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4 DA APLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AO

4.1 A Lei de Improbidade Administrativa aplicada aos cargos políticos

AGENTE PÚBLICO QUE PRATICA O ATO DE ASSÉDIO MORAL

Levando-se em consideração os julgados analisados69 dentre os presentes na jurisprudência Brasileira, foi possível verificar que ao enquadrar o agente público que comete o ato de assédio moral como um agente improbo, este poderá ser submetido à imposição das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa. Com isso, algumas indagações importantes são levantadas, dentre elas: a) caberia a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes denominados agentes políticos, visto que estes estão sujeitos ao enquadramento e punição pelo crime de responsabilidade regulado pela Lei n° 1079/50, ou no caso dos prefeitos regulado pelo decreto-lei n° 201/67 ; b) O assédio moral foi considerado pela jurisprudência como ato capaz de ferir os princípios que regem a administração pública, quais seriam estes princípios atingidos e o que a doutrina e jurisprudência lecionam sobre eles; c) o que prevê o projeto de Lei em tramitação no senado, o qual determina a inclusão do ato de assédio moral na Lei de Improbidade Administrativa?.

Portanto, utilizaremos este capítulo para abordar e tentar esclarecer todas estas indagações.

4.1 A Lei de Improbidade Administrativa aplicada aos cargos políticos

Como visto anteriormente os agentes políticos compreendem uma espécie dentre o gênero agente público, sendo estes dotados de prerrogativas e obrigações instituídas pela administração pública. Com isso, ao desempenharem determinada função, reconhecida com uma função de comando qualquer ação ou omissão por este tomada é dotada de responsabilidade e passível de punição.

Nesta linha de pensamento é perfeita a colocação feita pelo professor Adilson Abreu Dallari ao destacar que: é necessário deixar claro que em um sistema republicano, a possibilidade de se responsabilizar todo e qualquer governante é essencial, sendo equivocada a ideia que a punição de agente político configuraria agressão ao sistema constitucional 70.

69 Ver anexo 1.

70 DALLARI, Adilson Abreu. A Responsabilidade do Agente Político. In: Revista da faculdade de direito de

São Bernardo do Campos. v. 6, n. 1 (2000), Rio de Janeiro,200. P. 14-15. Disponível em https://revistas.direitosbc.br/index.php/fdsbc/article/view/569 acesso em 12/10/2017.

A Constituição da República de 1891 já previa a responsabilização de agentes políticos que causassem lesão à moralidade administrativa o que acarretaria na configuração do crime de responsabilidade. A lei de n° 1079/50 define os crimes denominados crimes de responsabilidade e regula o processo de julgamento destes, determina também, quais serão os sujeitos que poderão configurar como sujeitos ativos do crime, sendo estes: o Presidente da República, os Ministros de Estado, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, o Procurador- Geral da República, os Governadores e Secretários dos Estados. E no caso em que o sujeito ativo ocupe o cargo de prefeito municipal, o crime de responsabilidade será regulado pelo decreto Lei 201/67 71.

A discussão quanto à aplicação ou não da lei de improbidade administrativa aos cargos políticos ocorre por duas vertentes, à primeira por entender que devido a existência de um foro especial por prerrogativa de função inerente a determinados agentes, estes não estariam sujeitos a Lei de Improbidade Administrativa72; já a segunda vertente defende que pela existência de identidade de sanções puníveis pelo um mesmo fato, previstos concomitantemente na lei n°1079/50 (crimes de responsabilidades), no decreto-lei 201/67 e, na lei 8429/92 (lei de improbidade administrativa), também não seria possível a aplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos, pois os mesmo já responderiam pelos atos configurados como crime de responsabilidade, e caso fossem enquadrados na Lei de Improbidade Administrativa concomitantemente com o crime de responsabilidade estaríamos diante da ocorrência de bis in idem73.

De acordo com o entendimento do STF na RCL n° 2138/D.F 74 de 2007, onde a presente Reclamação foi ajuizada sob o pressuposto de que a ação de improbidade proposta contra o ex-ministro de estado não poderia ter curso perante a Justiça Federal de primeira instância, pois as imputações de improbidade, quando formuladas contra agentes políticos,

71 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 27 ed. São Paulo: Atlas, 2014, p.905.

72 Tem-se, desta forma, que o Presidente da República, por exemplo, é processado e julgado pelo STF (art. 102,

I, b, da Constituição Federal), o mesmo ocorrendo com os Deputados Federais e Senadores. Já os Governadores e as demais autoridades referidas pelo art. 105, I, a, serão julgados pelo STJ. Juízes de Direito e Promotores de Justiça, pelo Tribunal de Justiça (96, III), o mesmo ocorrendo quando se tratar de conduta praticada por Prefeito (art. 29, X). BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 10/11/2017.

