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A OPERACIONALIDADE COMO ELEMENTO DO DIREITO PROCESSUAL

4 O NOVO ESTÁGIO METODOLÓGICO DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL: O MÉTODO PROCESSUAL PRAGMÁTICO

4.1 A OPERACIONALIDADE COMO ELEMENTO DO DIREITO PROCESSUAL

O direito processual é essencialmente dinâmico.

O processo é movimento para frente. Sem movimento não há processo, es-vaziando-se por completo a noção de direito processual. A qualificação desse movi-mento – a operacionalidade do processo404 – é elemento constitutivo desse que é o

“ramo do conhecimento jurídico mais próximo do mundo da vida, da prática soci-al.”405

Ainda que se visualize o processo como uma relação jurídica, ou se tome a relação jurídica como categoria fundamental da teoria processual,406 tal concepção não oferece o elemento operacional, pois não permite perceber o movimento e a dinâmica como dados essenciais do fenômeno processual.

Um processo sem caráter operacional perde completamente a sua significa-ção social. A operacionalidade não se confunde com celeridade, mais se aproxi-mando de efetividade, mas com conteúdo peculiar: não é restrito ao aspecto jurídico, penetrando todas as dimensões do fenômeno processual. Operacional é um proces-so que funciona: atinge todos os seus escopos definidos a cada momento históri-co.407

Quando se fala em método para o direito processual, não há como afastá-lo da operacionalidade. Um método processual deve dar conta dessa dimensão dinâ-mica. Tem que estar permeado pela constante preocupação operacional. Cada solu-ção proposta pelo método deve passar por esse crivo. As soluções

404 Na doutrina de Pontes de Miranda aparece a ideia de que o processo é “operação em seguimento”, durante a relação jurídica processual (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Proces-so Civil. Tomo I. Rio de Janeiro: Forense; Brasília: INL, 1973. p. 45).

405 SILVA, O. A. B. da. Processo e ideologia: o paradigma racionalista, p. 1.

406 ABBOUD, G., OLIVEIRA, R. O dito e o não-dito sobre a instrumentalidade do processo: críticas e projeções a partir de uma exploração hermenêutica da teoria processual, p. 56.

407 VENTURI, E. Processo civil coletivo: a tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais ho-mogêneos no Brasil – Perspectivas de um Código Brasileiro de Processos Coletivos, p. 159-161.

operacionais, que conspirem contra a natureza dinâmica do processo, devem ser rejeitadas.

É preciso, portanto, perceber que o direito processual não pode ser estuda-do e produziestuda-do sem levar em consideração essa dinâmica que lhe é inerente. Esse elemento prático o faz diferente dos demais ramos jurídicos, os quais aceitam, em maior ou menor grau, ser analisados numa dimensão estática. Talvez a operaciona-lidade do processo seja o melhor critério de diferenciação entre o direito processual e o direito material.408 PONTES DE MIRANDA já dizia que o direito processual é “di-reito rente à vida e há de estar em contacto permanente com a vida, a que ele serve, por ser, como os outros ramos do direito, processo de adaptação social, porém, mais do que os outros, dinâmico.”409

É claro que reconhecer a dimensão operacional do processo não significa negar ou minorar as cargas axiológicas que o envolvem. O direito processual está permeado por valores, sobretudo constitucionais, os quais devem ser realizados na atividade processual. Os valores, concretizados como regras e princípios, impõem limites, mas também exigem ações positivas. Impedem, por exemplo, que o juiz de-cida sem a participação efetiva das partes. De outro lado, exigem que o processo tenha duração razoável. Os limites estão quase sempre bem definidos em regras.410 As ações positivas, nem sempre o estão, constando, na maioria das vezes, de prin-cípios ou de cláusulas gerais. Por conseguinte, garantir o respeito aos limites, para evitar a arbitrariedade, é caminho mais fácil do que implementar valores com dimen-sões positivas, porque tais valores não dependem apenas de regras, mas também da administração das diversas variáveis que compõem o seu resultado de ação.

Toda essa carga axiológica, hoje, pode ser resumida em uma frase: o pro-cesso deve ser justo!

408 Segundo Pontes de Miranda, “a distinção entre direito processual e direito material é de grande importância prática. Os fins e os expedientes técnicos são diferentes. Alguns conceitos mudam, ao se passar de um campo para outro, como o de exceção.” (PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil, p.

46).

