corrigido pelo facto 1,08 para compensar a ausência de dados. c) O valor real pode ser maior.

CARNE PEIXE LACTICÍNIOS

Ovos Vegetais Leite humano Bife

de vaca

Galinha Porco Salchichas

Peixe de oceano Peixe de água doce

Manteiga Queijo Gelado

Percentagem

Lipídica (%) 13,1 5,3 9,2 28,6 1,4 4,8 89,1 21,8 2,15 14,7 2,7 3,70

CONGÉNERES Concentração em ng OMS-TEQ/kg peso fresco

(OMS TEF 1998) PCDDs 0,189 0,097 0,124 0,165 0,115 0,472 0,467 0,218 0,079 0,125 0,047 0,257 PCDFs 0,083 0,107 0,111 0,130 0,083 0,338 0,195 0,123 0,052 0,184 0,031 0,089 ∑ PCDDs+PCDFs 0,272 0,204 0,234 0,294 0,198 0,810 0,662 0,341 0,131 0,307 0,078 0,346 PCBs non-orto 0,041 0,040 0,070 0,072 0,086 0,619 0,340 0,105 0,017 0,029 0,007 0,075 PCBs mono-orto 0,084 0,090 0,088 0,146 0,106 0,297 0,114 0,024 NQ 0,006 0,002 - ∑ PCBs 0,125 0,130 0,158 0,218 0,192 0,916 0,455 0,129 - 0,036 0,008 - TOTAL TEQ (LSC) (ND=1/2 LD) 0,397 0,334 0,392 0,512 0,390 1,726 1,117 0,470 0,160 a) 0,343 0,086 0,420c)

TOTAL TEQ (LIC)

(ND=0) 0,163 0,141 0,121 0,304 0,164 1,578 0,823 0,173 0,022

b)

0,072 0,008 0,417 c)

A tabela 2.13 mostra, que se verifica uma tendência entre o decréscimo dos níveis de PCDD/Fs e PCBs e a percentagem lipídica do respetivo alimento, ou seja regra geral, quanto maior é a percentagem de lípidos de um alimento maior é o seu nível de concentração em PCDD/Fs e PCBs (excluindo o caso do peixe de água doce). Este facto não será de estranhar, uma vez que sendo estas substâncias bastante lipofílicas, elas apresentam valores de log Kow relativamente elevados (ou seja, superiores a quatro). Verifica-se portanto, e em consonância com o que foi referido, que os vegetais estão entre os alimentos, nos quais, os níveis de concentração de PCDD/Fs e PCBs são menores (consequência de uma reduzida massa lípidica). A tabela 2.13 permite ainda constatar, que os níveis de congéneres de PCDD/Fs e PCBs de alguns alimentos oscilam entre 0,008 ng OMS-TEQ/kg (vegetais) e 1,578 ng OMS-TEQ/kg (peixe de água doce), no que respeita aos limites inferiores, e entre 0,086 ng OMS-TEQ/kg (vegetais) e 1,726 ng OMS-TEQ/kg (peixe de água doce), no que respeita aos limites superiores

Relativamente a Portugal, verifica-se que já existem alguns dados disponíveis que permitem avaliar os níveis destas substâncias nos alimentos que são comercializados. Na tabela 2.14, apresentam-se os valores de concentração em I-TEQ para alguns alimentos disponibilizados ao público.

Tabela 2.14.– Teor de PCDD/Fs e PCBs em alimentos comercializados em Portugal.

Na tabela existem dois valores de concentração, respetivamente os Limites Inferiores de Concentração – LIC (sempre que a concentração do congénere é inferior ao limite de quantificação do método considera-se que o seu valor de concentração na amostra é zero) e os Limites Superiores de Concentração – LSC (sempre que a concentração do congénere for inferior ao limite de quantificação do método considera-se que o seu valor de concentração na amostra é idêntico ao valor do imite de quantificação). Assim salienta-se, que relativamente à definição de limites superiores e inferiores de concentração, nesta tabela foram utilizadas as recomendações do Regulamento (CE) N.º 1881/2006, da Comissão de 19 de Dezembro de 2006, que fixa os teores máximos de certos contaminantes presentes nos géneros alimentícios. Tal como o leitor pode constatar, a diferença entre a definição de limites inferiores e superiores de concentração desta tabela, por comparação com a tabela 2.13, consiste no facto de nesta ser utilizado o limite de quantificação do método, enquanto que na anterior se utiliza limite de deteção.

