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A observação participante

2 TRILHANDO OS CAMINHOS DA PESQUISA

2.2 A observação participante

Através da atividade de observação direta, realizamos a caracterização da escola campo de investigação pertencente à rede municipal de Estrela de Alagoas - AL, considerando sua estrutura física, organizacional e pedagógica. Por meio da observação foi possível obter informações relevantes sobre os

sujeitos investigados na modalidade EJA, bem como para colaborar no processo de interpretação do objeto de estudo. Esta fase ocorreu com a presença da investigadora, seguida da direção.

Consideramos alguns critérios quanto à escolha dos sujeitos da pesquisa. Em primeiro lugar estabelecemos que os sujeitos da investigação além de serem professores/as do Ensino Fundamental Anos Finais da EJA da escola, locus de pesquisa, teriam que apresentar: interesse pessoal em participar como sujeito investigado por meio de aceitação formal em termo de consentimento livre elaborado pela pesquisadora. Desse modo, entramos em contato com os/as professores/as sujeitos da pesquisa e em seguida realizamos o diagnóstico das condições socioculturais dos/as alunos/as das turmas investigadas.

Do universo de 04 (quatro) professores/as que atuavam na modalidade EJA da Escola Constelação Orion, apenas 03 (três) professoras aceitaram a pesquisa, assinando o termo de consentimento enquanto sujeitos da investigação. Nesse sentido, a investigação iniciou-se com as professoras das seguintes disciplinas: Geografia, História, Ciências, Matemática e Inglês. Cabe destacar que devido ao número de turmas da modalidade EJA na escola campo de investigação, os professores assumem mais de uma disciplina como complemento de sua carga horária. Nessa discussão situamos a questão de organização pedagógica da escola campo de pesquisa, tratando-a como uma realidade escolar constituída de particularidades específicas quanto à prática curricular, ainda relacionada à modelos educativos universalistas. Além da organização disciplinar, a escola faz adaptações dos/as professores/as no que diz respeito à suas disciplinas não levando em consideração na maioria das vezes o seu campo de formação. Este modelo se configura como um elemento complexo para o desenvolvimento do processo de ensino presente na escola que oferta a modalidade EJA, pois se instauram neste campo um contexto educacional de problemáticas didático-pedagógicas que se refletem no ensino transmissivo dos conteúdos, no entanto, distantes de suas reais bases epistemológicas.

Como forma de identificar os sujeitos da pesquisa, optamos pelo anonimato. Os referidos sujeitos foram denominados por pseudônimos, representados pelas estrelas Três Marias, considerando a denominação da

escola. Assim, Mintaka (M) corresponde à Professora de Geografia e História; Alnilam (A) corresponde à Professora de Ciências e Matemática e Alnitak (AK) corresponde à Professora de Inglês.

Permanecemos por um longo período na sala de aula da EJA, a fim de observar e investigar criticamente a realidade, com enfoque nas ações docentes do/a professor/a da EJA, observando-as em sua relação com as diferenças socioculturais dos/as alunos/as, para compreender como esta ocorre, por que ocorre, interpretando o currículo da sala de aula. Deparamo- nos na investigação, com uma realidade da ação docente que ainda está sufocada pelo paradigma da Modernidade. Paradigma este de caráter positivista e de modelo cartesiano, no qual ensinar significa inserir o indivíduo na ordem do mundo. Sendo assim, a educação funciona como mero exercício de conscientização dos costumes estabelecidos e predeterminados, considerando-se a aprendizagem como um processo de assimilação passiva dos conteúdos. Este modelo foi comprovado nesta pesquisa pela aula expositiva, caracterizada pelo ensino verbalista, centrado nas professoras, enquanto os (as) alunos (as), em sua maioria copiavam, conversavam, dormiam, ou brincavam. Essa forma de ensino pouco faz sentido para a vida presente das pessoas jovens e adultas, uma vez que as discussões inerentes às diferenças socioculturais ocorriam de modo abstrato, de acordo com uma das aulas relacionadas ao Projeto Raízes de um Povo:

[...] como sabemos os costumes africanos também estão presentes nos costumes brasileiros. Vamos traduzir palavras do texto que trata dos costumes africanos. Se organizem em grupo e podem consultar o dicionário. (PROFESSORA ALNITAK).