409 PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil, p. XLVII.

410 A imposição de limites ao arbítrio dos juízes não é, porém, o único papel do direito processual. Nesse senti-do, não é possível concordar, inteiramente – a não ser ressalvando o momento histórico em que foi emitida –, a opinião de Pontes de Miranda, no sentido que “[...] se advertirmos em que a luta judiciária, substitutiva da luta material, somente se exerce dentro de formas que evitem o arbitrário, facilmente compreenderemos o papel do direito processual no mundo em que vivemos.” (PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 48).

Mas, ao contrário dos ramos do direito material, o direito processual não se exaure nas disputas axiológicas, na avaliação do bem ou do mal, na adoção deste ou daquele direito organizador da vida social.

A realização dos valores que congregam a ideia de processo justo compõe apenas uma parte da experiência processual. Desde a revolução processual de FRANZ KLEIN, já se sabe que o processo também exige administração.411 Adminis-trar o processo significa fazê-lo operacional, caminhar ao seu destino de realização do direito material. Não é tarefa que acomete apenas ao juiz, mas a todos aqueles que, de alguma forma, participam da elaboração de soluções processuais. Como dizia KLEIN, “juízes, advogados e partes devem colaborar para a formação de uma decisão justa.”412

Assim, não é possível afastar o direito processual da realidade empírica, do que acontece no “tumulto da vida forense”.413 A administração do processo é um dado da experiência. E se a operacionalidade é componente essencial do sucesso das instituições processuais, torna-se impossível conhecer o direito processual ape-nas pela visão da dogmática, das leis ou dos conceitos jurídicos.

A primeira novidade de um novo estágio metodológico para o direito proces-sual civil é levar a sério o componente operacional do processo, sem medo de se

“contaminar” com componentes e técnicas extrajurídicos. A fase instrumentalista do processo tocou nesse assunto quando elaborou a noção de efetividade processual.

No entanto, o trabalho dos instrumentalistas se deu apenas no nível dogmático. Não partiu para o nível administrativo do processo, nem bebeu das experiências do Law and Economics. Por tal razão, ficaram nas promessas, sem definir os meios para realizá-las.

Essa nova vertente administrativa e econômica das preocupações proces-suais não significa submeter o jurídico ao extrajurídico ou transformar o direito pro-cessual num feixe infinito de disciplinas afins, dentre as quais o jurídico disputaria um espaço qualquer. Significa, sim, como reconhece NICOLA PICARDI, a necessi-dade de uma proposta multimetódica, que não se satisfaça, apenas, com a lógica jurídica formal:

411 CIPRIANI, Franco. Nel centenario del regolamento di Klein: il processo civile tra libertà e autorità. Rivista di Diritto Processuale, Itália, CEDAM, n. 4, p. 973.

412 CIPRIANI, F. Nel centenario del regolamento di Klein: il processo civile tra libertà e autorità, p. 974, tradu-ção nossa.

413 SILVA, O. A. B. da. Processo e ideologia: o paradigma racionalista, p. 1.

Negli ultimi tempi si va, peraltro, delineando un ripensamento in punto do metodo. Recenti ricerche hanno evidenziato che il monismo metodologico è solo un espediente di comodo: la complessità del fenomeno processo non consente di circoscrivere l’oggeto delle nostre indagini ad un’unica prospettiva, sia esso il solo dato normativo ovvero il solo profilo sociologico.

Si è finito, così, per gettare un’ombra di sospetto sulla mentalità semplificatoria che ha alimentato una lunga stagione di studi e si va delineando l’esigenza di analizzare il nostro tema in una pluralità di prospettive disciplinari, attraverso un approccio multimetodico, o meglio, una forma di sincretismo di metodi giuridici.414

Um novo estágio metodológico deve, necessariamente, assumir essa com-plexidade do fenômeno processual. Administração, economia e sociologia comparti-lham o mesmo locus da experiência processual, cada qual fornecendo a sua medida de colaboração para a prática-com-êxito desse peculiar direito dinâmico. O fenôme-no processual não se reduz à lógica jurídica, nem aos conceitos e sistematizações legais e doutrinárias. Num direito dinâmico, operacional, que trabalha com dados empíricos de administração de rotinas, chega a ser contraproducente – para não dizer ilógico – produzir soluções abstratas, saídas de formulações exclusivamente ideais.415 A proposta deve ser multimetódica. O pensamento, sozinho, desacompa-nhado da experiência, não pode produzir um bom direito processual.