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CAPÍTULO 2 – ESTUDOS ESTRUTURAIS DA MESOTELINA DE H sapiens

2.1.4. A interação entre mesotelina e a proteína MUC16

Mesotelina de camundongo com peptídeo FLAG fusionado no seu C-terminal foi utilizada na busca de linhagens celulares às quais pudesse se ligar (Rump et al., 2004). Por citometria de fluxo, determinou-se ligação a OVCAR-3. Uma biblioteca de cDNA dessas células foi construída, expressa em células COS-7 e as células que se ligaram à mesotelina foram enriquecidas por citometria de fluxo. Dois clones foram isolados e seqüenciados, um de 1,1 kb e

1981). A proteína MUC16 é altamente expressa na superfície celular de células de câncer de ovário epitelial e fragmentos proteolíticos solúveis são secretados no sangue. A melhor aplicação para MUC16 tem sido o monitoramento de pacientes com câncer de ovário, já que a diminuição dos níveis após quimioterapia primária é um fator prognóstico importante (Bast et al., 1998). A estrutura primária de MUC16 indica se tratar de uma proteína transmembrana com enorme porção extracelular, região transmembrana e pequena região intracelular (figura 27).

Figura 27: Esquema da proteína MUC16.

A porção extracelular de MUC16, de 22097 resíduos de aminoácidos, é formada pelo domínio N-terminal, de 12070 resíduos (O'Brien et al., 2002), seguido por mais de 60 repetições de um motivo de 156 resíduos e uma parte do domínio C-terminal de 229 resíduos (O'Brien et al., 2001). O domínio C-terminal contém uma região extracelular, região transmembrana de 25 resíduos, e curta cauda citoplasmática de 31 resíduos, que contém um sítio de fosforilação em tirosina, RRKKEGEY (Yin & Lloyd, 2001). O domínio N-terminal e os domínios repetitivos são

Domínio N-terminal

Domínio C-

terminal

Motivos repetidos

N-terminal Motivo que se repete Módulo SEA Parte extracelular do domínio C-terminal Cauda citoplasmática Região transmembrana

ricos em serina e treonina e altamente N e O-glicosilados. As repetições apresentam homologia com domínio SEA (Sea-urchin sperm, Enterokinase, Agrin). A estrutura do domínio SEA da proteína de camundongo homóloga à MUC16 humana foi determinada por RMN (Maeda et al., 2004; código PBD: 1IVZ). O domínio apresenta enovelamento do tipo sanduíche α/β, que pode ser dividido em duas camadas: uma formada por β1, β2, β3, β6 e α1, e outra composta por α2, α3,

β4 e β5 (figura 28).

Figura 28: Estrutura do domínio SEA (Maeda et al., 2004).

A ligação de mesotelina a MUC16 é capaz de aumentar a adesão entre células (Rump et al., 2004). Células LO (linhagem endotelial de camundongo) expressando mesotelina se ligaram a células OVCAR-3, que naturalmente expressam MUC16, e essa ligação foi abolida com a adição de anticorpos anti-mesotelina, comprovando que a interação entre as duas proteínas determinou a adesão dos dois tipos celulares. Além disso, através de bibliotecas de SAGE, foi possível correlacionar a expressão das duas proteínas (Rump et al., 2004). Das 154 bibliotecas analisadas, 20 continham 2 ou mais tags para mesotelina. Destas, 7 continham 2 ou mais tags para MUC16. De 123 bibliotecas consideradas negativas para mesotelina, apenas 1 continha 2 ou mais tags para MUC16.

