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CONTROLE MINORITÁRIO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

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RAFAEL GUARILHA P. DE FREITAS

CONTROLE MINORITÁRIO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

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CONTROLE MINORITÁRIO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito, sob a orientação do Prof. Dr. Ivo Waisberg.

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BANCA EXAMINADORA

_____________________________________

_____________________________________

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(5)

O presente trabalho tem por objetivo analisar e explorar os aspectos controversos e relevantes presentes num contexto de controle minoritário, sobretudo aqueles relacionados à oferta pública por alienação de controle e à responsabilidade do acionista controlador. Para tanto, analisamos (i) a origem e a justificativa econômica do modelo de dispersão acionaria, modelo esse que propicia o surgimento do controle minoritário; (ii) a dinâmica do poder de controle; (iii) os principais contornos relacionados à definição do controle minoritário; (iv) a oferta pública por alienação de controle; e (v) a responsabilidade do acionista controlador minoritário por abuso do poder de controle.

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This work aims to analyze and explore the controversial and relevant aspects inserted in the context of the working control, giving special emphasis to the aspects related to the mandatory bid rule and to the responsibility of the controlling shareholder for the misuse of his control power. Therefore, we have analyzed (i) the origin and the economic justification of the pattern of dispersion of the company’s capital stock, which permits the appearance of the working control; (ii) the dynamism of the corporate control; (iii) the main aspects associated to the definition of the working control; (iv) the mandatory bid for the changing of the corporate control; (v) the responsibility of the minority shareholders for the misuse of the corporate power.

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INTRODUÇÃO... 08

1 A ORIGEM E A JUSTIFICATIVA ECONÔMICA DO MODELO DE DISPERSÃO ACIONÁRIA... 10

1.1 Os sistemas de governança corporativa... 10

1.2 O modelo americano... 15

1.3 O modelo britânico... 19

1.4 O modelo brasileiro... 21

1.4.1 A distribuição do capital no século XIX... 21

1.4.2 Os antecedentes da Lei 6.404/1976... 25

1.4.3 A concentração do controle acionário na Lei 6.404/1976... 26

1.4.4 O Novo Mercado e a flexibilização da concentração do controle acionário... 29

2 A DINÂMICA DO PODER DE CONTROLE... 33

2.1 A alocação do controle como forma de minimizar os problemas de conflito de interesses... 33

2.2 As circunstâncias fáticas do poder de controle... 37

2.3 O poder de controle segundo a Lei 6.404/1976... 40

2.4 As modalidades de controle interno... 46

2.4.1 Controle totalitário... 48

2.4.2 Controle majoritário... 50

2.4.3 Controle gerencial... 52

3 CONTROLE MINORITÁRIO... 56

3.1 Definição e considerações iniciais sobre o controle minoritário... 56

3.2 O Novo Mercado e o controle minoritário... 61

3.3 A importância e a dificuldade de se definir o controle minoritário... 65

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MINORITÁRIO... 76 4.1 Teorias sobre o direito ao prêmio de controle no Direito

Estrangeiro... 78 4.1.1 A OPA a posteriori no sistema norte-americano... 81 4.1.2 O sistema britânico e o City Code on Takeovers and Mergers... 84

4.1.3 O modelo da Diretiva Europeia sobre a oferta pública a posteriori

obrigatória... 86 4.2 A oferta pública obrigatória no Direito Brasileiro... 88 4.2.1 Teorias sobre o direito ao prêmio de controle no Direito

Brasileiro... 90 4.2.2 A evolução da legislação brasileira sobre a OPA obrigatória a

posteriori... 93

4.2.3 A aplicabilidade da OPA a posteriori segundo a Lei das S.A... 100

4.2.4 A aplicação do artigo 254-A ao controle minoritário... 105 4.2.4.1 A corrente que defende a não aplicação do art. 254-A à

transferência do controle

minoritário...

106

4.2.4.2 O entendimento de Erik Frederico

Oioli...

110

4.2.4.3 A posição da CVM sobre a aplicação do artigo 254-A à alienação

de controle minoritário... 112 4.2.5 As regras do Novo Mercado aplicáveis à transferência de controle

minoritário... 117 4.2.6 Linhas gerais do Comitê de Aquisição e Fusões... 121 4.2.7 As conclusões do autor... 123 5 A RESPONSABILIDADE DO ACIONISTA CONTROLADOR

MINORITÁRIO POR ABUSO DO PODER DE CONTROLE... 128 5.1 A responsabilidade do acionista controlador... 128 5.2 A aplicação do regime de responsabilização do acionista

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INTRODUÇÃO

Em meados da década passada, a dispersão acionária passou a ser um assunto frequente nas discussões sobre companhias abertas e mercado de capitais no Brasil. Apesar da evidência da matéria, ficou a impressão de que se fez pouco para compreender o controle minoritário, fruto desse fenômeno de dispersão acionária.

A verdade é que a existência desse poder sofre, muitas vezes, uma injusta contestação, sob o fundamento de que o artigo 116, "a", da Lei das S.A., caracteriza o controle como um poder permanente, que apenas a maioria das ações é capaz de prover. Não se pode aceitar esse argumento.

A crescente dispersão acionária trouxe para a companhia uma grande quantidade de pequenos acionistas, ávidos por dividendos e atentos ao preço das ações, mas com pouco interesse pela gestão e pelas assembleias da companhia. A Lei das S.A. anteviu essa consequência ao permitir, nos casos em que a dispersão acionária ocasiona o absenteísmo, uma redução significativa no quórum legal mínimo para aprovação das importantes matérias do artigo 136, incisos I a X.

Nesse contexto, apenas a coordenação improvável entre os diversos pequenos acionistas ou uma possível tomada de controle por escalada impediria a existência do controle minoritário. O fato é que, havendo um alto índice de absenteísmo na assembleia geral da companhia, é inteiramente plausível que um acionista, ou grupo de acionistas, detenha o poder de controle com uma quantidade minoritária de ações votantes, sobretudo se autorizada a redução do quórum legal mínimo.

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testado pelo direito, muito embora tenha sido objeto de uma rica discussão travada no famoso julgamento do caso TIM, pela CVM.

Os votos proferidos pelo Colegiado da CVM permitem concluir-se que há um inegável reconhecimento, pela Autarquia, da existência do controle minoritário, ainda que alguns detalhes técnicos tenham afastado a aplicação do artigo 254-A e o dever de realizar a oferta pública por alienação de controle, ora chamada de OPA a posteriori.

Aliás, a aplicação da OPA a posteriori em razão da transferência do controle

minoritário passou a ser objeto de muitas dúvidas, em razão da falta de regra específica sobre o tema. As discussões a respeito do assunto resultaram no surgimento de diferentes linhas de pensamento, que se dividem entre a defesa e a rejeição da aplicação do artigo 254-A na hipótese de cessão do controle minoritário.

Outra questão nova e não menos relevante surgida com a expansão do controle minoritário no Brasil se liga com a responsabilidade do acionista controlador minoritário. Seria o controlador minoritário passível de enquadramento no artigo 117, da Lei das S.A.? Qual seria o critério para caracterizar o controle minoritário para efeito de responsabilização?

Este trabalho tem como principal objetivo analisar o controle minoritário desde a sua origem nos países anglo-saxões até o seu desenvolvimento no Brasil, o qual se deve à reforma implementada no mercado de capitais nacional na década passada, que deu origem ao Novo Mercado, segmento de listagem da BM&FBOVESPA que exige um alto padrão de governança das companhias nele listadas.