73 “Outro princípio comum às sanções punitivas aplicadas pelo Estado é a proibição do bis in idem, conceituado

como a dupla punição por um mesmo fato. Proibição de dupla punição não se confunde com a proibição de dupla penalidade, isto é, quando a norma prevê como penalidade para sua ofensa duas restrições de direitos a serem impostas pela mesma autoridade em uma única punição- no âmbito de um único processo estatal que garanta a ampla defesa e o contraditório, tal como a sanção para um crime que se constitua de pena privativa de liberdade e pena de multa, concomitantemente.” ARÊDES, Sirlene. Responsabilização do agente público: individualização das sanções por ato de improbidade administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2012. P. 57.

74 STF. Pleno. RCL n° 2138/DF. Relator; Nelson Jobim, j.13.06.2007, Dje 18.04.2008 disponível em :

configurariam crimes de responsabilidade. No caso em tela, como se tratava de um ministro de Estado, era defendido que a competência para julgamento seria do STF. E assim, a suprema corte decidiu que punir o agente político por improbidade administrativa e por crime de responsabilidade, caracteriza o bis in idem, portanto nos casos em que o sujeito cometer um ilícito previsto tanto na Lei de improbidade quanto na de crime de responsabilidade, sendo o sujeito Presidente da República, Ministro de Estado, Procurador-Geral da República, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Governadores e Secretários de Estado, deverá ser aplicada a legislação mais específica para estes agentes, que no caso será a de crime de responsabilidade regulada pela Lei n° 1079/50.

Mas, posteriormente a suprema corte mudou seu entendimento em diversos julgados entendo pela possibilidade de sujeição dos agentes políticos ao duplo regime jurídico. Assim, dispõe o informativo 853 do STF, o qual destacou que todos os agentes estatais, inclusive os agentes políticos, devem utilizar-se do princípio da moralidade como pressuposto necessário e legitimador de seus atos governamentais.

Com isso, o Supremo reconheceu a possibilidade de responsabilização política de acordo com a Lei n°1079/50 e a responsabilização civil por improbidade administrativa conforme a Lei n° 8429/92, exceto para Presidente da República. Neste mesmo sentido prevê o REsp 1282046/RJ destacando que caberá apenas observar as restrições em relação ao órgão competente para impor as sanções quando houver previsão de foro privilegiado “ratione personae” na Constituição Federal 75.

O Superior Tribunal de Justiça também compactua deste entendimento adotado pelo STF, e determinou no REsp 1282046/RJ, in verbis:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGENTES POLÍTICOS. COMPATIBILIDADE ENTRE REGIME ESPECIAL DE RESPONSABILIZAÇÃO POLÍTICA E A LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. 1. Primeiramente, é de se destacar que os órgãos julgadores não estão obrigados a examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado durante um processo judicial, bastando que as decisões proferidas estejam devida e coerentemente fundamentadas, em obediência ao que determina o art. 93, inc. IX, da Constituição da República vigente. Isto não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. Neste sentido, existem diversos precedentes desta Corte. 2. Esta Corte Superior admite a possibilidade de ajuizamento de ação de improbidade em face de agentes políticos, em razão da perfeita compatibilidade existente entre o regime especial de responsabilização política e o regime de improbidade administrativa previsto na Lei n. 8.429/92, cabendo, apenas e tão-somente, restrições em relação ao órgão competente para impor as sanções quando houver previsão de foro privilegiado ratione personae na Constituição da República vigente. Precedentes. 3. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte provido. (REsp 1282046/RJ, Ministro

75 STF. Informativo n°853. Disponível em:

MAURO CAMPBELL MARQUES, Órgão Julgador SEGUNDA TURMA, Data do Julgamento 16/02/2012, Data da Publicação/Fonte DJe 27/02/2012) 76.

Quando a discussão diz respeito aos agentes políticos que ocupam o cargo de prefeito, o Superior Tribunal de Justiça adota jurisprudência assentada, inclusive por sua Corte especial, no sentido que não existe norma constitucional que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanções por ato de improbidade administrativa, exceto quando o agente político em tela for o Presidente da República, devido ao julgamento deste se dá em regime especial pelo senado federal de acordo com os artigos 85, V e artigo 86 da Constituição federal 77.

