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7.3 Lei 11.276/06: Da forma de interposição dos recursos e da negativa de

7.3.3 A negativa de seguimento ao recurso de apelação e o duplo grau de jurisdição

Uma das maiores críticas ao §1° do artigo 518 do CPC, seria não possibilitar à parte a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição.

É que, desde que se trocou a autotutela pela intervenção do Estado na esfera privada, possibilitou-se à sociedade a oportunidade de recorrer a fim de questionar a correção da decisão, cujo reexame, de acordo com a tradição romano-germânica, deverá ser procedido por um órgão colegiado.

Nas palavras de Nelson Nery Júnior, o duplo grau de jurisdição é erigido à categoria de garantia fundamental da boa justiça.117

É que os tribunais de segundo grau, formados em geral por juízes mais experientes e constituindo-se em órgãos colegiados, oferece maior segurança.118

Todavia, o já mencionado artigo 557 do CPC, 119 inovação incorporada em nosso ordenamento jurídico pela lei 9.756/98, significou uma modificação profunda

116 ASSIS, 2003, p. 18.

117 NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante em vigor. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 247.

no sistema de julgamento através de colegiados, porquanto possibilitou o julgamento singular pelo relator em determinadas hipóteses legais.

Com isto, nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco, têm-se “uma escalada que vem da colegialidade quase absoluta e aponta para a singularização dos julgamentos dos tribunais.”120

A novidade, agora, é que tal singularidade no julgamento pode dar-se já no primeiro grau, onde o próprio prolator da sentença, fazendo uma análise do mérito da questão em confronto com as súmulas do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, pode deixar de receber o recurso, evitando a remessa dos autos ao segundo grau, privilegiando a celeridade de um processo cujo fim já é conhecido pelos Tribunais.

Todavia, não podemos dizer que isto menospreza o princípio do duplo grau de jurisdição.

A possibilidade cada vez mais ampla de que os julgamentos ocorram de forma monocrática, e agora também no primeiro grau, confirmado a sentença em conformidade com súmula do Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça, não afronta o duplo grau de jurisdição ou a segurança jurídica das decisões, já que tal possibilidade somente é conferida àquelas sentenças que já refletem posicionamento da última instância do Judiciário, cristalizada através de súmulas.

Mesmo que as súmulas que servirão de embasamento às sentenças objeto de apelação não tenham caráter vinculante (somente algumas súmulas a serem editadas pelo Supremo Tribunal Federal poderão, hoje, ter o caráter vinculante), estas refletem o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal 119 Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

§ 1o-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.

120 DINAMARCO, Cândido Rangel. O relator, a jurisprudência e os recursos. In: NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 131.

de Justiça sobre a matéria controvertida, transformando-se, assim, em impeditivo ao seguimento do recurso de apelação, pois, na verdade, o seguimento da ação através de sucessivos recursos faria a ação desembocar na última instância do Judiciário, cujo posicionamento a respeito daquela matéria já estava consolidado através de súmula.

Portanto, uma vez que a negativa do seguimento da apelação dá-se exclusivamente em razão de que a matéria objeto de recurso já foi apreciada e decidida pelas instâncias superiores, refletidos através de súmulas, podemos dizer que, indiretamente existe a apreciação da matéria pelos graus superiores, não havendo, assim, afronta ao duplo grau de jurisdição já que a matéria já foi conhecida e apreciada na última instância.

7.3.4 Crítica

É clara a intenção do legislador, ao inserir o § 1º ao artigo 518 do Código de Processo Civil, no sentido de conferir uma maior celeridade ao processo pelo fato de que o processo, ao invés de tramitar por todos os graus de jurisdição até que não exista mais nenhum recurso oponível, deverá ter seu encerramento, dentro dos casos previstos em lei, ainda no primeiro grau.

Claro que, para aplicar este novo dispositivo, deve-se ter a colaboração dos julgadores e demais servidores, tanto na quantidade de servidores como na qualidade de seus serviços, devendo existir a harmonia entre as questões sumuladas e a fundamentação das sentenças.

A respeito da eficácia do novo artigo 518 do Código de Processo Civil, em seu parágrafo primeiro, para conferir maior celeridade processual, José Maria Rosa Tesheiner, em obra que é coordenador, manifesta-se de forma negativa à intenção da lei:

Primeiramente, porque, lamentavelmente, a fundamentação das sentenças exaradas pelos Magistrados não se tem revelado adequada, pelo que é possível afirmar-se que o acurado exame recomendado acima não será

realizado. Segundo porque, seja pela razão antes referida, seja pela circunstância de que aquele que litiga contra entendimento sumulado, em caráter protelatório, não se conformará com a decisão singular negando trânsito à apelação.121

Desta forma, sustenta-se que, ao invés de acabar sendo interposto um recurso de apelação, poderá acabar sendo interpostos três recursos (a apelação, cujo seguimento é negado), um agravo por instrumento (a fim de fazer receber a apelação), e um agravo (art, 557, §1° do CPC) acaso seja negado seguimento ao agravo por instrumento.

Todavia, não se pode deixar de considerar que uma coisa é o recebimento e o processamento completo de um recurso de apelação, com a intimação da parte da interposição do recurso, prazo para contra-razões, remessa ao Tribunal, designação de um relator e o julgamento do mesmo.

Outra coisa é o apelo ter seu seguimento negado na origem, e, mesmo que interposto agravo por instrumento, o mesmo deverá ter seu seguimento negado liminarmente se a matéria realmente estiver em conformidade com súmula do Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça. Interposto o agravo interno, o mesmo também tem seu processamento muito mais rápido que o recurso de apelação. Além do mais, o recurso não terá agregado efeito suspensivo, podendo, no primeiro grau, ser proposta a execução provisória do julgado, com as benesses previstas pela lei 11.232/05.

Nesta situação, absolutamente inegável a contribuição da lei 11.276/06 para a celeridade processual ao não permitir, por força do § 1º do artigo 518 do Código de Processo Civil, o seguimento de apelação que confronta sentença que está em acordo com súmula dos Tribunais superiores.

É que, mais uma vez, além de negar o seguimento do apelo ao Tribunal, também evita, com o julgamento no grau superior, a possibilidade de ingresso de embargos infringentes e, ao final, impede a existência de recurso especial e extraordinário.

121 TESHEINER, 2006, p. 214.

Do contrário, na pior das hipóteses, teremos a protocolo de um agravo por instrumento, o qual poderá ter seu seguimento negado monocraticamente, sem a necessidade das mesmas formalidades do recurso de apelação e, ao fim, um agravo interno desta decisão.

Entretanto, mais uma vez, ressalta-se que para a boa aplicação do referido benefício, existe a dependência, e muito, de uma maior perfeição técnica dos juízes, o que nem é sempre possível tendo em vista o absurdo volume de processos que são distribuídos todos os meses.

Assim, tal regra é eficaz para resolver a disseminação de recursos junto aos tribunais superiores, porém, infelizmente, depende de uma maior técnica, nem sempre existente pelo elevado volume de processos, das decisões de primeira instância.