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A MANCHESTER MINEIRA

No documento darielidaltrozoilha (páginas 33-36)

Localizada na Zona da Mata de Minas Gerais, Juiz de Fora conta com uma população estimada de 559.636 habitantes de acordo com projeção para o ano de 2016, e com uma área de 1.435,664 km2 (IBGE, 2017). Atualmente a divisão territorial do município, de acordo com dados da prefeitura, compreende 446,551 km2 de área urbana e 983,324 km2 de área rural divididos em quatro núcleos urbanos: Juiz de Fora (cidade), e as localidades situadas próximas aos distritos sede de Torreões (Humaitá, Monte Verde, Toledos e Pirapitinga); Rosário de Minas (Penido e Valadares) e Sarandira (Caeté). Alguns povoados passaram à categoria de bairros, deixando a condição de aglomerados urbanos isolados, como no caso de Igrejinha, Paula Lima e Chapéu D’Uvas, Dias Tavares e Filgueiras. (PMJF, 2016).

Sua localização estratégica possibilita um contato com os maiores mercados consumi- dores do país, e a infraestrutura de que dispõe permite os mais modernos empreendimentos, tendo como base de sua economia as pequenas e médias indústrias do ramo têxtil e do setor da construção civil. É também reconhecida na região pelo amplo e variado setor de comércio e serviços, que lidera com supremacia o Produto Interno Bruto (PIB) do município em 2015. Curioso o fato de que a produção agropecuária tem índices pratica- mente irrelevantes, tanto que nem constam nos gráficos referentes ao PIB (IBGE, 2017). É interessante analisar esse fato, pois mesmo com a tradição colonial mineira ligada às atividades rurais ou mineradoras, Juiz de Fora vai na contramão e desde o século XIX o município vem se tornando um dinâmico centro econômico, político, educacional, social e cultural.

Com estreita vinculação com o dinamismo do Rio de Janeiro, não participou da cultura colonial mineira. Seu desenvolvimento industrial, pautado pela modernização capitalista, trouxe para a cidade, além dos apitos das fábricas e da luz elétrica, o desejo de civilizar-se nos moldes dos centros europeus. Seus teatros, cinemas, jornais, colégios, e intensa atividade literária refletiam a vontade de criar uma nova imagem para a cidade, fugindo à tradição escravista (OLIVEIRA, 1994, p. 78).

Christo (1994) também apresenta esse embate na identidade dos juiz-foranos. O termo “carioca do brejo”, alcunha criada pelos belo-horizontinos, realça a identificação com o Rio de Janeiro em contraste com a cultura mineira. Outra denominação refere-se à cidade como “Europa dos pobres”. De acordo com a autora, a criação dessa expressão deve-se a Sylvio Romero no prefácio da obra “O Theatro de Juiz de Fora” de Albino

Esteves. Ela ainda apresenta diversas obras de historiadores que apontam a cidade como referência, “centro de luminosa civilização” do final do século XIX e início do século XX. Essas considerações remetem a raízes históricas que serão rememoradas a partir de agora. Serpenteando os morros, o rio Paraibuna dá início a história de Juiz de Fora. A presença marcante na região aliada a tradição católica dos portugueses que por aqui passavam no caminho de idas e vindas da exploração do ouro no interior de Minas Gerais, deram o primeiro nome ao povoado de Santo Antônio do Paraibuna. Segundo Oliveira (1994), o início do século XVIII é marcado pelo crescimento das cidades no interior do Brasil, em especial no estado de Minas Gerais, pois a mineração aurífera trouxe a necessidade de escoamento de produtos e também de suprir necessidades básicas das pessoas que estavam envolvidas nesse processo. Em função disso, novas estradas foram abertas no meio das matas, território ainda ocupado pelos remanescentes índios das tribos Puris e Coroados.

Por volta de 1703 é construída a estrada do Caminho Novo, cortando a Zona da Mata com o objetivo de facilitar o transporte de ouro da região das minas até a Corte, no Rio de Janeiro. Às margens da estrada vão surgindo os povoados com hospedarias, armazéns e postos oficiais de registro e fiscalização do ouro. É assim que surge Santo Antônio do Paraibuna. Em 1853 a vila é elevada à cidade e em 1865 recebe o nome de Juiz de Fora devido a presença constante de um magistrado nomeado pela Corte Portuguesa para trabalhar onde não havia juiz de Direito (OLIVEIRA, 1994).