E tal análise terá como enfoque a discussão a respeito desses problemas relacionados ao controle minoritário, representados pela dúvida acerca do lançamento de OPA a posteriori e da responsabilidade do acionista controlador num contexto de

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1 A ORIGEM E A JUSTIFICATIVA ECONÔMICA DO MODELO DE

DISPERSÃO ACIONÁRIA

Acredito que o presente estudo deve, em primeiro lugar, adentrar na origem de toda a discussão. Se o controle minoritário, tema central deste trabalho, deriva da descentralização da propriedade acionária de uma determinada companhia, este primeiro capítulo deve ter a função de oferecer um delineamento a respeito do surgimento da dispersão acionária na economia mundial. Como teve início esse fenômeno, os lugares onde ele prosperou e as razões jurídicas e econômicas que permitiram não só o seu nascimento, mas também a sua manutenção em determinados países, são temas cruciais para a compreensão deste trabalho como um todo. Para entender a origem e o desenvolvimento da descentralização da propriedade acionária, passaremos rapidamente por importantes e diferentes teorias sobre o assunto. Também analisaremos o tema a partir da realidade de países como Estados Unidos e Reino Unido, nações que formam o berço da dispersão acionária.

1.1 Os sistemas de governança corporativa

O primeiro estudo jurídico que enfrentou as consequências da forte dispersão acionária a que as empresas americanas estavam submetidas no início do século XX foi fruto da pesquisa de autoria de ADOLPHO BERLE e GARDINER MEANS (BERLE E

MEANS), de 1932. Na obra chamada The Modern Corporation and Private Property1,

concluíram os autores que, dada a extrema dispersão acionária existente naquela época nas grandes corporações americanas, o controle e a propriedade estavam dissociados. Na ocasião em que a obra de BERLE e MEANS foi publicada, a

propriedade acionária nas maiores companhias dos Estados Unidos encontrava-se inteiramente dispersa, a ponto de determinadas companhias não terem nenhum acionista com participação maior do que 1% no capital social. A conclusão a que chegaram os autores é que, nesse cenário de forte dispersão acionária, a separação

1 BERLE, Aldolph. A; MEANS, Gardiner C. The Modern Corporation and Private Property. 2 ed.

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entre controle e propriedade é decorrência direta do controle gerencial exercido pelos administradores dessas companhias. Ou seja, havendo a pulverização em larga escala do capital social, o controle pertencerá não aos acionistas, mas aos administradores. A propriedade, no entanto, permanece com os primeiros2. Este estudo se tornou a principal referência de uma teoria conhecida como “teoria do capitalismo gerencial”.3

A pesquisa de BERLE e MEANS rompeu com a ideia de que o exercício do

controle dependia da propriedade acionária e de que controlador é aquele que detém a maioria das ações ou votos que o concedam preponderância nas deliberações da sociedade. Segundo FÁBIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO

FILHO, a dissociação entre propriedade e controle nas sociedades por ações já havia

sido antevista por KARL MARX, sessenta anos antes: em sua célebre obra “O Capital”,

chegou a afirmar o filósofo alemão que as sociedades anônimas representavam “a produção privada fora do controle da propriedade privada”.4

Portanto, para os pesquisadores BERLE e MEANS, todas as companhias de

grande porte iriam, necessariamente, evoluir para um estágio em que a estrutura de capital seria representada pela total separação entre a propriedade e o controle.5

Porém, alguns estudos mais atuais indicam que o modelo de separação entre propriedade e controle, de autoria dos citados autores, que seria a consequência da grande dispersão acionária nas macroempresas, não se consagrou como o principal modelo de governança nem mesmo nos países mais desenvolvidos. No lugar da convergência para uma estrutura de capital única, o século XX foi testemunha do surgimento da polarização da estrutura de capital entre dois sistemas inteiramente

2 BERLE, Aldolph. A; MEANS, Gardiner C. The Modern Corporation and Private Property. 2 ed.

Transaction Publishers, 1991, p. 98-100.

3 EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado

de capitais– regime jurídico. 3. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 393.

4 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

anônima. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 52.

5 BERLE, Aldolph. A; MEANS, Gardiner C. The Modern Corporation and Private Property. 2 ed.

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distintos: o sistema da concentração da propriedade acionária e o sistema da dispersão acionária.6

Na estrutura de capital marcada pela concentração da propriedade acionária, identifica-se a existência de um controle majoritário, cujo exercício ocorre por meio da titularidade de mais de 50% das ações com direito a voto de uma companhia, seja por uma pessoa física ou jurídica, seja por um grupo familiar. É comum verificar-se nas companhias submetidas ao controle majoritário a sobreposição entre a propriedade das ações que asseguram o poder de controle e as funções executivas, especialmente aquelas atribuídas ao conselho de administração.7 Nesta modalidade de controle é frequente que acionistas integrantes do bloco de controle ou pessoas por eles indicadas tenham assento no conselho de administração.

Como características principais da concentração da propriedade acionária, é possível citar a preponderância dos blocos de controle, a existência de um mercado de capitais não muito desenvolvido, os altos benefícios decorrentes do exercício do controle, a falta de transparência e de regras efetivas de disclosure e um mercado

de controle acionário de pouca relevância.8

Por outro lado, no sistema caracterizado pela dispersão da propriedade das ações, não tem lugar o controle majoritário, simplesmente porque nenhum acionista será titular de mais de 50% das ações com direito a voto, emitidas por uma companhia. Num cenário de descentralização da propriedade das ações, são duas as possibilidades: ou tem vez o controle minoritário, exercido por um acionistas ou grupo de acionistas que detenham menos da metade do capital social votante, ou então ocorre o controle gerencial, cujo nascimento se dá numa situação em que o capital de uma companhia encontra-se de tal modo pulverizado, que são os administradores e não os acionistas os controladores da sociedade, na forma apontada pela importante pesquisa de BERLE e MEANS.

6 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

ownership and control. Yale Law Journal, v. 111, 2001, p. 3.

7 EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado

de capitais– regime jurídico. 3. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 394.

8 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

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Geralmente, o sistema da dispersão da propriedade acionária existe num ambiente em que o mercado de capitais é forte, as regras de disclosure e

transparência são rigorosas e o mercado de disputas pelo controle acionário é extremamente ativo, assim como ocorre nos Estados Unidos e no Reino Unido.9

Essa dualidade de sistemas de governança corporativa foi detidamente analisada por LA PORTA, LOPEZ-DE-SILANES, SHLEIFTER, e VISHNY, em estudo

conduzido em dezenas de países ao redor do mundo10. Para os pesquisadores, as companhias com o capital pulverizado só prosperaram de verdade nos países de

common-law por questões legais. Segundo eles, o sistema civil-law, ao contrário do common-law, não proporciona uma proteção adequada aos acionistas minoritários,

circunstância que dificulta a difusão do modelo da dispersão da propriedade acionária. Ao contrário, as regras claras e precisas sobre proteção do investimento da minoria constituem um relevante incentivo para a pulverização do capital das companhias. A conclusão dos autores foi fundamentada na demonstração de que o mercado de capitais é mais desenvolvido e líquido em países submetidos ao

common-law do que nos países que se submetem ao civil-law.

