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A insuficiência da técnica processual individualista do Código de

1 O DIREITO MATERIAL E SUAS NOVAS DIMENSÕES FACE À

3.2 A insuficiência da técnica processual individualista do Código de

173 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Op. cit., p. 117-118.

174 De acordo com Fábio Bonomo, para quem: “Já restou claro que, pela característica do

direito ambiental, não há que se falar em tutela ressarcitória (pelo menos a priori), pois, por mais bem ordenada que seja a atividade processual, na doutrina e na prática, ela sempre irá consumir um bom tempo (primeiro com o processo de conhecimento e, de posse da sentença condenatória, com um processo de execução), tempo que pode ser letal às pretensões de se obter um ambiente hígido e equilibrado. ALCÂNTARA, Fábio Bonomo. Op. cit., p. 146.

A dinâmica presente nas sociedades modernas ultrapassa a esfera individual do cidadão que, inserido em alguns grupos sociais, se depara corriqueiramente com interesses heterogêneos, acarretando nos chamados “conflitos de massa”.

Situação muito comum quando se analisa a crise ambiental pela qual o planeta vem passando. Ora, um acidente nuclear, por exemplo, tem capacidade de ocasionar contaminação a um número alarmante de pessoas, com o desenvolvimento de síndromes agudas de radiação que afetam diversos órgãos, acarretando danos ao sistema cerebral, sistema gastrointestinal, como também, ao sistema hematopoiético, ou seja, comprometem as células da medula óssea, o baço e os gânglios linfáticos, principais núcleos de produção de células sanguíneas.

Durante muito tempo, embora a sociedade tentasse se resguardar minimamente contra este tipo de acontecimento, via-se de tolhida por não possuir mecanismos verdadeiramente aptos.

A adoção tradicional do processo civil não permitia a proteção dos direitos difusos, uma vez que o processo era visto como uma relação de dicotomia entre as partes, tendo como finalidade a solução do litígio individual entre as mesmas. Nesse tocante, os direitos oriundos de um grupo, público em geral ou a um segmento do público não eram satisfatoriamente atendidos nesse esquema175.

Basta uma simples análise do Código de Processo Civil datado de 1973 para descobrir que o referido diploma legal não previu meios que subsidiassem a proteção necessária para esses tipos de bens jurídicos. Decorrência própria do viés que prevalecia à época, de se preocupar em tutelar bens individualmente considerados, oferecendo respostas não tão satisfatórias, isto é, soluções justas e efetivas.

Desta forma, manifesta-se Elvio Sartorio:

A evolução social permitiu identificar direitos diferentes daqueles destinados no CPC/73. Hoje, ao pensar em conflitos jurídicos, deve-se pensar que o litígio individual, tutelado por indenização, é apena uma das miríades de possibilidades de conflitos das relações humanas, tendo em vista que junto dele, convivem direitos que ultrapassam (i) a mera condição individualista e alcançam um viés coletivo (direitos de segunda e terceira geração) ou, ainda, (ii) mesmo sendo coletivos ou individuais, não restam satisfeitos pelo estigma da mera reparação indenizatória, e a ambos, até pouco tempo, o CPC não se demonstrou um instrumento adequado.176

Pela demonstração dessa fragilidade tornou-se clara a necessidade de se buscar instrumento jurídico capaz de lograr êxito nessa empreitada. A busca pela implantação de novos mecanismos processuais, tornou-se, então, imperiosa.

A esse respeito, assinala Fábio Alcântara:

A mudança das relações na sociedade moderna, afastando-se do individualismo clássico, criou uma nova forma de tutela, que implica a necessidade de adequar o instrumento (processo) a seus novos objetivos. Essa modificação de paradigma pode ser observada com maior clareza no redimensionamento de institutos que tiveram alterações significativas em sede de processo coletivo. 177

Não é por outro motivo que, nas sociedades de massa, ao se vislumbrar uma tutela jurisdicional, esta não mais se enquadra em uma estrutura processualística individualizada, como se observa do Código de Processo Civil de 1973; haja vista que os objetos a serem tutelados estão inseridos nos chamados interesses difusos, cuja característica principal é a sua indivisibilidade e titulares indeterminados, como acontece na tutela do meio ambiente.

Acima, quando se verificou a questão da evolução normativa de proteção ao direito ambiental, percebeu-se que, apesar de haver alguns instrumentos voltados para este fim, por diversos motivos, nenhum conseguia proporcionar efetiva tutela.

176 SARTORIO, Elvio Ferreira. Tutela preventiva (inibitória): nas obrigações de fazer e não

fazer. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, p. 14.

Motivo que ensejou a criação, por meio da Lei nº 7.347/85, de um novo instrumento jurídico, a Ação Civil Pública, que possibilitou um alargamento do leque dos instrumentos processuais existentes até então no Brasil. Sob este aspecto, essas novas técnicas surgiram com o escopo de democratização do Direito, isto é, a promoção de uma justiça ideal e solução pacífica dos conflitos existentes nas relações sociais.

A Ação Civil Pública tem como objeto não só a proteção do meio ambiente. Engloba, também, os chamados interesses difusos e coletivos, como é o caso dos direitos do consumidor; a lesão a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; as infrações à ordem econômica ou qualquer outro dessa natureza.178

Contudo, o objeto a ser analisado no presente trabalho limitar-se-á às ações propostas visando a proteção do meio ambiente, que, inclusive, foi a válvula precursora para o nascedouro dessa ação, que surgiu com o fim precípuo de dar regulamento ao art. 14, §1º da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, a já tão lembrada Lei nº 6.938/81.

Além do que, é cediço que, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, assim como o Código de Defesa do Consumidor, tal instrumento de tutela jurisdicional tornou-se o mais relevante e utilizado meio protetivo, justamente por seu alto grau de eficiência quando se tem como finalidade a proteção ambiental.