CONGÉNERES

Concentração em ng OMS-TEQ/kg peso fresco

(OMS TEF 1998)

Enguia Raia Safio Carne Bovina Ovos de

Galinha Pão de Alho

PCDDs 0,80 0,84 0,46 0,53 1,5 0,53 PCDFs 0,50 0,50 0,35 0,31 0,95 0,35 ∑ PCDDs + PCDFs 1,29 1,41 0,81 0,84 2,5 0,87 PCBs non-orto 2,9 0,89 4,4 0,22 2,4 0,07 PCBs mono-orto 1,2 0,12 0,78 0,03 0,002 0,008 ∑ PCBs 4,1 1,01 5,2 0,24 2,4 0,08 TOTAL TEQ (LSC) (ND= LQ) 5,4 2,4 6,0 1,1 4,8 0,95

TOTAL TEQ (LIC)

(ND=0) 4,8 1,1 5,2 0,03 2,5 0,08

Comparando os valores das tabelas 2.13 e 2.14, verifica-se que embora no global os valores das amostras recolhidas em Portugal sejam um pouco superiores, os resultados são relativamente concordantes.

Na tabela 2.15 apresentam-se mais resultados sobre os níveis destas substâncias em alimentos. Salienta-se que estes valores foram obtidos através da consulta de literatura científica, sendo que os teores das amostras são apresentados no sistema internacional (em I-TEQ).

Tabela 2.15. – Teor de PCDD/Fs em diferentes tipos de alimentos. [6]

ALIMENTO VALORES DE CONCENTRAÇÃO AUTORES DO ESTUDO

Batatas 0,04 ng I-TEQ/kg HMSO

Peixe

ND - 85 ng I-TEQ/kg Travis et al. 18,1 - 43,4 ng I-TEQ/kg gordura Beck et al.

0,48 ng I-TEQ/kg HMSO

Carne

0,2 – 1,66 ng I-TEQ/kg gordura Beck et al.

0,68 ng I-TEQ/kg HMSO

Frango 0,33 ng I-TEQ/kg HMSO

Ovos

1,07 ng I-TEQ/kg Beck et al.

0,19 ng I-TEQ/kg HMSO

Azeite vegetal 0,65 ng I-TEQ/kg HMSO

Hortícolas/vegetais 0,02 ng I-TEQ/kg HMSO Fruta 0,05 ng I-TEQ/kg gordura HMSO

Tendo em atenção os dados anteriores, e considerando o caso de uma alimentação típica de Portugal, constituída por sete grupos de alimentos com as proporções seguintes [54]:

1. Cereais e derivados e tubérculos (28% em massa); 2. Hortícolas (23% em massa);

3. Fruta (20 % em massa); 4. Lacticínios (18% em massa);

5. Carnes, peixes e ovos (5% em massa); 6. Leguminosas (4% em massa);

7. Gorduras e óleos (2% em massa).

Considerando também, que cada um destes grupos de alimentos apresenta funções e caraterísticas nutricionais específicas, pelo que, todos eles devem estar presentes na alimentação diária, não devendo ser substituídos entre si.

Verificando ainda, relativamente à água, que embora esta não possua um grupo específico está representada nos sete, uma vez, que todos os alimentos, em maior ou menor grau, possuem água na sua constituição.

Assim, face ao exposto e atendendo a todas as considerações enunciadas, verifica-se que o teor de congéneres de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina, que resulta da ingestão humana de alimentos, pode assumir os valores da tabela 2.16.

