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CAPÍTULO I UM TRIUNFO MARCANTE: AS VÁRIAS FACES DA

1.6 A OPÇÃO PELO COMUNISMO: AS EXPLICAÇÕES PARA A CRISE

Enquanto o Folha de Ituiutaba buscou justificativas no antagonismo entre Cuba e Estados Unidos para a declaração do carácter socialista da Revolução Cubana em 1961, o jornal O Repórter construía outra argumentação. Cabe ressaltar, que esse jornal não seguia necessariamente uma cronologia dos principais fatos que se sucederam em Cuba. Havia uma ênfase, conforme anteriormente mencionado nos temas que permitissem fortes críticas à experiência revolucionária. São exemplos disso: os pelotões de fuzilamento; e a ameaça que as políticas de tendência comunista adotadas por Cuba representavam para o continente. Quais teriam sido as estratégias utilizadas pelo jornal uberlandense para combater e desacreditar o regime cubano? Como demonstrar que a tendência esquerdizante e a posterior opção pelo socialismo eram equivocadas?

No dia 28 de janeiro de 1961, o jornal veiculava uma matéria intitulada “Crise Interna”183

, na qual comentava as operações militares comandadas por Fidel Castro para combater os opositores cubanos que haviam pegado em armas para combater o governo revolucionário nas guerrilhas de Escambray. O periódico fazia referência à convocação, pelo líder cubano, de 15.000 milicianos para lutarem contra seus opositores. A esse respeito, constatava que “O importante quanto à excessiva mobilização de milicianos, é que Fidel não pode mais agir, sem que sua ação seja altamente demagógica e emocional”. Considerava ainda que essa excessiva mobilização cumpria a função de não deixar o povo cubano pensar sobre a atual situação econômica em que viviam e que, de acordo com o jornal, era decorrente da “comunização” do país. Segundo O Repórter, a solução que Fidel encontrou foi “manter a população sob o impacto de grandes perigos

182Idem.

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internos e externos, em clima emocional sem precedentes na América Latina”. Com isso, o jornal alegava que os cubanos não teriam tempo “para pensar na alimentação, trabalho, moradia e até na religião”184.

Ainda nesta matéria, o jornal destacava a “escassez de víveres” e o “desemprego”, e reforçava o argumento de que “Se não fosse essa tensão, habilmente mantida pelo governo de Havana, assessorado por especialistas na propaganda comunista, o povo cubano viria a situação cada vez mais calamitosa”. O jornal ainda afirmava que não podendo resolver esses problemas, como todos os países que se deixam enredar pelo comunismo, Cuba teve de apelar para as ameaças de invasão e perigos internos. Contudo, o jornal avaliava ser “impossível manter tantas massas em um ambiente de tensão permanente. E mais impossível ainda será ‘fabricar’ motivos que justifiquem mobilizações constantes”185

.

Em sua edição do dia 26 de abril de 1961, O Repórter veiculava uma matéria assinada por Felipe Chávez, com o seguinte titulo “Como o regime de Castro reduz, sorrateiramente, os ganhos do trabalhador”186

. Nela, argumentava-se que os trabalhadores cubanos estavam percebendo, com base em “uma experiência própria” e de forma “dolorosa” a redução de seus ganhos. Segundo o articulista, o governo cubano enganava os trabalhadores, dizendo-lhes que os seus vencimentos estavam isentos do pagamento de impostos para o orçamento nacional, uma vez que

(...) essa maravilhosa promessa não passa de cortina de fumaça: os operários cubanos, como seus colegas de todas as nações comunistas, descobriram que um estado policial não precisa impor contribuições diretas para tirar dos trabalhadores porções substâncias de seus trabalhos. Os regimes comunistas têm muitas maneiras diferentes de dar salários aos trabalhadores com uma mão e tirá-los com outra.187

Ainda segundo Felipe Chávez, o trabalhador cubano percebia que seu salário continuava o mesmo, mas o preço dos produtos de que precisava subia cada vez mais. Referindo-se aos camponeses, o articulista mencionava a reprodução que o regime cubano fazia em suas “fazendas populares” de métodos utilizados “por outras ditaduras comunistas”, uma vez que era o regime que determinava o que se devia plantar, quanto

184 Idem. 185

Ibidem, p.1.

186

CHÁVEZ, Felipe. Como o regime de Castro reduz sorrateiramente os ganhos do trabalhador. O

Repórter, Uberlândia, n. 715, 26 abr. 1961, p. 2. 187 Idem.

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iria para o Estado e quanto iria para o camponês. Empenhado em demonstrar as falácias do líder cubano e desmascarar as políticas governamentais cubanas, Felipe Chávez avaliava que era bastante amplo “o campo para manipulações”188

.

