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A MULTISSENSORIALIDADE DO AMBIENTE CONSTRUÍDO

No documento palomaalmeidaromanosferreira (páginas 40-43)

2 CONFORTO, PERCEPÇÃO AMBIENTAL E OS SENTIDOS HUMANOS

2.3 A MULTISSENSORIALIDADE DO AMBIENTE CONSTRUÍDO

Todos os nossos cinco sentidos são estudados na psicologia há muito tempo e se tornaram importantes meios de compreensão e relacionamento com o meio ambiente (OKAMOTO, 2002, p. 111). O caminho para o conhecimento da realidade do meio ambiente é a participação direta e intensa do corpo e da mente como um todo (OKAMOTO, 2002, p. 111). Por isso, uma abordagem multissensorial irá enriquecer o conceito projetual de um ambiente.

De acordo com Schmid (2005), o espaço arquitetônico tem caráter multissensorial:

O espaço livre, bruto, ainda não trabalhado é, ao lado do comportamento das pessoas que se traduz em funções para os edifícios, programas arquitetônicos e, enfim, projetos é uma matéria-prima essencial da arquitetura. Encontra-se tanto no mundo natural como no mundo aculturado. O produto da arquitetura também é espaço o espaço da arquitetura, espaço pensado, civilizado, moldado para abrigar as pessoas e suas atividades. Cavernas e cúpulas, muros e telhados, portas e janelas, árvores e jardins são possíveis demarcações de espaço. Condicionam porções de ar que, por sua vez, trazem influências sobre fluxos de energia e matéria; sobre o estado físico da matéria sólido, líquido ou gasoso - o movimento das moléculas (temperatura) e das porções maiores da matéria (som e vento). Independente do ar, transita a radiação, visível (luz) ou invisível (calor). O trânsito de matéria inclui ar, água e umidade, odores e partículas. (...) Quase tudo o que há no espaço se sente. Entretanto, quase nada se vê, a não ser seus limites. (SCHMID, 2005, p. 52),

Pallasmaa (2018, p. 57) defende que a arquitetura é considerada uma disciplina visual, entretanto tem-se considerado as edificações como experiências multissensoriais. E o autor ainda completa afirmando que a arquitetura não é uma simples coletânea de imagens visuais isoladas, mas sim sua presença material e espiritual totalmente corporificada, que incorpora e infunde estruturas, tanto físicas quanto mentais (PALLASMAA, 2011, p. 42). Para o entendimento e a pr tica da arquitetura, Pallasma (2011, p. 16) afirma que importante analisar criticamente o papel da is o em rela o aos demais sentidos , e idenciando a hegemonia da is o, e complementa que a arquitetura modernista enfatiza o intelecto e os olhos deixando de lado os corpos e demais sentidos, assim como a memória e a imaginação.

Segundo Lindstrom (2007, p. 31), a is o o mais sedutor de todos os sentidos. Muitas vezes ele anula os outros sentidos e tem o poder de persuadir-nos contra toda a l gica .

Nos ambientes comerciais, o apelo visual vai desde a montagem da vitrine, passando pela disposição dos produtos no interior, a iluminação e a organização do ambiente como um todo (RAMOS; BRAGA, 2011, p. 89). De acordo com Malhotra (2013, p. 138), luz e cor são elementos diferenciais num ambiente comercial: um ambiente bem iluminado causa aproximação das pessoas e as compras acontecem por impulso, enquanto a cor é parte evidente no ambiente varejista, pois cada uma delas está associada a um tipo de estímulo, sensação e emoção diferente. Malhotra (2013, p. 128) vai além quando cita os efeitos da música nos espaços de varejo, influenciando os consumidores. Segundo ele, o ritmo ajuda o consumidor a prestar mais atenção na mercadoria quando existe uma coerência entre a mercadoria e o estilo musical ou ritmo da música. Isso porque a música influencia positivamente a percepção da qualidade da mercadoria, o preço e o serviço, por exemplo, música clássica transmite ao consumidor uma imagem prestigiosa, exclusiva e de preço alto, enquanto uma música popular se relaciona com preços mais baixos (MALHOTRA, 2013, p. 129). A is o isola, enquanto o som incorpora, a visão é direcional e a audição é onidirecional (...) a audição estrutura e articula a experiência e o entendimento do espa o (PALLASMAA, 2011, p. 46).