LUCIAN ARYE BEBCHUK11 tem outra teoria para explicar a existência dos

sistemas de governança em discussão. Em seu trabalho denominado A

Rent-Protection Theory of Corporate Ownership and Control, o autor defende que, nos

países em que os benefícios do controle são altos, os fundadores de uma companhia cujas ações serão oferecidas ao público na bolsa de valores tendem a manter o controle mesmo depois de realizada a oferta. Dessa maneira, com o poder de controle garantido, os fundadores desfrutarão dos benefícios advindos deste poder, protegerão, ao mesmo tempo, a companhia de competidores rivais, e terão a possibilidade de obter um melhor preço na eventualidade de colocarem à venda o

9 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

ownership and control. Yale Law Journal, v. 111, 2001, p. 3.

10 LA PORTA, Lopez-de- Silanos, Shleifer and Vishny, Investor Protection and Corporate Governance (Working Paper 2000). Disponível em: http://ac.els-cdn.com/S0304405X00000659/1-s2.0-S0304405X00000659-main.pdf?_tid=e9d99056-30b1-11e5-aa23

00000aacb361&acdnat=1437597819_09ef37ccdee8d82824012b92f1a91b89. Acesso em: 22 jul. 2015.

11 BEBCHUK, L. A rent-protection theory of corporate ownership and control. National Bureau of

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bloco de controle. Seria esse o motivo pelo qual, nos Estados Unidos, onde os proveitos do controle são relativamente baixos, os fundadores, em regra, quando ofertam publicamente as ações de sua companhia, optam pela estrutura uma ação, um voto.12

Uma terceira teoria merece ser citada, essa de caráter mais político do que econômico, de autoria de MARK ROE, exposta no trabalho Political Preconditions to Separate Ownership from Control13. De acordo com o autor, um mercado de capitais

forte é incompatível com o sistema político da social democracia, muito comum nos países europeus. Isso porque, segundo afirma, a social democracia pressiona os administradores das companhias para abrirem mão do aumento dos lucros para manter um alto índice de emprego. Quando passam por circunstâncias que demandariam a opção por um caminho de contenção de custos em razão de um mercado desfavorável, companhias instaladas em países submetidos a um regime social democrata são muitas vezes pressionadas a fazer investimentos para subsidiar outros custos. Assim, a concentração da propriedade acionária seria um meio de defesa contra as pressões constantemente sofridas. Isso porque, dessa forma é possível, para os grupos de controle, adotarem métodos contábeis pouco transparentes, esconderem reservas de capital e exercerem uma supervisão direta dos administradores, o que os torna menos suscetíveis às pressões externas14. Tal teoria explicaria o insucesso da pulverização do capital das companhias sediadas na Europa Continental.

Muito embora as três teorias apresentadas tragam importantes elementos fazendo a ligação entre as leis, os benefícios do controle e um mercado de capitais forte ou fraco, veremos que pela experiência americana e britânica não foram esses os motivos preponderantes para a disseminação da dispersão acionária. No caso

12 BEBCHUK, L. A rent-protection theory of corporate ownership and control. National Bureau of

Economic Research. Working Paper n. 7203, 1999. Disponível em: http://www.nber.org/papers/w 7203>. Acesso em: 05 jun. 2013.

13 ROE, Mark J. Political Preconditions to Separating Ownership from Control, 53, Stan. L. Rev. 539

(2000). In: COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of ownership and control. YaleLaw Journal, v. 111, 2001.

14 ROE, Mark J. Political Preconditions to Separating Ownership from Control, 53, Stan. L. Rev. 539

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dos Estados Unidos, por exemplo, o aparecimento do mercado ocorreu num momento em que não havia leis efetivas de proteção aos acionistas minoritários e os benefícios provenientes do exercício do controle ainda eram expressivos. Na verdade o caminho foi inverso: primeiro o mercado se fortaleceu e num momento posterior foram editadas as leis para garantir os direitos essenciais dos investidores. A plataforma que sustentou esse desenvolvimento do mercado, na total ausência de leis confiáveis, foi a autorregulação. Veremos adiante que a Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE) contribuiu de forma significativa para o propalado crescimento. E não foi só. Além da autorregulação, sempre houve uma sinalização positiva para os investidores de que o investimento deles não seria aniquilado.

1.2 O modelo americano

A dispersão acionária é exceção na economia mundial, enquanto a concentração da participação no capital social é a regra. Apenas nos Estados Unidos e no Reino Unido é que se pode identificar uma economia com uma cultura difundida de vasta dispersão acionária. Por outro lado, nos países emergentes e na Europa Continental, o que se percebe é uma prevalência da concentração do capital social nas mãos de grupos poderosos de controladores, muitas vezes familiares.

Na América, a concentração do controle das companhias em grupos familiares e em poucos e poderosos acionistas passou a arrefecer na passagem do século XIX para o século XX.15 E foi nesse período que a estrutura de governança corporativa baseada na pirâmide invertida se rompeu. Este modelo tradicional de governança foi contestado na obra The Modern Corporation and Private Property,

de BERLE e MEANS, publicada em 1932. Como visto, o resultado desse trabalho foi a

conclusão de que o controle e a propriedade estavam dissociados nas grandes companhias americanas naquele início de século XX.

15 BERLE, Aldolph. A; MEANS, Gardiner C. The Modern Corporation and Private Property. 2 ed.

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Esse fenômeno da divisão entre propriedade e controle foi fruto do intenso processo de dispersão acionária a que as companhias americanas se submeteram a partir da segunda metade do século XIX, quando teve início o projeto de expansão da indústria ferroviária americana. Tendo em vista a grandeza das distâncias geográficas a serem cobertas pela malha ferroviária, havia uma demanda por parte das companhias atuantes nesse ramo por uma enorme infusão de capital interno e estrangeiro16. Tal circunstância fez com que essas companhias passassem a realizar constantes emissões de valores mobiliários para captação de recursos. Como bem nota COFFEE JR., a perene necessidade por capital e a dependência do

capital estrangeiro produziram, dentre outras inovações, a pulverização do capital das grandes companhias e o crescimento da autorregulação por meio da imposição de regras na negociação de valores mobiliários.

O curioso é que o ponto de partida do desenvolvimento do mercado de capitais nos Estados Unidos ocorreu numa época em que não havia uma legislação efetiva de proteção aos acionistas minoritários. E foi aí que a autorregulação ganhou importância ao ocupar um espaço que precisava ser preenchido. Com propriedade, COFFEE JR. afirma:

Self help measures, including exchange self-regulation, can potentially provide functional substitutes that significantly compensate for any deficit in minority protection that the use of civil-law standards entails.17

A entidade que desempenhou esse papel de forma fundamental foi a Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE). Desde antes de virada do século XIX a NYSE já era tida como a guardiã da lisura financeira das empresas nela listadas. A entidade em questão sempre impôs rigorosas exigências para listar as companhias emissoras e com frequência rejeitava solicitações de listagem por variados e fundamentados motivos, sempre com o objetivo de proteger o investidor.18

16 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

ownership and control. Yale Law Journal, v. 111, 2001, p. 26.

17 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

ownership and control. Yale Law Journal, v. 111, 2001, p. 11.

18 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

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Mais tarde, na segunda década do século XX, aprofundando-se na defesa dos acionistas minoritários, a NYSE passou a rejeitar a listagem de companhias que tivessem, em seu capital social, ações sem direito a voto. Ademais, a NYSE impunha rígidas obrigações de abertura de informações aos investidores. Assim, na ausência de normas legais a respeito, a NYSE garantiu o acesso dos investidores às informações das companhias listadas e protegeu o direito de voto dos acionistas.