No entanto, a realidade do mundo contemporâneo traz à luz a evidencia de que não é mais possível desenvolver o ensino, sobretudo na EJA, nessa linha paradigmática, pois é necessário buscar novas bases epistemológicas sobre as quais as ações docentes sejam capazes de dá novos significados à vida dos sujeitos. Entendo o processo desse modo, há que se ressignificar o espaço da sala de aula da EJA, pois este pode ser entendido como espaço de encontro entre diferentes sujeitos que trazem consigo suas variadas formas

culturais, e a ação docente nesta perspectiva ganharia uma postura dialético- reflexiva, levando-se em consideração o desencadeamento das questões de ordem cultural, pois na pós-modernidade, a objetividade passa a ser discutida, uma vez que as verdades não são mais absolutas e é possível ter variadas versões de uma mesma realidade. Assim, esse paradigma anuncia um horizonte de riqueza e complexidade, caracterizado pela diversidade, pluralidade. Desse modo, na visão do mundo da totalidade, o ensino deixa de ser entendido de forma reducionista e passa a ser atrelado ao contexto sociocultural dos indivíduos.

Essa constatação deve-se aos momentos de observação de aulas. Sob este ponto de vista entendemos que o ocorrido neste caso é a falta de preparação no curso inicial de licenciatura para tratar da diversidade cultural, pois de acordo com nossas interpretações, ao analisarmos o Projeto Político de Curso (PPC) de graduação da professora em pauta, entendemos que há lacunas que se refletem em suas ações. Observamos que essa ação constitui- se de múltiplas conexões de ensino, desde a aplicação dos conteúdos à organização sistemática das atividades.

Averiguamos que a questão das diferenças socioculturais dos/as alunos/as não são tratadas numa teorização crítica e/ou pós-crítica constituindo-se em um processo de cunho fundamentalmente político, isto é, em um processo contínuo que envolve negociações e renegociações de interesses e onde a heterogeneidade poderia prevalecer, na qual o corpo docente pode se envolver de forma problematizadora, questionadora, pois na dimensão política a questão das diferenças do alunado aparece caracterizada pela necessidade de rever e ressignificar os conceitos de direitos humanos, democracia, pela prática multicultural de se buscar formas distintas de se construir e interpretar a realidade, dando abertura à pluralidade de vozes e culturas presentes no âmbito escolar, que possibilite às pessoas jovens e adultas refletir sobre a referida questão levando-se em consideração a discussão numa perspectiva democrática, tendo em vista sua própria identidade, não se restringindo apenas ao respeito, tolerância, valorização e/ou reconhecimento, mas pondo permanentemente em pauta a análise dos processos pelos quais as diferenças são produzidas, afirmando-se a diversidade no interior de uma política cultural crítica, compromissada com a

justiça social, (MACLAREN, 2000). No entanto, o que encontramos foram ações docentes pautadas na transmissão de conteúdos inerentes à questão que se relaciona à temática das diferenças, de uma forma geral, distante de reflexões, acerca da perspectiva que defendemos.

Para a realização do diagnóstico objetivando levantar previamente o perfil dos alunos da escola, mantivemos contato com as pessoas jovens e adultas no primeiro semestre de 2013, com a aplicação do questionário, considerando que este nos ajudaria a interpretar diferenças socioculturais que se representam simbolicamente no currículo das salas de aula da EJA da escola campo de pesquisa. Inicialmente, a pesquisadora no mesmo ritual de apresentação, situou os alunos com relação à pesquisa. Responderam ao questionário 36 (trinta e seis) alunos/as do lócus de pesquisa, de um universo de 36 (trinta e seis) alunos/as matriculados no semestre em pauta.

No momento da apresentação sobre a aplicação dos questionários, a pesquisadora foi bem flexível, informando aos sujeitos que os mesmos poderiam ficar bem à vontade para responder, não havendo necessidade de identificação, apenas respostas e que seria aplicado pelas professoras. As professoras das turmas investigadas aceitaram aplicar o referido instrumento, com os alunos presentes e posteriormente com aqueles/as faltosos/as. Assim, recolhemos os questionários logo após todos/as os/as alunos/as terem respondido. O prazo se estendeu por volta de três (03) semanas para a recolha destes, uma vez que os/as alunos/as passam longos períodos afastados das aulas, precisamente nos períodos de colheita e também nos períodos de festas, considerando que a cultura local se caracteriza também na realização de festas das padroeiras nos povoados dos municípios.