Tabela 2.16. – Consumo diário de alimentos em Portugal e estimativa de PCDD/Fs assimilado. a)

Valores retirados da tabela 2.15. b) Valores retirados da tabela 2.13 (no caso dos laticínios corresponde à média da manteiga, queijo e gelado). c) Valores retirados da tabela 2.14 (média dos peixes, a carne bovina e os ovos). d) Nestes cálculos utilizaram-se os valores dos Limites Inferiores de Concentração para cada alimento. Salienta-se ainda, que optou-se por utilizar simplesmente a notação TEQ, pois os dados das tabelas 2.13, 2.14 e 2.15 não são apresentados todos no mesmo sistema de TEF. Neste sentido refere-se, que para o propósito da comparação não é significativamente relevante a diferença de sistemas, uma vez, que os TEF atribuídos pelos distintos organismos não são muito discrepantes (tabela 2.12).

GRUPO DE ALIMENTO Consumo diário equivalente

[54]

(g)

Níveis de PCDD/Fs e PCBs [ng TEQ/kg peso fresco]

Total assimiladod) [ng TEQ/kg alimento]

Cereais/derivados/tubérculos 460 (cerca de 7 porções) 0,04 a) 0,018

Hortícolas 380 (cerca 2,5 porções) 0,02 a) 0,0076

Fruta 330 (cerca de 2 porções) 0,008 b) 0,003

Laticínios 300 (cerca de 2 porções) 0,339 b) 0,102

Carnes/peixes/ovos 80 (cerca de 2 porções) 2,73 c) 0,218

Leguminosas 70 (cerca de 1 porção) 0,02 a) 0,0014

Gorduras/óleos 30 (cerca de 2 porções) 0,65 a) 0,020

TOTAL 1650 3,9 0,370

Assim, de acordo com os dados da tabela 2.15, para uma pessoa normal cujo peso médio corresponde a 70 kg (no caso dos homens) e 55 kg (no caso dos mulheres), verifica-se que a dose diária assimilada com essa dieta corresponde a 5,3 pg TEQ/kg massa corporal/dia para os homens (respetivamente, 0,370 ng TEQ/70 kg) e 6,7 pg TEQ/kg massa corporal/dia para as mulheres (respetivamente, 0,370 ng I-TEQ/55 kg).

Em 2002, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO – Food and Agriculture Organization) e o Comité Conjunto de Peritos em Aditivos Alimentares da Organização das Nações Unidas (JECFA – Joint FAO/WHO Expert Committee on Food Additives), estabeleceram o valor provisório tolerável para a assimilação diária em 70 pg OMS-TEQ/kg massa corporal/mês, para os congéneres de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina (de agora em diante utilizar-se-á a sigla m.c. para designar massa corporal) [55]. Tal como referido na tabela 2.16, embora os resultados apresentados sobre os teores de congéneres de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina estejam em TEQ e o valor estabelecido pela OMS esteja em OMS-TEQ, para o propósito da comparação, não é relevante a diferença de sistemas, dado que os TEF atribuídos pelos distintos organismos não são significativamente diferentes (tabela 2.12). Assim, é comum aparecer na literatura científica apenas a menção a TEQ quando se pretende aferir a dose diária tolerável, podendo não se discriminar portanto, qual é o tipo de sistema que está a ser utilizado. Deste modo, verifica-se que os valores de assimilação mensal de PCDD/Fs e PCBs com atividade de dioxina, que foram determinados com base neste estudo, são para o caso dos homens e mulheres, respetivamente 158 pg TEQ/kg m.c./mês e 202 pg TEQ/kg m.c./mês (assumindo no cálculo a condição da referida dieta). Constata-se então, que estes valores superam o máximo recomendado pela OMS, pelo que, é importante efetuar novos estudos sobre o teor destes contaminantes nos alimentos comercializados em Portugal, por forma, a permitir esclarecer com maior detalhe os verdadeiros níveis de concentração/assimilação.

No documento PEDRO MANUEL DA FONSECA ANTUNES (páginas 93-98)