Os dois principais pilares do desenvolvimento do mercado de capitais nos Estados Unidos foram, portanto, a capacidade de monitoramento da NYSE e os mecanismos desenvolvidos pelos underwriters19 americanos de atrair o capital

estrangeiro20 de que tanto necessitavam as empresas de infraestrutura.

Foi nesse contexto que a descentralização da propriedade acionária se difundiu na América e, com ela, apareceu o controle gerencial apontado por BERLE e

MEANS. A respeito da caracterização dessa modalidade de controle, vale notar que

ela ocorre quando os administradores dominam a companhia de forma autônoma, sem vínculos com grupos formados por acionistas minoritários. Essa condição de comando pode ser atingida por meio da manipulação dos votos dispersos nas assembleias, com a utilização da chamada proxy machinery, que se consubstancia

na captação dos votos da maioria absenteísta por meio de procurações.

A alta dispersão acionária favorece muito o exercício do controle pela administração por dois motivos principais, como bem observa MELVIN ARON

EISENBERG: primeiro porque é natural que acionistas detentores de um ínfimo

percentual do capital social de uma companhia não dediquem muito tempo analisando assuntos ligados aos seus rumos, o que faz com que se tornem acionistas conscientemente apáticos; segundo porque quando o capital social de uma companhia é divido em milhares de acionistas, os votos são computados por

19“O termo

underwriter, consagrado no direito inglês e norte-americano, foi tomado de empréstimo da

legislação sobre seguros, em que era inicialmente utilizado para se referir à atividade dos indivíduos ou das empresas que seguravam o emissor dos papéis contra as perdas provenientes do insucesso

da colocação”. (EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de capitais – regime jurídico. 3. ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 180).

20 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

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meio de procuração, e não pessoalmente. Portanto, quando os acionistas quiserem se contrapor à administração, deverão organizar as proxy fights, que são os pedidos

públicos de procuração, o que, além de trabalhoso, é muito custoso. Dessa forma, muitas vezes é mais simples para o acionista insatisfeito vender a sua participação, retirando-se da sociedade, do que se opor à administração.21

Entretanto, desde que foi publicado o estudo de BERLE e MEANS, houve uma

mudança na composição do capital social das grandes companhias americanas. Muito embora a pulverização do capital ainda seja o modelo vigente nos Estados Unidos, com o surgimento dos investidores institucionais foi possível perceber certa concentração de capital nas mãos desses investidores, que se subdividem em seis principais categorias22: fundos de pensão privados, fundos de pensão públicos, bancos, mutual funds, companhias de seguro e fundações.

A partir do surgimento dos investidores institucionais no mercado de capitais dos Estados Unidos houve uma passagem do absenteísmo para o ativismo acionário. E com isso foi perdendo força a Wall Street Rule, cujo preceito era: se não

gosta da administração, venda; se não vender, apoie a administração. Algumas regras editadas pela SECURITIES EXCHANGE COMISSION(“SEC”) e pelo UNITED STATES

DEPARTMENT OF LABOR (“DOL”) contribuíram para o fortalecimento do ativismo,

sobretudo dos fundos de pensão públicos. Por exemplo, as regras de pedido de procuração foram revisadas, de forma a remover os empecilhos que existiam quanto à comunicação entre os investidores institucionais23.

21 EISENBERG, Melvin Aron. Corporations and Other Business Organizations. 9. ed. New York:

Foundation Press, 2005.

22 EISENBERG, Melvin Aron. Corporations and Other Business Organizations. 9. ed. New York:

Foundation Press, 2005, p. 155.

23 EISENBERG, Melvin Aron. Corporations and Other Business Organizations. 9. ed. New York:

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1.3 O modelo britânico

No Reino Unido, pode ser dito que a origem do sistema de propriedade do capital das grandes corporações guarda significativa semelhança com o sistema de grande parte dos países do mundo: a regra era a concentração de capital em poder de grupos familiares. Nada diferente do convencional. Muito embora os acadêmicos e estudiosos do assunto discutam a respeito do exato momento em que a dispersão acionária se instalou no Reino Unido, é certo que a transição da concentração para a pulverização do capital teve inicio a partir do último quarto do século XIX, momento em que passou a aumentar significativamente o numero de companhias listadas na

LondonStock Exchange (LSE).24

No fim do século XVIII, a economia britânica já tinha definitivamente se transformado numa economia de indústria e o Reino Unido se consolidado como a principal nação industrial e consumidora do mundo. Porém, mesmo tendo uma economia importante e sofisticada, o mercado de capitais do Reino Unido era ainda focado em negociações de dívidas do governo e títulos de dívida de companhias ferroviárias oferecidos no exterior, os chamados bonds25. Esse cenário começou a

mudar no início do século XX e a LSE passou a negociar cada vez mais valores mobiliários domésticos. Isso porque, nessa época houve um declínio considerável nos empréstimos concedidos pelas empresas britânicas aos tomadores estrangeiros e um aumento do interesse dos grandes investidores pelos maiores lucros proporcionados pela negociação das ações das companhias listadas. Além disso, as famílias donas de negócios privados passaram a encarar a bolsa de valores como uma opção de saída e liquidação de investimento26. Ademais, como apontam FRANKS, MAYER e ROSSI, ocorreram nesse período sucessivas emissões de capital

para financiar o crescimento e a expansão das companhias. Demonstram os citados

24 COFFEE JR. The rise of dispersed ownership: the roles of law and the state in separation of

ownership and control. YaleLaw Journal, v. 111, 2001.

25 CHEFFINS, Brian R. Putting Britain on the Road Map: The Emergence of the Berle-Means

Corporation in the United Kingdon. Disponível em:

http://papers.ssrn.com/paper.taf?abstract_id=218665. Acesso em: 05 jun. 2013.

26 CHEFFINS, Brian R. Putting Britain on the Road Map: The Emergence of the Berle-Means

Corporation in the United Kingdon, p. 17. Disponível em:

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autores que o propósito das inúmeras captações que ocorreram a partir do inicio do século 20 foi, principalmente, a aquisição de outras companhias.27Assim, em 1907 já eram 600 as companhias listadas na LSE.

Apesar de o movimento das empresas para a bolsa de valores ter se consolidado nos primeiros anos do século passado no Reino Unido, não foi na mesma época que a dispersão da propriedade acionária se estabeleceu por lá. Os fundadores que promoviam a distribuição das ações de suas companhias ao público ainda retinham uma grande parcela de participação no capital social e desempenhavam um relevante papel nas tomadas de decisões28. A corporação descrita por BERLE e MEANS não havia se instalado em terras britânicas.

Não há certeza a respeito do momento em que efetivamente se deu a transição da concentração para a dispersão da propriedade acionária. BRIAN R.

CHEFFINS diz que essa passagem teve início nos primeiros anos subsequentes à

Primeira Guerra Mundial29. P.SARGANT FLORENCE concluiu estudo sobre o tema em

1951 e atestou que estava havendo uma verdadeira revolução nas companhias britânicas no caminho do divórcio entre o controle e a propriedade30. No mesmo sentido caminhou a análise de LESLIE HANNAH, para quem o controle gerencial tinha

definitivamente se estabelecido na economia britânica em meados do século XX, sendo que o autor atribui este fato à onda de fusões ocorrida nos anos 1920 e 1930, circunstância que aumentou o tamanho das companhias e o grau de integração vertical.