No entanto, a aplicação dos questionários ao público das pessoas jovens e adultas da Escola Orion, foi extremamente útil, pois foi possível recolher informações prévias dos referidos sujeitos, levando-se em consideração nossas indagações acerca de suas condições socioculturais naquele momento. Ao elaborar os questionários, um dos pontos que levamos em consideração foi a formulação das questões, bem como o enunciado de apresentação, uma vez que a linguagem e o tom das questões são de extrema importância. Os questionários se constituíram também em um instrumento importante no processo de construção de dados da referida investigação, pois

nos possibilitaram basicamente acessar alguns aspectos que se relacionam com o enfoque da observação direta da pesquisa. A aplicação dos questionários justifica-se, ainda conforme Marconi e Lakatos (2003), por oferecer as vantagens de atingir um grande número de pessoas simultaneamente, garantindo ainda o anonimato dos entrevistados. Além dos questionários aplicados aos/às alunos/as, junto à secretária escolar, foi possível analisarmos as fichas de matrículas dos/as alunos/as ainda na fase de exploração do campo de pesquisa, o que nos possibilitou iniciar a investigação tendo em mãos alguns dados que contribuíram também para focar melhor as observações.

A pesquisa teve como fio condutor a permanência da pesquisadora no campo de estudos, a partir do processo de recolha de informações, construção dos corpora por meio das observações, entrevistas, análise documental, bem como através dos questionários aplicados aos/às alunos/as, desde a fase exploratória da pesquisa, que se caracterizou também na definição da questão de partida que norteou toda a investigação. Um dos pontos fundamentais da referida pesquisa foi o envolvimento participativo e contínuo da pesquisadora no locus de pesquisa, considerando que esta não dispõe de papel de julgadora, ou mesmo de desenvolver atividades comparativas, mas de participante, procurando obter ampla compreensão do evento em estudo.

Quanto ao percurso de descrição da investigação, este teve por base o entrelaçamento dos corpora, bem como das produções das professoras investigadas, sendo essas os planos de aulas e planejamentos de ensino, o que nos permitiu, por meio de nossas interpretações que não deixaram de ser reflexiva em nossa visão, a descrição detalhada dos resultados obtidos. Quanto aos registros no decorrer da investigação, no sentido de caracterizar a ação docente e sua relação com as diferenças socioculturais dos/as educandos/as no currículo da sala de aula da EJA, realizamos um acompanhamento sistemático das aulas dos sujeitos da pesquisa a partir da observação participante. Os registros no caderno de campo se constituíram em notas de campo com base em orientações necessárias para atuarmos em sala de aula enquanto pesquisadoras. No caderno de campo, além de registrarmos a ação de cada professora de forma sistemática por meio de um roteiro pré- estabelecido, registramos ainda fatos, sentimentos, reflexões e interpretações

que ocorreram durante as observações. Vale destacar que a observação requer dos/as pesquisadores/as uma ampla dimensão, no olhar atento, ouvido apurado e uma memória saudável, (VIANA, 2003). Ao mesmo tempo o registro objetiva um caráter fidedigno possível a partir das anotações dos eventos observados, tendo em vista que a investigação e os seus aspectos de evolução constituem notas de campo que segundo Bogdan e Biklen (1994) referem-se de maneira coletiva a todos os dados construídos durante a investigação, incluindo-se as referidas notas, as transcrições das entrevistas e dos documentos oficiais, ou vozes a partir de gravações, uma vez que a investigação depende da exatidão desse material. Desse modo, todo o material empírico da pesquisa foi sendo registrado em notas de campo, bem como a evolução da pesquisa, no sentido de situar a pesquisadora neste contexto.

