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PARTE I: ACESSIBILIDADE URBANA E A (RE)PRODUÇÃO DO ESPAÇO: ASPECTOS

2 PRIMÓRDIOS DA FORMAÇÃO DE BELO HORIZONTE: ACESSIBILIDADE,

2.2 A Nova Capital

2.2.4 A expansão urbana da metrópole em construção: conurbação e acessibilidade

2.2.4.2 A municipalização da gestão do trânsito e dos transportes

Intervenções de maior vulto foram retomadas a partir dos anos 1990, momento em que o gerenciamento dos transportes urbanos passou a ser de responsabilidade exclusiva dos municípios69.

Diante dessa nova realidade, referendada pela Constituição Estadual de 198970, foi criada a BHTRANS (Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte) em 31 de julho de 1991, através da Lei Municipal n. 5953, que herdara basicamente as mesmas atribuições dos órgãos antecessores, porém restringindo-se à escala municipal, e não mais metropolitana.

O primeiro grande obstáculo enfrentado pela BHTRANS foi a falta de informações sobre o sistema de transporte coletivo da Capital. Por questões meramente políticas, o Estado, através da equipe da TRANSMETRO, sonegou informações diversas, necessárias ao gerenciamento do transporte, desde dados mais simples, como os quadros de horários das linhas, até os mais elaborados, como as planilhas de cálculo da CCT (DIAS, 1996).

69 De acordo com o que reza o inciso V do artigo 30 da Constituição Federal de 1988, a saber: “...

compete ao município organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial”.

70 Em seu artigo 170, definiu que a “organização e a prestação de serviços públicos de interesse local,

diretamente ou sob regime de concessão, permissão ou autorização, incluindo o transporte coletivo de passageiros, configuram competência privativa do município”.

Os embates políticos envolvendo Prefeitura e Estado continuaram nos primeiros anos da gestão BHTRANS, só sendo minimizados a partir da completa extinção da TRANSMETRO (1994), momento em que suas atribuições referentes aos serviços intermunicipais foram repassadas para a diretoria metropolitana do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de Minas Gerais – DER/MG (DIAS, 1996).

Em meio às dificuldades enfrentadas, a autonomia municipal na administração dos serviços de transporte e trânsito inaugurou um momento de reflexão sobre as gestões passadas, notadamente no que diz respeito aos equívocos cometidos, bem como o início de um processo de (re)planejamento dos serviços ligados à mobilidade na metrópole. Nesse sentido, toma corpo, em 1995, o Plano de Reestruturação do Sistema de Transporte Coletivo do Município de Belo Horizonte (BHBUS), “concebido no

sentido de suprir as carências que o atual sistema apresenta para o atendimento das necessidades de transporte da população, de utilizar seu potencial de estruturador da vida da cidade e de indutor de sua expansão e da ocupação de seus espaços” (SILVA, 1996: p. 15).

Nesse contexto, foram adotadas algumas medidas de reestruturação de grande impacto sobre o sistema de transporte da metrópole, merecendo destaque a implantação de estações de ônibus em regiões periféricas e de grande demanda de passageiros. Estabelece-se o Sistema Tronco-alimentador; a licitação do transporte público coletivo por ônibus; a implementação do Sistema Interbairros, que promoveu uma reorganização de cores e numerações das linhas de ônibus, as quais tiveram seus itinerários racionalizados; dentre outras (BHTRANS, 2000).

Tais ações, em grande medida, integravam-se ao Plano Diretor de Belo Horizonte, que determinou como objetivo estratégico e orientação de desenvolvimento

urbano, o policentrismo, a fim de minimizar a intensa concentração de tráfego na área central da Capital (COSTA, 2001). As diretrizes para o sistema viário municipal, dispostas no seu artigo 18, são explícitas quando prevêm:

“I - reformular a atual estrutura viária radioconcêntrica, mediante interligações transversais que integrem os elementos estruturais do Município, por meio da complementação do sistema viário e das vias de ligação às áreas de adensamento preferencial e aos pólos de emprego; II- articular o sistema viário com as vias de integração metropolitanas e as rodovias estaduais e federais;