27 FRANKS, Julian R., COLIN, P. Mayer; ROSSI, Stefano. Ownership: Evolution and regulation.

London Business School and Saïd Business School, University of Oxford. Mimeograph.

28 CHEFFINS, Brian R. Putting Britain on the Road Map: The Emergence of the Berle-Means

Corporation in the United Kingdon. Disponível em:

http://papers.ssrn.com/paper.taf?abstract_id=218665. Acesso em: 05 jun. 2013.

29 CHEFFINS, Brian R. Putting Britain on the Road Map: The Emergence of the Berle-Means

Corporation in the United Kingdon. Disponível em:

http://papers.ssrn.com/paper.taf?abstract_id=218665. Acesso em: 05 jun. 2013.

30 FLORENCE, P. Sargant. The Logic of British and American Industry: A Realistic Analysis of

Economic Structure and Government (London). In: CHEFFINS, Brian R. Putting Britain on the Road Map: The Emergence of the Berle-Means Corporation in the United Kingdon. Disponível em:

(22)

Não obstante, outros estudos conduzidos nos anos 1970 demonstravam que a estrutura de separação entre controle e propriedade não havia ainda dominado o Reino Unido. Conforme apurou FABIO ULHOA COELHO, constatou-se no Reino Unido

que, nos anos 1930, pelo menos metade das maiores companhias encontrava-se, ainda, sob o controle de acionista com participação societária dominante. Nos anos 1950 e 1960, o percentual de grandes companhias nessa condição havia descido para 1/3. Segundo o autor, estudos de 1975, sob outros critérios, e levando em conta o novo perfil de atuação de investidores institucionais, apontaram ligeira reversão na tendência de crescimento da dispersão do capital e declínio do controle majoritário.31

1.4 O modelo brasileiro

1.4.1 A distribuição do capital social no século XIX

Assim como em grande parte dos países do mundo, a sociedade anônima se disseminou no Brasil no século XIX como um importantíssimo veículo a serviço do capitalismo moderno. Em principio, a sua constituição ocorria por meio de um privilégio outorgado pelo Estado. Nesse sistema, foram criadas algumas poucas companhias, como, por exemplo, o Banco do Brasil, o Banco Troco das Barras de Ouro, a Companhia de Seguros de Conceito Público e, ainda, a Companhia de Mineração dos Anicuns, com sede em Goiás (cujas ações seriam pagas “12$000 em dinheiro e um escravo, de 16 a 35 anos, sem moléstia alguma, com vestimenta e ferramenta”).32

Em seguida, surgiu o sistema da autorização governamental, o qual vigeu em parte considerável do século XIX, e que estabelecia que a constituição de sociedade

31 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. vol. 2. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.

305.

32 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A Lei das S.A: pressupostos, elaboração,

(23)

anônima deveria depender de autorização governamental específica. O Conselho de Estado era o órgão responsável por apreciar e aprovar ou não os pedidos de autorização para a formação de companhias.33

MARIANA PARGENDLER se dedica a desconstruir alguns mitos ligados às

sociedades anônimas no Brasil. Um deles se relaciona com a governança corporativa. A autora aponta que até mesmo a mais prestigiada doutrina incorre em erro ao não reconhecer o modelo de intervenção estatal na estrutura da governança interna das companhias daquela época. A singeleza do Código Comercial sobre o assunto explicaria um pouco a confusão. Diante da ausência de regras especificas, muitos podem ter interpretado que havia plena liberdade das partes para montar a estrutura interna mais afeita aos próprios interesses.34

Ledo engano. O Conselho de Estado se utilizava de seu poder de veto sobre a constituição de companhias para impor a adoção de regras estatutárias de governança que atendessem melhor aos seus anseios. A intervenção estatal na governança ia desde decisões que condicionavam a aprovação dos estatutos ao mínimo de ações exigido para a convocação de assembléia geral até a proibição de voto de acionistas por procuração. Quase nenhuma área escapava do crivo do órgão regulatório em questão.35

Outro mito que merece ser desvendado, conforme a obra de MARIANA

PARGENDLER, diz respeito à origem da concentração de controle no Brasil. Quanto à

predominância dessa espécie de controle no país, parece não ter restado dúvidas de sua existência desde estudo empírico publicado por NELSON EIZIRIK, em 1987, que

33 PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In:

KUYVEN, Luiz Fernando Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 4.

34 PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In:

KUYVEN, Luiz Fernando Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 5.

35 PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In:

(24)

demonstra que o controle gerencial era incipiente no Brasil e que a concentração de controle nas companhias era uma realidade predominante36.

De fato, a tese de BERLE eMEANS da separação entre propriedade e controle

nunca foi uma realidade brasileira, a despeito de alguns avanços alcançados, sobretudo na década passada, época que testemunhou o surgimento de algumas poucas companhias com capital pulverizado. Diante de um cenário de concentração da propriedade acionária, a Lei 6.404/1976 consagrou o instituto do controlador da sociedade anônima.

Porém, ao contrário do que muitos pensam, nem sempre a concentração foi a regra. Até o advento da Lei 3.150/1882, que extinguiu o regime da autorização governamental, as sociedades anônimas, em geral, não apresentavam controle definido. Tal circunstância se devia à ingerência do poder estatal na condução dos destinos das companhias, naquele momento exercido pelo Conselho de Estado.

O mecanismo de voto imposto pelo Conselho de Estado às companhias praticamente inviabilizava a formação de um controle definido. Esse mecanismo se consubstanciava no sistema de voto regressivo, cujo efeito limitava o poder de voto dos grandes acionistas. A limitação de voto poderia se dar seja pela imposição de um teto ao número máximo de votos por acionista, seja pela adoção de uma escala regressiva, por meio da qual o número de votos aumentaria de forma não-proporcional ao número de ações: na primeira hipótese de limitação, permitia-se, por exemplo, o máximo de 10 votos por acionista; na segunda hipótese, ao acionista poderia se conceder um voto por até cinco ações, um voto por 10 ações até 100 ações, um voto por 100 ações e assim por diante.37

O sistema de voto regressivo se contrapõe ao sistema de voto proporcional, predominante hoje no mundo e há muito em vigor no Brasil. Por esse mecanismo, o voto é proporcional à participação acionária, o que significa dizer que haverá um

36 EIZIRIK, Nelson. O mito do controle gerencial. Alguns dados empíricos. Revista de Direito

Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro. São Paulo: RT, n. 66, 1987, p. 103.

37 PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In:

(25)

voto por cada ação detida. Tal regra comporta algumas exceções, refletidas nas popularíssimas ações preferenciais sem direito a voto, amplamente utilizadas no mercado brasileiro, assim como nas ações de classe especial com votos múltiplos38 adotadas em outros países, sobretudo nos Estados Unidos39. Pelo sistema de voto progressivo, os acionistas com as maiores participações poderão deter o controle da companhia, ainda que as suas participações, em conjunto, não somem mais de 50% do capital social.

