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Capítulo I – Fundamentação teórica

2. Estereótipos de género na publicidade

2.2. A mulher como Objeto Sexual

XX, aumentaram os produtos direcionados ao sexo feminino, bem como campanhas para os publicitar. No entanto, o surgimento destes novos papéis não garantiu uma melhoria da imagem feminina. A variedade de anúncios em que a mulher figura, bem como o espectro de produtos anunciados aumentou. Produtos de higiene e de saúde são cada vez mais protagonizados pela mulher, bem como cerveja e outras bebidas alcoólicas, anunciados, estes últimos, com recurso à sensualidade. A mulher torna-se, assim, um meio para atingir um fim, subjugando a sua aparência e considerando-a o seu único fator de valência.

Caroline Heldman (citada em Lourenço, Artemenko, e Bragaglia, 2014) afirma que o termo “objetificação” consiste em “analisar alguém ao nível de um objeto, sem considerar os seus atributos emocionais e psicológicos”. Segundo este conceito definido, então, por “objetificação sexual é o processo de representar ou tartar uma pessoa como um objeto sexual, que serve apenas para o prazer de outro” (Heldman 2012) Ao focarem apenas nos aspetos sexuais e físicos da mulher, ela é vista como um objeto, ou seja, assume-se um ser humano como algo inanimado que serve apenas para admiração de outros.

A partir do momento em que alguém vê um ser humano como algo para ser usado ou algo abaixo deles próprios, a mulher perde a sua capacidade de se afirmar e de ocupar o seu lugar na sociedade como ser humano com direitos iguais aos do sexo oposto. Como seres humanos, do sexo feminino ou masculino, não pode haver um certificado de pertença e, caso haja algum, que seja de nós próprios. Criar um anúncio, para qualquer produto, em que a mulher seja representada sem roupa e em poses sensuais que muitas vezes simulam a violação sexual não pode ser visto como libertação sexual. É apenas uma máscara que simula liberdade mas é na realidade exploração sexual da imagem feminina ou masculina.

(Lourenço et al 2014), consideram nas suas conclusões, que é impossível negar que “ a submissão e a “objetificação” do público feminino se traduziram em efeitos nocivos à sobrevivência igualitária entre os géneros”. A ideia de que o sexo feminino é o sexo fraco, de que todos os elementos do corpo feminino podem ser vistos como sexuais, é o que motiva a criação destas campanhas, que não seriam eficazes se os consumidores não aprovassem esta exploração básica do corpo feminino, mesmo que consentida pela modelo ou atriz publicitária.

A representação sexual da mulher que era antes limitada à pornografia, ganha novos contornos na publicidade. A posição do corpo, as expressões faciais e a

representação do ato sexual entre a mulher e o homem foram adotadas várias vezes de pornografia violenta. (Kilbourne 1999) Anúncios de marcas como a Sisley, American

Apparel e Dolce & Gabbana que levam demasiado à letra o termo “porno-chique”, um

termo cunhado pelo crítico de arte Hilton Kramer em 1970 para descrever determinadas fotografias de moda. O termo não é de todo positivo dado o exagero e o embelezar do ato sexual ou de mostrar o corpo que transporta a pornografia de uma forma glamorosa para a publicidade, para além da simulação de abuso sexual representado como algo elitista e elegante.

De acordo com a teoria da “Objetificação” de Barbara L. Fredrickson e Tomi-Ann Roberts (1997), a mulher reage à “objetificação” ao ver-se a si própria da mesma forma que a sociedade a vê, como um mero objeto. Desta forma, para a mulher, o seu valor próprio torna-se dependente da sua aparência, vendo o seu corpo como um objeto a ser avaliado. Isto mostra os efeitos que a representação do corpo feminino, de uma forma tão sexualizada e editada, traz para a mente feminina. Esta visão distorcida da realidade, que é transmitida para mulheres tão jovens que os corpos ainda não tiveram tempo para se desenvolver, é um dos principais fatores para os problemas alimentares como a anorexia e a bulimia.

O mais preocupante nestas pesquisas é que, apesar de toda a controvérsia e os estudos realizados que mostram que este tipo de campanhas vai mutilar mentalmente – e por vezes fisicamente – jovens mulheres e mulheres adultas em todo o mundo, a realidade mantêm-se em todas as plataformas. A forma dramática e exagerada que a publicidade usa o corpo nu da mulher bem como a própria nudez como ilustração de um anúncio é algo habitual para nós ao folhearmos qualquer revista. Um exemplo extremo desta realidade surgiu este ano em um anúncio da marca de pasta de dentes orgânica BOCA.

No anúncio, que segundo Rachel Moss (2017), jornalista para o Huffington Post, apareceu num suplemento que veio com o jornal The Times de Julho, surgia uma mulher sentada num sofá usando apenas um par de sapatos de salto alto a segurar a pasta de dentes anunciada. Em resposta à polémica e às queixas que o anúncio levantou, a marca BOCA, de acordo com Moss (2017), negou que a mulher no anúncio está nua, afirmando que há uma linha “between sexual objectification and the expression of sensuality”. A Advertising Standards Authority (ASA), não concordou com a defesa da marca pois baniu o anúncio de surgir novamente, pois representa a mulher como um objeto sexual e é considerada ofensiva. O anúncio em questão pode ser observado na figura nº 1, e é possível observar que a pasta de dentes em si é quase invisível, a modelo em si está numa

posição que sugere o ato sexual – pernas abertas – e cujo rosto nem surge na imagem, realçando a ideia de objeto com a desconstrução das partes do corpo que remetem para a sexualidade.

A pobre defesa da marca revela que não houve qualquer cuidado artístico na criação do anúncio. Um porta-voz da Raconteur Media Ltd., proprietária da marca BOCA, afirmou que, segundo o artigo de Moss (2017), “did not believe that the image of the woman in the ad was overtly sexual” e que ela estava, na sua maioria, obscurecida pela cadeira na imagem, com apenas uma perna visível. É compreensível que o porta-voz da empresa procure defender a imagem da marca mas descreve erradamente a imagem do anúncio, pois ambas as pernas estão abertas e visíveis e a cadeira não deixa nada para a imaginação. A única justificação para o anúncio é que o sexo vende, argumento que a marca nunca poderia usar para explicar o anúncio que parece ridículo, dado o produto anunciado. No entanto, é positivo constatar que cada vez mais marcas são punidas, e as suas campanhas censuradas, ao sexualizar e diminuir um ser humano, apesar de o filtro

Figura 1: BOCA – 2017

Fonte: http://www.huffingtonpost.co.uk/entry/toothpaste-ad-banned-for-objectifying- women_uk_5a1421a0e4b0c335e9973e60

deixar passar mais anúncios deste género do que deveria.

A eterna justificação para o uso da mulher como um objeto sexual reside no facto de que o sexo vende. Vendo-se assim esta representação da mulher como uma forma justa de cumprir objetivos de vendas. No entanto, à luz da modernização e da luta feminista viral, torna-se mais claro que os consumidores consideram estes anúncios ofensivos, não apenas para a mulher mas também para quem vê, independentemente do sexo ou orientação sexual. (Andersson & Schytt, 2017)

As autoras citam ainda o estudo levado a cabo por Severn, Belch e Belch em 1990 que mostra que as atitudes do consumidor em relação à publicidade e às intenções de compra eram mais positivas se houvesse sexualização no anúncio. (Andersson & Schytt, 2017). Há que realçar que o estudo foi conduzido à quase 30 anos atrás e na sociedade em que vivemos em que novos ideais se renovam a cada dia, esta noção de atração pela publicidade em vez de repúdio pode estar com os dias contados.