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A imaginação no pensamento de Aristóteles

CAPÍTULO 3 A IMAGINAÇÃO CRIATIVA, DA NOVA CIVILIDADE

3.2 A imaginação no pensamento de Aristóteles

Nesta perspectiva, foi selecionada a obra de Aristóteles56: De Anima (On the South), ou Estudo sobre a Alma57. Segundo Aristóteles (2010, p. 66), a “alma é aquilo pelo qual vivemos”, e essa alma é composta por faculdades nutritivas, perceptivas, discursivas e pelo movimento. E prossegue em seu pensamento, afirmando que “cada uma das partes das almas possui sensibilidade e desloca-se; e se possui sensibilidade, também possui imaginação e desejo. É que onde existe sensibilidade existem também, de facto, a dor e o prazer, e onde existem estes, existe necessariamente também apetite.” (ARISTÓTELES, 2010, p. 66).

No interior da alma, há também as faculdades perceptivas e opinativas. Sendo assim, a alma, conforme o filósofo, é aquilo pelo qual vivemos, exercemos a percepção, e meio pelo qual discorremos; não pode ser considerada como matéria e sujeito.

Ao longo da respectiva obra, Aristóteles elabora o seu pensamento sobre os sentidos nas diversas perspectivas: tato, paladar, audição, os nutrientes do ser mediante as percepções e sensações. Considerando o enfoque deste tópico, cabe-nos apresentar o que Aristóteles entende por imaginação.

O filósofo considera que, ao contrário da ciência e do entendimento, nem sempre a imaginação poderá ser considerada como verdadeira, uma vez que, mediante ela, podemos criar imagens que poderão ser falsas. A imaginação depende, necessariamente, da volatilidade do ser humano.

A imaginação, por seu turno, é algo diferente da percepção e do pensamento discursivo. Ela não sucede, de facto, sem a percepção sensorial, e sem ela não existe suposição. Que a imaginação não é, contudo, a mesma coisa que [o pensamento], nem que a suposição, isso é evidente. É que essa afecção depende de nós, de quando temos vontade (é possível, pois, supor algo diante dos olhos, como os que arrumam em mnemónicas, criando imagens). Formar opiniões, por sua vez, não depende apenas de nós, pois são necessariamente ou falsas ou verdadeiras. Além disso, quando formamos a opinião de que algo é ou temível ou horrendo, somos directamente afectados. O mesmo acontece no caso de algo encorajador. Já quando se trata da imaginação, comportamo-nos como se observássemos, num quadro, as coisas temíveis ou encorajadoras. Da própria suposição também existem vários tipos: a ciência, a opinião, a

56 “Aristóteles nasceu em Estágira, colônia de origem jônica, na Macedônia, Grécia, no ano de 384 a. C. Filho de

Nicômaco, médico do rei Amintas III, recebeu sólida formação em Ciências Naturais. Com 17 anos partiu para Atenas, tornou-se discípulo de Platão”. (ARISTÓTELES, 2000-2018).

sensatez e os contrários destas. (ARISTÓTELES, 2010, p. 111).

A ação de imaginar origina-se do movimento, e não é possível ocorrer sem a percepção sensorial.

Ora, uma vez que a visão é o sentido por excelência, a palavra imaginação deriva da palavra luz, porque sem luz não é possível ver. E por permanecerem e serem semelhantes às sensações, os animais fazem muitas coisas graças a elas. Acontece isto a uns_ por exemplo, aos animais selvagens _por não terem entendimento; a outros, porque se lhes tolda, por vezes, o entendimento, por estarem doentes ou durante o sono. Este é o caso, por exemplo, dos homens. A respeito da imaginação_ o que é e porquê_ baste o que foi dito. (ARISTÓTELES, 2010, p. 113).

Ao analisar essa sentença, pode-se dizer que, embora Aristóteles não desconsidere a imaginação enquanto uma capacidade mental perceptiva, ele subestima a faculdade do imaginar, argumentando que esse exercício pertence aos animais ou aos homens, se estiverem doentes ou com sono. Portanto, a imaginação é uma faculdade inferior à razão. Se contextualizarmos essa sentença, com a representação de infância que havia nessa época, apontam-se as crianças como seres animalescos, sem razão alguma, carentes de um ser superior (adulto dotado de intelecto) para guiar-lhes ao caminho do entendimento.

A alma, conforme a filosofia aristotélica, movimenta-se, porque nela há desejos de diferentes percepções. Ao realizarmos a conexão com a representação de infância, ou melhor, aquilo que de fato associa-se à ideia de vivenciar a infância, denota-se como centro dessa representação a pulsão constante da criança em explorar o mundo, característica significativa do ciclo infantil.

O pequeno ser explora o mundo mediante as diferentes percepções: o tato, paladar, audição, visão, olfato, sentindo todas as percepções que os objetos produzem em nosso ser. Em meio a essas percepções, a criança cria associações. Ilustra-se tal assertiva da seguinte forma: se é dia, tem que haver o sol; se é noite, tem de haver estrelas, pois a visão possibilitou as respectivas combinações.

A retenção dessas percepções é o que produz a memória, a qual nos acompanhará ao longo de nossa vida. O cheiro da terra molhada no campo, ou o cheiro do café exalando na cozinha logo pela manhã, o doce fabricado junto com os familiares, as diferentes sensações produzidas e acumuladas em nossa memória estarão retidas em nossa mente até o fim da nossa existência.

Por intermédio da retenção dessas memórias, conseguimos recriar em nossa mente as experiências vivenciadas num dado momento, ou criar um novo instante em função da conservação de nossas lembranças advindas das percepções.

A imaginação é externalizada mediante o uso das diversas linguagens: escrita, pintura, música e desenhos, com o princípio de nominar o que foi criado, sentido e concebido, mediante a capacidade mental.

Esse ato de criar algo poderá ser viabilizado como entendimento, ou vislumbrado como algo racional, se for passível de comprovações científicas. Do contrário, a imaginação torna-se restrita ao sentir, por isso, denota-se como uma faculdade mental inferior.

Se a imaginação é latente na infância, e se é considerada como um exercício intelectual inferior, a criança não pode ser considerada como um ser dotado de intelecto, portanto, é um ser inferior, pois sua capacidade intelectual restringe-se ao imaginar, ato que muitas vezes não é considerado como racional ou passível de entendimento.

A exigência do saber perpassa pela capacidade do indivíduo em ser racional. O conhecimento deve estar atrelado à razão.

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