Assim dispôs o STJ no AgRg no AREsp 369.518/SP: “A jurisprudência de ambas as Turmas que integram a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que os agentes políticos municipais se submetem aos ditames da Lei n.8.429/1992, sem prejuízo da responsabilização política e criminal estabelecida no DL n. 201/1967.” 78

O STF também já exauriu o seu entendimento, determinando a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa concomitantemente com a responsabilização criminal estabelecida no Decreto-Lei 201/67, conforme determinado em sede de repercussão geral no RE n ° 683.235:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. AGENTE POLÍTICO. DESVIO E APLICAÇÃO INDEVIDA DE RECURSOS DO FUNDEF. LIBERAÇÃO DE VERBAS SEM PRÉVIA LICITAÇÃO. FRAUDE EM

PROCESSOS LICITATÓRIOS. DESNECESSIDADE DE LESÃO

PATRIMONIAL AO ERÁRIO PARA CARACTERIZAÇAO DE ATO DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA QUE VIOLE PRINCÍPIOS

ADMINISTRATIVOS. 3. Os Prefeitos Municipais, ainda que sejam agentes políticos, estão sujeitos à Lei de Improbidade Administrativa, conforme o disposto no art. 2º dessa norma, e nos artigos 15, V, e 37, § 4º, da Constituição Federal. Também estão sujeitos à ação penal por crime de responsabilidade, na forma do Decreto-Lei nº. 201/67, em decorrência do mesmo fato. Precedentes do STJ e deste Tribunal 79. [grifos nosso]

76 STJ. REsp 1282046/RJ. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Segunda turma. Data do Julgamento

16/02/2012, DJe 27/02/2012. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21357403/recurso- especial-resp-1282046-rj-2011-0224344-7-stj/inteiro-teor-21357404 . Acesso em : 19/10/2017.

77 STJ. RE no RESP 1.108.490/RJ. Relator: Ministro Humberto Martins. Dj. 02/02/2001.

78 STJ. AgRg no AREsp 369.518/SP. Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em

13/12/2016, DJe

28/03/2017https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=769516 37&num_registro=201300419103&data=20171026&tipo=91&formato=PDF. Acesso em 28/11/2017.

79 STF. RE 683.235/PA. Relator: Ministro Cezar Peluso. Plenário. Data do Julgamento: 30/08/2012. Disponível

Portanto, quanto à discussão a respeito da aplicabilidade ou não da Lei de improbidade administrativa aos agentes políticos devido à existência de foro especial por prerrogativa de função ou por acarretar o in bis idem, concluímos, a partir das jurisprudências atuais do STF e do STJ, que exceto quando o agente político for o Presidente da República, todos os outros agentes políticos estarão sujeitos a incidência na lei de improbidade administrativa juntamente com o crime de responsabilidade, tanto o previsto na Lei 1.079/50 quanto o disposto no Decreto-Lei 201, seguindo o preceito constitucional que determina a incomunicabilidade das instâncias proporcionando a aplicação de ambas legislações simultaneamente, assim dispõe o artigo 37 § 4 da C.F : “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível” 80.

Importante colocação fez o doutrinador Fabio Medina Ozório onde destaca que se equipararmos, para os agentes políticos, a improbidade administrativa ao crime de responsabilidade, os tornando-os imunes a LIA, estaríamos vulnerabilizando aos princípios da independência das instâncias punitivas. O mesmo conclui que devemos diferenciar os crimes de responsabilidade, como de direito penal que se cuida, e já na improbidade, estaremos diante do direito administrativo em seu papel sancionador 81.

Portanto, deve existir um controle severo frente aos agentes políticos, pois os mesmo são dotados de prerrogativas públicas inerentes ao cargo que ocupam, e quando estes através de seus atos desviam-se do fim a que se destina sua função, devem ser punidos pelos atos ímprobos de acordo com a Lei de Improbidade Administrativa. E, para não caracterizar o bis in idem ao aplicar as sanções ao sujeito que foi enquadrado tanto na Lei de improbidade Administrativa quanto na de crime de responsabilidade, deverá o magistrado distinguir as sanções políticas previstas no crime de responsabilidade das sanções previstas na lei de improbidade, aplicando as sanções políticas previstas para os crimes de responsabilidade, tais como: perda do cargo e inabilitação para o exercício da função pública, quando configurada a existência de crimes de responsabilidade concomitantemente com as demais sanções previstas

80 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 10/11/2017.

81 OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública: corrupção:

no art. 12 da Lei de Improbidade administrativa, quando configurada a existência da improbidade administrativa 82.

4.2 O assédio moral como ato capaz de ferir os princípios da legalidade, impessoalidade e