• Nenhum resultado encontrado

Definição e considerações iniciais sobre o controle

3 CONTROLE MINORITÁRIO

3.1 Definição e considerações iniciais sobre o controle

O controle minoritário corresponde à situação em que o controle é exercido por menos da metade das ações com direito a voto de uma companhia122. Assim como o controle gerencial, o controle minoritário123 decorre diretamente do alto grau de dispersão acionária presente numa determinada companhia. No entanto, este se diferencia daquele na medida em que o grau de dispersão, apesar de alto, não é capaz de aniquilar inteiramente a relação entre propriedade e controle das decisões empresariais.

Nesse passo, uma distinção definitiva entre o controle gerencial e o controle minoritário relaciona-se com a natureza de cada um. Enquanto o primeiro se liga ao controle da empresa, o segundo refere-se ao controle societário, e deriva da propriedade acionária.

O controle minoritário pode se estabelecer de forma espontânea ou induzida. Se não houver mecanismos societários artificiais para se impedir que qualquer acionista detenha mais da metade das ações com direito a voto, ele será espontâneo. Será induzido, por outro lado, quando houver a imposição de limitações ao exercício do voto, ou quando se exigir que o acionista que atingir um determinado patamar no percentual do capital social com direito a voto faça uma oferta pública para adquirir as demais ações em circulação, medida que encarece a aquisição de controle, arrefecendo o desejo de compra por eventuais interessados.124

122 Os autores norte-americanos Berle e Means denominam o controle minoritário de working control

(BERLE, Adolph A; MEANS, Gardiner C. The Modern Corporation and Private Property, p. 69 e ss).

123 Erik Frederico Oioli faz uma crítica à denominação controle minoritário: segundo o autor, tal

denominação, além de criar certa confusão em alusão ao termo acionista minoritário, não representa com exatidão esse tipo de controle. Diz que, apesar de exercido com menos da metade das ações com direito a voto, essa modalidade de controle só existe porque seu detentor, ainda que com tal posição acionária, possui posição majoritária nas assembleias da companhia. O autor prefere utilizar a denominação controle diluído (OIOLI. Erik Frederico. op. cit. p, ).

Em complemento à dispersão do capital social e às medidas de proteção contra a aquisição do controle, um terceiro elemento primordial para a viabilização do controle minoritário é o absenteísmo dos acionistas nas assembleias gerais. Como frisado por ERIK FREDERICO OIOLI, o fenômeno representado por essa

modalidade de controle é cada vez mais comum em função da acentuação da diferença entre acionistas empresários e acionistas capitalistas ou investidores. Os empresários tem como objetivo conduzir a empresa, ao passo que os demais procuram investir capital sob administração alheia com o único propósito de auferir renda. Consequentemente, quanto mais numerosos forem os acionistas investidores no mercado de ações, maiores serão as oportunidades para os acionistas empresários conduzirem as atividades da sociedade com um pequeno percentual do capital votante.125

FABIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO FILHO afirmam que o sistema

societário brasileiro fez uma clara opção pelo controle minoritário com relação ao capital social total, ao estabelecer a regra segundo a qual até 50% do capital social pode ser representado por ações preferenciais (art. 15, § 2º, da Lei das S.A.)126. Tal

modelo foi estruturado para permitir a captação de recursos no mercado de capitais sem eliminar o controle. Por força da regra antes mencionada, o controle de uma companhia pode ser exercido com a propriedade de apenas 16,7% do capital social total. Porém, o controle minoritário objeto deste trabalho é aquele que corresponde ao universo de ações emitidas com direito a voto. E nesse universo, em regra, por mais contraditório que isso possa parecer, o controle será, na prática, majoritário.

Isso porque, a lei societária brasileira permite a votação por maioria dentro do capital votante. Nas palavras de FABIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO

FILHO:

125 OIOLI, Erik Frederico. Regime jurídico do capital disperso na lei das S.A. São Paulo: Almedina,

2014, p. 58.

126 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

O art. 129 da Lei das S.A. estabelece uma regra procedimental para a Assembleia, prevendo que tratando-se de Assembleia-geral, deverá votar favoravelmente a maioria dos presentes. A maioria ausente não é uma maioria, como deixaram claro os arts. 125, 135 e 136 da mesma lei. O primeiro e o segundo, ao preverem quoruns especiais para a primeira convocação de Assembleias Gerais Ordinárias e Extraordinárias, deixam claro que a mesma Assembleia poderá instalar-se em segunda convocação com qualquer quórum, i.e., que pode prevalecer o voto da minoria caso a maioria esteja ausente. O último dispositivo, ao prever a obrigatoriedade da aquiescência da maioria dos acionistas com direito a voto para as deliberações nele enumeradas, deixa claro, a contrario sensu, que as deliberações que ali não estejam enumeradas poderão ser aprovadas por acionistas representando a minoria do capital social com direito a voto.127

A respeito do artigo 136, da Lei das S.A., há flexibilidade mesmo quanto às matérias cuja aprovação requer o voto de acionistas que representem, no mínimo, metade das ações com direito a voto. Neste caso, o § 2º. do referido dispositivo prevê que a CVM pode autorizar a redução desse quorum qualificado no caso de companhia aberta com propriedade das ações dispersa no mercado, e cujas três últimas assembleias tenham sido realizadas com a presença de acionistas representando menos da metade das ações com direito a voto.

Esse quadro confirma ser inteiramente possível que um acionista, titular de menos da metade das ações votantes, comande a companhia de forma isolada.

FABIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO FILHO ainda defendem que o

controle minoritário também é reconhecido pelo art. 116, da Lei das S.A., uma vez que, a existência do requisito, para definição de acionista controlador, do uso efetivo do poder para dirigir as atividades sociais, só tem razão de ser em função da existência do controle minoritário. Prosseguem os autores dizendo que o uso do poder é irrelevante no caso de controle majoritário, visto que o acionista terá status de controlador pelo simples fato de deter mais da metade do capital social com

127 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

direito a voto, cabendo a eles as responsabilidades decorrentes, ainda que por omissão.128

Essa interpretação do art. 116 da Lei das S.A., porém, enfrentou resistência na doutrina. EDUARDO SECCHI MUNHOZ a desconstruiu com sucesso, ao ressaltar que

tal dispositivo não estabelece nenhuma distinção entre as espécies de controle (majoritário ou minoritário), ao se prever o requisito do uso efetivo do poder. E ainda defende que não parece correta a afirmação de que, no caso do controlador majoritário, o desuso do poder significaria que o comando da sociedade se exerceria em seu nome. O autor ilustra o seu posicionamento com o exemplo representado pelo acionista que detém mais da metade das ações com direito a voto, mas nunca comparece às assembleias, permanecendo em posição de total absenteísmo. O outro acionista que comparecer ao conclave, ainda que seja proprietário de menos da metade das ações, pode determinar a orientação dos negócios sociais, hipótese em que se caracteriza o controle minoritário.129

Parece ser correta a posição de EDUARDO SECCHI MUNHOZ, pois, como já foi

dito aqui, para a lei societária, não será considerado acionista controlador a pessoa que, embora detendo quantidade de ações que, em tese, lhe assegura a maioria dos votos em assembleia geral, não utiliza efetivamente tal poder para impor a sua vontade na condução direta dos negócios sociais e na eleição da maioria dos administradores.

De todo modo, é inegável que o art. 116, da Lei das S.A., admitiu implicitamente o controle minoritário, justamente por não exigir um percentual mínimo de ações para definir o controle acionário. É indiscutível, também, que o voto de acionistas titulares de ações que representem menos da metade das ações com direito a voto pode possibilitar o comando da companhia, em vista dos artigos 125, 135 e 136, § 2º, da Lei das S.A.

128 COMPARATO, Fábio Konder; SALOMÃO FILHO, Calixto. O poder de controle na sociedade

anônima. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 58.

129 MUNHOZ, Eduardo Secchi. Aquisição de controle na sociedade anônima. São Paulo: Saraiva,

Da mesma forma que o controle majoritário, o controle minoritário pode ser unipessoal ou conjunto. É unipessoal quando o seu exercício acontece por intermédio de apenas uma pessoa, física ou jurídica. O controle conjunto, por seu turno, é exercido por, no mínimo, duas pessoas, que vinculam as suas ações em acordo de acionistas. O sucesso do controle conjunto irá depender do nível de dispersão acionária e da convergência de interesses. Quanto maior a dispersão, menor será o número de ações necessárias para o exercício do controle societário; e quanto maior for a convergência de interesses, mais fácil será o domínio do processo de decisões societárias, com exceção daquelas que exigem quorum qualificado (art. 136, da Lei das S.A.).130

O fato é que o poder de controle minoritário será revestido de maior ou menor grau de estabilidade, a depender da atuação dos acionistas titulares de participações minoritárias, porém, expressivas no capital votante, em conjunto e visando objetivos comuns, seja em observância de acordos de voto arquivados na sede da companhia, seja em observância de acordos de voto não arquivados ou de compromisso informais e não escritos131.

Como bem colocado por Luís André N. de Moura Azevedo, são os acionistas ligados por acordos, oficiais ou não, que têm os estímulos necessários ao exercício, em conjunto, dos direitos e prerrogativas legais que, em razão da elevada dispersão acionária, podem lhes garantir o poder de controle minoritário132.

Por exemplo, numa companhia aberta submetida a controle exercido por acionistas que detém, em conjunto, menos do que a maioria das ações votantes, mas que são signatários de acordo de acionistas arquivado na sede, o poder de controle, ainda que minoritário, se reveste de certa estabilidade. Esse domínio só poderá ser ameaçado se houver um conluio dos demais acionistas ou uma aquisição

130 CASTRO, Rodrigo Monteiro de. Controle Gerencial. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 97. 131 AZEVEDO, Luís André N. Moura. Ativismo dos investidores institucionais e poder de controle nas

companhias abertas. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; MOURA AZEVEDO, Luís André N. de (Coord.). Poder de Controle e Outros Temas de Direito Societário e Mercado de Capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 233.

132 AZEVEDO, Luís André N. Moura. Ativismo dos investidores institucionais e poder de controle nas

companhias abertas. In: CASTRO, Rodrigo R. Monteiro de; MOURA AZEVEDO, Luís André N. de (Coord.). Poder de Controle e Outros Temas de Direito Societário e Mercado de Capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 233.

de ações que superem o número de ações detidas pelos acionistas ligados por acordo de voto133.

Apesar de constituir um importantíssimo instrumento para o surgimento e manutenção do controle minoritário, o acordo de acionistas arquivado na sede social não é decisivo para o surgimento dessa espécie de controle. Isso porque, basta que os votos de um acionista, ou de um conjunto de acionistas, unidos por acordo de voto ou compromissos de voto, ainda que não arquivado, ou mesmo não escrito, efetivamente prevaleçam nas assembléias gerais, permitindo a ele (s) dirigir as atividades empresariais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia, mesmo que por um período limitado.