Em meados do século XIX, a economia do Brasil vive um novo momento com a grande expansão da produção cafeeira, surgindo grandes fazendas com numerosos escravos em Minas Gerais. Oliveira (1994) e Pinto (2004) destacam que havia fazendas menores que desenvolviam atividades ligadas à produção de subsistência, garantindo o abastecimento das fazendas e dos núcleos urbanos crescentes da região. Em 1850 é construída a Estrada União e Indústria para encurtar a viagem entre a Corte e a província de Minas. Em função disso, os primeiros imigrantes alemães chegam para a construção da estrada e também para trabalhar com a agricultura, o comércio, e a construção civil. Chegam também outros imigrantes europeus e árabes que desenvolveram atividades próprias de seus grupos sociais atendendo às crescentes demandas da vida urbana. Christo (1994) argumenta que os incentivos à vinda dos imigrantes europeus para Juiz de Fora decorreram em função destes já terem experiência com o trabalho nas fábricas e serem mão de obra pronta e barata para trabalhar no crescente processo de industrialização da cidade.

De grande produtora de café à destacada produção industrial e à atividade do comércio, Juiz de Fora no final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX empreende o “plano de modernização”, com projetos na área de transporte, energia, saúde, comunicação e sistema bancário (CHRISTO, 1994). Destaca-se a já citada Estrada União Indústria (1861), a Estrada de Ferro Pedro II (1875), a Companhia Mineira de Eletricidade (1888), a Sociedade de Medicina e Cirurgia (1889), o telefone (1883), o telégrafo (1884), os

jornais “O Imparcial” e “O Pharol” (1870 e 1872), o Banco Territorial de Minas Gerais (1887) e o Banco de Crédito Real de Minas Gerais (1889). Em 1889, com a inauguração da Usina de Marmelos Zero, a primeira hidrelétrica de grande porte da América Latina, a cidade ficou conhecida como o “Farol de Minas”. Juiz de Fora chegou ainda a ser a cidade mais importante do estado, devido ao forte desenvolvimento do setor industrial conseguido durante a época em que era chamada de “Manchester mineira”.

As manifestações da cultura barroca não têm lugar na cosmopolita Manchester mineira. As atividades culturais além de exaltarem os hábitos urbanos eram a expressão do status de classe social, demonstrando quem poderia ter acesso aos sinônimos da moder- nidade. Saraus, apresentações circenses e teatrais movimentavam a cidade, principalmente as turnês das companhias de teatro do Rio de Janeiro, que frequentemente estavam por aqui. A produção literária também era expressiva. Tanto que em 1909 é criada em Juiz de Fora a Academia Mineira de Letras, seguindo o modelo da Academia Brasileira e organizada inicialmente por um grupo de 12 intelectuais residentes na cidade, número posteriormente ampliado para 40. Caracterizava-se por ser um grupo fechado que não tinha a preocupação com um grupo leitor, haja vista a grande população de analfabetos ou pouco escolarizados nesse período (CHRISTO, 1994).

No entanto, Oliveira (1994) destaca que a partir da década de 1920 começa um processo de decadência na industrialização do município, em consequência do crescimento da industrialização no restante do estado e da concorrência com as indústrias têxteis de São Paulo. Além desses fatores, a autora aponta problemas de infraestrutura e o crescimento de setores comerciais e de prestação de serviços que foram se sobrepujando à indústria local. Na sequência, a autora mostra a constante participação de Juiz de Fora nos debates políticos, na efetivação do golpe militar de 1964 e na mobilização popular e sindical em prol do trabalho, de condições sociais e da redemocratização do país. Também salienta que a partir dos anos de 1960 ocorre grande crescimento populacional e consequente urbanização descontrolada, o foco da economia desloca-se para a prestação de serviços impulsionada pela criação da Universidade Federal que passa a ser uma influência educacional e cultural marcante. Mudanças ocorreram em todos os setores, adequando-se as demandas locais e nacionais.

Analisando a história do município, percebe-se o foco nos processos econômicos, políticos e culturais urbanos, seguindo a lógica da modernidade. E como foi sentido esse processo pelas comunidades rurais? Buscar tais informações através das narrativas dos moradores que atualmente vivem no campo nos ajudará a preencher o que está ausente na história oficial.

No documento darielidaltrozoilha (páginas 33-36)