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A Institucionalização das Escolas Brasileiras

CENA II: O DESPONTAR

1.2.1 O Embrião

1.2.2.3 A Institucionalização das Escolas Brasileiras

a partir das décadas finais do século XVIII, as ações do poder político, no que se referem à instrução pública brasileira, foram voltadas para a construção de um sistema de ensino público organizado. Durante todo o século XIX, tal como aconteceu em Portugal, o poder público brasileiro investiu em reforma da instrução pública, buscando criar e definir uma estrutura da educação nacional como um conjunto articulado de escolas e instituições de ensino superior e, principalmente, na organização de um ensino secundário que desse uma cultura geral à elite do país. (...) No caminho traçado pelo poder estatal desde os setecentos, com a absorção da responsabilidade pela instrução pública pelo Estado e logo fora do domínio da Igreja, o ensino de Desenho entrou nas tentativas de sistematização de uma organização de saberes a serem ensinados nesses espaços escolares. Surge como um saber necessário à formação profissional do cidadão, para atender à administração, à indústria e à economia do país (p.172)

A instituição da instrução oficial no Brasil iniciou-se logo após a independência do país, a partir da Carta Lei de 25 de março de 1824, que representa a primeira constituição brasileira. A Carta versava, dentre outros assuntos, ―sobre a garantia da gratuidade da Instrução primária a todo cidadão e sobre o direito ao acesso aos elementos das Ciências, Belas-Artes e Letras, através dos Colégios e Universidades‖ (Ibidem, p.173). A partir dessa carta, em 1827 foi outorgada a Lei de 15 de novembro que criou as primeiras escolas primárias do Brasil.

Valente (2007, p.111) destaca que o projeto de Lei previa que os professores primários ensinariam a ler, escrever e contar. Embora o conhecimento de Geometria fosse pensado como importante nas escolas de primeiras letras, em especial as noções necessárias às medições de terrenos e ao traço de figuras com régua e compasso, muita polêmica deu-se em relação a essa questão e o ensino de Geometria foi finalmente impugnado:

As tentativas de incluir na escolarização fundamental noções de Geometria foram infrutíferas do ponto de vista do que ocorreu de fato no ensino primário do Império.(...) De início por não haver professores habilitados e depois, em razão de não ser um conhecimento escolar solicitado para ingresso em nenhuma instituição de ensino secundário (Ibidem, p.113).

Definida a escolarização primária – escola de aprender a ler, escrever e contar - ―o estabelecimento dos cursos superiores no Brasil impõe a obrigação de definir quais deverão ser os pré-requisitos para ingresso do futuro médico, advogado e engenheiro‖ (Ibidem). Seguiu-se, então, um processo de transformação, principalmente no ensino secundário, que se encontrava fragmentado em forma de Aulas Régias provenientes da Reforma Pombalina.

Assim, a partir do Ato Adicional de 1834 começaram a ser tomadas providências com o intuito de organizar esse ramo de ensino, sendo criadas as Escolas Normais, os Liceus Provinciais a partir de 1835, e ainda o Colégio Pedro II em 1837. A urgência era formar mão- de-obra especializada que pudesse atuar em um sistema de ensino público eficaz, capaz de contribuir para a constituição da nação civilizada e compor o quadro do funcionalismo público administrativo e técnico.

O ensino secundário, que foi consolidando-se após a independência do país, tinha um caráter fortemente preparatório para o ensino superior. Segundo Valente,

a constituição das escolas primárias, a criação dos cursos jurídicos, do Colégio D. Pedro II, a solidificação dos preparatórios às escolas superiores, o aparecimento dos liceus provinciais, enseja a elaboração e seleção do que deve ser importante em Matemática para a formação

prévia, pré-universitária, do futuro bacharel. O caráter da escolarização secundária, por esse tempo, era de curso preparatório para o ensino superior. Não se tratava de formação do adolescente. Daí o fato de as Matemáticas ensinadas nos liceus e preparatórios serem aquelas valorizadas nos exames para ingresso ao ensino superior. E é por força dos exames preparatórios que as Matemáticas vão sendo amalgamadas à cultura clássico-literária predominante. (Ibidem, p.119)

. Foi no bojo da criação dessas instituições, então, que o Desenho começou a sair da esfera privada dos ateliês e das Escolas Militares, e passou a fazer parte da cultura escolar geral. Isso, por conta dos professores militares convocados para o ensino nos preparatórios, o que acabou difundindo a escolarização técnico-militar desen

-

professorado que atuaria na instruc .