Em outra matéria, veiculada no dia 29 de maio de 1961, O Repórter comentava alguns desdobramentos da frustrada da invasão da Baía dos Porcos, ocorrida no mês anterior, que resultou na vitória do governo revolucionário sobre os exilados cubanos que, apoiados pelos Estados Unidos, invadiram o país. Muitos desse exilados derrotados foram presos ou condenados à morte. A propósito desses exilados que foram presos pelo regime, o jornal, em uma coluna intitulada “O que dizem e pensam os outros”189

, apresentava a opinião de alguns dos “principais” periódicos da América Latina sobre uma decisão polêmica de Fidel Castro, conforme se verifica no trecho abaixo:

Os principais jornais da América Latina qualificaram de cínico, desumano e monstruoso o oferecimento feito por Fidel Castro de entregar, em troca de 500 tratores, mil prisioneiros, que o seu regime tem em custódia após o malogrado desembarque do mês passado.190

O jornal ainda afirmava que o periódico La Prensa, da Argentina, comparava a atitude de Fidel Castro com a do governo nazista em relação a um episódio em que o regime nazista fez uma troca de judeus por caminhões. Afirmava ainda que se em Cuba não tem as câmeras letais, seria pelo fato de que “elas foram substituídas pelo paredón”. O Repórter também cita o Correo de la Tarde, que teria afirmado que Fidel Castro representa o retrocesso do velho mundo, chegando a sugerir que o líder cubano deveria ser expulso do continente. É interessante notar aqui a estratégia utilizada pelo jornal O Repórter para legitimar seu discurso de crítica à Revolução, demonstrando que sua opinião não era única, mas compartilhada pelos “principais jornais” da América Latina. A propósito dessa estratégia utilizada pelo jornal em sua coluna “O que dizem e pensam os outros”, convém lembrar a reflexão da historiadora Tânia Regina de Luca, ao destacar a importância de que a análise de um periódico atente para aspectos, como, por exemplo, “a escolha de títulos e textos programáticos, que dão conta das intenções e expectativas de um jornal, além de fornecer pistas a respeito da leitura de passado e de futuro compartilhada por seus propugnadores”191

. Finalmente, caber destacar que para o

188 Idem.

189 O QUE dizem e pensam os outros. O Repórter, Uberlândia, n. 3737, 29 mai. 1961, p. 2. 190 Ibidem, p.2.

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jornal uberlandense, em sua avaliação da economia cubana, a opção de Fidel Castro pelo comunismo deixava o povo cubano em uma “situação cada vez mais calamitosa” e era a causa das debilidades econômicas do país caribenho192.

O agravamento da crise econômica do país caribenho e da situação descrita como “cada vez mais calamitosa” para a população cubana seria retomada nas páginas d’O Repórter em sua edição do dia 11 de junho de 1961. Na matéria intitulada “Povo protesta contra racionamento generalizado em Cuba”193, eram reproduzidas declarações de camponeses refugiados em Miami sobre o panorama econômico da ilha caribenha, para os quais “O continuo decréscimo da produção doméstica, que se traduz na escassez de comestíveis, se deve em grande parte à falta de resistência do guajiro (camponês) à tirania de Fidel Castro e seus cúmplices”. O jornal mencionava também que Che Guevara, ministro da indústria de Cuba, havia declarado que a produção de açúcar tinha sido a mais baixa dos últimos anos. Destacava ainda as declarações de Puentes e José fraga, que haviam fugido de Cuba em um pequeno barco, e mencionavam que alguns camponeses, insatisfeitos com o regime, estavam praticando atos de sabotagem nas plantações de cana-de-açúcar e em outros cultivos. Puentes teria ainda revelado sua insatisfação com a existência das cadernetas de racionamento em Cuba e revelado que a situação de escassez era pior nos povoados. Diante disso, os camponeses cubanos, segundo o relato de Puentes, prosseguiam em sua luta pela liberdade, observando o seguinte lema: “camponês semeia para seu próprio consumo e não para abastecer o imperialismo soviético”194

.

O Repórter seguia sua linha discursiva utilizando-se de declarações de “cidadãos fugitivos” de Cuba para evidenciar a existência de uma oposição interna na ilha e retratar a crise pela qual passava o país. Além da Igreja Católica e de seus fiéis, agora também os exilados cubanos ganhavam notoriedade nas páginas do jornal por sua resistência ao governo revolucionário e por sua oposição aos rumos socialistas da Revolução.

192

Idem.

193

POVO protesta contra racionamento generalizado em Cuba. O Repórter, Uberlândia, n. 3746, 11 jun. 1961, p. 3.

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1.7. Hermenêutica da distância: as vozes dos exilados cubanos nas páginas d’O