Quando se pensa no sentido tátil, é importante lembrar que a pele lê a textura, o peso, a densidade e a temperatura da matéria (PALLASMAA, 2011, p. 53). Desse modo, a sensibilidade deste sentido é instantânea e serve de alerta para o nosso bem-estar e prazer (RAMOS; BRAGA, 2011, p. 91). Pallasmaa (2011, p. 53) cita o prazer de apertar a maçaneta da porta que brilha com os milhares de mãos que passaram por ela antes de nós, a ma aneta da porta o aperto da m o do pr dio , ele ainda considera que o tato pode nos conectar com o tempo e com as tradi es, além da atração, por exemplo, de se aproximar de uma parede de concreto, ou tocar a maciez aveludada de uma determinada textura. A gravidade é medida pela sola dos pés, bem como a densidade e a textura do chão, mais sentidas quando o pé está descalço (PALLASMAA, 2011, p. 53). A textura que compõe o ambiente comercial pode tornar possível que o consumidor reconheça a qualidade da marca e do produto (RAMOS; BRAGA, 2011, p. 91).

Para tratar do paladar no campo da arquitetura, cabe uma frase de Pallasmaa (2011, p. 56): a origem mais arcaica do espa o de arquitetura a ca idade oral . E emplificando tal afirmação, Ruskin (1978, p. 316 apud PALLASMAA, 2011, p. 56) declara que gostaria de comer todo o mármore de Verona, toque por toque, enquanto Tanizaki (1977, p. 15 apud PALLASMAA, 2011, p. 56) afirma que a tigela laqueada aproximada à boca traz um momento de transe. Neste

sentido, Pallasmaa afirma que uma superf cie de pedra polida de cor delicada sentida subliminarmente pela língua. Nossa experiência sensorial do mundo se origina na sensação interna da boca, e o mundo tende a retornar s suas origens orais (PALLASMAA, 2011, p. 56). E ainda narra um episódio de sua vida quando ao visitar uma residência na Califórnia sentiu-se compelido a ajoelhar e tocar com a língua a soleira de mármore branco da porta de entrada, que brilhava delicadamente (PALLASMAA, 2011, p. 56).

Um impulso olfativo é determinante para o ser humano detectar milhares de odores. A mem ria mais persistente de um espa o seu cheiro (PALLASMAA, 2011, p. 51), por isso cada espaço pode apresentar um odor específico: o odor de uma loja de bala remete à inocência e a curiosidade da criança e o odor forte de uma sapataria nos lembra a emoção de uma cavalgada (PALLASMAA, 2011, p. 52). O comportamento de compras é facilmente marcado mediante os odores usados em lojas, objetivando tornar este ambiente um lugar único e diferenciado do seu concorrente (MALHOTRA, 2013, p. 134). Malhotra (2013, p. 134) afirma ainda que alguns odores são capazes de atrair os consumidores, incentivando-os a permanecer mais tempo dentro da loja e, consequentemente, comprar mais. Pensar no odor do espa o uma forma de tirar o odor do reino encarnado e não representativo e encorajar as pessoas a prestar mais atenção em seus nari es (CANNIFORD; RIACH; HILL, 2017, p. 242, tradução da autora).

Pallasmaa (2011) acredita que

cada experiência arquitetônica é multissensorial; qualidades do espaço, matéria e escala são medidas igualmente pelos olhos, ouvidos, nariz, pele, língua, esqueleto e músculos. Arquitetura reforça a experiência existencial, a sensação de estar no mundo. (Pallasmaa, 2011, p.47).

Ele acredita que a arquitetura deve enriquecer a vida se dirigida a todos os sentidos e nos con ida a ressensoriali ar a arquitetura, pois estamos perdendo essa capacidade de sentir e é preciso estarmos mais atentos aos sentimentos que os materiais despertam em nós: o toque, a textura, o peso, a densidade do espaço e a luz (PALLASMA, 2011, p. 37).

Malnar e Vodvarka (2004) seguem o mesmo pensamento de Pallasmaa se questionando sobre

o que aconteceria se projetássemos para todos os nossos sentidos? Suponha, por um momento que o som, o tato e o cheiro fossem tratados da mesma maneira que a visão, e que a emoção fosse tão importante quanto a cognição. Como seria o nosso ambiente construído se os sentidos, sentimentos e memória fossem fatores críticos para o projeto, mais vitais ainda que a estrutura e o programa? (MALNAR; VODVARKA, 2004, p. 24 apud NEVES; DAMAZIO, 2011, p. 27).

Os autores destacam e valorizam os sentidos no ato de projetar, pois os espaços são vivenciados através dos sentidos humanos, por isso um projeto multissensorial tem a capacidade de afetar em maior profundidade a percepção humana.

No documento palomaalmeidaromanosferreira (páginas 40-43)