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A importância e a dificuldade de se definir o controle

3 CONTROLE MINORITÁRIO

3.3 A importância e a dificuldade de se definir o controle

Como já abordado, o exercício do poder de controle em companhias abertas cujo capital social é pulverizado junto ao público, pode resultar do fato de que uma grande parcela do quadro acionário não se interesse em comparecer às assembleias e se preocupe apenas com os dividendos ou com a valorização de suas ações para posterior revenda no mercado.

Somando-se esse fator ao ativismo de um grupo organizado, ainda que pequeno, de acionistas, é possível que surja um núcleo de poder na sociedade exercido por titulares de participação minoritária no capital da sociedade. A investigação a respeito da existência desse núcleo, que pode ser representado por um acionista, ou grupo de acionista, muito embora não seja uma tarefa simples, é extremamente importante.

Essa investigação pode ser feita com objetivos distintos, como, por exemplo, o de responsabilizar o acionista ou grupo de acionistas, por danos decorrentes de abuso de poder, ou para se exigir a formulação de oferta pública de aquisição de ações. Há, como se verá, quem diferencie essas duas hipóteses, considerando que para cada uma delas o legislador teria a intenção de conceder tratamentos distintos, e defendem que deveria haver uma interpretação própria para conceituar o conceito de controle em cada uma dessas situações.146

A dificuldade em se proceder com essa identificação de forma clara se deve à inexistência de presunção legal atrelada à titularidade de um percentual mínimo do

145 OIOLI, Erik Frederico. Regime jurídico do capital disperso na lei das S.A. São Paulo: Almedina,

2014, p. 73.

146 BOCATER, Maria Isabel. Poder de Controle e Influência Significativa. In: KUYVEN, Luiz Fernando

Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 836.

capital votante que possa caracterizar o controle minoritário, da mesma forma que não há um critério seguro a se seguir para identificar a presença do requisito da permanência exigido pelo art. 116 da Lei das S.A., a fim de caracterizar a constituição de um bloco que exerça o controle da sociedade.147

O mesmo não ocorre na legislação americana, por exemplo, que apresenta presunções legais da existência de um controle minoritário. FABIO KONDER

COMPARATO menciona o Investment Company Act, de 1940, que assume a

existência de controle com a detenção de 25% do capital votante de uma companhia. O mesmo autor também cita o Public Utility Holding Company Act e o

Bank Holding Company Act, que estabelecem uma porcentagem de 10% e 25%,

respectivamente, para o reconhecimento de que uma companhia é holding da outra. Tratam-se de presunções juris tantum, mas não é comum produzir-se, na prática, prova em contrário.148

No Brasil, só é possível encontrar uma regra sobre a presunção de controle na autorregulação, especificamente no Regulamento do Novo Mercado da BM&FBOVESPA, que tem aplicação sobre as companhias que aderem ao segmento especial de listagem em questão. Muito embora esse documento adote o conceito de controle da lei societária, a sua interpretação é ampla, e engloba uma presunção de exercício do controle em casos de dispersão acionária. O regulamento do Novo Mercado segue a orientação que constava da extinta Resolução CMN 401/1976.149

Dessa forma, as companhias que subscrevem o Regulamento do Novo Mercado devem adotar em seus estatutos sociais a seguinte definição de controle: "Poder de Controle significa o poder efetivamente utilizado de dirigir as atividades sociais orientar o funcionamento dos órgãos da Companhia, de forma direta ou indireta, de fato ou de direito. Há presunção relativa de titularidade do controle em

147 BOCATER, Maria Isabel. Poder de Controle e Influência Significativa. In: KUYVEN, Luiz Fernando

Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 836.

148 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

anônima. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 56.

149 BOCATER, Maria Isabel. Poder de Controle e Influência Significativa. In: KUYVEN, Luiz Fernando

Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 839.

relação à pessoa ou ao Grupo de Acionistas que seja titular de ações que lhe tenham assegurado a maioria absoluta dos votos dos acionistas presentes nas 3 (três) últimas Assembleias Gerais da Companhia, ainda que não seja titular das ações que lhe assegurem a maioria absoluta do capital votante".150

As sociedades que optarem por aderir ao Regulamento do Novo Mercado ficam vinculadas à presunção de controle enunciada. Se ao longo de três assembleias seguidas, determinado acionista, ou grupo de acionistas, exercer seu voto com ações que configurem a maioria absoluta de votos dos acionistas presentes, será considerado acionista controlador. A presunção relativa, porém, pode ser afastada por prova em contrário.

Mas se a companhia não integra o Novo Mercado, a identificação do controle minoritário se torna complexa justamente pela falta de regra de presunção da caracterização do controle. Uma proposição de grande valia foi oferecida por FABIO

KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO FILHO, para quem o método de identificação

do controle deve variar de acordo com a disciplina que deve ser aplicada. Para tanto, sugerem que deve se adotar metodologias distintas paras as hipóteses de alienação de controle acionário e responsabilização do controlador por abuso de poder.151

Segundo os autores, se o caso for definição do controle para atribuição de deveres e responsabilidades aos controladores, conforme artigo 117, da Lei das S.A., é primordial que se adote a noção de controle tendo em conta a situação de fato. Argumenta-se que grande parte das hipóteses elencadas no § 1º, do art. 117, refere-se a atos específicos ou de duração certa. Poderia, portanto, ser absorvido por definição que tenha em conta o controle momentâneo, mesmo que, por ser minoritário, venha a ser transferido logo após a lesão causada por ação ou omissão.152

150 Conceito estabelecido pela definição de Poder de Controle presente na cláusula 2.1. do

Regulamento do Novo Mercado.

151 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

anônima. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 59.

152 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

Nessa linha de raciocínio, os autores dizem que uma concepção diferente de controle deve ser utilizada quando a disciplina, para a sua aplicação coerente, demanda a consolidação de uma posição jurídica. Como exemplo, é feita menção à disciplina da alienação de controle e da oferta pública. Para eles, só seria possível a aplicação desses institutos se houver uma posição jurídica passível de avaliação sob o ponto de vista patrimonial. Aponta-se que o controle só pode representar o valor da organização empresarial quando gerar poder estável sobre ela. E por conta disso é que FABIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO FILHO afirmam que a disciplina

da alienação de controle insere-se num contexto de definições estáveis do poder de controle, como posição jurídica.153

A relevância da discussão sobre a identificação do acionista controlador minoritário, quer para efeito de responsabilização por abuso de poder de acionista no exercício do controle, quer para o efeito de acionar o gatilho da oferta pública de aquisição de ações por alienação de controle, pede que o assunto seja analisado detidamente e em item próprio. Os capítulos IV e V desse trabalho analisarão o assunto cuidadosamente.

3.4 A cláusula de poison pill: proteção da dispersão acionária ou do acionista