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A NOÇÃO DE SOLUÇÕES PROCESSUAIS

4 O NOVO ESTÁGIO METODOLÓGICO DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL: O MÉTODO PROCESSUAL PRAGMÁTICO

4.2 A NOÇÃO DE SOLUÇÕES PROCESSUAIS

Bem por isso um novo estágio da metodologia processual deve trabalhar com a noção de “soluções processuais”.

Uma solução processual é uma resposta, empiricamente orientada, para um problema processual. Ela é produto de uma análise multidimensional, que comunga as demandas valorativas do processo justo, com as exigências funcionais do pro-cesso operacional. Uma solução processual trabalha todas as variáveis possíveis da gênese do problema.

414 “Nos últimos tempos se vai, a despeito disso, delineando uma mudança de ideia na questão do método. Pes-quisas recentes têm evidenciado que o monismo metodológico é somente um expediente de conveniência: a complexidade do fenômeno processual não permite circunscrever o objeto das nossas indagações por meio de uma única perspectiva, seja somente o dado normativo, seja somente o ponto de vista sociológico. Terminou-se, assim, por lançar uma sombra de dúvida sobre a mentalidade simplificadora que alimentou um longo estágio dos estudos e se vai delineando a exigência de analisar o nosso tema numa pluralidade de perspectivas disciplinares, através de uma proposta multimetodológica, ou melhor, uma forma de sincretismo dos métodos jurídicos.” (PI-CARDI, N. Manuale del processo civile, p. 14, tradução nossa).

415 PICARDI, N. Manuale del processo civile, p. 13.

Metodologicamente, uma solução processual é diferente porque a sua fonte de inspiração não é unicamente a lei ou os conceitos jurídicos. O juiz que procura uma solução processual não se limitará a abrir o código ou um livro de doutrina. A-brirá o código, folheará o livro, talvez isso lhe seja suficiente diante da dimensão do problema. Mas – a experiência cotidianamente ensina –, nem sempre os textos le-gais ou compêndios científicos fornecem solução ou, em inúmeras situações, a solu-ção por eles fornecida não satisfaz a grandeza do problema, ou seja, a solusolu-ção for-necida pela metodologia tradicional não é operacional, não funciona na prática ou dificulta a administração do processo.416 Pragmaticamente falando, uma solução processual, em casos tais, deve buscar outras fontes que propiciem uma resposta criativa, avaliando comparativamente as diversas hipóteses de resolução do proble-ma, tendo em vista as suas consequências.417

A criatividade está na base da noção de solução processual, reveladora da implementação ou concretização de um processo operacionalmente justo.

Aqui reside o maior de todos os entraves para a construção de um método processual que realize as aspirações, há tanto amealhadas, de efetividade proces-sual. No direito (ao contrário da administração), tradicionalmente, a criatividade é considerada um anátema: um juiz criativo é um “juiz ativista” (em sentido negativo), que conspira contra a segurança das instituições jurídicas, decidindo unicamente conforme sua consciência ou preferências pessoais.418 É claro que uma proposta metodológica não deve aderir a uma criatividade irresponsável. Enquanto método, deve apontar os caminhos para que a criatividade frutifique em soluções processuais adequadas, sem arbitrariedades. O processo justo repele a arbitrariedade. O impor-tante é não confundir as coisas. Criatividade não é o mesmo que arbitrariedade. Um processo operacional não pode deixar de contar com as iniciativas criativas. O

416 No dizer de Pontes de Miranda, “Livro de doutrina – manual, comentários ou tratado – há de ser livro útil aos juízes e advogados, como roteiro para as suas atividades. Os livros que não resolvem dúvidas, os livros sem valor prático, são livros de metafísica ou de retórica jurídica; não são livros de ciência. É perder tempo lê-los e mencioná-los. Ou se sabe direito, ou não se pode falar sobre direito. Ninguém pode escrever filosofia da botânica sem ser botânico. Um dos males da civilização está no que escrevem sobre o direito os que somente conhecem o que se escreveu sobre ele. É com tijolos, barro e madeira que se constrói, ou com ferro e cimento. Não se pode edificar, criar, com estampas de casas, ou sobre o estilo. O direito de um povo, por mais integrado que esteja em certa zona de cultura, tem o seu estilo, e vive dentro dele. O jurista tem de revelá-lo, e pouco lhe adianta o que pensaram sobre os sistemas jurídicos os que nunca entraram, a fundo, num sistema jurídico. O mérito dos livros, só se há de medir pelo que deixaram na doutrina e na jurisprudência. O mérito a mais, que possam ter, advém-lhes do que obtiveram de adesão dos juízes e dos intérpretes, e pela notícia que deram do que se pensou e julgou nesses dez ou mais anos.” (PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil, p. L).

417 EISENBERG, J.; POGREBINSCHI, T. Pragmatismo, direito e política, p. 112-113.

418 LOPES, M. E. de C. Ativismo judicial e o novo Código de Processo Civil, p. 303.

todo consiste em oferecer as balizas para essa criatividade. Mas, impedir a criativi-dade na produção de soluções processuais é sepultar qualquer tentativa metodoló-gica de suplantar os obstáculos que até hoje prendem o direito e o processo ao pa-radigma racionalista.

Pode-se dizer que um juiz pragmático, enquanto juiz criativo, é ativista,419 mas no sentido positivo do termo, tal qual o emprega ROBERTO BERIZONCE, con-ferindo-lhe uma noção mais profunda, endereçada “a la obtención de una finalidad en la que predominan los valores fundamentales.”420 Esse juiz ativista, que não se confunde com o juiz ativo ou diligente/atuante, é aquele que, a partir de uma visão

“progresista, evolutiva, reformadora, sabe interpretar la realidad de su época y le confiere a sus decisiones un sentido constructivo y modernizador, orientándolas a la consagración de los valores esenciales en vigor.”421

A criatividade reivindicada por uma nova fase do direito processual exige uma postura não conformista diante do problema. A experiência sempre vai fornecer novas problemáticas. Novos problemas, novos processos, com diferentes demandas e extensões. O mundo globalizado, para o bem ou para o mal, estará constantemen-te sendo impactado por mudanças. Não é o caso de baixar a cabeça e aceitar que não é possível resolver o problema que se apresenta. Sempre será possível resolver o problema, pois no campo jurídico não há determinismo. Talvez a resposta não seja fácil. Talvez não esteja à vista para um formalista, que procura no sistema lógico a resposta esperada. Mas estará presente para um administrador de processos, que não se limita pela opção lógica e percebe que administrar processos é administrar pessoas.

Trabalhando com a noção de soluções processuais, o método processual pragmático exercitará a criatividade responsável, porque empiricamente orientada.

Não só dirigida a juízes, como a juristas e a legisladores. Em todas as esferas de produção do direito processual, a busca será por soluções processuais, com respeito ao caráter operacional do processo, mas sem descurar das garantias fundamentais.

O impacto com a realidade será o “banco di prova dei meccanismi processuali”, na

419 EISENBERG, J.; POGREBINSCHI, T. Pragmatismo, direito e política, p. 118.

420 BERIZONCE, R. O. Activismo judicial y participación en la construcción de las políticas públicas, p. 44-45.

421 BERIZONCE, R. O. Activismo judicial y participación en la construcción de las políticas públicas, p. 45.

dicção de NICOLA PICARDI.422 Deixa-se de lado a elegância terminológica ou a jus-teza sistemática para conferir maior adequação e eficiência ao processo.

4.3. A PRESTAÇÃO JURISDICIONAL COMO FONTE METODOLÓGICA