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7 CRIME ORGANIZADO

De acordo com estudos realizados pelo Instituto de Criminologia de Cape Town, na África do Sul, estima-se que desde a Guerra Fria, o crime organizado passou a ser uma ameaça global, sem precedentes na história, individualmente. (DANTAS, 2002, s.p.)

Trata-se de um fenômeno social bastante complexo e difícil de ser combatido, podendo ser compreendido como um grupo, organizado estruturalmente com a finalidade de simples obtenção de recursos financeiros e poder por meio de atividades ilegais, utilizando-se de meios tecnológicos e da globalização, frequentemente recorrendo à intimidação de terceiros e ao medo.

chinesas, as Máfias italianas e, ainda, as Yakuza no Japão, que remontam ao crime organizado pelo mundo. Note-se que o fortalecimento das atividades ilícitas praticadas por essas organizações, contava com o apoio de autoridades corruptas.

(SILVA, 2009, p. 03)

No Brasil o surgimento de organizações criminosas remonta ao surgimento do movimento conhecido como cangaço que atuou no sertão nordestino entre os séculos XIX e XX, se empenhava em contestar o coronelismo e os grandes fazendeiros e para isso cometendo os mais variados crimes sobre a égide de uma organização hierárquica. E ainda, o marco inicial das associações organizadas a partir da instituição da lei das contravenções penais, que tipificou o chamado “jogo do bicho”, um jogo de azar que em meados do século XX, foi criado com o fim de angariar fundos para salvar os animais do Jardim Zoológico do Rio Janeiro, pelo Barão de Drumond, cuja ideia era, em síntese, sortear prêmios por meio do recolhimento de apostas. (BARROS, 2004, p. 27)

Muito bem empreendida, a ideia despertou o interesse de organizações que amparadas pelo manto da ilegalidade e corrompendo as autoridades, movimentavam um mercado altamente rentável com as apostas. Em seguida, com o surgimento da loteria esportiva, autorizando as apostas juridicamente, o “jogo do bicho” perdeu sua força nos dias atuais. E, obviamente, não se pode olvidar do movimento dos Comandos, organizações extremamente violentas, que se levantaram quando o Estado perdeu o controle interno dos presídios superlotados, que atualmente aterrorizam o país e põe em xeque a segurança nacional. (BARROS, 2004, p. 27)

Estima-se que o que permitiu a instituição do crime organizado foi o abuso de poder por parte de quem o detinha, ou seja, das autoridades públicas, bem como a corrupção dessas autoridades políticas na época.

Atualmente, o crime organizado é puramente capitalista agindo de maneira supra estatal submetendo a sociedade desprotegida às suas imposições ficando a mercê das vontades de criminosos estruturalmente organizados com armamentos pesados, que por meio de suborno e aproveitam-se das falhas do poder público para atuar, buscando tão somente o enriquecimento puramente ilícito.

Nesse sentido, bem elucida Maria Leonor Assunção em seu artigo

“Do lugar onde o sol se levanta, um olhar sobre a criminalidade organizada”:

Os membros das organizações criminosas actuam numa pragmática específica, têm atrás de si um aparelho mais ou menos sofisticado, capaz de protegê-los, desde logo, face às entidades com competência em matéria de investigação dos crimes por eles cometidos e, assim, lhes garantir a impunidade, e de criar uma imagem de facilitação da actividade criminosa e de eficácia, geradora de sentimentos de fidelidade ao direito e aos valores que ele tutela, cuja aquisição e reforço funcionam como elemento dissuasores da prática de crimes, como ensina a moderna teoria dos fins das penas. (ASSUNÇÃO, 2003, p. 96)

Há uma preocupação internacional com o crime organizado, tendo em vista a gigantesca proporção alcançada pelos ilícitos internacionais ligados ao tráfico de drogas, de armas, corrupção de agentes públicos estrangeiros trabalhadores das fronteiras e da lavagem de dinheiro, fato esse que leva os países a se organizarem de modo a cooperar uns com os outros no intuito de combater o crime organizado.

Conforme bem acentuado pelo magistério dos promotores de justiça Silvio Antonio Marques e Adriana Ribeiro Soares de Morais:

O Ministério Público, a polícia, o Poder Judiciário e outros órgãos estatais, por isso, devem se preparar e se articular para combater as organizações criminosas, os agentes públicos corruptos e os lavadores de dinheiro que atuam em diversos países. Nos âmbitos civil e administrativo, são imprescindíveis medidas que propiciem a perda de bens de origem criminosa e a recuperação de ativos subtraídos dos cofres públicos.

