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A mulher e os estereótipos de género na publicidade

Capítulo I – Fundamentação teórica

2. Estereótipos de género na publicidade

2.1. A mulher e os estereótipos de género na publicidade

A premissa ‘o consumidor tem um género na língua inglesa e é feminino’ tornou- se regra para a publicidade no início do século XX. Com isto, vinha também o conhecimento de que 80% das compras – exceto a aquisição de grandes eletrodomésticos, automóveis e casas – eram feitas pelas mulheres. Os lugares de chefia das agências de publicidade até 1950 eram ocupados por homens – brancos e protestantes – enquanto as mulheres tinham sorte em obter empregos como rececionista e secretária. Hoje em dia, mais de metade dos empregados das agências americanas são mulheres, não sabendo ao certo, no entanto, quantos desses lugares são de chefia (O’Barr, 2005:18). Nesses anos de desigualdade de género, os homens eram publicitários e as mulheres eram consumidoras. Por isso, quando a publicidade falava para os consumidores, usualmente fazia-o usando uma voz masculina de autoridade.

Stuart Ewen (1976), que explorou o papel dos publicitários no início do século XX, revela na sua obra como a publicidade oferecia às mulheres aparelhos para as ajudar nas tarefas, como máquinas de lavar a roupa, e ao mesmo tempo as instruía nos seus próprios papéis de dona de casa, mãe e doméstica. Só no renascimento do feminismo, em 1970, é que a publicidade começou a permitir que elas falassem por elas próprias, assumissem papéis de autoridade nos anúncios e fossem contratadas para cargos de decisão e de criatividade na indústria publicitária.

Hoje em dia, os manifestantes saem à rua para contestar as escolhas preconceituosas levadas a cabo pelas marcas e pelos publicitários porém, os dois únicos papéis principais da mulher nos anúncios são de objetos-sexuais que estão sujeitas ao poder masculino ou mães que tentam conjugar a família com o trabalho.

Numa pesquisa levada a cabo em 1971, Alice E. Courtney e Sarah Wernick Lockertz analisaram inúmeras revistas da época como a “Life, Look, Newsweek, The New Yorker, Saturday Review, Time, and U.S. News and World Report”. Com este estudo procuraram saber quais os papéis desempenhados pelos géneros na publicidade. Os resultados no entanto foram desanimadores. Raramente as mulheres eram representadas a trabalhar e quando eram limitavam se a ser “entertainers, hospedeiras de bordo, professoras, operárias em fábricas, e um papel identificado apenas como “mulher trabalhadora”

(Courtney e Lockertz 1971:93)

Nas suas análises finais, Courtney e Lockertz (1971, p. 94 95) concluíram que a publicidade representava a mulher pelo uso dos seguintes estereótipos, bem presentes nas campanhas de hoje:

 “A woman’s place is in the home.” Anúncios tradicionais em que a mulher figura tem habitualmente como cenário a habitação, mais propriamente a cozinha, onde desempenham o papel de mãe e dona de casa;

 “Women do not make important decisions or do important things.” Sendo que o papel de decisor cabia ao homem, a mulher deveria obedecer ao que o homem estipulava, ou seja, a mulher não tinha voz em nenhum assunto;  “Women are dependant and need men’s protection.”A posição da mulher

nos anúncios em relação ao homem traduz-se na palavra submissão. Desde a posição física do homem em relação à mulher nas campanhas, fica patente uma ideia de inferioridade social e psicológica;

 “Men regard women primarily as sexual objects; they are not interested in women as people.” Outra das facetas da mulher nos anúncios continua a ser a de inspirar sexualmente o consumidor. Desta forma, é utilizada como mero objeto sexual aumentando as vendas, sem respeito pelos valores éticos e morais de todos os envolvidos.

Apesar de ser uma ideia ultrapassada e sexista, que reduz a mulher à função reprodutora, a publicidade ainda hoje, 46 anos depois desta pesquisa, representa a mulher como um simples objeto de admiração, desejo sexual ou de apenas um corpo bonito. Hoje em dia, a diferença entre os géneros é cada vez menor, no entanto, os media tendem a perpetuar os estereótipos de género tradicionais. A mulher de hoje protagoniza papéis distintos dependendo dos produtos que anuncia e do género do público-alvo. Segundo Milena Oliveira-Cruz (2016), “nos produtos voltados para o uso familiar ou doméstico (como produtos de limpeza, medicamentos ou alimentos), prevalece a “rainha do lar”: mãe zelosa”, por outro lado em anúncios “prioritariamente voltados ao público masculino (como automóveis e bebidas alcoólicas), a mulher aparece como um “objeto de desejo” do homem” (Oliveira-Cruz, 2017)

De acordo com Wolska (2011), devido à grande influência que os media têm sobre as atitudes das pessoas, eles podem representar determinados grupos sociais de uma forma negativa e irrealista. Na maioria dos anúncios as mulheres são representadas como

as donzelas em perigo. Embora tenha havido protestos generalizados em 1960 e 1970 por parte dos grupos feministas que, no seu direito, se sentiam ultrajadas pela forma como eram representadas nos anúncios, a imagem da mulher como “bela, atrativa, e muitas vezes maternal” (Igoe 2006) não sofreu alterações, apenas pequenas modificações.

Com todas estas representações do corpo feminino, como se não pertencesse à mulher apresentada, e com todo o imaginário sexual criado nas páginas das revistas que qualquer jovem pode comprar, é natural que, citando Ada Igoe (2006), “os anúncios que constantemente usam mulheres magras em posições sexuais ou comprometedoras estão a afetar a forma como as mulheres se veem a si mesmas”

As implicações emocionais que essas representações irreais trazem para a mente feminina têm solução, basta acabar com papéis estereotipados que os anúncios transmitem e a sociedade assume como corretos. A dona de casa, a mãe dedicada, a mulher que tem cuidado com o cabelo e a pele, são papéis que não resumem um ser humano e não devem ser traços obrigatórios para considerar uma mulher como um exemplo perfeito do seu género. Nenhum ser humano é mecanizado para agir, ser e parecer da forma que a sociedade quer que ele seja.

Dussán (2016) explica que “grande parte desta pressão é criada pela publicidade, na forma em que a indústria mostra as mulheres, com o único propósito de vender um produto” As campanhas influenciam a forma como a mulher se vê e mostra com ela deveria ser em campanhas recheadas de estereótipos e de edição de imagem que torna as mulheres em produtos perfeitos e manipuláveis. Veja-se o exemplo das campanhas a cera depilatória ou lâminas para depilar em que as mulheres surgem sem pelos, antes do processo de depilação que é apresentado no anúncio, e vestidas e arranjadas como se de uma tarefa simples e natural se tratasse.

A luta pela igualdade e os direitos da mulher aclamava que não deveria haver distinção entre ocupações masculinas ou femininas. Que as preferências e a personalidade de um individuo não deveriam ser atribuídas ou consideradas a um género ou outro. No entanto, os media ainda usam estes modelos estereotipados, justificando-se com o facto de estes serem reconhecidos por toda a gente o que torna mais fácil a compreensão da mensagem por parte dos recetores. (Wolska 2011)