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A MUDANÇA LINGUÍSTICA PELO VIÉS DA GRAMÁTICA GERATIVA

De modo geral, a variação e mudança linguística estão associadas aos estudos da Linguística Histórica, visto que ela tem como principal função

Interpretar mudanças – fônicas, mórficas, sintáticas e semântico- lexicais – ao longo do tempo histórico, em que uma língua ou uma família de línguas é utilizada por seus utentes em determinável espaço geográfico e em determinável território, não necessariamente contínuo (MATTOS E SILVA, 2008, p. 8).

Mattos e Silva (2008) sugere que a Linguística Histórica seja subdividida em duas grandes vertentes: a) Linguística Histórica lato sensu e b) Linguística Histórica stricto sensu. Seguindo essa linha de pensamento, a Linguística Histórica lato sensu trabalharia com dados datados e localizados, embasando os estudos etnolinguísticos, assim como as teorias do texto, do discurso e da conversação que se baseiam em corpora datados e localizados, ao passo que a Linguística Histórica

stricto sensu se ocuparia da mudança linguística: o que muda e como muda nas línguas.

No que tange a vertente stricto sensu, Mattos e Silva (2008) propõe uma nova subdivisão: a) Linguística Histórica sócio-histórica; b) Linguística Diacrônica associal. Sendo a primeira disposta a considerar fatores extras e intralinguísticos, enquanto que a segunda considera apenas fatores intralinguísticos.

Assim, a autora compreende que os estudos da linguística gerativa estejam inseridos na vertente da Linguística Histórica stricto sensu, mais especificamente na subdivisão da Linguística Diacrônica associal. Embora se saiba que esta ramificação da Linguística Histórica trabalhe com a análise de corpora, datados e localizados, o que não cabe ao gerativismo, este se encaixaria no mesmo contexto por se tratar de uma teoria que, para o olhar de Mattos e Silva (2008), almeja, tomando como ponto de análise a mente do falante, entender como e por que as mudanças linguísticas ocorrem. Em suma, busca-se, pelo viés da gramática gerativa, compreender a mudança linguística atrelada a fatores intralinguísticos. A esse propósito, Mattos e Silva (2008, p. 12) diz que as investigações da Linguística Gerativa

Buscam “explicar” [...] as mudanças – no caso, sintáticas – que ocorreram sem considerar fatores externos, ou sócio-históricos, interessados apenas nos fatores próprios à grammar [a gramática de uma dada língua-L] do falante, ou seja, em seu processamento computacional. (Grifos da autora).

Embora concordemos com a afirmativa de Mattos e Silva (2008) ao reconhecer que

A preocupação central ou objeto de estudo desse modelo da linguística [a linguística gerativa] seja, sobretudo, a aquisição da linguagem, ver-se-á que gerativistas se preocuparam e se preocupam, escreveram e escrevem sobre a mudança da I-Grammar [língua-I] para a E-Grammar [língua-E], porque intuíram que a mudança poderá dar pistas para a aquisição (MATTOS E SILVA, 2008, p. 28).

Discordamos da opinião da autora quanto ao papel do ambiente sociocultural no processo de mudança linguística sob o olhar gerativista. Está claro que, para as teorias gerativas, a aquisição da linguagem é inata ao ser humano. Isto não quer dizer, porém, que todo o processo de construção da competência linguística seja

autossuficiente e, assim, indiferente a outros fatores. A este respeito, Pinto e Cavalcante (2008, p. 161) esclarecem que

Esse é um aspecto importante do pensamento chomskyano e sobre a qual tem havido muita confusão; a teoria gerativa defende que uma parte do conhecimento lingüístico é inato, não que todo ele o seja. Em outras palavras, defende que a própria capacidade de aquisição da língua só é devido a uma capacidade genética, que os princípios que regem a aquisição são preexistentes na mente humana e que o aspecto estrutural da linguagem, ou seja, as possibilidades da estrutura gramatical das línguas é codificada geneticamente. Isso não significa que não existam muitos outros aspectos relacionados ao uso, a conhecimentos culturais e extra-linguisticos que sejam importantes para que um falante possa se comunicar adequadamente em um contexto social. (Grifos nossos).

É preciso considerar que, “na herança do estruturalismo, os estudos sobre a ‘mudança lingüística’ irão se desenvolver como estudos diacrônicos” (PAIXÃO DE SOUSA, 2006, p. 45), isto é, a língua é compreendida como um continuum. Porém, para o gerativismo, a língua é compreendida de maneira sincrônica. Ou seja, é composta por substituições de gramáticas de uma geração à outra (PAIXÃO DE SOUSA, 2006; PINTO, 2011). O modelo mentalista de língua entra em jogo, então, para justificar o quê faz com que o ser humano tenha a capacidade de adquirir uma linguagem. Neste caso, o social é, de fato, irrelevante, pois o que se busca compreender é a estruturação da língua-I. O modelo de construção da competência linguística proposto por Chomsky (1994), exemplificado em (14), não prevê que a língua mude.

(14) GU + input = língua-L

Entretanto, como apontam os dados históricos, “as línguas mudam sem cessar” (BALLY apud COSERIU, 1979, p. 15). Então, como explicar, a partir de um viés gerativista, a mudança linguística? É a mudança ocorrida no ambiente externo que servirá de gatilho para a mudança interna da gramática. Neste sentido, é incoerente pensar que o social não seja relevante e indispensável para se conceber a mudança. Assim,

Uma das linhas de pesquisa sobre aquisição e mudança no quadro gerativista investiga a instabilidade nas próprias gramáticas. Ou seja,

localizam a potencialidade de variação e erro no sistema de aquisição [...]. Evidentemente, as teorias de aquisição e mudança nesse quadro precisam investigar quais os pontos da arquitetura da gramática que comportam variação-erro-mudança. No entanto, em algum ponto-limite, se torna sempre necessário invocar um agente externo de perturbação da lógica da gramática (PAIXÃO DE SOUSA, 2006, p. 41). (Grifo nosso).

Por fim, reforçamos que

Mesmo que a preocupação da lingüística gerativa seja a mente, quando esse modelo teórico é deslocado de uma análise sincrônica para uma análise diacrónica, tais fatos históricos [...] não podem ser simplesmente abstraídos da investigação lingüística. Se a mudança lingüística acontece, de fato, no momento da aquisição da linguagem, que, embora seja guiada geneticamente pela faculdade da linguagem, está deterministicamente relacionada com o ambiente lingüístico, os processos históricos que constituíram esse ambiente devem ser incluídos fatidicamente na análise linguística (PINTO, 2011, p. 230).