(MARQUES e MORAIS, 2009, p. 09)

A exata definição de crime organizado é controversa e complexa, por vezes, não se concretiza nem mesmo no direito comparado; dadas as divergências de nação para nação, assim recorrendo ao ordenamento jurídico brasileiro verifica-se a Lei nº 9.034/95, onde verifica-se encontra certa omissão quanto à definição do crime organizado, os tipificando analogamente aos crimes de associação criminosa e quadrilha ou bando do Código Penal. Ainda com a revogação expressa do artigo 1º desse dispositivo legal pela Lei nº 10.271/01, o problema quanto à definição legal do crime organizado ainda não se convalidou, pois a nova lei apenas distinguiu

associação criminosa e dos crimes de quadrilha e bando e enunciou o crime organizado deixando de tipificá-lo. Atente-se então que o conceito de crime organizado para o ordenamento jurídico brasileiro está todo e completamente aberto, sendo uma anomia, e mais precisamente nas precisas palavras de Luiz Flávio Gomes (2010, s.p.):

Organização criminosa, portanto, hoje, no ordenamento jurídico brasileiro, é uma alma (uma enunciação abstrata) em busca de um corpo (de um conteúdo normativo, que atenda o princípio da legalidade).

Nesse contexto, visando elucidar questões como a definição das associações criminosas, bem como os meios de obtenção das provas, e o procedimento criminal das infrações correlatas, no dia 02 de agosto deste ano de 2013, foi editada a Lei 12.850/2013.

Inexorável destacar que a referida lei veio em um excelente momento, porquanto traz mudanças significativas no panorama dos meios de prova, e revoga totalmente a Lei 9.034/95, colocando à disposição do aparato estatal métodos eficazes de combate à criminalidade que ganha cada dia mais força.

Em seu artigo 1º, no § 1º a Lei nº 12.850/2013 dispõe o conceito de criminalidade organizada:

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

No entanto, lamentavelmente, o legislador restringiu o conceito associação criminosa apenas àqueles que se associarem com o fim de praticar infrações cujas penas sejam superiores a quatro anos de prisão; excluindo assim, os que se organizam para a prática de contravenções como o “jogo do bicho”, por exemplo. E ainda, abre certo precedente para a corrupção, segundo Francisco Sanni Neto, considerando-se que também está de fora do enquadramento pela nova lei uma “quadrilha que se organize estruturalmente com escopo de fraudar

licitações, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente”. (NETO, 2013, s.p.)

Além disso, em seu bojo, mais precisamente no artigo 15, a nova lei trata sobre o acesso do delegado de polícia, por seu poder requisitório, independentemente de autorização judicial, a dados cadastrais do investigado, como qualificação pessoal, filiação, bem como endereços mantidos pela Justiça Eleitoral, provedores de internet, instituições financeiras e administradoras de cartão de crédito, não necessitando mais de autorização judicial para fazê-lo.

Outra mudança substancial de acordo com a nova lei é a possibilidade de infiltração de policiais na fase da investigação das organizações criminosas, nos termos do artigo 3º, inciso VII e artigo 10. Que será admitida mediante demonstração de indícios de associação para a criminalidade organizada, necessitando também apontar o alcance das tarefas dos agentes, qualificação das pessoas investigadas (se possível) e a impossibilidade de se produzir a prova através de outros meios. Em suma, concretizar-se-á a infiltração em ultima ratio, quando não dispuser de outros meios aptos para a produção de provas contra o crime organizado.

Por vezes, entende-se completamente razoável tal medida, considerando os riscos deste procedimento, embasado pelo princípio da proporcionalidade, como bem assenta Francisco Sannini Neto (2013, s.p.):

Considerando a Lei 9.296/96, que trata das interceptações telefônicas, esta também estabelece que este procedimento só poderá ser realizado quando não for possível a obtenção de provas por outros meios, qual dos procedimentos investigativos deve ser adotado em primeiro lugar? A infiltração de agentes ou a interceptação telefônica? Em princípio, entendemos que a infiltração de agentes deve ser subsidiária à interceptação telefônica, especialmente em virtude do risco que este procedimento acarreta aos agentes policiais. Num confronto entre o direito de privacidade do investigado e o direito a vida ou integridade física do policial, deve prevalecer este último, inclusive com base nos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

Feitas estas considerações, salta aos olhos, sem nenhuma sombra de dúvida, que a Lei 12.850/2013 institui mudanças positivas e prósperas que certamente serão eficazes no combate ao crime organizado no cenário nacional.