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A leitura multimidial

No documento 2013MaireJosianeFontana (páginas 52-57)

2 LEITURA E EXPERIÊNCIA LITERÁRIA: MULTIPLICIDADE E

2.2 A leitura multimidial

Quando se fala em literatura, logo nos vem à mente a imagem de livros impressos. Contudo, a leitura pode ser realizada não apenas por meio impresso, mas também por outros suportes de informação, como os meios digitais, mais especificamente o computador.

A leitura na tela do computador faz-nos refletir sobre o espaço que esse suporte vem ocupando na vida contemporânea, nas maneiras de ler e de se comunicar que ele propicia, e, ainda, no confronto que vem acontecendo entre esse suporte de leitura e o livro impresso. O livro, que já foi considerado sinônimo de modernidade, hoje disputa espaço com os computadores, que representam o novo e apresentam tecnologias mais sofisticadas. No entanto, é necessário destacar que a preferência pelo uso do computador não põe em risco a existência do livro.

Zilberman (2007, p. 188), em relação à leitura em suporte digital, destaca que:

Como a introdução à realidade virtual depende do domínio da leitura, essa não sofre ameaça, nem concorrência. Com efeito, fortalece-se, por dispor de mais um mecanismo para sua difusão. Quanto mais se expandir o uso da escrita por intermédio do meio digital, tanto mais a leitura será chamada a contribuir para a consolidação do instrumento, a competência de seus usuários e o aumento de seu público.

Desse modo, diante da tela do computador, os leitores continuam a ler, sendo ainda mais difundida, mudando apenas o suporte de leitura. No entanto, adquirem novos comportamentos, sendo-lhes permitido, por exemplo, criar seus próprios textos, formando uma tessitura a partir da combinação de vários fragmentos, segundo seus interesses, que vão formando um novo texto. O que esse leitor possui diante do computador é uma imensa variedade de opções que conduzem a uma leitura “globalizada”, sendo comum uma leitura não linear, descontínua, favorecida pelas interfaces eletrônicas, já que existe a possibilidade de adentrar outros textos a partir do texto que está sendo lido, formando um imenso hipertexto.

O hipertexto se difere do texto convencional porque não impõe ao leitor uma ordem de leitura, já que na tela do computador ele tem à sua frente vários caminhos a serem seguidos. Porém, deve-se atentar para essa forma de leitura, pois, assim como ela pode permitir uma compreensão global do texto, pode também fragmentar o texto de tal forma que acabe deixando o leitor confuso e disperso.

Não é necessário considerar a tela do computador como uma página, mas como um espaço tridimensional, dotada de amplitude, de altura e de profundidade, como se os textos atingissem a superfície da tela a partir do fundo do aparelho. Consequentemente, no espaço digital não é o objeto que é dobrado, como no caso da folha do livro manuscrito ou impresso, mas o texto mesmo. A leitura consiste, por conseguinte, em “desdobrar” esta textualidade móvel e infinita.

Temos, assim, uma nova maneira de ler, uma maneira fragmentada, descontínua, não linear, que permite que o leitor, de dentro de um texto, tenha acesso a outros textos, e, dessa forma, possa “desdobrar” o texto, descobrindo-o, entendendo-o, a partir de uma nova forma de leitura. A relação de interatividade entre leitura e hipertexto permite a ação do leitor sobre o conteúdo, e possibilita um diálogo, mesmo que virtual, com o texto. Portanto, o sentido do

texto não está em suas palavras, nem na mente do leitor, mas na interação

texto-leitor-contexto, unindo as informações que este já possui com as que o texto fornece para que ele infira significados e represente mentalmente o que o texto provoca ou descreve.

A leitura do texto eletrônico coloca o leitor contemporâneo diante de uma textualidade móvel e infinita que lhe oportuniza fazer ajustes no texto. Tendo a tela como suporte, é possível navegar de um texto a outro a partir de links, os quais proporcionam uma navegação infinita.

A partir desse novo relacionamento entre leitores e textos e entre leitores e escritores, tendo como suporte a tela do computador e a internet, surge o leitor de telas, também chamado, de acordo com Santaella (2004), de “leitor hiperextensivo” ou “leitor imersivo”, que se diferencia do leitor surgido no século XVIII porque agora pode participar da confecção do texto que lê. É, portanto, um leitor interativo e livre para escolher os rumos de sua leitura, livre para fazer intervenções antes impensáveis, e que, dessa forma, acaba mesclando-se com o escritor do texto.

Com relação ao livro eletrônico, Chartier (1999) descreve-o como uma revolução nas estruturas do suporte material do escrito assim como nas maneiras de ler. Assim, esse novo modelo de livro promovido por um suporte virtual transformou as relações sensoriais, elementos importantes no processo de leitura. O que antes era entendido como livro cede espaço para uma nova formatação que constitui o não livro. A tela não possibilita a sensação do manuseio como o livro tradicional. Não há mais uma relação afetiva; os sentidos não são mais os mesmos aguçados como no livro impresso, no qual se fazem presentes e bem marcantes o tato, o contato direto com o objeto, a visão, que é atraída pela cor, pelo formato, e

até o olfato, que identifica se o livro tem cheiro de novo, de velho etc. No livro eletrônico, apenas a visão atua extensivamente.