Percebia-se no Conselho de Estado uma enorme preocupação em evitar que um determinado acionista assumisse um papel preponderante nas assembléias. Buscava-se, assim, se impedir que decisões de relevo para a companhia fossem tomadas em favor de um pequeno grupo de acionistas em detrimento do interesse da maioria. Não era incomum que o órgão regulador em questão indeferisse o aumento do limite de votos por acionista.40

As sociedades anônimas oitocentistas não só, surpreendentemente, não apresentavam controlador definido, como também não apresentavam o traço familiar tão característico desse tipo de sociedade no Brasil. Era possível se encontrar nos estatutos de companhias nacionais, no final do século XIX, regras proibitivas de parentesco entre membros da diretoria41. Tal proibição subsiste no direito brasileiro atual, mas aplica-se unicamente aos membros do conselho fiscal, conforme redação do art. 162, § 2º, da Lei 6.404/1976. A típica companhia familiar brasileira apenas veio a se consolidar na década de 30, tendo sido a pedra de toque do Decreto 2.627, de 1940.

38 A lei societária no Brasil veda o voto plural, conforme estabelece o art. 110, § 2º., da Lei

6.404/1976.

39 Tem se notado um movimento nos Estados Unidos direcionado à utilização de votos múltiplos,

sobretudo para se conceder mais poder aos acionistas fundadores. É o caso do Google Inc, cujo capital social prevê ações de classe B que conferem aos acionistas fundadores 10 vezes mais votos do que as ações de classe A, componentes do Free Float.

40

“ao examinar o pedido de alteração dos estatutos do Banco Comercial do Rio de Janeiro, no qual

se pretendia atenuar o limite de 20 para 40 votos por acionista, o Conselho de Estado julgou

excessivo o máximo proposto”. (PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In: KUYVEN, Luiz Fernando Martins. Temas essenciais de direito empresarial: estudos em homenagem a Modesto Carvalhosa. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 8).

41 PARGENDLER, Mariana. Cinco mitos sobre a história das sociedades anônimas no Brasil. In:

(26)

1.4.2 Os antecedentes da Lei 6.404/1976

A realidade econômica dos anos que antecederam o Decreto n. 2.672/40, legislação que passou a reger as sociedades anônimas a partir da década de 1940, permitia apenas o florescimento de companhias pequenas e médias, e as mudanças econômicas que tiveram início em meados da década de 60 do século passado apresentavam aspectos e problemas completamente distintos daqueles que surgiram nas décadas anteriores. Questões referentes à distribuição do poder na companhia, dos papéis desempenhados pelos acionistas e administradores, e da responsabilidade social da companhia e dos seus controladores passaram a demandar respostas que a legislação então vigente não era capaz de atender.42

Assim, surgiu a Lei n.º 4.728, de 14 de julho de 1965, que introduziu no nosso sistema jurídico uma série de novos institutos para a prática societária, a qual veio acompanhada dos incentivos fiscais lançados pelo Governo, como forma de estímulo ao mercado de capitais.

Naquela época, o país estava sob o domínio do Governo Militar, que fez uso dessas medidas de incentivos fiscais para estimular a abertura de capital das empresas nacionais. O efeito de tais medidas foi tão expressivo que levou várias companhias a listarem as suas ações não com o objetivo de se beneficiarem das vantagens do mercado de ações, mas sim dos benefícios fiscais. O resultado disso foi o advento de uma forte crise especulativa no ano de 1971, evento que gerou muitas perdas para os investidores. Como consequência da crise, houve o esvaziamento do mercado primário de ações.43

A verdade é que tanto a Lei n.º 4.728/1965, como a estratégia governista de apelar para os incentivos fiscais, não surtiram os efeitos esperados. Nesse contexto,

42 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A: pressupostos, elaboração,

aplicação. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 129.

43

José Luiz Bulhões Pedreira define mercado primário “como o mercado para novas ações emitidas

por companhias que tenham um projeto a implantar ou expandir, e que dependam da colocação de suas ações para conseguir levantá-lo”. (TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREIRO, José Alexandre

(27)

entendeu-se que o mercado primário precisava ser revitalizado e que era o momento de se pensar numa reforma estrutural das regras aplicáveis às sociedades anônimas brasileiras. A responsabilidade pela elaboração do Anteprojeto sobre as companhias coube a LAMY FILHO e BULHÕES PEDREIRA. O trabalho desses juristas foi submetido à

intensa discussão e o seu texto final ganhou corpo no Projeto de Lei n.º 2.559/7644. Depois de aprovado, este projeto transformou-se na Lei n.º 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que passou a ser um diploma de larga utilização na esfera econômica do Brasil.

1.4.3 A concentração do controle acionário na Lei 6.404/1976

Em resumo, pode-se dizer que os objetivos primordiais da Lei das Sociedades por Ações eram dois: viabilizar a grande empresa privada nacional e proteger os acionistas minoritários. Esses objetivos eram totalmente interligados, uma vez que o alcance do primeiro dependia do aprimoramento do segundo. Ou seja, a formação dessa grande companhia nacional apenas seria possível se o investidor pudesse ter confiança no sistema societário, o que dependeria de uma adequada tutela dos acionistas minoritários.45

Não há dúvidas de que a Lei 6.404/1976 representou um grande avanço na proteção das minorias, tendo se adotado, dentre outras medidas de extrema relevância, o princípio do full disclosure, abrindo-se o acesso do investidor a

informações importantes sobre as demonstrações financeiras e aos administradores, fiscais e auditores independentes.

44 O objetivo da propositura do Projeto Lei das Sociedades por Ações está estampado no item 4 da Exposição de Motivos n. 196, de 24 de junho de 1976, do Ministério da Fazenda: “O Projeto visa,

basicamente, a criar a estrutura juridical necessária ao fortalecimento do mercado de capitais de risco no País, imprescindível à sobrevivência da empresa privada na fase atual da economia brasileira. A mobilização da poupança popular e o seu encaminhamento voluntário para o setor empresarial exigem, contudo, o estabelecimento de uma sistemática que assegure ao acionista minoritário o respeito a regras definidas e equitativas, as quais sem imobilizar o empresário em suas iniciativas,

ofereçam atrativos suficientes de segurança e rentabilidade”.

45 TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREIRO, José Alexandre Tavares. Das Sociedades Anônimas

(28)

Apesar de se caracterizar como um importante instrumento na defesa dos direitos dos acionistas minoritários, a Lei 6.404/1976 foi concebida para girar em torno do controle acionário, de forma que reconheceu e disciplinou a figura do acionista controlador, por meio dos artigos 116 e 117. Para LAMY FILHO e BULHÕES

PEDREIRA, a lei societária não poderia ignorar a realidade nacional, e entendiam que

“o papel do acionista controlador é essencial ao funcionamento das companhias que não atingiram a dimensão necessária à institucionalização”.46

Os idealizadores da lei societária brasileira acreditavam que não era o momento de se adotar o paradigma das grandes companhias americanas, conhecidas como corporations. A crença era de que a economia no Brasil ainda não

estava pronta para as companhias de capital pulverizado, controladas pela administração. Tal espécie de companhia seria somente possível no último estágio de expansão da macroempresa.47

A lei do anonimato criou, então, de um lado, a figura do empresário-empreendedor, que nada mais é do que o acionista controlador; de outro, foi criada a figura do acionista investidor, que atuava como uma espécie de ator externo ao empreendimento empresarial, titular de direitos patrimoniais contra a sociedade.