O Colégio Pedro II era um colégio destinado à elite burguesa do Brasil e foi criado com o intuito de servir de modelo à escolarização secundária do país. Nesse colégio, ao longo do século XX, ―no processo de construção de um sistema de estudos simultâneos e seriados, organizados em um curso regular, o Desenho fez parte do quadro das vinte e duas disciplinas que foram distribuídas entre os sete anos do curso‖, trabalhado principalmente, vinculado aos saberes da Geometria e do Desenho Linear (TRINCHÃO, 2008, p. 200).

Já as Escolas Normais, instituídas em nosso país a partir da década de trinta dos oitocentos, foram intensamente influenciadas pelo chamado ensino mútuo

, chamados monitores. Estes eram os únicos que recebiam os ensinamentos diretamente do professor, e então, orientados pelos mestres, ensinavam os alunos mais atrasados. Os alunos eram divididos por classes, sendo que cada classe era dirigida por um monitor, que por sua vez, ficava com a responsabilidade de ensinar a turma.

A partir de 1832, na França, esse método passou a incluir o Desenho Linear12 em sua didática, já que o governo francês ―obriga a ensinar aos alunos-mestres o Desenho linear, a agrimensura e as outras aplicações da Geometria‖ (D‘ENFERT, 2007, p. 40). O ensino de Desenho, que passou a acontecer nas Escolas Normais, era baseado no manual de Louis Benjamin Francoeur13, Dessin Linéaire et arpentage, primeiro manual de Desenho dedicado ao ensino público com vistas à sua vulgarização, e organizado de acordo com as políticas educacionais de cunho iluminista no século XIX. Esse manual acabou constituindo o ―método‖ Francouer, trazendo como conteúdo não somente os elementos de Desenho, mas sim, uma didática de ensino de Desenho - o Desenho Linear.

Foi do saber em Desenho socializado nos tratados artísticos e militares, que surgiu a seleção dos conhecimentos básicos, como necessidade fundamental do aprendizado no ensino elementar público. De acordo com d‘Enfert (2007), ―o Desenho linear representa a transposição de saberes da Geometria Descritiva, criada pelo desenhista francês Gaspar Monge, no final do século XVIII e início do século XIX‖ (p. 36). Os propósitos do Desenho Linear estavam voltados ao ensino científico do Desenho e à sua aplicação prática na construção e reprodução de objetos, buscando um aperfeiçoamento profissional do alunado.

Da necessidade de organizac

, con

, que circulava pelas academias militares e ateliês, para o ensino

(TRINCHÃO, 2008, p.221).

12

O Desenho Linear é considerado não somente um saber, mas um método de ensino de Desenho. Este saber é produto (ou transposição) de conhecimentos mais amplos da Geometria Descritiva de Gaspard Monge, com vistas ao ensino primário. Um de seus principais pressupostos é que do aprendizado da técnica do Desenho através de instrumentos, sejam enfatizadas construções de desenhos a mão livre, buscando -se a justeza do olho e da mão. (TRINCHÃO, 2008).

13

Louis-Benjamin Francoeur viveu em Paris entre 1773 e 1849, seguiu a carreira militar e acadÊmica. Enquanto

o Bonaparte e na carreira acadê

. (TRINCHÃO, 2008, p.266).

, ―a partir da inserc

esteve a servico da formac -de-obra fabril, inclusive no Brasil‖, sendo incluído, por exemplo, ―na segunda cadeira da Escola Normal da Bahia, em 1836‖ (Ibidem, p. 218).

Logo,

a transposic

professores, promovida pelo manual de Francoeur, contribuiu para a socializac

, com sua inserc

, elementares e normais. Isso ocorreu independente dos percalc

, economicas e sociais incutidas no processo da criac

. (TRINCHÃO, 2008, p.370).

A chegada dos Liceus Preparatórios, das Escolas Normais e, sobretudo, do modelar Colégio Pedro II, deu início, portanto, ao processo de institucionalização do sistema de ensino brasileiro. Vale destacar que a partir da criação das Escolas Normais, o ensino primário em algumas escolas, em função da formação do professor, passou a além de ensinar a ler, escrever e contar, também a desenhar. O que é importante, de fato, é que nesse movimento, o Desenho foi ganhando espaço na formação da cultura geral do povo. Novas investidas quanto ao seu ensino vieram com Rui Barbosa e principalmente, com a onda de industrialização que tomou o Brasil nas primeiras décadas do século seguinte...

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