Trata-se, segundo Chartier (2007), de um processo que transcende o livro impresso, seu conteúdo, os conceitos de autoria, a noção de diálogo, alargando o conceito de leitura, uma vez que a interatividade é um elemento constante nesse novo formato, que permite o alargamento da noção de leitura e que vai além do livro como conhecemos. No meio eletrônico, há uma diversidade de textos, os quais são produzidos ou recebidos pelos leitores de formas bem semelhantes, normalmente decididas pelo próprio leitor. Dessa forma, cria-se uma continuidade textual que torna difícil distinguir os gêneros de texto, já que a leitura em frente à tela é descontínua. O mundo eletrônico permite uma relação inovadora entre os textos, impondo a estes uma nova forma de organização, que não é mais linear ou dedutiva como era em meio impresso.

O texto eletrônico, diferentemente do impresso, é um texto móvel, maleável, e o leitor pode intervir nele da maneira que julgar mais conveniente, fazendo alterações não somente em suas margens, mas também em seu conteúdo, que pode ser reduzido, aumentado, deslocado ou marcado. Ocorre, dessa maneira, uma variação nas formas como as obras são dadas a ler e, possivelmente, nos sentidos que os leitores atribuem aos textos que tornaram seus.

As inúmeras formas de interação possibilitadas pelo ambiente virtual entre os cibernautas criam comportamentos inovadores. Atualmente, estamos diante de uma sobrecarga de informação, disponível a todos que têm acesso à Internet. Isso exige que tais informações sejam filtradas pelos leitores, para que possa se transformar em conhecimento, ajustando-se ao contexto em que estamos inseridos.

É interessante destacar que, quando uma nova formação cultural surge, a anterior não desaparece, pois elas se unem, se interpenetram. Observa-se que, com o surgimento da escrita, não desapareceu a oralidade, assim como com o surgimento da escrita virtual, não desapareceu a escrita no papel. Há, portanto, uma interdependência entre elas. Segundo Santaella (2007, p. 128), “todas as formas de cultura, desde a cultura oral até a cibercultura hoje coexistem, convivem e sincronizam-se na constituição de uma trama cultural hipercomplexa e híbrida”. Assim, vivemos hoje uma mistura das mais variadas formas de cultura (oral, impressa, escrita, midiática, entre outras).

Atualmente, estamos convivendo com uma ‘nova geração’ chamada de Homo

zappiens (VEEN; VRAKKING, 2009), que desafia os educadores a uma redefinição dos

“nasceu com um mouse nas mãos”, que descobriu o mundo pelos recursos tecnológicos, por meio de uma imensa variedade de canais de televisão, jogos de computador, iPods, sites,

blogs e telefones celulares, ou ainda que acessam, o Twitter, o Facebook ou o Skype, e

conhecem as câmeras digitais, o Smartphone, dentre tantos outros meios que permitem à atual geração ter controle sobre o fluxo de informações, além de mesclar comunidades virtuais e reais, comunicando-se em rede e colaborando entre si, de acordo com suas necessidades. O

Homo zappiens consegue resolver problemas com muita habilidade, sabe se comunicar muito

bem, e é um processador ativo de informações. Esses sujeitos cresceram em um mundo onde informação e comunicação estão disponíveis a quase todas as pessoas e podem ser usadas de maneira ativa.

Hoje, as crianças passam boa parte do dia em frente à TV, jogando no computador ou conversando com seus amigos e outras pessoas em bate-papos virtuais. Dessa forma, processam uma grande quantidade de informação por meio das tecnologias. Diante disso, Veen e Vrakking (2009, p. 20-30) consideram que:

Os usos dessas tecnologias influenciaram o modo de pensar e o comportamento do

Homo zappiens. Para ele, a maior parte da informação que procura está apenas a um

clique de distância, assim como está qualquer pessoa que queira contatar. Ele tem uma visão positiva sobre as possibilidades de obter a informação certa no momento certo, de qualquer pessoa ou de qualquer lugar. [...] Chamaremos essa geração de

Homo zappiens, aparentemente uma nova espécie que atua em uma cultura

cibernética global com base na multimídia.

Em meio a essa nova geração, que tem acesso a tanros novos formatos, não se pode esperar que ajam baseados em comportamentos antigos, sendo necessária, portanto, uma adequação no que se refere às tecnologias e seus usos.

Contudo, é necessário considerar que essa geração não é absoluta, afinal, ainda há espaços que estão distantes dessa realidade, tanto domicílios como ambientes escolares, que comportam sujeitos que não fazem parte da geração Homo zappiens.

No documento 2013MaireJosianeFontana (páginas 52-57)