Evidentemente, esses distintos grupos de acionistas deveriam exercer, de acordo com a lei, diferentes papéis na condução da macroempresa: o controle empresarial seria exercido pelo empresário-empreendedor, de forma livre e contundente; já a garantia dos interesses dos investidores ocorreria por meio da diretriz de que a atuação do controlador deveria sempre ocorrer no interesse da sociedade e do grupo de acionistas, e não pautar-se pelo seu interesse pessoal (interesse social). Para tanto, a lei atribuiu ao empresário-empreendedor um conjunto de deveres e responsabilidades diferenciados, de forma a garantir que o interesse social seria sempre perseguido.

46 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A: pressupostos, elaboração,

aplicação. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 204-205.

47 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

(29)

Nesse contexto, a estrutura de poder e investimento na esfera da macroempresa foi organizada pela Lei 6.404/1976 a partir de definição da figura do acionista controlador, atribuindo-lhe deveres e responsabilidades especiais48, assim como da previsão e disciplina das ações preferenciais, cujo direito de voto poderia ser suprimido e que poderiam ser emitidas até o limite de 2/3 do total das ações componentes do capital social.49

Assim, caberia ao acionista-empreendedor dirigir os rumos da companhia, com larga liberdade de organização, ao passo que os acionistas investidores, detentores de ações preferenciais, não deveriam influenciar no desenvolvimento das atividades da empresa. Ou seja: os direitos conferidos aos acionistas investidores seriam puramente patrimoniais, faltando-lhes direitos políticos capazes de colocar limites na atuação do empresário-empreendedor.50

Existia no Brasil certa desconfiança de que o modelo de pulverização do capital social era de fato mais eficiente do que o sistema baseado na figura do acionista controlador. BULHÕES PEDREIRA e LAMY FILHO falavam que a transferência

do poder dos acionistas aos administradores poderia dar ensejo ao surgimento da tecnocracia, que ocorre quando o objetivo dos administradores deixa de ser a eficiência da empresa, mas o exercício do próprio poder51. O sentimento era de que não havia ainda maturidade suficiente para a adoção de tal sistema. Então, a lei partiu da premissa de que primeiro haveria de ser criada a grande empresa nacional, com acionista controlador e investidores, para, num momento posterior, pensar-se em estruturas corporativas com elevado nível de dispersão acionária.52

48 Lei das S.A. arts. 116, 117 e 246.

49 Quando as ações preferenciais foram introduzidas inicialmente no Brasil, pelo Decreto-lei n.º

21.536, não havia limite para a sua emissão. O teto máximo da emissão da ação preferencial veio a ser estabelecido, pela primeira vez, pelo Decreto n. 2.672/1940.

50 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 54.

51 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A: pressupostos, elaboração,

aplicação. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 204.

52 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

(30)

1.4.4 O Novo Mercado e a flexibilização da concentração do controle acionário

O embrião do surgimento das primeiras companhias com capital pulverizado no Brasil foi a estabilidade macroeconômica conquistada nos anos 90, duas décadas depois de promulgada a Lei 6.404/1976. Na virada do ultimo século presenciou-se uma importante aceleração da economia nacional e um ambiente muito favorável ao crescimento do mercado de capitais. A existência de oportunidades de investimento e a abundância de liquidez e de recursos disponíveis no mercado financeiro internacional fez com que os investidores passassem a olhar para o Brasil como um destino prioritário de investimento. Aproveitando os ventos favoráveis, a década de 2000 foi um marco no desenvolvimento do mercado brasileiro, haja vista a ocorrência de eventos como a desmutualização da BM&FBOVESPA (Bolsa de Valores do Estado de São Paulo)53 e a subsequente abertura de seu capital. Com isso, vieram à tona antigas discussões sobre a necessidade de se aumentar o poder dos acionistas minoritários e de finalmente ter-se algum sucesso na atração da poupança popular para o mercado de capitais brasileiro, que sempre viveu de investimentos especulativos específicos e de investidores dispostos a entrar e sair rapidamente das sociedades. Assim, foi editada a Lei 10.303/ 2001 que, dentre outras medidas de proteção aos acionistas minoritários, proibiu a emissão de ações preferenciais sem direito a voto, ou com voto restrito, em patamar superior ao percentual de 50% do capital social total da companhia, medida tomada com o objetivo de flexibilizar a concentração do controle acionário.

Entretanto, por pressão dos grandes grupos controladores no Congresso Nacional, a reforma de 2001 foi mais tímida do que se esperava, ainda carecendo o sistema jurídico de uma proteção aos investidores efetiva e sólida, capaz de finalmente criar um arcabouço para o florescimento da negociação dos valores mobiliários no mercado primário. E, assim como nos Estados Unidos, muito mais do

53 A partir da década de 1990, houve um intenso movimento de transformação da bolsa-associação

(31)

que a regulação estatal, foi a autorregulação que veio a criar condições para a expansão das práticas de governança corporativa e para uma maior proteção aos investidores54. E foi aí que a BM&FBOVESPA entrou em cena. No final dos anos 2000, pouco antes do início da vigência da reforma do diploma societário, foram criados três novos segmentos de listagem especiais de governança corporativa, cuja adesão é voluntária, e que trouxeram regras de transparência e direitos dos investidores que ultrapassavam o mínimo previsto na Lei das Sociedades por Ações. Esses segmentos são o Nível 1, o Nível 2 e o Novo Mercado.

Como bem afirma EDUARDO SECCHI MUNHOZ, o lançamento do Novo Mercado

foi a forma encontrada pela BM&FBOVESPA de driblar as dificuldades de se promover uma reforma efetiva na Lei das Sociedades por Ações. “Foi, portanto, uma iniciativa da autorregulação, com o objetivo de contornar a dificuldade de buscar-se uma solução baseada em reforma da lei societária”.55 O interessante, como nota CALIXTO SALOMÃO FILHO, foi que a solução para o problema saiu da via institucional

para a contratual. Dada a paralisação das instâncias institucionais, sobrou aos particulares, convencidos da necessidade da ética e da aplicação de princípios cooperativos para sobreviver, implementá-los por meio de contrato56. O principal avanço do Novo Mercado, vale dizer, foi a proibição de emissão pelas companhias de ações sem direito a voto, tema que já havia provocado enorme controvérsia quando da reforma societária em 2001 e que acabou ficando de fora da Lei 10.303/2001.

Por intermédio do lançamento dos segmentos especiais de listagem, sobretudo do Novo Mercado, a BM&FBOVESPA pretendeu conferir ao mercado ambientes de negociação que atraíssem o interesse dos investidores e que, em paralelo, valorizassem as companhias listadas em tais segmentos.

54 SALAMA, Bruno Meyerhorf; PRADO, Viviane Muller. Proteção ao acionista minoritário no Brasil:

breve histórico, estrutura legal e evidências empíricas. Disponível em:

http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/7779/Working%20paper%2063.pdf?sequ ence=1. Acesso em: 05 jul. 2015.

55 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 66.

