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A internalização das regulações: Continuum da Autodeterminação

A Teoria da Autodeterminação (DECI; RYAN, 1985; RYAN; DECI, 2000a, 2000b) propõe que a motivação extrínseca pode ser compreendida como variando em quatro tipos de acordo com diferentes graus de autodeterminação. Esse desmembramento da motivação extrínseca apoia-se no conceito de internalização, um processo ativo pelo qual demandas do ambiente ou regulações externas são transformadas em autorregulações, tornando-se um valor pessoal. Desta forma, a motivação é expressa por meio de um continuum de autodeterminação, como pode ser visto no Quadro 1, no qual estão presentes todos os tipos de regulação

propostos teórica e empiricamente: desmotivação, motivação extrínseca, e motivação intrínseca.

É importante destacar que o fato do processo de internalização e assimilação de regulações ser expresso por meio de estados não sugere que ele seja a manifestação de um desenvolvimento linear, em que a pessoa deverá passar por cada estágio do continuum. Ao contrário, ela pode rapidamente internalizar uma regulação nova, como a mudança de série, ou de professor, em qualquer ponto do continuum, dependendo dos fatores situacionais desta regulação e de suas experiências anteriores (RYAN; DECI, 2000a).

Comportamento Ausência de autodeterminado determinação

Motivação Ausência de

motivação Motivação Extrínseca Motivação

Intrínseca

Estilos

reguladores regulação sem regulação externa introjetada regulação identificada Regulação regulação integrada regulação intrínseca

Locus de causalidade percebido

impessoal externo algo externo Algo

interno interno Interno Processos reguladores ausência de intenção, desvalorizaç ão, falta de controle submissão, recompensa s externas e punições autocontrole, ego envolvimento , recompensas internas e punições Importânci a pessoal, valorização consciente concordância , consciência, síntese com o eu interesse, prazer e satisfaçã o inerente

Quadro 1 - Continuum de autodeterminação, tipos de motivação com os seus loci de causalidade e processos correspondentes. (Fonte: DECI; RYAN, 2000)

Na extremidade esquerda do continuum encontra-se a desmotivação, um estado caracterizado pela ausência de intenção ou impulso para agir, pelo fato de o indivíduo não atribuir valor à ação, não se sentir competente para fazê-lo, não esperar obter resultados, nem se preocupar, caso lhe sejam oferecidas

recompensas ou punições. Comportamentos desmotivados são iniciados e regulados por forças totalmente fora do controle da pessoa. (DECI; RYAN, 1985; RYAN; DECI, 2000b).

Na sequência, tem-se a motivação extrínseca em sua expressão menos autônoma, regulada externamente. Nela, a pessoa age para atender uma demanda social externa, como uma recompensa ou para fugir de uma punição. Seu comportamento é controlado ou alienado, com lócus de causalidade externo. Por exemplo, um estudante com este tipo de regulação, estuda para uma prova ou teste para obter uma boa nota ou evitar ser ridicularizado pelos colegas como incompetente, ou na gíria popular, “burro”. Este aluno, provavelmente, não irá buscar informações adicionais para melhorar sua compreensão sobre o conteúdo discutido em sala ou mesmo para a realização de uma atividade avaliativa (DECI; RYAN, 1985; RYAN e DECI, 2000a).

O segundo nível de motivação extrínseca é a regulação introjetada, na qual as pressões exercidas sobre o comportamento são internas. O individuo realiza uma atividade para atender as expectativas do seu ego e, assim, se sentir orgulhoso e evitar sentimentos de culpa ou ansiedade. Implica em ele ter uma regulação interna, mas não aceitá-la como própria. Portanto, há uma internalização no individuo da regulação para a atividade, entretanto, esta não se apresenta como originada dele, o que a caracteriza como coercitiva e o seu lócus de causalidade ainda é externo (DECI; RYAN, 1985). Este é o caso de um estudante que cumpre as atividades escolares para evitar o sentimento de culpa de não corresponder ao investimento físico e financeiro que seus pais estão oferecendo a sua educação, ou para não parecer “burro” para os demais.

Um tipo mais autodeterminado da motivação extrínseca é a regulação identificada. Identificação consiste em uma valorização consciente das metas e regras da regulação ou do comportamento, em que a pessoa atribui uma importância pessoal à ação. Nesse caso, seu lócus de causalidade é interno. Um exemplo desse tipo de motivação é aquele aluno que estuda com afinco a matéria de matemática no ensino fundamental ou médio por entender que essa disciplina será importante para ser um futuro administrador de empresas (RYAN; DECI, 2000a).

O tipo mais autônomo de motivação extrínseca é a regulação integrada e a integração ocorre quando uma regulação identificada é totalmente assumida pelo

self. O que significa dizer que elas foram avaliadas e agrupadas com outros valores

e interesses pessoais já constituídos. Porém, elas são realizadas a fim de se obter um resultado satisfatório e não pelo puro e simples prazer em fazê-las, como é o caso da motivação intrínseca. Ratelle et al. (2007) afirmam que este tipo de regulação é mais comum em adultos e não em adolescentes, que serão o foco desta pesquisa. Por esse motivo, a regulação integrada não será avaliada neste estudo.

No fim do continuum, tem-se a motivação intrínseca, apresentada anteriormente, que refere-se a tendência inata para explorar, desenvolver e aplicar habilidades e capacidades. Motivadas intrinsecamente, as pessoas se engajam em atividades pela satisfação e interesse inerente a elas.

Como já afirmado anteriormente, a ocorrência da motivação intrínseca no contexto escolar é difícil de ser promovida e encontrada nos alunos, dada as próprias características que permeiam esse ambiente. Contudo, é possível motivar os alunos em atividades e lições que são importantes, mas não necessariamente intrinsecamente interessantes. Em outras palavras, o professor pode favorecer a adoção por parte dos alunos dos tipos mais autônomos de motivação para realizarem suas tarefas escolares, ajudando-os no processo de internalização, descrito anteriormente (REEVE; 2004).

Assim, o conceito de motivação autônoma possui uma relevância considerável para o contexto educacional. Por isso, nesta pesquisa ele será a base para se avaliar as razões que os estudantes autorrelatarem para fazer a tarefa de casa de matemática.