As observações ocorreram no turno noturno, e os momentos de observações foram organizados da seguinte maneira: Professora de Geografia e História: 3h/a (semanal); Professora de Ciências e Matemática: 06h/a (semanal); Professora de Língua Estrangeira Moderna – Inglês – 02h/a (semanal). O trabalho de campo e a permanência de observação ocorreram semanalmente com uma carga horária de 11h/a nas 03 (três) turmas, observando a ação docente de 03 (três) professoras. O período de nossa atuação em campo foi de 16 (dezesseis) meses. Ou seja, um ano e quatro meses, e as observações foram iniciadas em maio de 2013, o que totalizou um ano, ou seja, dois períodos letivos de observação em sala de aula da modalidade EJA. Os referidos momentos se constituíram nos registros dos eventos levando-se em consideração as atitudes dos sujeitos investigados no que diz respeito ao tratamento das diferenças socioculturais dos alunos, tendo em vista as atitudes do corpo docente num plano delimitado no espaço da sala de aula. Observamos os aspectos da ação docente quanto aos procedimentos, metodologias, materiais utilizados que dizem respeito a cada disciplina, com enfoque no objeto de estudo da pesquisa.

Entendemos a referida observação como não estruturada, uma vez que nos fixamos nos aspectos da ação docente das professoras que julgamos essenciais ao objetivo do estudo. As observações das aulas ministradas pelas professoras Mintaka, Alnilan e Alnitak foram realizadas pela pesquisadora, tendo a participação desta de forma moderada, uma vez que a mesma

procurou estabelecer um equilíbrio entre as observações e interações que ocorreram durante este período, por meio de diálogo informal com os/as educandos/as, ora ouvindo seus comentários sobre suas vidas, suas dificuldades, interesses e desinteresses de estar na sala de aula. Outras vezes, por meio das respostas a alguns questionamentos levantados pelos/as alunos/as e até mesmo, em respostas às questões dos sujeitos investigados.

A finalidade da pesquisadora nos momentos de observação foi a de acompanhar as atitudes, modos de agir e desenvolver as atividades de ensino do professorado no locus de investigação, atentando para a descrição das situações vividas, compreendendo-as e desvelando-as em seus diversos significados, enfim, estando sempre à espreita enquanto pesquisadora, observando o maior número de situações possíveis no decorrer de todo processo investigativo. Os momentos destinados à observação foram seguidos de uma ficha roteiro como um guia.

Para André (2008a), a duração do contato direto do/a pesquisador/a no campo de estudos pode variar desde algumas semanas até vários meses ou anos. É uma decisão que vai depender dos objetivos do trabalho, da aceitação do pesquisador pelo grupo, de sua experiência e do número de pessoas envolvidas. No entanto, objetivando organizar nosso tempo, previmos a observação participante em sala de aula com enfoque na ação docente para um período de doze meses, como já mencionamos. A observação foi interrompida no momento de saturação do objetivo pretendido.

As observações ocorreram de maneira tranquila, pois as professoras investigadas nesses momentos nos transmitiram confiança, e ao mesmo tempo segurança, contribuindo para o desenvolvimento da pesquisa com mais detalhes. Um dos pontos positivos das observações da ação dos sujeitos que participaram da investigação, mesmo não sendo finalidade da referida pesquisa, foi o envolvimento que mantivemos com o público de pessoas jovens e adultas das turmas observadas. No início pareciam um pouco assustados/as, mas no decorrer dos dias, fomos nos tornando familiar. O trabalho de observação ocorreu de forma satisfatória, e gradativa, quando a pesquisadora adentrou o campo de maneira ética, sentando estrategicamente no fundo da sala aula, aproximando-se aos poucos dos sujeitos ali envolvidos. Cabe destacar ao longo das observações não houve necessidade de intervenção por

parte da pesquisadora. Nesse sentido, podemos dizer que o tempo desta esteve designado tão somente às anotações ou registros no caderno de campo.

No quadro a seguir apresentamos sistematicamente o número de observações realizadas:

QUADRO 1 - Sessões de observação in locus

SUJEITOS INVESTIGADOS TURMA

01

TURMA 02/03

Aula / disciplina

Aula /disciplina

Professora (ALNILAM) Ciências e Matemática, 23

Ciências e Matemática, 25;

Professora (ALNITAK) Inglês, 10; Inglês, 11; Professora (MINTAKA) Geografia e

História, 27;

Geografia e História, 25;

TOTAL POR TURMA 60 61

FONTE: Registro das observações no caderno de campo.

Durante o tempo em que permanecemos no campo de pesquisa, observamos 48 eventos nas disciplinas Ciências e Matemática; 21 eventos na disciplina Inglês e 52 eventos nas disciplinas História e Geografia, totalizando 121 eventos.