56 SALOMÃO FILHO, Calixto. O Novo Direito Societário.3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros,

(32)

Curioso notar que a mesma lei que permite a emissão de ações preferenciais e a concentração do controle acionário, não contém, por outro lado, obstáculos para que, por meio da autorregulação, sejam criadas regras no sentido de que determinadas companhias a elas vinculadas só possam emitir ações ordinárias. Dessa maneira, conforme leciona EDUARDO SECCHI MUNHOZ, “a fonte de legalidade

das regras provenientes da autorregulação, é, sem dúvida alguma, a Lei das S.A., que estabeleceu a estrutura básica da companhia e conferiu aos agentes privados a liberdade necessária para encontrar as regras mais adequadas ao seu crescimento e expansão”.57

O mercado não reagiu muito bem aos primeiros três anos de existência dos segmentos especiais de listagem. No final de 2003, havia apenas 2 companhias listadas no Novo Mercado e 3 listadas no Nível 2. Aos poucos a situação começou a mudar e a explosão das ofertas públicas iniciais de ações teve início em 2006. No ano de 2007, foram realizadas no Novo Mercado 41 ofertas públicas e no final daquele ano eram 92 as companhias listadas no segmento em questão.58

Como já abordado, o Brasil é um país que sempre ostentou uma forte concentração acionária nas companhias abertas. Muito embora esse quadro perdure até os dias de hoje, com um enorme número de companhias controladas por um acionista majoritário, que detenha mais de 50% de suas ações com direito a voto, ele começou a se flexibilizar a partir dos anos 2000, com o lançamento, pela BM&FBOVESPA, do Novo Mercado. A estrutura de propriedade do capital e de controle das companhias listadas no Novo Mercado é bem diferente da estrutura apresentada pelas companhias integrantes do sistema de negociação tradicional e até mesmo do Nível 1 e do Nível 2 da BM&FBOVESPA. E isso se deve muito ao fortalecimento dos direitos dos acionistas minoritários surgido com a regulamentação consubstanciada no Novo Mercado.

57 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

2013, p. 94.

58 GORGA, Érica.

(33)

Tendo como referência dados de 2006 e 2007, ÉRICA GORGA elaborou um

estudo demonstrando que, num universo de 92 companhias listadas àquela época no Novo Mercado, 65 não eram controladas por um controlador majoritário. Mesmo tendo se identificado que 20 dessas 65 companhias possuíam um bloco de controle ligado por acordo de acionistas, o número de companhias com capital disperso representava praticamente a metade das companhias listadas no Novo Mercado59. Para citar números um pouco mais atuais, segundo informações da BM&FBOVESPA, de um total de 125 companhias listadas no Novo Mercado em 2010, 47 possuíam mais de 51% de suas ações em circulação no mercado, sem estar em poder de um acionista controlador.60

Pela análise das características acionárias do capital social das companhias listadas no Novo Mercado, é possível concluir que o modelo do capital concentrado deixou de ser exclusivo, apesar de ainda ser largamente predominante. É prevalecente no Novo Mercado a presença de companhias com certo grau de dispersão acionária, caracterizadas pela presença de blocos de acionistas com participação minoritária no capital, alguns dos quais com efetivo poder de comandar a atividade empresarial: é o que se chama de controle minoritário.

59 GORGA, Érica.

Changing the paradigm of stock ownership from concentrated towards dispersed ownership? Evidence from Brazil and consequences for emerging countries. Nortwestern Journal of International Law&Business, v. 29, 2009, p. 439-554.

60 VALLENTI, G. Crise expõe empresas sem controladores. Valor Econômico. São Paulo, 17 ago.

(34)

2 A DINÂMICA DO PODER DE CONTROLE

2.1 A alocação do controle como forma de minimizar os problemas de conflitos de interesses

Constitui-se como um importante objeto de estudo no âmbito da governança corporativa a questão da incidência do principal/agent problem em estruturas

societárias. Na definição de JENSEN &MECKLING, uma relação de agência se define

como a relação contratual por meio da qual uma ou mais pessoas (principal) designa

outra pessoa (agente) para executar serviços em seu nome, envolvendo a delegação de algumas tomadas de decisão ao agente.61

No contexto societário, a problemática dessa relação entre agente e principal se consubstanciaria no conflito de interesses advindo de uma relação de agência entre, de um lado, aqueles que detêm o controle e administração da empresa, e, de outro, todos os demais agentes que conferem recursos ou esforços à sua viabilidade62. Esse é um problema que chama a atenção no direito societário, mormente em função do conflito dos inúmeros interesses que circundam uma sociedade.

Quando numa relação de agência, agente e principal atuam como utility

maximizers, são grandes as chances de que nem sempre o agente atuará conforme

o melhor interesse do principal63. O centro desse problema forma-se pela questão da determinação de quais os interesses devem ser perseguidos pelos controladores e administradores, no exercício de suas funções. O que se precisa é de uma definição sobre qual o interesse último da sociedade. Na busca dessa definição, a teoria contratualista de JAEGER identifica o interesse da sociedade como o interesse de

61 JENSEN & MECKLING. Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Costs and Ownership

Structure. 3 J Financial Economics 305, 308 (1976).

62 MACEDO, Ricardo Ferreira de. Controle não societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. p. 4. 63 JENSEN & MECKLING. Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Costs and Ownership

(35)

seus sócios, ao passo que a teoria institucionalista de RATHENAU identifica o

interesse da sociedade com o interesse público64. Na doutrina norte-americana, essas teorias foram refletidas no debate travado porBERLE e DODD.

Como frisado por RICARDO FERREIRA DE MACEDO, a partir desse debate houve

a evolução dos dois principais modelos de governança corporativa, representados pelo shareholder-oriented model e pelo stakeholder model65. O shareholder-oriented model respalda-se, fundamentalmente, na visão da empresa societária como objeto

de propriedade de seus sócios66. Disso resulta que o modelo de responsabilidade e gestão se direcionam, prioritariamente, para o atendimento do interesse dos sócios67. Na outra ponta se situa o modelo que privilegia o atendimento aos interesses laborais, os interesses dos próprios administradores, os interesses do Estado, ou os interesses da comunidade dos stakeholders, modelo esse conhecido

como stakeholder model.68

O modelo de gestão baseado no interesse dos sócios e, consequentemente, na maximização do valor da propriedade das ações detidas por seus titulares tornou-se o padrão de governança adotado nas principais economias do mundo, ainda que de forma não hegemônica69. Como contraponto ao shareholder oriented model,

existem os críticos adeptos da importância da responsabilidade social da empresa,

64 MACEDO, Ricardo Ferreira de. Controle não societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 7-8. 65 Por stakeholders entende-se que são todos aqueles que detenham interesse na atividade de

determinada empresa.

66 O liberal Milton Friedman, em artigo publicado no N.Y. Times, defendia que a responsabilidade

social da empresa é gerar lucro para os seus proprietários: “In a free-enterprise, private property system, a corporate executive is an employee of the owners of the business. He has direct responsibility to his employers. That responsibility is to conduct the business in accordance with their desires, which generally will be to make as much money as possible while conforming to the basic rules of the society, both those embodied in law and those embodied in ethical custom” (The Social

Responsibility of Business Is to Increase its Profits, N.Y. Times, Sept. 13, 1970, § 6º. (maganize) at 32).

67 No emblemático caso Dodge v. Ford Motor Co. julgado pela Corte do Estado de Michigan, nos

Estados Unidos, foi travada uma interessante discussão sobre qual deve ser o propósito final da empresa. No julgamento, a Corte considerou ilegal a decisão do Conselho de Administração, controlado por Henry Ford, acionista majoritário, de não pagar dividendos aos acionistas para investir os lucros na expansão do emprego na companhia. A conclusão do julgado foi de que a companhia deve ser organizada e conduzida para o fim principal de gerar lucros para os acionistas, de forma que os poderes dos administradores deve ser empregado para tal fim.

68 MACEDO, Ricardo Ferreira de. Controle não societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 8. 69 O labor-oriented model teve lugar na Alemanha do Segundo pós Guerra. Tal modelo impôs

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