A maior taxa de morte por câncer de ovário ocorre devido à metástase pela cavidade peritonial antes do diagnóstico. Nesse caso, a metástase não ocorre por disseminação nos vasos sangüíneos ou linfáticos, e sim pela migração de células. Já foi demonstrada a ligação de CD44H e integrina β de células de câncer de ovário a ácido hialurônico e fibronectina de células mesoteliais (Cannistra et al., 1993; Strobel & Cannistra, 1999). Sugeriu-se então que a ligação de MUC16 de células de câncer de ovário a mesotelina de células mesoteliais poderia também auxiliar no processo que leva a metástase. Bloquear essa interação poderia prevenir ou reverter a metástase e aumentar a sobrevivência dos pacientes (Rump et al., 2004). Já o trabalho de Yen e colaboradores (Yen et al., 2006), apresentado na página 66, sugeriu o mecanismo contrário. A mesotelina expressa nas células de câncer de ovário poderia se ligar às moléculas de MUC16 também presentes nessas células, aumentando a coesão entre as células do tumor e impedindo que estas se ligassem às células mesoteliais normais e se espalhassem pela cavidade peritonial.

A ligação entre mesotelina e MUC16 é de alta afinidade, com KD de 5-10 nM (Gubbels et al., 2006). Além disso, a ligação é dependente de glicanos N-ligados a MUC16, mas não da glicosilação de mesotelina, já que a ligação é abolida quando MUC16 é previamente tratada com

N-glicosidase PNGaseF mas ocorre normalmente quando mesotelina é expressa em bactéria (Gubbels et al., 2006).

O sítio de interação a MUC16 na mesotelina foi recentemente identificado por truncagem e mutagênese (Kaneko et al., 2009). É a região E296-L359, que corresponde aos primeiros 64 resíduos da mesotelina. Esse fragmento apresentou 100% da ligação a MUC16 quando comparado com a mesotelina inteira, mostrado por western blot, citometria de fluxo e ELISA. Ele também competiu com a mesotelina inteira pela ligação à MUC16 e mostrou-se capaz de impedir a adesão celular em concentrações de até 10 µg/mL para OVCAR-3 e até 1 µg/mL para células YOU (linhagem de mesotelioma humano). Dos quatro mutantes para alanina gerados nesse trabalho, 1 não foi capaz de ligar a MUC16 (Y318A), 1 reteve 100% da capacidade (H354A) e 2 tiveram a capacidade de ligação diminuída (W321A e E324A). Esses mutantes foram escolhidos baseando-se na conservação de seqüência (comparado com mesotelina de camundongo) e na possibilidade de ligação ao carboidrato.

No início de 2009 foi publicado um modelo da mesotelina (Sathyanarayana et al., 2009). A modelagem foi feita utilizando-se 9 programas diferentes de predição de estrutura secundária e 4 diferentes servidores de predição de estrutura terciária com a seqüência da proteína precursora MPF/mesotelina. A estrutura que aparece nos resultados de todos os programas é a carioferina α de Saccharomyces cerevisiae (código PBD: 1BK5). O modelo gerado sugere uma estrutura em super-hélice feita de repetições de hélices tipo ARM (figura 29).

Figura 29: O modelo da mesotelina. Em (a), par estéreo da representação de fitas do modelo; em (b),

alinhamento entre motivos repetitivos do modelo de mesotelina e da estrutura de 1BK5. As figuras foram retiradas de Sathyanarayana et al., 2009 e modificadas. A cadeia vai do N para o C-terminal de baixo para cima. As repetições 1, 3, 5 e 7 estão em laranja e as repetições 2, 4, 6 e 8 estão em amarelo. Os resíduos marcados em ciano no alinhamento estão mostrados da mesma cor no modelo e evidenciam posições onde geralmente há resíduos hidrofóbicos em repetições ARM. As setas horizontais no topo do alinhamento mostram as bordas das hélices da 7ª repetição de 1BK5. A seta vertical indica a posição da Y318 de mesotelina. As caixas em vermelho indicam a região de ligação a MUC16 (Kaneko et al., 2009).

a)

A região responsável pela interação com MUC16 compreenderia a primeira repetição e parte da segunda (figura 29) do modelo. A Y318, que se mostrou essencial à ligação, deve se localizar entre duas hélices da primeira repetição, enquanto W321 e E324 estariam localizados no início e no meio, respectivamente, da hélice que vem em seguida na mesma repetição.

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