III- reduzir o caráter da área central de principal articuladora do sistema viário;

IV- melhorar a estruturação espacial, criando condições de articulação interna que consolidem centros;

V- buscar uma melhor articulação das periferias, entre si e com os centros;

VI- melhorar a acessibilidade da população aos locais de emprego, de serviços e de equipamentos de lazer;

VII- implantar obras viárias de atendimento ao sistema de transporte coletivo e de complementação do sistema viário principal;

VIII- tornar obrigatório o planejamento da integração entre o transporte coletivo e o sistema viário;

IX- implantar pistas especiais para transporte de massa” (BELO HORIZONTE, 1996).

Quanto ao processo de reestruturação do trânsito da Capital, foi revigorado ainda o Plano da Área Central (PACE), com a realização de intervenções importantes, como a recuperação das avenidas Paraná e do Contorno, por exemplo, ambas ocorridas no final dos anos 90.

Ao que tudo indica a participação popular mostrou-se importante na gestão do transporte e trânsito da cidade. A Prefeitura Municipal, através da BHTRANS, criou canais abertos de comunicação entre Poder Público e comunidade, como o Fórum Municipal de Trânsito, as Jornadas Participativas, o Conselho Fiscal da Câmara de Compensação Tarifária e a Central de Atendimento ao Usuário (BHTRANS, 2000).

Vale lembrar que esse diálogo torna-se mais acentuado a partir de 1993, momento em que partidos de esquerda conquistam a Administração Municipal.

Seguindo uma trajetória semelhante à de Belo Horizonte, Betim também investiu num processo de municipalização integral do sistema de transportes, através da criação, em 17 de dezembro de 1993, da empresa Transporte Urbano de Betim (TRANSBETIM). Após a sua regulamentação, que aconteceu no início do ano seguinte, coube ao órgão gerenciar, além do trânsito, o transporte coletivo da cidade, porém devendo ao DER/MG, o gerenciamento das linhas intermunicipais que atendem o município (MORAES, 1996).

Contagem, por sua vez, foi o primeiro município da RMBH a criar uma estrutura para gerenciar o sistema de transportes. Tal iniciativa, anterior às diretrizes definidas pelas Constituições Federal e Estadual, começou a se conformar nos primeiros anos da década de 80, quando, sob a administração municipal de Newton Cardoso (1980-1984), a prefeitura de Contagem obteve permissão para criar e gerenciar algumas linhas de transporte coletivo exclusivamente municipais. Entretanto, a consolidação desse processo deu-se na administração de Ademir Lucas (1993-1996), com a criação da Superintendência de Transportes Urbanos (TransCon/SMDU), fato que, embora possibilitasse o controle do sistema viário e ampliasse o número de linhas gerenciadas pelo município, manteve sob a gerência do DER/MG as linhas intermunicipais e, sob a administração da BHTRANS, o sistema de táxi (COSTA e FREITAS, 2001; GOUVÊA, 1992).

O processo de municipalização, paulatinamente, se estendeu para outras cidades componentes da RMBH, havendo a criação de subsistemas municipais de transporte

também em Ibirité, Santa Luzia, Pedro Leopoldo e Ribeirão das Neves, permanecendo os demais subsistemas sob gerenciamento do DER/MG.

Importa ressaltar, no entanto, que “a falta de um plano diretor metropolitano

impediu um planejamento comum dos sistemas de transportes e viário para a região metropolitana” (FJP, 1996: p. 310). Assim, a atual organização dos serviços de transportes coletivos na RMBH ocorre de forma independente, estando o gerenciamento das inúmeras redes a cargo de organizações governamentais que não se articulam entre si e que pertencem a diferentes esferas de governo. Tal fato obriga os usuários dos sistemas de transporte público a dependerem de diferentes redes e serviços (onde se inclui o Trem Metropolitano, administrado pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos / CBTU), não raro, sem integração física e tarifária, tendo comprometidos seus anseios de acessibilidade e mobilidade intrametropolitanas.